XII CONGRESSO INTERNACIONAL ABRALIC
Resumo:311-1


Oral (Tema Livre)
311-1SERES PREDESTINADOS AO MAL: A PERSONAGEM FEMININA E O MAL, COMO POTÊNCIA DE DESTRUIÇÃO, NA PROSA DE LÚCIO CARDOSO
Autores:Elizabeth da Penha Cardoso (USP - Universidade de São PauloFAPESP - Fundação do Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo)

Resumo

Os grandes pecados na prosa de Lúcio Cardoso (1912-1968) são de autoria feminina e parte considerável de sua obra tem gênese na energia destruidora de um feminino inconformado com seu destino, buscando a concretização de seus desejos, nem que seja no âmbito do crime ou da morte. Rosa (Salgueiro, 1935), Madalena (A luz do subsolo,1936), Ida (Mãos vazias, 1938), Diana (Dias perdidos, 1943), Aurélia (O desconhecido, 1940), Hilda (Professora Hilda, 1946), Laura (O anfiteatro, 1946), Stela (Inácio, 1944), Nina e Ana (Crônica da casa assassinada, 1959) são mulheres pecadoras, estimulando ou cometendo o roubo, o assassinato, o adultério, o incesto, a vaidade, a luxúria e a inveja. A prosa publicada pelo autor durante a década de 1940 é crucial para a interpretação da presença do mal em sua obra. Especialmente por causa de Stela, personagem feminina de Inácio, que preconiza características relevantes do exercício do mal em Nina e Ana, de CCA. Inácio é a primeira novela da trilogia “O mundo sem Deus” e Stela é a personagem que inicia esse universo comandado pelo diabólico, pois por meio da transgressão ela desorganiza o mundo pequeno burguês profanando a maternidade, praticando o adultério e a prostituição. Como conseqüência sua família é desfeita, Inácio, seu marido, transforma-se em uma figura diabólica e ela ganha caráter de mito fundador, análogo ao de Eva, já que, por causa de sua transgressão um novo mundo tem início: “O mundo sem Deus”. Um lugar amoral, escuro, mesquinho, no qual as pessoas são negociadas e traídas sem consideração, sem remorso e sem perdão. Não há um Deus a temer ou adorar. Desse modo, Stela condensa dois temas fundamentais para a obra de Lúcio: a família decadente, que precisa ser contestada e destituída de seu poder sobre os sujeitos, e o exercício do mal – principal estratégia feminina para aniquilar a família conservadora e patriarcal. O artigo, embasado na pesquisa do doutorado sobre as personagens femininas de Lúcio Cardoso, está composto por dois momentos principais. Primeiro, a abordagem da produção do autor durante a década de 1940, localizando aí as interlocuções do mal e do feminino, para, então, ler Stela e suas relações com o mal. O trabalho discute o tema com a fortuna crítica de Lúcio e aborda o mal enquanto potência de destruição, conceito de Jacques Lacan, desenvolvido no Seminário 7, na esteira de Freud (especificamente Além do princípio do prazer e O mal-estar na civilização). Tal diálogo com a psicanálise renova a leitura da obra em questão. Para complementar a abordagem psicanalítica, as obras de Beauvoir, Roudinesco, Badinter e Thébaud colaboram com a leitura do tecido histórico que permeia a situação da mulher e seu exercício da maldade. Num segundo viés, o trabalho articula a tradição literária sobre Satã e o conceito freudiano de estranho, para desdobrar a leitura dessa família desfeita e desse mundo inaugurado pela potência de destruição feminina em novas interpretações do mal.