ANDRESSA LUCIANE MATHEUS MEDEIROS, PAULO ASTHOR SOETHE
A recepção da épica na obra Grande Sertão: Veredas é tema recorrente na crítica rosiana. Contundo, este trabalho pretende discutir a influência das principais características da narrativa homérica, lendo-as como recursos digressivos retóricos no Grande Sertão: Veredas, discutindo de que maneira as digressões são arquitetadas e o modo como elas fornecem argumentação essencial na composição do eixo narrativo. A análise aqui porposta apresenta como base teórica as retóricas e poéticas clássicas e a interpretações que estas fazem das digressões em Homero, bem como argumentos de classicistas contemporâneos como Malcolm Heath. O objetivo deste trabalho é apresentar uma análise das digressões em Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa, a partir da influência das obras de Homero na elaboração das digressões. Tomo como ponto de partida para tais afirmações as anotações pessoais de Guimarães Rosa sobre a Ilíada no documento E17, seção Ilíada, no Arquivo Guimarães Rosa (IEB-USP), cadernos, nos quais o autor tomou notas breves e registrou algumas das principais características da narrativa homérica como: antecipações, epítetos e comparações com animais (símiles); multiplicidade na imagem, dualidade de nomes, intercalações e perguntas retóricas. Na primeira metade do Grande Sertão: Veredas existem diversas partes digressivas que empregam elementos formais e estilísticos como os acima citados. Assim sendo, essa comunicação tem como foco a análise das funções estratégicas de algumas dessas características da épica, porém as abordando como categorias digressivas, tendo como objetivo analisar de que maneira colaboram para a construção do sentido e da estética do romance como um todo, permitindo ao leitor estender os significantes para novos significados, por meio de associações imagéticas, léxicas, e fonossemânticas e pelas repetições dos Leitmotive, que ocorrem ao longo do romance. Portanto, concluímos que o emprego da digressão no Grande Sertão: Veredas objetiva multiplicar as possibilidades de investigação do tema principal e a manifestar as relações entre o sensível (explícito na ação) e o inteligível (expresso através do pensamento, da subjetividade da palavra). Assim, o eixo narrativo e digressão estão organizados de modo que são complementares tanto em relação à matéria e quanto à organização do discurso. Segundo, Malcolm Heath em Unity in Greek Poetics a complexidade coesiva é um traço comum nas obras gregas e que estas possuem muitas vezes uma característica centrífuga, no sentido em que ampliam a temática através do distanciamento do tema central, e que pensamentos ou digressões adornam o discurso e não prejudicam a unidade ou coesão do texto. Heath lança uma série de exemplos, entre eles os poemas épicos Ilíada e Odisseia e alguns glosas de comentadores da antiguidade sobre as técnicas homéricas, nos quais as digressões ou figuram como elementos importantes para a ampliação das ideias. Acredito que os apontamentos de Rosa colaboram para a confirmação de algumas de minhas hipóteses sobre a influência de Homero em Grande Sertão: Veredas.
Palavras-chave: HOMERO, DIGRESSÃO, CARACTERÍSTICAS DA NARRATIVA HOMÉRICA, GRANDE SERTÃO: VEREDAS