XII CONGRESSO INTERNACIONAL ABRALIC
Resumo:506-1


Oral (Tema Livre)
506-1A subversão do sólito: uma análise comparativa de Nights at the Circus e The Bloody Chamber and Other Stories, de Angela Carter
Autores:Maria Cláudia Simões (UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro)

Resumo

No decorrer dos séculos, as mulheres têm sido subjugadas pelo patriarcado e compelidas a desempenharem papéis estabelecidos por padrões tradicionais. O comportamento feminino sólito, isto é, habitual, frequente, esperado neste tipo de representação, reflete discursos sexistas enraizados na sociedade, nos quais não é oferecida voz às mulheres. Em A Dominação Masculina, Pierre Bourdieu (2009) afirma que a “força da ordem masculina se evidencia no fato de que ela dispensa justificação”. Muitas obras literárias tradicionais, mesmo na literatura infanto-juvenil, por exemplo, refletem a dominação masculina de sujeitos femininos, e reiteram estereótipos da mulher submissa ou em perigo, que é sempre resgatada por um homem. No processo de desconstrução dessa visão masculina em relação às mulheres, escritores/as contemporâneos/as podem lançar mão de estratégias narrativas que privilegiem a ruptura dos padrões impostos, contribuindo para a subversão dos papéis gendrados estabelecidos e oferecendo uma forma de rever valores tradicionais. Nesse sentido, o realismo mágico, uma vertente do insólito ficcional, pode ser um importante instrumento nesta tarefa. Maggie Ann Bowers (2004) declara que o realismo mágico oferece ao escritor que deseja escrever contra regimes totalitários um meio de atacar as definições e as suposições que embasam tais sistemas. Desafiar os pilares da sociedade patriarcal é um dos objetivos da problematização dos discursos sexistas. A presente comunicação objetiva discutir, em uma análise comparativa, as obras Nights at the Circus (1984) e The Bloody Chamber and Other Stories (1979), da escritora inglesa Angela Carter, investigando o uso do realismo mágico na desconstrução da habitual, sólita, representação do sujeito feminino, representação esta galgada em pré-conceitos estabelecidos pela sociedade patriarcal. Situado na Europa de 1899, na virada para o século XX, o romance Nights at the Circus apresenta Sophie Fevvers, uma mulher alada e independente, representante dessa “Nova Mulher” do fim do século, capaz de escapar pelos céus das amarras impostas por sistemas sexistas, que visam a manter as mulheres sob o seu jugo. Seguindo a mesma abordagem transgressora, na coletânea The Bloody Chamber, Carter apropria e reescreve contos do século XVII de Charles Perrault. Nas reescrituras que faz de textos infantis como “O Barba Azul” e “A Bela e a Fera”, a autora solapa imagens que retratam o sujeito feminino de maneira gendrada à luz de visões tradicionais masculinas. Maggie Bowers acrescenta que realismo mágico se refere à ficção que inclui acontecimentos mágicos em uma narrativa realista verdadeira onde o sobrenatural não é uma questão simples ou óbvia, mas, sim, uma ocorrência do cotidiano, admitida, aceita e integrada na racionalidade do realismo literário. Nas obras aqui abordadas, Angela Carter, por meio do realismo mágico, subverte a imagem sólita da mulher, dando-lhe voz e desestabilizando a ordem da sociedade patriarcal.