Oral (Tema Livre)
335-1 | RUAS NUMERADAS, FANTASMAS PORTUGUESES, CIDADÃOS MOÇAMBICANOS - A FICCIONALIZAÇÃO DO PASSADO HISTÓRICO NO ROMANCE "CRÓNICA DA RUA 513.2", DE JOÃO PAULO BORGES COELHO | Autores: | Ana Beatriz Matte Braun (UFPR - UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ) |
Resumo O objetivo da comunicação é debater as possíveis formas de ficcionalização do passado histórico no romance Crónica da rua 513.2, publicado em 2006, fruto da recente mas produtiva carreira literária do moçambicano João Paulo Borges Coelho. Partindo do conceito de historicidade, entendido como conjunto de acontecimentos que afetam uma comunidade e continuam condicionando seus caminhos (WEINHARDT, 2008), pretende-se analisar as estratégias desenvolvidas pelo romance para problematizar as noções de verdade histórica, acessibilidade aos relatos e a dialética velho e novo, tradição e modernidade. Assim como a crônica da rua 513.2 não é uma crônica, e sim um romance, as ruas de Maputo não mais ostentam nomes de heróis e nobres portugueses. Elas agora têm nomes de personalidades africanas, ou simplesmente números - uma vantagem, segundo o narrador, já que números "permanecem iguais e idênticos nos dois lados da barricada: não há quatros revolucionários nem cinco coloniais" (COELHO, 2006). Também as casas da rua, antes habitadas por portugueses, agora são residência de cidadãos moçambicanos que devem lidar com a nova realidade trazida pela independência. No plano da vida pública, há a vigilância constante dos representantes da FRELIMO, o desemprego, a estagnação econômica e quebra de vários aparelhos estatais por falta de mão de obra qualificada, a nova política anti-corrupção e os campos de reeducação para os que infringem a lei. Dentro de casa, na esfera privada, há os fantasmas do tempo colonial, a memória de um tempo que não será facilmente esquecido pelos moçambicanos. A rua 513.2 situa-se, deste modo, em um entre-lugar, morada de vivos e mortos, ou ainda na definição de Lúkacs, "um microcosmo que generaliza e concentra" (apud HUTCHEON, 1999). Assim, a narrativa explicita como as relações de poder e exploração, que, antes encenadas por colonizadores e colonizados, agora tornam-se lutas entre forças sociais nativas, contradições internas e fontes de desestabilização no interior da própria sociedade moçambicana (HALL, 2003). |