XII CONGRESSO INTERNACIONAL ABRALIC
Resumo:872-1


Oral (Tema Livre)
872-1Callado e o jogo do(s) texto(s): variações e ressonâncias de Dom Casmurro em A missa do galo
Autores:Juliana Cristina Salvadori (PUC MINAS - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais)

Resumo

O presente artigo originou-se de uma das disciplinas de teorias críticas oferecidas pelo programa de pós-graduação em Letras, da PUC Minas, com foco em estética da recepção. Como trabalho final foi-nos proposto que escolhêssemos, da obra Missa do galo – variações sobre o mesmo tema (1977), organizada por Osman Lins, o conto que recriava o original de Machado de Assis de modo que mais nos parecia efetivo em termos de estratégias textuais, tendo como base teórica o ensaio de Iser (2002) “O jogo do texto”. O desafio estava em tentar apontar no fazer ficcional de um leitor privilegiado – a saber, qualquer um dos autores que concordaram com a proposta de Lins de homenagear Machado reescrevendo o conto – questões relativas à recepção e ressonância da literatura em suas próprias obras, como em um sofisticado jogo de espelhos no qual um leitor, digamos, comum, alegremente se perde, mas no qual um bom leitor, um leitor privilegiado, um leitor-autor na concepção barthesiana, efetivamente toma parte e constantemente (re)ajusta os reflexos e espelhamentos entre o seu mundo do “como se” e o desafiante “como se” machadiano. Após a leitura dos contos, chamou-me a atenção a recriação feita por Antônio Callado, pois pude lê-lo a partir de Dom Casmurro, isto é, tendo o romance como a estratégia texto-ficcional central adotada por Callado em sua recriação. Voltemos, então, à base teórica proposta. Talvez o grande achado, digamos assim, do texto de Iser seja o deslocamento do conceito de mímesis aristotélico enfatizando sua função performativa em detrimento da até então destacada função representativa. Esse deslocamento produz o “espaço” para sua proposta radical: o duplo movimento que o jogo textual efetua, um na direção do significado que, uma vez tido como certo, acaba por terminar o próprio jogo, e outro em favor da preservação do movimento, do jogo, pelo diferimento do sentido. E, se assim o é, o jogo admite diferentes desempenhos por parte de diferentes leitores no ato da recepção: pode-se tanto jogar para se obter a “vitória” (significado) ou pelo próprio prazer do jogo, mantendo assim, o jogo livre e o significado em aberto (p. 108). Callado, como bom jogador, adota estratégias que visam a manter o jogo livre, isto é, a manter o texto em movimento. Dito de outro modo, ao invés de sucumbir ao que Harold Bloom (2002) denomina como angústia da influência e acabar por tentar “completar” a obra do precursor, o grande Outro da literatura brasileira que é Machado de Assis e, desse modo, “fechar o texto”, Callado adota a estratégia de apelar para Dom Casmurro (2009) de modo a continuar o movimento ambíguo e duplo dessa empreitada ambígua e dupla que é a de ler/escrever A Missa do Galo: em outras palavras, a ambiguidade textualmente inscrita em Dom Casmurro (2009) ressoa e amplia a ambiguidade de A Missa do Galo (1977), abrindo desse modo a possibilidade do jogo livre, isto é, as possibilidades de significação.