O objetivo desta comunicação é analisar o romance A Confissão da Leoa (2012), de Mia Couto e o conto “Meu tio o Iauaretê” (1961), de Guimarães Rosa. O estudo será conduzido sob uma perspectiva comparatista com o intuito de estabelecer aproximações e divergências entre as obras escolhidas, visto que o romance de Couto dialoga diretamente com o conto rosiano. Minha análise se concentrará na maneira como ambas as obras trabalham a questão da animalidade inerente ao ser-humano, assim como a linha tênue entre o que é humano e o que é animal. Além disso, relacionarei o tema da animalidade com a violência que apresentam os textos de Rosa e Couto. O ensaio de Haroldo de Campos, “A linguagem do iauaretê”, evidencia a presença de um léxico de origem indígena e africana que conversa e interage com o português brasileiro. Este cenário remete a um Brasil colonial que se estabelece em meio ao multilinguismo que sabemos ter feito parte da formação da identidade brasileira. Por sua vez, A Confissão da Leoa (2012) também apresenta um espaço cultural, histórico e político que foi e ainda é influenciado pelo domínio português e onde também convivem diversas línguas e dialetos. Dessa forma, pretendo colocar em pauta também a questão colonialista que marca tanto o Brasil, quanto Moçambique – lugar onde se desenvolve a obra de Mia Couto. O Brasil não-urbano e animalesco de Rosa em “Meu tio o Iauaretê” (1961), convida-nos a problematizar a nossa condição pós-colonialista e também o entendimento do que é aproximar-se de uma circunstância não-racional do ser. Parto do pressuposto de que o conto de Rosa também trabalha com a figura do indígena, que habita e traduz a fauna e a flora que o cercam; assim como Couto retrata um ambiente rural, moradia de algumas tribos ao norte de Moçambique, onde os limites entre o racional e o não-racional são sutis. Nesse ambiente que permeia ambas as obras estudadas, existe a transformação do ser-humano em animal, que pode ser interpretada utilizando como ferramenta o conceito de Deleuze & Guattari, em A Thousand Plateaus (2005), onde os autores refletem sobre o devir-animal. Nas obras de Rosa e Couto, a figura animal é situada em posição privilegiada, algo que contraria a tradição artístico-literária da representação ostensiva do ser-humano como o centro da narrativa. Assim, é possível perceber que ambos os autores tendem a se opor à norma da “máquina antropológica”, como descrita por Agambem (2004), e se focam necessariamente na dualidade do ser-humano.