XII CONGRESSO INTERNACIONAL ABRALIC
Resumo:544-1


Oral (Tema Livre)
544-1Sophie Calle: modulações em fuga...
Autores:Danusa Depes Portas (PUC-RIO - Pontifícia Universidade CatólicaCNPQ - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico Tecnológico)

Resumo

A presente comunicação entende-se como investigação de elementos teóricos demarcando um campo de trabalho de interesse para os estudos de literatura. Refiro-me ao estudo da relação entre texto e imagem, como abordagem fértil para a compreensão do regime representativo numa sociedade cada vez mais dominada pela dinâmica da “cultura da imagem”. Esse campo vem se definindo de modo interdisciplinar e alargando sua perspectiva para uma linha de pesquisa que foi denominada de visual culture, o que motivou Thomas Mitchell a falar de uma verdadeira “virada pictórica” nas ciências humanas atuais em seu livro Pictury Theory. O livro expõe essa ideia da imagem emergir como paradigma dentro das ciências humanas, não só como um tópico central de estudo, mas como característica cultural percebida a exemplo das teorias de Foucault cuja relação entre o enunciável e o visível teria ancorado uma epocalização inicial da modernidade. Posteriormente, Deleuze lendo a obra inteira do filósofo formula sinteticamente a proposta. O propósito é explicitar a articulação entre a escrita e a imagem na série Doubles-jeux, coletânea de sete livretos, de autoria de Sophie Calle e as relações textuais desta obra com o livro Leviatã de Paul Auster; lançar um breve olhar acerca do seu processo criativo e o modo peculiar de se projetar em suas obras. Sophie é fotógrafa, performer, escritora. A ideia inicial parte sempre de um projeto fotográfico que, posteriormente, se transforma em instalações, e depois é transposto para o formato livro, em edições luxuosas que apresentam pequenos textos e fotografias. O meio expressivo usado por Sophie Calle compõe paradigmas discursivos polifônicos, que parecem confundir o sujeito representado, aquele que o representa e o texto-obra resultante. Em Doubles-jeux, o ato fotográfico pode ser visto como parte do jogo de olhares (e de espelho) dentro da obra. Quando fundamenta seus trabalhos num efeito de realidade produzido pela fotografia, Sophie não pretende sublinhar o poder de analogia ou a capacidade retórica das imagens fotográficas. Ao contrário, o que faz é demarcar a incompletude e a precariedade de sua empresa para garantir nela um espaço de identificação, entre o eloquente estereótipo da composição e a muda singularidade de uma existência fragilmente retida. Essa escritura resiste a definições, oscilando entre ficção e documento, e se constitui como uma pequena cartografia de gestos afetivos, em um modo de operar descrito por Deleuze como devir, como qualquer coisa que se realiza no “milieux”, no entre-dois, na disjunção do enunciável e do visível. Os jogos de Sophie agenciam uma poética cooperativa que oscila entre criação literária e experiência estética, promovendo o cruzamento de códigos. Seu projeto é marcado por um gesto político de atravessamento do sistema de comunicação, produzindo a formação de formas híbridas que desafiam modelos explicativos. Tais processos de contaminação na esfera da literatura, cultura e mídia, geram uma ampliação significativa do repertório teórico e das práticas críticas em seus respectivos campos disciplinares.