XII CONGRESSO INTERNACIONAL ABRALIC
Resumo:358-1


Oral (Tema Livre)
358-1Metáforas para o “indizível” da periferia.
Autores:Wesclei Ribeiro da Cunha (UFC - Universidade Federal do CearáUFC - Universidade Federal do CearáUFC - Universidade Federal do CearáUFC - Universidade Federal do Ceará)

Resumo

O presente trabalho pretende desenvolver uma reflexão acerca da consolidação de um novo estilo de escrita, resultante do processo de formação literária e cultural de Clarice Lispector (1920-1977), sobretudo no que concerne à apropriação e transformação de leituras realizadas pela escritora, para interpretação de A paixão segundo G.H, considerando-se as narrativas de vida e de obra clariceana, numa “complexa alquimia criativa” (GOTLIB: 1995, p.15). Com efeito, no itinerário místico de G.H., a narrativa desenvolve reflexões sobre o aspecto metalinguístico concomitante aos aspectos poético e transcendental do ser, em cujo processo narrativo se inscrevem “os grandes temas verbais da existência”, “uma mitologia pessoal e secreta” (BARTHES: 2004,p. 10), peculiares à poética clariceana. Em A paixão segundo G.H., sob condensada estrutura, a escritora desenvolve instigantes questões acerca da existência humana, nas condições de centro e periferia, visto que é a partir do reconhecimento da condição de Janair, ex-empregada de G.H., que a protagonista descobre, com mal-estar, um outro mundo de imagens, motivados por rudimentares desenhos, “de um homem nu, de uma mulher nua, e de um cão que era mais nu do que um cão” (LISPECTOR: 1998, p. 41), feitos por Janair com ponta quebrada de carvão, na parede caiada, contígua à porta do bas-fond. As imagens desse “inesperado mural”, que precedem o sacrílego ritual de comer da massa branca do interior de um asqueroso inseto, desconfortam, constrangem a protagonista, na medida em que a lembrança da ex-empregada, que até então fora vista sob total indiferença, encontra-se presente coercitivamente. Assim, é mister a essa tessitura a contestação de valores sócio-culturais e “desistência” de padrões narrativos tradicionais, a partir da qual (tessitura) se originam novas possibilidades de leitura de uma difícil realidade, num contexto de “crise dos fundamentos da vida humana”, no “Breve Século XX” (HOBSBAWN: 2002). Podemos também inferir uma problematização de como se engendra a construção de um novo texto metafórico, resultante do “esforço humano” empreendido com a linguagem, que obtém maior êxito, conforme destaca a narradora-personagem G.H. (LISPECTOR: 1998, p.176), quando não consegue designar, visto que o “indizível” resulta do “fracasso da linguagem”, em face da trágica busca de desvelar os mistérios da condição humana. Nessa perspectiva, em A paixão segundo G.H., “a realidade é a matéria-prima”, a linguagem é o modo como se vai buscá-la, o que possibilita, à tessitura poética, estender o domínio da palavra sobre regiões mais complexas e inexprimíveis, capaz de fazer da ficção uma forma de conhecimento do mundo e das ideias. Este trabalho integra a pesquisa “Histórias de Leitura: Bibliotecas Pessoais”, sob a Coordenação da Profª. Drª. Odalice de Castro Silva, do Programa de Pós-Graduação em Letras – Literatura Brasileira, da Universidade Federal do Ceará.