Oral (Tema Livre)
866-1 | O Labirinto Contemporâneo: a experiência do Minotauro em Borges e Cortázar. Imaginário, efeito de real e contração da monstruosidade. | Autores: | Diego Paleólogo (UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro) |
Resumo O objetivo deste trabalho é pensar a presença do Minotauro e do Labirinto em Jorge Luiz Borges e Julio Cortázar; a lógica externo/interno da monstruosidade em um jogo contemporâneo de velar e revelar o monstro; o desaparecimento do Minotauro como sintoma de uma sociedade que experimenta a contração da monstruosidade e da anomalia: o monstro não é mais da ordem do visível. Sendo o Minotauro um monstro incapaz de esconder sua marca indelével, não transita na cartografia contemporânea de monstros.
O Minotauro é produto do egoísmo e ambição de Minos e, em seqüência, do desejo incontrolável de Pasífae pelo Touro Sagrado – dessa união surge uma criatura híbrida, cabeça de touro e corpo de homem, o Minotauro. O monstro é trancado em um Labirinto construído para ser sua prisão e túmulo – uma casa monstruosa, como escreve Borges. O Minotauro faz parte de uma categoria especial de monstros mitológicos, muitas vezes surgidos a partir de uma conduta profana, quase como uma resposta ao desrespeito da moral vigente. Nesse cenário, o Minotauro responde mais a um castigo e uma maldição. O crime de Minos é não sacrificar o Touro Sagrado; o de Pasífae, a rainha, é a luxúria incontrolável, que a leva a produzir um artifício para ter relações com o touro – tudo é atravessado por uma espécie de lógica da monstruosidade: desejos em excesso, que ultrapassam o corpo e a razão.
Em suas diversas releituras, o Minotauro e o Labirinto aparecem quase como uma entidade. No movimento surrealista emerge como um dos grandes símbolos, representado por André Masson, Pablo Picasso e outros. A associação do Minotauro ao Surrealismo está relacionada à intensidade de morte presente no movimento e a constituição de um monstro paradoxal, corpo que aponta para dois sentidos ao mesmo tempo: homem e animal. Picasso confere ao Minotauro ares humanos, delicada fragilidade – o monstro não é mais a besta furiosa que assombra o Labirinto e sim um monstro perdido, deslocado, anacrônico – quase doméstico e erotizado.
Outro momento crucial no qual o Minotauro emerge, ainda como potência monstruosa, é na Argentina das décadas de 40 e 50. Jorge Luiz Borges e Júlio Cortázar, expoentes da Literatura Fantástica, abordam tanto o Minotauro quanto o Labirinto. Metáfora política ou existencial, é nesse momento que o monstro realiza radical dobra em sua existência. Borges e Cortázar invertem o jogo e dão voz ao monstro, que agora é uma espécie de poeta e criatura incompreendida dentro de sua própria prisão; o Labirinto participa da lógica exterior/interior, acentuando as oposições fundadoras da modernidade e suas erosões contemporâneas.
Qual seria, hoje, o lugar do Minotauro? Em um mundo no qual a ciência e a medicina regulam nossa existência, o ele responderia aos excessos e erros da ciência. Tendo como baliza os pensamentos de Michel Foucault sobre corpo, biopoder e biopolítica e seguindo as linhas deleuzianas de sentido, agenciamento e paradoxo, a proposta é pensar o Minotauro e a monstruosidade em uma específica produção literária contemporânea voltada, cada vez mais, para os efeitos e impressões de realidade. |