XII CONGRESSO INTERNACIONAL ABRALIC
Resumo:1060-1


Oral (Tema Livre)
1060-1O insólito do real em Washington Cucurto: o infame e o bizarro diante da modernidade periférica porteña
Autores:Paula Santana (UFPE - Universidade Federal de Pernambuco)

Resumo

Procurando inspiração na metáfora “entre voz e letra”, proposta por Padilha (2005), busco pensar possíveis aproximações entre a sociologia e a literatura. Assim como o limite aparentemente instransponível entre a voz de quem grita (fugida e difusa) e a letra escrita (documentada e fixa) pode ser convertido em ação política, o distanciamento entre literatura e sociedade também pode ser alterado. Entendo que as interpretações sociais atualmente têm muito a aprender com as artes e, do mesmo modo, as narrativas estudadas ganham sentido ao compreendermos os espaços sociais e as temporalidades históricas que as atravessam. Sendo assim, teço considerações sobre os ecos de uma modernidade periférica na Argentina, percorrendo a narrativa literária contemporânea do escritor Washington Cucurto, sem, contudo, escapar de uma abordagem também estética. Diante disto, articulo a noção de insólito, dentro do universo diegético de Cucurto, junto aos filamentos de modernidade periférica que pairam sobre Argentina hoje, uma vez que pensar tais tensões significa, numa via de mão dupla, dar conta das mudanças que se deram tanto no texto literário quanto no contexto social. Abre-se, assim, caminho para a reflexão acerca de uma realidade social contra-hegemônica, repleta de particularidades e linhas fronteiriças. O insólito na literatura de Cucurto traz à tona eventos narrativos que desestabilizam o cotidiano, que rompem censuras e lançam o leitor num redemoinho de sensorialidades. O texto de Cucurto se circunscreve numa senda de modernidade pós-vanguarda, em que a relação do novo com o tradicional e o insólito torna-se uma importante estratégia de narrar. Cucurto personifica o desejo de “no dejar morir” (Cucurto, 2003),bem como os dilemas, as angústias e as alegrias efêmeras de migrantes paraguaios, bolivianos ou dominicanos, das “ticks” e dos cantores de cúmbia villeira que vivem em bairros de periferia que mais parecem microcosmos, completamente apartados da realidade ordinária de Buenos Aires. Todavia, tais personagens não são construídas a partir de uma realidade naturalista. Cucurto as apresenta como monstruosidades, criaturas infames, bizarras e “supernaturais” em busca de uma identidade perdida. Em suas múltiplas dimensões, a construção insólita dessa diegese bizarra e infame representa também uma categoria política, o “outro” da civilização, o choque do diferente. Suas personagens representam o subalterno, o reprimido pela cultura dominante, que assume ser “o outro”, ser o monstro, ser o infame como maneira de dessacralizar o “politicamente correto”, e fazer visível (e risível) a intolerância da sociedade sólita diante do diferente. Neste sentido, o presente artigo visa articular um duplo objetivo: o primeiro é analisar a prosa de Cucurto, a fim de apreender as trilhas percorridas por suas narrativas em meio aos impasses e dilemas que a complexa realidade contemporânea argentina vai sugerindo. Diante deste objetivo mais geral, procuro dar conta de uma análise das incidências do insólito ficcional na tessitura de Cucurto, perspectiva esta que se conforma como fundamental, pois possibilita uma mirada mais detalhada sobre os ares modernos que pairam sobre a Argentina na contemporaneidade.