Desde as últimas décadas do século XX, os deslocamentos espaciais, individuais ou coletivos, são temas da literatura latino-americana, principalmente os deslocamentos do eixo Sul- Norte, ou seja, dos países latino-americanos para os Estados Unidos. Entretanto, se a migração dos anos 60 do século passado foi impulsionada pelas ditaduras nos vários países da região ou pela possibilidade de uma vida melhor; nas primeiras décadas do século XXI, as motivações para deixar o país de origem são as mais variadas possíveis: estudo, turismo, imposições de trabalho ou apenas o desejo de mudança. Tais perspectivas contribuem para que se crie a ideia de um "planeta nômade", onde tudo e todos estão em constante movimento. Desse modo, os deslocamentos mais do que as identidades locais tornaram-se objetos de pesquisa para os estudos latino-americanos. As causas e as consequências desses deslocamentos abrangem os mais diversos campos do saber, porém, convergem para a problematização das relações de pertencimento único que desestabilizam os conceitos preconcebidos de nação, identidade, cultura e linguagem. Segundo Toro (2010), na época atual, que denomina como Pós-modernidade, as migrações interseccionam o global e o local e contribuem para uma produção cultural simultânea, desestabilizadora do conceito de pertencimento. Ao cruzar a fronteira estadunidense, os latino-americanos vinculam-se a outra língua, paisagens culturais e memórias identitárias, criando mecanismos de identificação que não coincidem com os que possuíam, em um constante processo de reconfiguração identitária. Desse modo, torna-se impossível desvincular os relatos oriundos desses deslocamentos espaciais das questões identitárias. As identidades afetam e são afetadas pelos deslocamentos, já que a experiência da migrância permite, a partir do encontro com o outro, um constante processo de (re)invenção de si mesmo, já que “na situação da diáspora, as identidades tornam-se múltiplas” (HALL, 2008, p. 28-9. A obra Sam no es mi tío: veintidós crónicas migrantes y un sueño americano (2012), organizada por Aileen El-Kadi e Diego Fonseca trata dessas relações. O livro é um mosaico no qual se pode encontrar crônicas, reflexões pessoais, ensaios e testemunhos dos autores. Os textos são propícios para mostrar a experiência do sujeito em trânsito que se move constantemente pelos vários espaços das duas culturas, já que a experiência da errância e a projeção de identidade gerada pelos deslocamentos permitem pensar em sua subjetividade a partir de um lugar duplo, híbrido, não-unitário. Assim, os textos presentes na obra estabelecem novas relações com o espaço que suscitam algumas perguntas: Quais as consequências desses deslocamentos territoriais para a (re)construção identitária do sujeito migrante? A partir de que espaço cultural se poderia ler os textos desses escritores migrantes? Portanto, pretende-se, a partir da obra citada, analisar e discutir a relação entre as experiências de deslocamentos e reterritorialização e suas consequências para a (re)construção identitária As várias respostas que podem ser dadas as essas perguntas acabam por ressignificar os conceitos homogeneizantes de identidade, identidade nacional e, por conseguinte, o próprio conceito de literatura nacional, tão veemente defendido durante a criação das nações independentes da América Latina no século XIX.