Oral (Tema Livre)
123-1 | TORTURA SOB DEBOCHE: UMA QUESTÃO DE RISO OU MORTE (ANÁLISE DE “TRILOGIA MACABRA”, DE ALEX POLARI) | Autores: | Wilberth Salgueiro (UFES - Universidade Federal do Espírito Santo) |
Resumo Em 1978, Alex Polari de Alverga publica o livro de poemas Inventário de cicatrizes. O militante político se encontrava, então, encarcerado, por conta do seu envolvimento direto no sequestro do embaixador alemão Holleben, em junho de 1970. No ano seguinte, Polari é preso e preso permanece até 1980. O livro Inventário de cicatrizes traz, em versos, reminiscências, impressões, notícias e reflexões acerca não só do cotidiano da cadeia, o que inclui falar das condições de vida e sobrevivência, como excursiona por problemas gerais de poética e de escrita. Apesar dos inúmeros padecimentos explicitados ao longo da obra, há um traço que, de certo modo, surpreende o leitor: a presença constante do humor, em forma mista de deboche e ironia, sobretudo porque este humor se produz pela voz daquele que sofria o martírio e praticamente durante o constrangimento da dor, contrariando afirmação de Vladímir Propp ao dizer que “é possível rir do homem em quase todas as suas manifestações. Exceção feita ao domínio dos sofrimentos, coisa que Aristóteles já havia notado” (Comicidade e riso). A ideia da comunicação é analisar as três partes do poema “Trilogia macabra” – o torturador, o analista de informações, a parafernália da tortura – tentando mostrar que o uso do recurso humorístico é legítimo, mesmo quando se apropria de fatos macabros e hediondos como escada para sua aparição, o que não significa desrespeito ou desprezo pela dor ou tragédia acontecida: “Além disso [o torturador] acredita que é macho, nacionalista, / que a tortura e a violência / são recursos necessários / para a preservação de certos valores / e se no fundo ele é um mercenário / sabe disfarçar bem isso / quando ladra” (Polari). A técnica básica para produzir humor em condição tão adversa será, exatamente, a construção de “um pano de fundo não cômico ou humorístico em relação ao qual o outro, o cômico, apareça” (Sírio Possenti, Humor, língua e discurso). Para além da análise específica do poema, a comunicação tem em mente reafirmar a força cicatrizante do humor, não para abolir o trauma e sim para dar a ele uma leveza impensada, uma alegria vinda e inventada da própria treva – artes de uma grandeza que os torturadores jamais imaginariam. |