XII CONGRESSO INTERNACIONAL ABRALIC
Resumo:638-1


Oral (Tema Livre)
638-1Exílio e erotismo em “Lixo e purpurina” e “Uma praiazinha de areia bem clara, ali, na beira da sanga”, de Caio Fernando Abreu.
Autores:Thais Torres de Souza (USP - UNIVERSIDADE DE SÃO PAULOUSP - UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO)

Resumo

Essa comunicação tem o objetivo de abordar a relação entre exílio e erotismo em “Lixo e purpurina” e “Uma praiazinha de areia bem clara, ali, na beira da sanga”, contos de Caio Fernando Abreu. O tópico é mencionado de maneira direta em “Lixo e purpurina” e aparece indiretamente no segundo conto, cujo protagonista é obrigado a fugir de sua terra natal por uma razão também externa ao sujeito; nesse caso, a necessidade de fugir após ter assassinado seu objeto de desejo. Em ambos os casos, trata-se de uma experiência própria daquilo que Foucault chama de “era do biopoder”, marcada pelo controle dos corpos e pelo cerceamento do desejo homoerótico (FOUCAULT, 1988). O que nos preocupa particularmente na análise dos contos é como o exilado metaforiza certa condição do indivíduo moderno e ex-cêntrico, que não se insere em nenhum lugar e que está em permanente situação de desconforto e de desarticulação com o contexto em que vive, ou, nas palavras do narrador de “Lixo e purpurina”: “alguém que não está nem aqui nem lá, seja onde for”. Essa especial atenção de nenhuma maneira desconsidera as outras dimensões do exílio, mas deve-se ao especial interesse por esse personagem constante na obra de Caio Fernando Abreu. Em “Uma praiazinha de areia bem clara, ali, na beira da sanga”, por exemplo, é possível supor que um dos motivos que impulsiona o narrador para o exílio seja a necessidade de fugir do cerceamento de sua sexualidade, já que o relacionamento homossexual entre o personagem e seu amigo Dudu jamais seria aceito na conservadora cidade de Passo da Guanxuma. No entanto, não se trata apenas de uma reação a homofobia. Embora o personagem mate seu objeto de desejo, há diversas relações homoeróticas e heterossexuais que ele vivencia. A sexualidade não é, portanto, completamente cerceada a ponto de impedir qualquer contato erótico e o narrador não se vê impelido a matar todos os sujeitos que são objetos de seu desejo. Ao contrário, ele foge apenas do amor e do desejo que sentia pelo homem por quem verdadeiramente se apaixonou. Segundo Bataille (2004), se, por um lado, a paixão é uma promessa de fusão que resolveria, ainda que momentaneamente, a descontinuidade inerente do ser humano, por outro essa promessa é uma ameaça: “para os amantes, existe mais chance de não poder se encontrar por muito tempo que de gozar de uma contemplação desvairada da continuidade íntima que os une” (BATAILLE, 2004, p. 33). Ginzburg (2005) afirma que “Lixo e purpurina” - e podemos, por extensão, compreender da mesma forma “Uma praiazinha de areia bem clara, ali, na beira da sanga” - constitui um “limite insustentável” em razão da “condição do duplo exílio” vivida pelos personagens. O exílio não é apenas geográfico, mas uma condição dos indivíduos deslocados fadados a incompletude. Incompletude essa que o erotismo, apesar da promessa, não soluciona.