XII CONGRESSO INTERNACIONAL ABRALIC
Resumo:819-1


Oral (Tema Livre)
819-1A linguagem proliferante: o insólito na Hilarotragoedia, de Giorgio Manganelli
Autores:Claudemir Francisco Alves (PUC MINAS - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais)

Resumo

A obra do escritor italiano Giorgio Manganelli (1922-1990) se destaca pela radicalidade com que se recusam os cânones do romance, pondo em questão não apenas as formas e os fins, mas a própria possibilidade da narrativa. Fazendo uma releitura da obra inaugural desse autor, a Hilarotragoedia, analisam-se, neste artigo, os procedimentos de construção textual pelos quais a linearidade e a teleologia do pensamento são evitadas. Essas estratégias antinarrativas fazem de Hilarotragoedia – como da maioria das obras subsequentes desse autor – um maquinismo linguístico montado para produzir, no leitor, um estranhamento frente a uma linguagem levada à fronteira da comunicabilidade. Lança-se o leitor diante de uma linguagem insólita, na medida em que é desnudada a suposta capacidade da palavra de comunicar algo sobre a realidade. Pelo predomínio de figuras como o paradoxo, o oxímoro e o adunaton, exploram-se as determinações fortuitas, simultâneas e contraditórias do real. Explicita-se, dessa forma, a impossibilidade (mas, igualmente, a necessidade) da existência, do conhecimento e do discurso. O real é, então, concebido como resultante de agenciamentos; a impostação epistêmica, como rigorosamente arbitrária; e a linguagem, como radicalmente incongruente. A idiossincrasia do insólito, na ficção manganelliana, se deve ao entrecruzamento que se produz, nessa antinarrativa, entre a linguagem, a epistemologia e uma peculiar metafísica negativa que se funda não sobre o ato de ser, mas sobre os possíveis do ser. Tal concepção afilia-se a uma tradição moderna poética e filosófica que se caracteriza pela recusa ao otimismo pouco crítico da razão pós-iluminista e pela valorização do papel da linguagem na constituição e representação do real. Desses postulados filosóficos, decorre uma concepção literária que desontologiza autor, leitor e texto, os quais passam a ser percebidos como papéis pragmáticos em um jogo.