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"TRAMA TEXTUAL, RASTROS TRANSLINGUAIS: LITERATURA E INTERDEPENDÊNCIA DA DIFERENÇA"
- Gerson Roberto Neumann (UFRGS)
- Fernanda Boarin Boechat (UFPA)
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A GEOPOESIA ENTRE VIAGENS E MIGRAÇÕES: CRÍTICA POLIFÔNICA, PASSAGENS E ETNOFLÂNERIES
- Ana Clara Magalhaes de Medeiros (Universidade Federal de Alagoas)
- Willi Bolle (Universidade de São Paulo)
- Augusto Rodrigues da Silva Junior (Universidade de Brasília)
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AMÉRICA LATINA EM MOVIMENTO: TRÂNSITOS, ATRAVESSAMENTOS E TRADUÇÕES
- Flavia Braga Krauss de Vilhena (Universidade do Estado de Mato Grosso)
- Alexandre Barbosa (Universidade Estadual Paulista)
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COMPARATIVISMO INTERAMERICANO: QUANDO O OLHAR 'DESVIA' PARA OS EXCLUÍDOS
- Andre Rezende Benatti (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul)
- Zilá Bernd (Universidade La Salle - Canoas - UNILASALLE)
- Leoné Astride Barzotto (Universidade Federal da Grande Dourados)
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ESCRITAS DE SI EM TRAVESSIA: NARRATIVAS DO EU NA AMÉRICA LATINA E NO CARIBE (SÉCS. XIX-XXI)
- Joana de Fátima Rodrigues (UNIFESP)
- Mayra Coan Lago (Universidade Federal do Rio Grande, FURG)
- Cesar Augusto Garcia Lima (Universidade do Estado do Rio de Janeiro, UERJ)
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FRONTEIRAS EM MOVIMENTO: LITERATURA, ARTES E POLÍTICA NA ERA DO INTER/NACIONALISMO
- Anderson Bastos Martins (Universidade Federal de Juiz de Fora)
- Victor Coutinho Lage (Universidade Federal da Bahia)
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MUNDOS JUDAICOS COM/PARTILHADOS: DIÁSPORAS, VIAGENS, MIGRAÇÕES
- Kênia Maria de Almeida Pereira (Universidade Federal de Uberlândia)
- lyslei de souza nascimento (Universidade Federal de Minas Gerais)
- Nancy Rozenchan (Universidade de São Paulo)

"TRAMA TEXTUAL, RASTROS TRANSLINGUAIS: LITERATURA E INTERDEPENDÊNCIA DA DIFERENÇA"
EIXO: CONTATOS INTERCULTURAIS: DIÁSPORAS, VIAGENS, MIGRAÇÕES
SIMPÓSIO: "TRAMA TEXTUAL, RASTROS TRANSLINGUAIS: LITERATURA E INTERDEPENDÊNCIA DA DIFERENÇA"
COORDENADORES:
- Gerson Roberto Neumann (UFRGS)
- Fernanda Boarin Boechat (UFPA)
RESUMO: A configuração da trama textual, desde sua origem até a recepção, recebe a atenção aqui como um processo em contínua construção, cujos rastros translinguais apontam para uma interdependência da diferença que é um fundamento elementar da obra literária. Seriam as literaturas do mundo (conceito usado aqui como consequência de discussões em torno do conceito do século XIX Weltliteratur), portanto, segundo Ottmar Ette (2005), repositórios do “saber sobre a vida” (Lebenswissen), articuladas por uma polilógica, que se fundamenta no uso da linguagem e de sua complexidade. Conforme o teórico romanista e comparatista alemão Ottmar Ette (2016, p. 13), que faz uma (re)leitura das literaturas do mundo nos seus textos críticos, é possível estabelecer um processo para se repensar a Literatura, procurando-se fazer uma leitura obrigatoriamente mais ampla do que se entendeu por Weltliteratur. Para o comparatista alemão, o "[...] próprio termo ‘literaturas do mundo’ mostra que as formas de produção, de recepção e de distribuição da literatura, em escala planetária, não se alimentam de uma única ‘fonte’, não são reduzíveis a uma única linha de tradição ? como à tradição ocidental, por exemplo." Ainda segundo Ette, o termo literaturas do mundo compreende um cenário "não mais para um entendimento mediador, dialógico [...] entre o ocaso e o nascente, entre ocidental e não ocidental, mas para uma compreensão e vivência polilógicas de um saber que jamais pode ser reduzido a uma lógica única." Ao retomar a ideia de Weltliteratur defendida pelo clássico alemão Johann Wolfgang von Goethe com veemência e obstinação contra o conceito de literatura nacional, ademais, Ette menciona que sob um ponto de vista atual trata-se de uma época que há muito já transcendeu seu apogeu histórico. Nesse sentido, e em diálogo com o sistema científico do pesquisador e naturalista alemão Alexander von Humboldt, o comparatista indica na literatura a presença da relacionalidade de proporções globais por que se interessou o cientista alemão. Trata-se de uma relacionalidade viva e interconectada, em constante evolução: uma ordem pulsante. Essa trama inextricável só encontraria harmonia na convivência da diferença, muito além da ideia de coexistência pacífica, logo indicando essa interdependência da diferença. Em oposição à compartimentalização dos saberes ocorrida a partir da segunda metade do século XIX, responsável pela lógica predatória que devasta o planeta, a literatura é observada aqui como ambiente de convívio, meio fundamental do saber, cuja dimensão estética nos comove e move, mobiliza aspectos éticos e fundamenta a produção de reflexões de modo amplo e em diversos campos da pesquisa. Em diálogo com o projeto cosmos do viajante e naturalista Alexander von Humboldt, a literatura pode representar um continuum entre cultura e natureza em que se encenam rastros de caminhos, mudanças e migrações em um mundo interligado em todas as esferas. Revela-se na literatura a multiplicidade de línguas, mídias, disciplinas e discursos que nela circulam, cuja recepção promove efeitos que ultrapassam o sujeito leitor e sua individualidade. As literaturas do mundo são a expressão de um SaberViver, SaberVivenciar, SaberSobreviver e SaberConviver. Para o grande humanista prussiano (ETTE, 2022) “a arte não é um mero ‘acréscimo’, uma simples ‘decoração’, mas um meio fundamental de saber, utilizado para compreender, apresentar e representar o mundo em toda a sua diversidade e interconectividade”. Nesse sentido, o saber das literaturas do mundo possibilita uma abertura à “ecologia dos outros”. Unindo o humano à natureza, “em sua estruturação polilógica, que só pode ser traçada através de uma filologia multilógica”, as literaturas do mundo têm uma “permanência que é muito maior do que as estruturas de poder político que as cercam, que as cidades e arquiteturas que as abrigam e mesmo que as línguas e comunidades linguísticas que outrora as geraram e testemunharam”. Situadas em níveis transhistóricos, transculturais e institucionais, “com a ajuda de textos literários (e da literatura de viagem), poderia ser escrita uma história dos mais diversos projetos de convivência ou de ideias de sustentabilidade”. A partir da compreensão apresentada, objetiva-se no presente Simpósio Temático, observar o estar-a-caminho que se configura na obra literária, cujo fim interpretativo ou em si mesma como objeto artístico autônomo não se sobressai aos rastros da trama textual marcada pela convivência e interdependência da diferença capaz de fazer justamente referência a cenários (sustentáveis) que estão em constante movimento e transformação.
PALAVRAS-CHAVE: Literaturas do mundo; Weltliteratur; SaberSobreViver; Con-vivência; Ette; Cosmos Littera

A GEOPOESIA ENTRE VIAGENS E MIGRAÇÕES: CRÍTICA POLIFÔNICA, PASSAGENS E ETNOFLÂNERIES
EIXO: CONTATOS INTERCULTURAIS: DIÁSPORAS, VIAGENS, MIGRAÇÕES
SIMPÓSIO: A GEOPOESIA ENTRE VIAGENS E MIGRAÇÕES: CRÍTICA POLIFÔNICA, PASSAGENS E ETNOFLÂNERIES
COORDENADORES:
- Ana Clara Magalhaes de Medeiros (Universidade Federal de Alagoas)
- Willi Bolle (Universidade de São Paulo)
- Augusto Rodrigues da Silva Junior (Universidade de Brasília)
RESUMO: O narrador (Der Erzähler) de Walter Benjamin aponta para o silenciamento das pessoas perante a guerra. Mikhail Bakhtin propôs a carnavalização como instrumento de liberdade. O primeiro, um judeu alemão que morreu refugiando-se da Segunda Guerra, movimentou “imagens do pensamento” (BENJAMIN, 1986, p. 143) que congregassem novas formas de apreensão da modernidade por meio de passagens, ensaios e artes. O russo fundador da crítica polifônica, no rastro da multiplicidade, engendrou: polifonia, dialogismo e inacabamento. Diante da atualidade das considerações benjaminianas e bakhtinianas, no contexto do século XXI, que comporta simultaneamente uma pandemia e uma guerra global iminente, propomos constante atualização da crítica literária a partir dos estudos em geopoesia (desenvolvidos na ABRALIC desde 2018). Entre a etnografia e a etnoflânerie, o geopoeta (Erzähler) busca formas dialógicas de pensar o nosso milênio – pleno de migrações e diásporas, viagens e enfronteiramentos. Deslocando contatos plurivocais com a matéria literária que move e demove um painel de brasis liminares, marcados por movimentos migrantes multilaterais, evocamos sempre a palavra do outro. Dos contatos interculturais redimensionados pelas tecnologias da informação e o cenário globalizado, atuando na pedagogia da autonomia digital, a teoria da geopoesia desponta como cartografia de poéticas, estéticas e navegações: nascendo do encontro de topografias para discutir “formas geopolíticas e geoculturais de vida” (GILROY, 2001, p. 25). Territorialidades, vocalidades, corporalidades advindas do Sertão, da Amazônia, do Cerrado, da Caatinga, do Pantanal e dos Pampas compõem paisagens polifônicas que convocam o olhar responsável dos estudiosos deste Simpósio, ocupados em viajar, observar e anotar, num país de dimensões continentais, retratos de movimentos diaspóricos. Busca-se constituir literaturas de campo, distantes do mar, reveladoras de raizamas (raízes e rizomas): sertanejas, caipiras, indígenas, quilombolas, centroestinas, “do mato”, “do norte”, “da floresta”, “de pobre”, do nordeste retirante. Seguimos rotas de andarilhos e navegantes, ambulantes e flâneurs, estradeiros e flâneuses revolucionárias, foliões e mascarados. Os geopoetas, com suas vozes, entre transeuntes e transes, recusa a palavra autoritária e o discurso monológico – conforme Bakhtin (2010) e Paulo Bezerra (2005). A geopoesia comparada migra entre campo e cidade, vãos e vaus, sob o signo do “grandesertão.br”, preconizado por Willi Bolle (2004). Este ST movimenta pesquisas que abordem as seguintes manifestações: oralidade, prosa, teatro, cordel, performance, cinema literário, literatura de viagens, cyberflânerie e vocalidades. Estabelecemos também correspondências com viajantes de outras paragens: africanos, ibéricos, alemães, jesuítas, judeus, apátridas que respondem à travessia colonial dos tempos de formação da América. Deslocamentos e migrações que levaram à ascensão de uma brasilidade desde Machado de Assis a Lima Barreto, passando por Euclides da Cunha e Antônio Conselheiro, Mário de Andrade e Guimarães Rosa. A crítica polifônica interage com versistas centroestinos: Cora Coralina, José Godoy Garcia, Anderson Braga Horta, Cassiano Nunes, Santiago Naud e Niemar; prosadores das gentes e das tropas demigrantes, a exemplo de Bernardo Guimarães, Maria Firmina dos Reis, Hugo de Carvalho Ramos, Graciliano Ramos, Bernardo Élis, Dalcídio Jurandir, Milton Hatoum, Cristino Wapichana, Eliane Potiguara, Julie Dorrico, dentre outros/as. Os estudos de cultura popular estabelecem diálogos com investigadores brasileiros, tais como Carlos Rodrigues Brandão, Hermilo Borba Filho, Ariano Suassuna e Raduan Nassar. O direito ao literário (CANDIDO, 2011) e a visão autoconsciente da literatura comparada permitiram a constituição da crítica polifônica enquanto campo e ferramenta acadêmica que faculta a emergência do povo, dos subalternos (dos rincões do país) no seio universitário. Trabalhar com a geopoesia implica enfrentar o preconceito literário, renovar perspectivas do cânone e apresentar autores esquecidos ou pouco estudados. Ao mesmo tempo, refletir sobre os contatos entre corpos, vozes e performances e suas reverberações – em diálogo com a geopoética, ecocrítica, geocrítica e estudos decoloniais. Para tal, o espaço e a experiência urbana também se apresentam como paradigmas de vidas em obras, de obras em vida (e na morte). Enfim, neste Simpósio, abrimos uma “moldura teórica que questiona a tradição e o patrimônio cultural literário” (BOLLE, 1986, p. 9), para provocar inquietações no seio das literaturas e críticas comparadas. Diante de nossa fome insaciável por viagens, convidamos ao perene exercício da etnoflânerie – sempre atenta aos contatos e contextos interculturais.
PALAVRAS-CHAVE: Geopoesia; Literaturas de Viagens; Etnoflânerie; Crítica Polifônica.

AMÉRICA LATINA EM MOVIMENTO: TRÂNSITOS, ATRAVESSAMENTOS E TRADUÇÕES
EIXO: CONTATOS INTERCULTURAIS: DIÁSPORAS, VIAGENS, MIGRAÇÕES
SIMPÓSIO: AMÉRICA LATINA EM MOVIMENTO: TRÂNSITOS, ATRAVESSAMENTOS E TRADUÇÕES
COORDENADORES:
- Flavia Braga Krauss de Vilhena (Universidade do Estado de Mato Grosso)
- Alexandre Barbosa (Universidade Estadual Paulista)
RESUMO: Entendemos a América Latina como um contexto geopolítico que tem se apresentado como palco e caldeirão de intensos trânsitos e transformações que acabam por reverberar no âmbito artístico, filosófico e literário, despertando desde o fim do século XX a atenção de todo o mundo (ROLNIK, 2008), por despontar como vanguarda no desmoronamento de uma certa concepção de modernidade, sustentada em grande parte por dicotomias e universais racionalizantes (CUSICANQUI, 2010, QUIJANO, 2019, MIGNOLO, 1995). A partir dessa premissa, o objetivo deste seminário é debater amplamente estudos e pesquisas que se debrucem sobre o atual cenário literário na e sobre a América Latina, que lemos como sendo da ordem do mestiço (KUSCH, 2000; ANZALDÚA, 1987), do híbrido (CANCLINI, 1995), do transcultural (ORTIZ, 1983; HALL, 2002) e do feminista (LUGONES, 2021), sob a influência da perspectiva do fluxo migratório de sujeitos e saberes. Com ênfase na autoria literária e na produção livresca, bem como na circulação dessa literatura e sua recepção nos países da região, que cada vez mais se deparam com a necessidade de lidar com a alteridade, o simpósio temático pretende congregar reflexões que se centrem nas narrativas produzidas a partir dos chamados deslocamentos, forçados ou não, territoriais ou subjetivos, humanos e ideológicos, que transformam e são transformados pelo cenário político, social, cultural e econômico da região. Como sabemos, as migrações de crise (CLOCHARD, 2007; BAENINGER, 2018) trazem à tona não só as vulnerabilidades do país de origem de quem atravessa fronteiras geográficas forçosamente, ocasionadas por conflitos armados, perseguições religiosas ou políticas, desastres ambientais e misérias econômicas e morais, mas também as do país de destino, que, impõe sua língua nacional e suas práticas culturais dominantes às pessoas migrantes recém-chegadas em nome de uma pretensa harmonia social coletiva. Essa lógica silencia línguas, práticas comunicativas e epistemes já subalternizadas pela colonialidade. Nesse contexto migratório, em que as demandas por igualdade, dignidade e fim das violências reais e simbólicas se cruzam com a pauta feminista, nos cabe perguntar como a literatura, entendida aqui como um direito inalienável (CANDIDO, 2011), reverbera a escrita dessa região plurilíngue, de línguas liminares de fronteiras e transcultural? Quais são os caminhos e projetos humanizadores que se valem da expressão literária, como elemento gregário e transformador em Abya Yala? Assim, com o objetivo de entender a América Latina na contemporaneidade a partir de um viés literário, editorial e tradutório, este seminário contempla várias áreas de estudo que, analisadas sob óticas metodológicas distintas, contribuam para debates interdisciplinares, como por exemplo: Categorias latino-americanas para pensar a literatura; Identidades latino-americanas; Literatura de e sobre mulheres migrantes e viajantes; Literatura e decolonialidade; O papel e o conceito de escrita; Produção literária, editorial e tradutória na América Latina Tradução, recepção e circulação de conhecimento; Traduções feministas; Transculturalidade.
PALAVRAS-CHAVE: Literatura latino-americana contemporânea; Identidades latino-americanas; Literatura e decolonialidade; Produção e tradução literária.

COMPARATIVISMO INTERAMERICANO: QUANDO O OLHAR 'DESVIA' PARA OS EXCLUÍDOS
EIXO: CONTATOS INTERCULTURAIS: DIÁSPORAS, VIAGENS, MIGRAÇÕES
SIMPÓSIO: COMPARATIVISMO INTERAMERICANO: QUANDO O OLHAR 'DESVIA' PARA OS EXCLUÍDOS
COORDENADORES:
- Andre Rezende Benatti (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul)
- Zilá Bernd (Universidade La Salle - Canoas - UNILASALLE)
- Leoné Astride Barzotto (Universidade Federal da Grande Dourados)
RESUMO: A literatura comparada, em meados da década de 1970, sofreu uma profunda mudança na América Latina, quando, sinteticamente, podemos afirmar, a partir dos estudos de Sandra Nitrinni (2015) e Eduardo Faria Coutinho (2003), ela volta seus olhos não mais a um discurso coeso e universal sobre a região, mas para a pluralidade cultural que compõe o continente americano. Por meio dessa nova visada sociocultural, a literatura representa, revisa e reescreve o fato de que as Américas compartilham entre si o fato histórico de serem territórios invadidos, conquistados e colonizados. Com o questionamento proposto pela Literatura Comparada ao olhar o universalista proposto anteriormente à década de 1970 aos estudos de literatura, reflete-se, portanto, acerca da identidade e da cultura daqueles que foram esquecidos e/ou rechaçados pelo cânone estabelecido. A partir de tal princípio, seria possível, no âmbito da Literatura Comparada “tradicional”, comparar literaturas emergentes entre si, como temos feito mais recentemente? Para responder a essa questão teórica – talvez uma questão para a pós-crítica? - invocaremos a reflexão de Wlad Godzich, na introdução do livro Confluences littéraires Brésil-Québec: les bases d´une comparaison (1992) de Michel Peterson e Zilá Bernd, cuja proposta é comparar suas literaturas periféricas sem passar pelo “centro”, ou seja, abandonar a ideia eurocêntrica que caracterizava tradicionalmente a Literatura Comparada, Godzich observa que as literaturas ditas emergentes apresentam uma tendência de resistência, opondo-se a certos aspetos da globalização: algumas opõem-se, sem, contudo, questionar o processo em si, enquanto outras manifestam oposição frontal a esse fenômeno. Nesse sentido, verifica o pesquisador que algumas literaturas emergentes tiram partido da globalização, como foi o caso do boom das literaturas latino-americanas que ganharam renome transnacional, enquanto outras se agrupam em uma espécie de “comunidades de consciência” (1992, p. 53), compartilhando determinadas bandeiras como a valorização da mulher, a luta contra os integrismos e as exclusões de determinados grupos como, negros, indígenas, homossexuais entre outros. Godzich conclui que é em relação a esse processo complexo que o comparatismo literário pode se desenvolver e se ressignificar. É em relação a esse processo complexo e diferenciado que os estudos comparados podem desenvolver-se. Todo comparatista sempre soube que a comparação exigia sempre um tertium comparationis. Frequentemente esse terceiro termo ficava implícito, o que permitiu valorizar um dos dois termos da comparação, fazendo assim pesar a balança em favor dos modelos hegemônicos. Tornando explícito o terceiro termo da comparação, escapa-se desse preconceito. Adotando o desenvolvimento da Literatura e das literaturas na sua relação com a globalização, nos asseguramos não somente do trabalho comparatista, mas, como destaquei anteriormente, de exercer o trabalho de resistência também, pois os laços que tecemos exigem que deixemos escapar alguns fios dessa malha que é a globalização, opondo a ela uma outra visão da ordem mundial. (GODZICH, 1992, 53-54, tradução nossa). “No ensaio "A escrita e os excluídos", presente em Literatura e Resistência (2002), Alfredo Bosi propõe que para compreendermos as relações estabelecidas entre a Literatura e os sujeitos excluídos ou que estão à margem da sociedade, os negligenciados precisamos percebê-los a partir de dois prismas distintos, porém relacionados. Primeiramente Bosi se refere aos historiadores da literatura que percebem os excluídos, os marginalizados ou negligenciados como objeto da escrita literária. São estes sujeitos, suas vivências e experiências empíricas que darão base para que os escritores construam suas personagens, seus enredos, as temáticas escolhidas por estes, dando a estes sujeitos, que por determinados motivos estão ou foram excluídos, marginalizados ou negligenciados pela sociedade como um todo, o protagonismo dos textos literários. Já a segunda relação apontada por Bosi, entre o sujeito excluído e a escrita literária, aponta para o homem sem letras - o ensaísta versa sobre o excluído enquanto sujeito do processo simbólico. Com isso, buscamos a atualidade dos debates da Literatura Comparada nas diversas sociedades das Américas por meio de uma problemática da exclusão, da marginalização, da negligência de determinados sujeitos, seja a problemática qual for, de gênero, racial, política, cultural, social, dentre outras, provocadas pelos mais variados fatores e manifestadas das mais variadas formas nas sociedades atuais e nas artes que as representam. Desta forma o simpósio propõe acolher trabalhos que debatam a Literatura Comparada a partir deste “desvio” do olhar, evidenciado acima, o para os sujeitos que, das mais variadas formas, foram excluídos, marginalizados ou negligenciados pela crítica literária.
PALAVRAS-CHAVE: Relações Literárias Interamericanas; Literatura Comparada; exclusão; marginalização; desvio do olhar.

ESCRITAS DE SI EM TRAVESSIA: NARRATIVAS DO EU NA AMÉRICA LATINA E NO CARIBE (SÉCS. XIX-XXI)
EIXO: CONTATOS INTERCULTURAIS: DIÁSPORAS, VIAGENS, MIGRAÇÕES
SIMPÓSIO: ESCRITAS DE SI EM TRAVESSIA: NARRATIVAS DO EU NA AMÉRICA LATINA E NO CARIBE (SÉCS. XIX-XXI)
COORDENADORES:
- Joana de Fátima Rodrigues (UNIFESP)
- Mayra Coan Lago (Universidade Federal do Rio Grande, FURG)
- Cesar Augusto Garcia Lima (Universidade do Estado do Rio de Janeiro, UERJ)
RESUMO: A partir do diálogo entre a filosofia, a história, a teoria literária e a literatura, propomos neste simpósio uma travessia pela história da América Latina e do Caribe, desde o século XIX aos nossos dias, considerando especialmente os momentos das viagens científicas, técnicas e culturais pelo continente americano, da escravidão, da diáspora, dos grandes fluxos migratórios e dos deslocamentos forçados ou voluntários mais recentes. Tendo em vista esses distintos momentos, buscaremos propiciar uma reflexão sobre os contatos interculturais ocorridos entre os diferentes sujeitos ao longo dos anos por meio da análise das suas “escritas de si”. Estas sob a forma de cartas, diários, relatos de viagens, autoficções, autobiografias e textos autorreferenciados permitem que resgatemos e problematizemos as distintas percepções, vivências, experiências e relações entre os variados sujeitos em contraste com seus processos de exploração e resistência, migração, desenraizamento original ou mesmo de protagonistas locais e das pessoas ou sujeitos “comuns” (HOBSBAWM, 1994). O ponto de vista dos sujeitos comuns, dos oprimidos e explorados, que estão inseridos em um conjunto de relações sociais pautadas por sistemas de exploração de classe, gênero, sexualidade e raça tem sido objeto de preocupação dos historiadores sociais e de pesquisadores de outras áreas do conhecimento que se preocupam em compreender a “história escrita a contrapelo” ou a “história vista de baixo”, que têm ganhado fôlego especialmente a partir da década de 1980 (BENJAMIN, 2013; THOMPSON, 1987). Nos últimos anos, diversos pesquisadores têm produzido uma série de estudos com as “escritas de si” dos sujeitos comuns em um esforço de ouvir as vozes antes silenciadas por meio dos fragmentos do passado que permitem conhecermos seus anseios, experiências e projetos (CAMPUZANO, 2017; LAGO, 2021; NOFAL, 2016; OLIVEIRA, 2022; RAGO, 2013). Outros, adotando a história política e a história cultural, têm buscado compreender as variadas facetas dos encontros entre o eu e o outro nas escritas de si por meio de diários, relatos de viagens, autobiografias e entre outros nestes momentos (FRANCO, 2008; CUIÑAS, 2013). Como uma das referências desse olhar amplo sobre a escrita de si, que envolve o histórico e também os processos de subjetivação do sujeito, pensamos na perspectiva de Michel Foucault (2009), que se remeteu à Antiguidade para refletir sobre o contemporâneo, tanto no que se refere aos hypomnemata, registros pessoais adotados pelos gregos, quanto em seus estudos sobre a correspondência, como forma vizinha de expressão mais pessoal do que aqueles, como um gesto que afeta tanto aquele que escreve quanto aquele que lê a missiva. Além desta referência, também dialogamos com estudos gerais e específicos sobre as escritas de si nos campos da História e da Literatura que reconhecem a importância de nos debruçarmos sobre esta documentação que nos permite acompanhar as narrativas de sujeitos diversos e as, motivações mais íntimas das suas ações para expressar seus sentimentos e angústias, no sentido de manifestar seus anseios, entre tantas outras possibilidades de falar sobre si, sobre o outro, e o que lhes envolve junto à sua época. Elas também propiciam ferramentas para trabalhar com esta documentação e advertem sobre a importância do pesquisador ter maior cuidado teórico-metodológico, especialmente para não cair no que a historiadora Angela de Castro Gomes denominou “as malhas do feitiço”, que envolve os mitos da “espontaneidade”, “autenticidade” e “ilusão da verdade” das escritas de si, algo que também foi alertado por C. Prochasson, G. Levi e P. Levillain. Estimulamos trabalhos que abordem as produções de escritas de si que tratam dos variados contatos interculturais, das experiências vivenciadas e do cotidiano dos diferentes sujeitos, das relações sociais e/ou políticas de mulheres e homens negros na diáspora, de imigrantes, de trabalhadoras e trabalhadores, de orientações e experiências sexuais divergentes dos modelos instituídos, entre outros. Assim, acolheremos, propostas que reflitam sobre as escritas de si na América Latina e no Caribe, nessa relação entre o sujeito e sua época, que problematizem narrativas ou poéticas cujo ethos, à maneira do narrador-marinheiro de Walter Benjamin (1994), conte o que viveu e viu, mas, sobretudo, relate as repercussões íntimas dessa jornada. Deste modo, esperamos que este diálogo interdisciplinar venha à luz como contribuição no sentido de ampliar a capacidade crítica sobre tal temática, sobre tais estudos, além da difusão de novos olhares inter e multidisciplinares lançados para esse campo das Ciências Humanas.
PALAVRAS-CHAVE: escritas de si; História; Literatura; diálogo interdisciplinar

FRONTEIRAS EM MOVIMENTO: LITERATURA, ARTES E POLÍTICA NA ERA DO INTER/NACIONALISMO
EIXO: CONTATOS INTERCULTURAIS: DIÁSPORAS, VIAGENS, MIGRAÇÕES
SIMPÓSIO: FRONTEIRAS EM MOVIMENTO: LITERATURA, ARTES E POLÍTICA NA ERA DO INTER/NACIONALISMO
COORDENADORES:
- Anderson Bastos Martins (Universidade Federal de Juiz de Fora)
- Victor Coutinho Lage (Universidade Federal da Bahia)
RESUMO: A relação entre a literatura e as artes, de um lado, e questões político-sociais, de outro, é multifacetada e historicamente muito variada. Em certa perspectiva, a própria formação da literatura e da arte consideradas “modernas” é inseparável da consolidação de princípios democráticos e/ou republicanos, assim como de certos ideais de nacionalidade e soberania. Nesse sentido, essa história também é inevitavelmente atravessada por dimensões político-sociais constitutivas da (busca por) uma definição de laços de comunidade e suas correspondentes alteridades externas e internas a uma sociedade ou a uma nação. A literatura e as artes, dessa forma, estabelecem com frequência uma relação íntima com as dinâmicas internas e internacionais de identificações e diferenciações entre “nós” e “outros(as)”. A teoria política, incluindo a teoria política internacional, tem interagido com os estudos literários e com as artes de maneira cada vez mais intensa e profícua nas últimas décadas, a tal ponto de se identificar nela a ocorrência de uma “virada estética” (Bleiker, 2009; Shapiro, 2013). Em constante interação com perspectivas variadas – tais como as abordagens pós-coloniais (por exemplo, Bhabha, 1998; Spivak, 1999) e decoloniais (por exemplo, Quijano, 2000; Mignolo, 2003), os estudos culturais (Hall, 2003; Gilroy, 2001 ; Moreiras, 2001) e a filosofia política (por exemplo, Rancière, 2000) –, essa teoria tem recorrido à literatura e às artes, a fim de reinterpretar criticamente conceitos que lhe são fundamentais, até mesmo fundantes, a exemplo de: cidadania, migração, nação, comunidade, guerra, violência, raça, gênero, igualdade, entre outros. Pode-se perceber, ainda, uma sensibilidade crescente para a problematização de concepções teórico-políticas que reproduzem dicotomias como guerra/paz, nacional/internacional, cidadão/estrangeiro, particular/universal. Não se trata, nesse movimento, de decretar como irrelevantes para o pensamento crítico contemporâneo os conceitos de “estado” ou de “nação”, tampouco de negligenciar as permanentes tensões entre universalidades e particularidades. O que se coloca como desafio é a necessidade de se pensar esses conceitos e tensões sem que as fronteiras entre o interno e o externo, o doméstico e o internacional, o cidadão e o estrangeiro sejam naturalizadas ou reificadas. Ou seja, coloca-se a tarefa de um pensamento teórico não sobre as fronteiras, mas nas fronteiras, a partir delas, com e contra elas. Por sua vez, a literatura contemporânea, bem como o cinema e as demais artes, vem desenvolvendo modos e práticas narrativas e representacionais voltados para uma evidente busca pela inserção nesse debate, o qual, por sua vez, suscita a participação de todas as áreas do saber no sentido de pensar o cenário contemporâneo atravessado pela globalização e por vertentes variadas de vivência cosmopolita, assim como por um recrudescimento do nacionalismo e pela proliferação de fronteiras físicas e simbólicas. Paralelamente ao surgimento dessa gama de produções artísticas, professores(as) e críticos(as) se debruçam na pesquisa transdisciplinar que embasa o diálogo entre os estudos das relações internacionais, os estudos literários e as artes contemporâneas, numa contribuição que tanto é promissora quanto desafiadora, uma vez que implica o deslocamento desses(as) pesquisadores(as) na direção de campos marcados por especificidades conceituais e metodológicas e, portanto, diversos de suas áreas de especialização. Na esteira dessa problematização, a própria fronteira que separa e conecta, de um lado, literatura e artes, e, de outro, a reflexão sobre aqueles conceitos políticos fundamentais se apresenta como um lugar a partir do qual se pode lançar luz sobre como violências, desigualdades e subalternizações são reproduzidas ou intensificadas, assim como são negociadas, contestadas e mesmo superadas. Dito isso, a proposta deste Simpósio é reunir contribuições que interajam criticamente com essas fronteiras e com as modalidades de trânsito entre elas. Mais precisamente, pretende-se colocar em diálogo trabalhos que, através da interação com a literatura e com as artes, proponham discussões críticas sobre conceitos como nação, cidadania, estado, humanidade, migração, comunidade, violência, raça, gênero, igualdade, entre outros. Convidamos pesquisadores(as) de diferentes áreas (estudos literários, artes em geral, relações internacionais, ciências sociais, entre outras) com pesquisas pertinentes ao campo dialógico aqui esboçado e que se interessam, em última instância, pela constituição de um espaço de cruzamentos transdisciplinares. Referências Bibliográficas: BHABHA, Homi. O local da cultura. Belo Horizonte : Ed. UFMG, 1998 BLEIKER, Roland. Aesthetics and world politics. Nova York : Palgrave Macmillan, 2009 GILROY, Paul. O Atlântico negro. Rio de Janeiro : Editora 34, 2001 HALL, Stuart. Da diáspora. Belo Horizonte : Ed. UFMG, 2003 MIGNOLO, Walter. Histórias locais / projetos globais. Belo Horizonte : Ed. UFMG, 2003 MOREIRAS, Alberto. A exaustão da diferença. Belo Horizonte : Ed. UFMG, 2001 RANCIÈRE, Jacques. La partage du sensible: esthétique et politique. Paris: La Fabrique Éditions, 2000. SHAPIRO, Michael J. Studies in trans-disciplinary method: after the aesthetic turn. Nova York: Routledge, 2013. SPIVAK, Gayatri. A critique of postcolonial reason. Cambridge, Ma. : Harvard University Press, 1999.
PALAVRAS-CHAVE: literatura; artes; política; relações internacionais

MUNDOS JUDAICOS COM/PARTILHADOS: DIÁSPORAS, VIAGENS, MIGRAÇÕES
EIXO: CONTATOS INTERCULTURAIS: DIÁSPORAS, VIAGENS, MIGRAÇÕES
SIMPÓSIO: MUNDOS JUDAICOS COM/PARTILHADOS: DIÁSPORAS, VIAGENS, MIGRAÇÕES
COORDENADORES:
- Kênia Maria de Almeida Pereira (Universidade Federal de Uberlândia)
- lyslei de souza nascimento (Universidade Federal de Minas Gerais)
- Nancy Rozenchan (Universidade de São Paulo)
RESUMO: Este simpósio receberá propostas de comunicações que elaborem reflexões críticas sobre os múltiplos e variados mundos judaicos culturais, artísticos, literários, entendidos como arquivos que são reiteradamente impactados e atravessados por diásporas, viagens e migrações. A história, a literatura e a tradição judaica em geral oferecem, com diversidade, uma importante oportunidade para se analisar os males e os benefícios do exílio, as trocas culturais, bem como o exercício, muitas vezes precário, da coexistência, como afirma Maria José de Queiroz em Os males da ausência ou A literatura do exílio (1998). A literatura, em todas as suas manifestações, em diálogo com o cinema, a fotografia, as artes visuais e gráficas, das tábuas da Lei às telas do computador, como avaliam Regina Zilberman & Marisa Lajolo (2009), deixam vislumbrar os contatos interculturais dos judeus com outros grupos étnicos de forma excepcional. Amós Oz e Fania Oz-Salzberger em Os judeus e as palavras (2015) distinguem a controvérsia, a ironia, o autoexame, os muitos exílios, as diásporas e a Shoah, além de uma particular relação com a memória, como estratégias discursivas em que esse grupo, em sua diversidade, fazem falar vozes, exibem lugares de pertencimento e de adoção que evidenciam estratégias de inscrição pondo em relevo uma tradição literária criativa e criadora em movimento e em metamorfose. Essas características revelam interatividades, identidades, memórias e realidades que ressignificam não só a escrita, mas o corpo, como adverte Silviano Santiago em A fisiologia da composição (diante do objeto livro, criando contatos e promovendo a coexistência. Ricardo Foster, em A ficção marrana: uma antecipação das estéticas pós-modernas (2009), compreende a figura “ex-cêntrica” do marrano – o judeu convertido ao cristianismo que, ocultamente, mantém sua fé e sua prática religiosa – como uma espécie de paradigma altamente proveitoso no estudo das imposturas, simulações e deslocamentos da contemporaneidade, não só do marrano, no tempo histórico em que ele está inscrito, mas também do sujeito contemporâneo que, entre as dobras do discurso, é atravessado pela nova história, pela antropologia, pela filosofia, pela psicanálise. Outras estratégias de aproximação e afastamento, como a recriação de mitos e lendas tal qual a do Golem, deixam vislumbrar reflexões sobre o estranho, o familiar, de acordo com Sigmund Freud (2019), e sobre o estranhamento, o estrangeiro, o incômodo diante do desconhecido e a longa história do medo no Ocidente, segundo avalia Jean Delumeau (1991). A tradição judaica migra para outras tradições e concepções do estar no mundo, como o mito de Lilith e as questões de gênero, que revelam o estranhamento diante do feminino, a reelaboração de mitos da criação e a relação com a escrita e outros tantos temas caros à reflexão presente na ficção que se perpetuam no contexto judaico e migram para outros espaços revelam a vitalidade e abrangência desse acervo viajante. Os textos se configuram como uma pré-história contemporânea, como vestígios de um passado que se filtram no presente a partir de uma concepção de leitura e escrita cada vez mais ampla e difusa, atravessando cartografias, mapas e atlas, fazendo convergir, confluir e combinar mundos, línguas e memórias como pode ser confirmado em Aventuras de uma língua errante, fundamental livro de Jacó Guinsburg sobre o ídiche (1996). A errância, nesse sentido, estabelece a ambiguidade do vocábulo. Errar, no sentido de equivocar e no sentido de vagar. Ambas as concepções estão presentes, para o estudioso, como estratégia de inscrição e sobrevivência judaica em espaços e tempos muitas vezes adversos. A noção de compartilhamento de bens culturais e práticas discursivas que instauram enunciados como acontecimentos híbridos continuamente reorganizados, traduzidos e revisados é, assim, paradigmática nos estudos judaicos, em geral, e na literatura judaica, em particular. O modo de ação do escritor, nesse contexto, lendo e relendo o acervo judaico, um arquivo, portanto, que o antecede, implica estabelecer estratégias para entrar e sair da tradição, para propor ao leitor um jogo de transmissões, de retomadas, de citações como é possível apreender, por exemplo, na relação da imigração com a literatura no Brasil, em Imigrantes judeus/escritores brasileiros, de Regina Igel (1997). Constituídos por vestígios de cultura, de onde se retiram fragmentos dispersos, esses mundos compartilhados podem alcançar desfechos não previstos. Nesse contexto, o que se acessa não é mais uma tradição imaginada como coesa e fechada, mas um rastro, um recorte, vários recortes, que se inscrevem na contemporaneidade de forma negociada.
PALAVRAS-CHAVE: Diásporas; Viagens; Migrações; Exílios
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ENEIDA MARIA DE SOUZA E O NÃO LUGAR DA CRÍTICA
- Marília Rothier Cardoso (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro PUC-Rio)
- Myriam Corrêa de Araújo Ávila (Universidade Federal de Minas Gerais)
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ENTRE O CÂNONE E O ESQUECIMENTO: PROCESSOS DE (NÃO) CANONIZAÇÃO DE AUTORES E OBRAS
- Valdiney Valente Lobato de Castro (UERJ)
- Yurgel Pantoja Caldas (UNIFAP)
- Alan Victor Flor da Silva (CMBEL)
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EPISTEMOLOGIA DO ROMANCE: DIÁLOGOS E INTERAÇÕES NA CONSTRUÇÃO DE SABERES COMUNS
- Ana Paula Aparecida Caixeta (Universidade de Brasília)
- Itamar Rodrigues Paulino (Universidade Federal do Oeste do Pará)
- Maria Veralice Barroso (Universidade de Brasília)
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ESTUDOS RETÓRICOS E POÉTICOS
- Marcus De Martini (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA)
- Jean Pierre Chauvin (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO)
- Marcelo Lachat (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO)
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LITERATURA E RELIGIOSIDADE
- João Cesário Leonel Ferreira (Universidade Presbiteriana Mackenzie)
- Marcos Lopes (UNICAMP)
- José Cândido de Oliveira Martins (Universidade Católica Portuguesa)
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LITERATURAS INSUBMISSAS E SABERES INDISCIPLINADOS: CONSTRUINDO FUTUROS ANCESTRAIS
- Fernanda Vieira de Sant Anna (Universidade do Estado de Minas Gerais - UEMG/Divinópolis)
- Edimara Ferreira Santos (Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa))
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LITERATURAS, AFRICANIDADES E DESCOLONIZAÇÃO: TEÓRICAS/OS (D)E PELES NEGRAS
- Luiz Henrique Silva de Oliveira (CEFET-MG)
- Felipe Fanuel Xavier Rodrigues (UFRR)
- Paulo Dutra (UNM)
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NATURALISMO/NATURALISMOS
- Leonardo Mendes (UERJ)
- Haroldo Ceravolo Sereza (UFSCAR)
- Claudia Barbieri (UFRRJ)
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REVISÃO DA HISTORIOGRAFIA TEATRAL: LER E RELER FONTES PRIMÁRIAS, VISÕES CRÍTICAS E JUÍZOS ESTÉTICOS NA DRAMATURGIA
- Maria Clara Gonçalves (UNESP/Assis)
- Elizabeth Ferreira Cardoso Ribeiro Azevedo (USP/ECA)
- Fabiana Siqueira Fontana (CAL/UFSM)
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ROLAND BARTHES PLURAL: ENQUANTO SE PODE PERGUNTAR
- Márcio Venício Barbosa (Universidade Federal do Rio Grande do Norte)
- Claudia Amigo Pino (Universidade de São Paulo)
- Laura Taddei Brandini (Universidade Estadual de Londrina)
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SABERES EM CONFLUÊNCIA
- Natalie Souza de Araujo Lima (Universidade Federal Fluminense)
- Thiago de Abreu e Lima Florêncio (Universidade Regional do Cariri (URCA))
- Felipe Wircker Machado (Cefet-RJ)
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TEORIAS CRÍTICAS DA LITERATURA JUVENIL BRASILEIRA (2000-2020): REFLEXÕES E DEBATES
- Eliane Aparecida Galvao Ribeiro Ferreira (Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" - UNESP)
- Ricardo Magalhães Bulhões (Universidade Federal do Mato Grosso do Sul - UFMS)
- Thiago Alves Valente (Universidade Estadual do Norte do Paraná - UENP)
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YORUBANTU: EPISTEMOLOGIAS AFRICANAS (YORÙBÁ, JEJE, FON, BANTU) E NEGRO-BRASILEIRAS NO CAMPO DOS ESTUDOS LITERÁRIOS
- José Henrique de Freitas Santos (UFBA)
- Eumara Maciel dos Santos (UFOB)
- Vercio Gonçalves Conceição (UFOP)

ENEIDA MARIA DE SOUZA E O NÃO LUGAR DA CRÍTICA
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: ENEIDA MARIA DE SOUZA E O NÃO LUGAR DA CRÍTICA
COORDENADORES:
- Marília Rothier Cardoso (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro PUC-Rio)
- Myriam Corrêa de Araújo Ávila (Universidade Federal de Minas Gerais)
RESUMO: Figura destacada na consolidação da ABRALIC, a pesquisadora Eneida Maria de Souza participou do movimento fundador da associação e foi sua segunda presidente, no biênio de 1989-1990. Professora titular da UFMG, integrou o grupo responsável pelo estabelecimento do Centro de Estudos Literários da Faculdade de Letras, gerenciador do Acervo de Escritores Mineiros, que reúne material indispensável para o conhecimento das fontes primárias da literatura – tarefa de que ela foi integrante entusiasta. Tendo oferecido muitos cursos na área de Teoria da Literatura e Literatura Comparada, tanto em sua universidade quanto em outras instituições de prestígio do país e do exterior, Eneida tornou-se uma personalidade incontornável dos Estudos Literários, nas últimas décadas. Formou quadros importantes para os departamentos de Letras e influenciou fortemente, através de suas publicações, o estado da teoria e da crítica de arte, em âmbito latino-americano. Sua atuação institucional foi tão importante quanto seu legado crítico. Eneida empenhou-se em firmar e consolidar intercâmbios acadêmicos tanto no Brasil como no exterior. Sua defesa dos estudos culturais contra uma visão excludente da literatura colaborou para provocar uma guinada na área. Em suas palavras, “Até então, a formação era muito voltada para a teoria, depois veio a necessidade de se trabalhar com o contexto. Foi por isso que me interessei pela relação entre a obra e a vida do escritor. Um dos grandes avanços da teoria literária foi sair da análise meramente textual.” Os cursos, palestras e ensaios que circulam com sua assinatura, vêm contribuindo para o fortalecimento das bases epistemológico-políticas da Teoria da Literatura e da Cultura, estimulam o exercício comparativista na complexidade do contexto geopolítico atual, ampliam o campo de contaminações e confrontos salutares entre as manifestações culturais centrais e periféricas, investigam a sobrevivência de soluções estético-semânticas na arte contemporânea e integram, com destaque, o movimento auto-avaliador da crítica. Fica, assim, evidente que a investigação deste legado é indispensável ao tratamento das questões referentes ao tópico “Epistemologias plurais, saberes comuns”, que desconstrói hierarquias, rompe com preconceitos e abre horizontes ao conhecimento, razão pela qual nosso simpósio se inscreve nesse eixo. Este é um convite aos sócios da ABRALIC para que se ocupem do legado de Eneida Maria de Souza visando alargar o alcance da crítica da literatura e da cultura e, assim, prestando homenagem à competência desta pesquisadora. Neste ano do centenário da eclosão do movimento modernista brasileiro, é indispensável discutir Macunaíma através de A pedra mágica do discurso e repensar a trajetória de Mário de Andrade, retomando sua correspondência com Henriqueta Lisboa, editada e discutida por Eneida, em livro que lhe valeu o segundo lugar no Prêmio Jabuti em 2011. Num momento de interesse pelo intercâmbio literário latino-americano, O século de Borges atrai releituras; o interesse pelo olhar investigativo sobre obras e biografias de escritores exige a consulta a Crítica cult e Janelas indiscretas com tomada de posição diante das perspectivas abertas nesses dois livros. A importância de se conhecerem trajetórias intelectuais consistentes torna benvinda a leitura de Tempo de pós-crítica. O empenho em manter-se informado sobre os debates mais recentes no campo da Literatura Comparada e dos Estudos Culturais aponta para a variedade instigante de questões enfrentadas em Narrativas impuras, publicado no final de 2021. Esses, entre outros, são itens da intensa atividade crítica desenvolvida por Eneida Maria de Souza, com indiscutível efeito iluminador sobre as perplexidades do presente. Propomos que as mesas do Simpósio se organizem em torno de tópicos como: crítica biográfica, autoficção, crítica da crítica, modernidades tardias e modernidade residual, arquivos em movimento, expressões do cosmopolitismo na cultura brasileira, todos eles desenvolvidos nas pesquisas, ensaios e livros da crítica mineira. São benvindas também comunicações sobre sua trajetória de estabelecimento de redes de pesquisadores no Brasil, com a participação em programas de pós-graduação de todo o país, sua atividade na ABRALlC, seu papel como incentivadora na criação de PPGs e periódicos em diversas instituições, idealização e criação do Acervo de Escritores Mineiros sob sua liderança, sua circulação presencial e teórica por países de cinco continentes e as ressonâncias desse trânsito em sua visão da literatura e da cultura, o cinema, a fotografia e a música nos ensaios de Eneida Maria de Souza.
PALAVRAS-CHAVE: Eneida Maria de Souza; crítica; estudos culturais

ENTRE O CÂNONE E O ESQUECIMENTO: PROCESSOS DE (NÃO) CANONIZAÇÃO DE AUTORES E OBRAS
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: ENTRE O CÂNONE E O ESQUECIMENTO: PROCESSOS DE (NÃO) CANONIZAÇÃO DE AUTORES E OBRAS
COORDENADORES:
- Valdiney Valente Lobato de Castro (UERJ)
- Yurgel Pantoja Caldas (UNIFAP)
- Alan Victor Flor da Silva (CMBEL)
RESUMO: Segundo Robert Darnton (2010), os autores constituem um segmento de um circuito de comunicação associado a muitos outros elementos, como os editores, os tipógrafos, os livreiros, os leitores, entre outros. Esse circuito demonstra que os escritores não são os únicos envolvidos nos processos de produção e circulação de impressos. Muito pelo contrário, são completamente dependentes dos demais agentes do circuito de comunicação e estão à mercê das influências intelectuais, da conjuntura econômica e social e das sanções políticas e legais. Do mesmo modo, Roger Chartier (1999) afirma que os autores também estão constantemente sujeitos a uma série de tensões que delimitam a atividade da escrita, pois quase sempre são obrigados a atender as exigências implícitas ou explícitas impostas pelos editores, pelo suporte material onde se materializam os textos, por uma ou várias comunidades de leitores e, de um modo bem mais geral, por um mercado de circulação de impressos. Sendo assim, a compreensão acerca do cenário literário construído na entronização de um escritor expande-se como um processo de aceitação para além da mera relação entre autor e público: Bourdieu (1996) destaca afinidade do escritor com seus pares como elemento singular no processo de canonização. Nesse sentido, todos esses segmentos do circuito de comunicação interferem diretamente não apenas na atividade de produção literária, como também no estatuto do qual desfruta um escritor na sociedade na qual está inserido. Em razão do papel que esses agentes desempenham, alguns autores desfrutam de um espaço privilegiado no meio artístico-literário, enquanto outros são relegados ao esquecimento. Reconstruir, portanto, o processo de canonização de um determinado escritor é remontar todos os seus passos percorridos ao longo dos anos para alcançar um lugar de relevo no cânone literário, o lugar ao qual pertence o grupo seleto dos autores mais representativos de uma determinada nacionalidade. Segundo Marisa Lajolo (2001) e Márcia Abreu (2004), um escritor, para alcançar esse lugar de prestígio, deve passar pelo número máximo de instâncias de legitimação ou consagração, a exemplo das universidades, dos suplementos culturais dos grandes jornais, das revistas especializadas, dos livros didáticos, das histórias literárias, entre outros. Essas instâncias, de modo geral, apresentam a tarefa de julgar e hierarquizar o conjunto de textos que circulam em meio a uma determinada sociedade e, consequentemente, são as responsáveis pelo estatuto social atribuído aos autores, pois têm o poder institucional de declarar escritores e obras como pertencentes ao cânone literário. A (não) canonização implica, além da avaliação da qualidade estética e literária das obras, diversas consequências mais concretas. Os autores canonizados, por exemplo, desfrutam de um espaço muito mais privilegiado no cenário literário, pois são estudados por diversos críticos e especialistas e apresentam uma extensa fortuna crítica, assim como também as obras desses literatos possuem várias e diferentes edições (para todos os gostos e, sobretudo, para todos os bolsos) e, por conseguinte, podem ser lidas por um público leitor muito mais amplo e diversificado. Os não canonizados, em contrapartida, possuem pouco espaço no cenário literário, pois carecem de críticos e especialistas, de referências bibliográficas, de fortuna crítica, de edições para suas obras e, principalmente, de leitores. Em alguns casos não muito raros, até mesmo informações biográficas a respeito de escritores que ficaram à margem do cânone são dificilmente encontradas, a exemplo do ano de nascimento e morte, naturalidade, bibliografia, entre outras. As pesquisas em periódicos, por exemplo, revelam uma série de escritores brasileiros que produziram durante os séculos XIX e XX, mas hoje são completamente desconhecidos dos leitores deste século, isso porque os impressos desenharam a imagem da leitura: periodicidade, diversidade de temas, atualidade e propagação mudaram as práticas de produção e leitura do texto literário, o que produziu uma democratização da leitura devido o acesso fácil tanto no que concerne ao barateamento dos custos quanto às condições de manuseio do suporte. Com isso as folhas públicas passam, então, a desenhar a imagem da leitura e as relações que por ela se estabelecem entre os sujeitos que cooperam para a circulação do texto literário. Desse modo, a proposta deste simpósio temático é congregar trabalhos que procurem traçar aspectos da trajetória de consagração ou de esquecimento de autores e obras de qualquer nacionalidade e de qualquer século. Para tanto, esses trabalhos devem considerar o papel da crítica literária, das história literárias, das universidades, das editoras, das livrarias, dos jornais, entre tantos outros.
PALAVRAS-CHAVE: Cânone literário; Processo de canonização; Instâncias de legitimação; Autores; Obras.

EPISTEMOLOGIA DO ROMANCE: DIÁLOGOS E INTERAÇÕES NA CONSTRUÇÃO DE SABERES COMUNS
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: EPISTEMOLOGIA DO ROMANCE: DIÁLOGOS E INTERAÇÕES NA CONSTRUÇÃO DE SABERES COMUNS
COORDENADORES:
- Ana Paula Aparecida Caixeta (Universidade de Brasília)
- Itamar Rodrigues Paulino (Universidade Federal do Oeste do Pará)
- Maria Veralice Barroso (Universidade de Brasília)
RESUMO: Partindo do eixo “Epistemologias plurais, saberes comuns”, a proposta para este simpósio foi construída em diálogo com a teoria da Epistemologia do romance cujas reflexões desenvolvem-se tomando como ponto de referência o objeto de criação estética enquanto lugar de conhecimentos. Como o próprio nome sugere, em sua gênese, o campo teórico em questão buscou na prosa romanesca literária aproximações dialogais com a filosofia de modo a construir tessituras nas quais fossem permitidas pensar questões da condição humana. Valendo-se da interdisciplinaridade e da transversalidade pressupostas pelos estudos comparados, tal como aponta Eduardo Coutinho (2011), a Epistemologia do romance foi, ao longo dos anos, estabelecendo conexões com diversas áreas do pensamento. Cabe ressaltar, entretanto, que dentro desse universo de movimentos e trânsitos contínuos, um dos fatores que lhe garantiu atuar com coerência teórica diz respeito ao eixo que internamente orienta seus fazeres: a estética e a epistemologia. Ultrapassando a compreensão da epistemologia enquanto ramo da filosofia, cuja preocupação, na história da modernidade, esteve voltada ao desenvolvimento científico, ao centrar-se no objeto de criação artística como ponto referencial, a Epistemologia do romance buscou até aqui desenvolver seus estudos mediante a compreensão de se pensar questões que abranjam a vida nos contextos contemporâneos, sem, no entanto, prescindir dos fios que nos trouxeram até o presente. Ao lidar com a estética enquanto possibilidade epistemológica, a ER não poderia negligenciar reflexões como as de Baumgarten e de Immanuel Kant, que, ainda no século XVIII, entenderam a necessidade de se pensar o conhecimento associado às sensações. Se Baumgarten delimitou a Estética como nova disciplina filosófica nela observando a possibilidade de se conhecer também através das sensações, pautando-se na centralidade do sujeito, Kant constrói um sistema filosófico no qual o conhecimento só pode se efetivar por meio das relações entre os sentidos e o entendimento. Embora Kant tenha percebido a relação direta entre a constituição de saberes (conceitos) e a experiência sensível do sujeito no âmbito de suas críticas, a arte, como objeto belo, ocuparia um lugar no qual a experiência permaneceria no campo dos juízos e não do entendimento. Para Kant, do belo (natural ou da arte) não seria possível extrair conhecimentos. Foi somente no século XIX, com a estética hegeliana, que a arte ganharia um lugar de destaque nos estudos da Estética, como também passaria a ser vista como parte importante no processo dialético sem o qual o conhecimento não se formularia. Dessa tríade que filosoficamente consolida a Estética, interessa essencialmente aos estudos da Epistemologia do romance o modo como trouxeram para o âmbito da reflexão - especialmente os dois últimos - a experiência estética como processo de entendimento da realidade. Ainda que as percepções acerca das sensações tenham sido bastante alteradas desde o nascimento da Estética como disciplina filosófica, as problematizações acerca da experiência são solos sobre os quais atuaram pensadores no século XX - cujos frankfurtianos são significativas referências - aportando com extrema vitalidade nas reflexões contemporâneas como as de Byung-Chul Han (2019), por exemplo. Do olhar sobre experiências que constituem a relação do sujeito com o objeto estético literário nasce o objetivo desse simpósio que, tal como observou Michel Maffesoli, entendendo a necessidade de se propor reflexões que tendem a permanecer fixadas em campos de conhecimentos alimentadas por “um racionalismo puro” ou “ ceder às sereias do irracionalismo”, buscando atuar em um campo refratário, as discussões aqui pretendidas objetivam pensar, sobretudo, as ambivalências enquanto constitutivas das experiencias e, que por sua vez, dão abertura à epistemologias plurais e saberes comuns, tal qual prevê a obra literária - enquanto lugar de ontologias - e o eixo que conduz a proposição desse simpósio. Considerando a importância de se conceber a literatura como um espaço de múltiplas representações que perfazem as ontologias contemporâneas, no âmbito das reflexões desse simpósio serão bem-vindos estudos que busquem contribuir com: discussões literárias e filosóficas que envolvam experiência sensível, efeito estético, juízo de gosto e pensamento; discussões sobre criação e recepção a partir da Estética e da Poética; questões de natureza epistemológica pensadas a partir do século XX, especialmente as norteadas pelas novas configurações da “razão sensível” (MAFFESOLI, 2008); quaisquer contribuições que considerem saberes múltiplos oriundos do objeto estético e da experiência estética. Palavras-chave: Epistemologia do romance; Estética; Estudos Comparados; Pluralidades.
PALAVRAS-CHAVE: Epistemologia do romance; Estética; Estudos Comparados; Pluralidades.

ESTUDOS RETÓRICOS E POÉTICOS
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: ESTUDOS RETÓRICOS E POÉTICOS
COORDENADORES:
- Marcus De Martini (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA)
- Jean Pierre Chauvin (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO)
- Marcelo Lachat (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO)
RESUMO: Os estudos retóricos e poéticos vêm recebendo uma atenção renovada nos últimos anos, na academia, seja na esteira de trabalhos que procuraram resgatar a importância da disciplina de Retórica, como os de George A. Kennedy (Classical Rhetoric and its Christian and Secular Traditions) e Brian Vickers (In Defense of Rethoric), seja, principalmente, na relação dessa com a crítica literária, na tentativa de retomar uma relação íntima com as poéticas anteriores à Modernidade. Se a crítica humanista e estilística de meados do século XX já alertava para a importância de uma reconstrução histórica das formas de escritura, como já se notava em Erich Auerbach, em seu clássico Mimesis, ou ainda no monumental Literatura Europeia e Idade Média Latina, de Ernest Robert Curtius, seria necessário ainda um pouco mais de tempo para que, no Brasil, houvesse um redirecionamento dos estudos literários nesse sentido. Sinais do interesse global que tem azeitado a produção da pesquisa científica em tais domínios ocorrem com a maturidade manifesta dos altos estudos acerca da obra de escritores emblemáticos das letras luso-brasileiras, como o padre Antonio Vieira e o poeta Gregório de Matos. Assim, trabalhos como os de João Adolfo Hansen (A Sátira e o Engenho) e Alcir Pécora (Teatro do Sacramento) são fundamentais para os estudos poéticos e retóricos no Brasil. Também é notório o desenvolvimento da pesquisa sobre a obra teológica de Vieira, na condição de réu do Tribunal do Santo Ofício, realizada pela profa. Adma Muhana, grandeza na qual se inclui a edição dos “Autos do processo” de acusação a que o padre foi submetido durante décadas do século XVII, pela Inquisição de Portugal, e a publicação de textos proféticos do autor luso-brasileiro. Desse modo, esses trabalhos, dentre outros, foram emblemáticos para o resgate dessas formas de representação, já que apontam para a necessidade de reconstruir "arqueologicamente", nos dizeres de Hansen, textos anteriores ao final do século XVIII, que, não raro, eram lidos pela crítica sob viés anacrônico, ou, pior ainda, considerados de pouca ou nenhuma relevância para o leitor contemporâneo. Essa renovação tende a romper um círculo vicioso de desinteresse e desconhecimento das letras escritas antes que vigorasse a concepção dita “moderna” nas artes, pontualmente antes de meados do século XVIII, quando, como se sabe, toda a forma mentis e a escrita foram profundamente alteradas e mesmo rompidas. Assim, este Simpósio de "Estudos Retóricos e Poéticos" pretende discutir trabalhos nos campos da poética e da retórica, especialmente voltados para corpora das letras antigas e modernas (até o final do século XVIII), tendo como objetivos principais: elaborar um panorama das atividades de pesquisa realizadas no Brasil sobre preceptivas e produções retóricas e poéticas; estabelecer redes associativas de conhecimento e divulgação dessas pesquisas e de seus objetos; definir mecanismos institucionais para a troca de informações; agregar pesquisadores de temáticas afins com objetivo de divulgação de resultados de trabalhos; vitalizar a produção acadêmica brasileira nos domínios dos estudos retóricos e poéticos. Para tanto, propõem-se os seguintes eixos temáticos em que podem se inserir as propostas de comunicação: - Retórica e poética nas letras clássicas ou antigas; - Retórica e poética nas letras modernas; - Manuscritura, história do livro e da cultura letrada; - Relações entre as letras e o discurso da história; - Retórica e poética e as disciplinas humanísticas; - Retórica, poética e filosofia; - Recepção de tratados de retórica e poética; - Retóricas e poéticas medievais; - Retórica e poética nas letras portuguesas e luso-brasileiras dos séculos XVI, XVII e XVIII. Espera-se, desse modo, que os trabalhos deste Simpósio mostrem antes ruínas letradas do que construções atemporais anacronicamente idealizadas, recorrendo-se àquilo que enforma essas práticas letradas em seus próprios tempos, em especial, às technai retórica e poética e às matérias elaboradas tecnicamente, para que se compreendam melhor as especificidades de tempos que não são os da “modernidade literária”.
PALAVRAS-CHAVE: Letras; Literatura; Retóricas; Poéticas; Humanidades.

LITERATURA E RELIGIOSIDADE
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: LITERATURA E RELIGIOSIDADE
COORDENADORES:
- João Cesário Leonel Ferreira (Universidade Presbiteriana Mackenzie)
- Marcos Lopes (UNICAMP)
- José Cândido de Oliveira Martins (Universidade Católica Portuguesa)
RESUMO: No Ocidente contemporâneo, a religião é um fenômeno que constantemente suscita debates acalorados por sua expansão e diversidade nas principais esferas da vida social. Sensíveis ao impacto moral, político e, mais precisamente, às formas de produção das subjetividades modernas e das identidades pessoais e coletivas, as áreas de humanidades (a antropologia, a sociologia, a história em seus diversos matizes, a psicologia, as artes em suas múltiplas linguagens, além da própria ciência da religião) fazem da religiosidade um dos seus focos de pesquisa, construindo no ambiente acadêmico certa acumulação crítica, que se traduz na constância de alguns núcleos temáticos e na estabilidade de um aparato conceitual para a análise do fenômeno (NOGUEIRA, 2015). No século 20, com a suposta autonomia de um campo específico dos estudos literários, alguns críticos e intelectuais se dedicaram à compreensão do fenômeno religioso na sua interface com os diversos gêneros literários (KUSCHEL, 1999; JASPER, 2009; VILLAS BOAS, 2016). Mas, em geral, a regra tem sido um silêncio obsequioso ou, paradoxalmente, uma tolerância à diferença sem a pesquisa vigorosa do que é irredutível e comum aos dois “objetos”. No entanto, é fato que a religião e suas expressões ocupam espaço relevante, tanto na literatura mundial (FRYE, 2004, p. 9-10), quanto nas literaturas de língua portuguesa (GUIMARÃES; LEONEL, 2018; AGUIAR; LEONEL, 2021). Tal fato encontra testemunho na produção de cinco dossiês em revistas acadêmicas relativos ao tema no ano de 2020 (REVISTA CERRADOS, 53, v. I e v. II; TEOLITERÁRIA, v. 10, n. 20, v. 10, n. 22; ESTUDOS DE RELIGIÃO, v. 34, n. 3; REVISTA CAMINHOS, v. 18). As raízes da própria ideia de literatura, tal como a conhecemos hoje, se encontram interligadas com o sagrado e a religiosidade. Assim, a mélica e a épica gregas, por exemplo, não podem ser plenamente compreendidas, se não considerarmos suas relações com o imaginário religioso em seus contextos originais de produção. Momentos importantes da história da literatura ocidental estabelecem conexões com a religiosidade: os poemas barrocos de Quevedo e Gôngora; o teatro de Shakespeare; a épica tardia de Camões, em Os Lusíadas; a prosa extraordinária de James Joyce; o universo mítico africano recriado por Mia Couto ou os contos sedutores de Jorge Luis Borges são alguns dos exemplos possíveis dessa relação instigante. No caso específico da literatura brasileira, é possível percebermos o diálogo fecundo entre poesia, representação ficcional e religiosidade, que já se inicia entre nós, por exemplo, nas práticas letradas de José de Anchieta e de Gregório de Matos, perpassa o arcadismo, o romantismo (CANDIDO, 2009, p. 227-229) e o realismo, com especial destaque, neste último, para a obra de Machado de Assis (QUEIROZ, 2008). Ao longo dos séculos XX e XXI, a literatura brasileira continuará esse diálogo nas obras de escritores como Jorge de Lima, Augusto Frederico Schmidt, Cecília Meireles, João Guimarães Rosa, Jorge Amado, Ariano Suassuna, Milton Hatoum, Adélia Prado, Hilda Hilst, Conceição Evaristo, entre tantos outros que poderiam ser citados. Considerando, pois, o desafio teórico e crítico para a constituição de um campo interdisciplinar nas relações entre literatura e religião, ou entre literatura e espiritualidade, este Simpósio discutirá as seguintes questões: (1) de que modo se manifesta e como é representada a experiência religiosa nas obras literárias; (2) como se estabelecem as relações intertextuais entre poesia, romance, conto, drama e textos religiosos; (3) como se estabelecem as relações intertextuais entre textos literários de diferentes tradições; (4) em que medida as manifestações poéticas do sagrado são uma reserva semântica para a crítica à modernidade; (5) as políticas de identidade, que discutem raça e gênero, estabelecem que pactos hermenêuticos com a religião e a literatura, (6) que questões teóricas devem ser repensadas para abarcar o estudo desses objetos; (7) como elementos advindos do campo literário, externos às obras, modificam ou condicionam a publicação dessas obras e, por fim, (8) qual o estatuto da memória em textos religiosos e literários. A abordagem proposta não se inscreve diretamente nas áreas de estudos que tratam da religião, seja a teologia ou as ciências da religião, uma vez que elege o tema da religiosidade e investiga sua presença na literatura a partir de teorias e análises próprias ao campo. Todavia, o alcance crítico e especulativo desse campo se amplia e se consolida no diálogo vigoroso com as humanidades. O simpósio Literatura e Religiosidade, que esteve presente nos quatro últimos congressos da ABRALIC, tem participado efetivamente da identificação e aplicação de referenciais teóricos relevantes para os estudos vinculados a seu campo de pesquisa em contexto nacional. A apresentação de comunicações e o contato entre pesquisadores e pós-graduandos se constituem em fórum estimulante para o desenvolvimento da área.
PALAVRAS-CHAVE: Religiosidade; Valor Literário; Teorias Literárias; Interdisciplinaridade; Intertextualidade.

LITERATURAS INSUBMISSAS E SABERES INDISCIPLINADOS: CONSTRUINDO FUTUROS ANCESTRAIS
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: LITERATURAS INSUBMISSAS E SABERES INDISCIPLINADOS: CONSTRUINDO FUTUROS ANCESTRAIS
COORDENADORES:
- Fernanda Vieira de Sant Anna (Universidade do Estado de Minas Gerais - UEMG/Divinópolis)
- Edimara Ferreira Santos (Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa))
RESUMO: Uma práxis decolonial passa pela construção de ecologias de saberes que desmantelem a lógica da monocultura de ser/pensar do ocidente e suas categorias binárias de classificação. Considerando que as ciências ocidentais foram / são utilizadas para construir e apoiar sistemas de exclusão e opressão, contribuindo para as emergências da contemporaneidade, como injustiça social e ambiental, genocídio de povos “minorizados”, epistemicídios de saberes insubmissos, crise climática, é urgente que nos voltemos para epistemologias plurais para frear o apocalipse disfarçado de progresso inventado pelo ocidente. É necessário rebelar-se contra a monocultura do saber e do rigor (SANTOS, 2007), para ver florescer e para semear sistemas de conhecimento tradicionais ancestrais. Nesse sentido, as literaturas, como ferramenta imaginativa e meio de construção de memória social e coletiva, têm um papel fundamental na reimaginação radical necessária para a construção de mundos possíveis. É claro que a literatura é um meio de autoexpressão, mas ela se torna mais do que isso quando produzida por populações marginalizadas pelo ocidente - como os Povos de Abya Yala, Povos de África e Afrodiaspóricos, por exemplo. Como nos ensina Joy Harjo (Muscogee, Turtle Island / USA) “[...] falar, custe o que custar, é tornar-se empoderada e não vitimizada pela destruição” (HARJO, 1997, tradução nossa). Na esteira dos conhecimentos do povo Wapichana, a palavra é magia e, em uma sociedade construída pelo discurso, ela tem poder de criar e desmantelar realidades. Ademais, os estudos mais recentes sobre a literatura têm nos levado a refletir sobre sua reescrita ao longo da história, em um processo de reimaginação radical do passado. Entendemos que literatura como belles lettres tem em sua origem colonial o silenciamento de literaturas “outras”, não-ocidentais. Partindo desta perspectiva, há movimentos contemporâneos de (re/des)construção de epistemologias não-ocidentais/desocidentadas no debate teórico literário, de de(s)colonização do cânone literário e da pluralidade de vozes, o que nos indica uma possível ruptura para com a tradição literária enquanto belles lettres, bem como aponta para a (re)existência de literaturas historicamente silenciadas e invisibilizadas. As literaturas plurais rompem com o papel colonizador das belles letters e apresentam-se como espaço de multiplicidade, criando espaços transfronteiriços decoloniais e (re)inscrevendo a pluralidade de expressões, confrontando diretamente o sistema-mundo patriarcal / capitalista / colonial / moderno. Nos interessa discutir neste Simpósio Temático, a partir da diversidade de expressões de escritoras, pesquisadoras, professoras e intelectuais do Sul Global, os movimentos de (re)formulação de entendimentos de literatura e crítica literária, podendo incluir análises dos movimentos históricos, sociais, políticos, culturais e geográficos de (r)existência pelas literaturas de tradição oral e tradição escrita, produzidas a partir de marcadores de gênero, raça, etnia, classe, sexualidade, identidades, (des)territorialidade, linguagem e posicionalidade. Através das discussões ocorridas no âmbito deste simpósio, objetivamos caminhar para a construção coletiva de epistemologias plurais que contribuam diretamente para a (re)escrita de futuros não-apocalípticos, não apenas dentro da academia, mas em nosso organismo-mundo, nossa casa-comum, Pachamama. Assim, nos voltamos para os estudos das Literaturas Indígenas, Afro-Brasileiras, dos Feminismos não-civilizatórios - como o comunitário e o camponês -, dos Futurismos Afro e Indígena, das Epistemologias do Sul e de Saberes Indisciplinados e Insubmissos. Também nos interessa dialogar sobre processos de apropriação e resignificação das línguas e saberes dos colonizadores na construção de artes e sistemas de conhecimentos revolucionários plurais. Nosso aporte teórico inclui Alvez (2011), Carvajal (2010, 2020), Evaristo (2020), Graúna (2013), Harjo (2021), Justice (2018), Kambeba (2020), Maracle (1996), Mignolo (2011), Quijano (2010), Santos (2007), Tuhiwai Smith (2012) e Vergès (2020,2021). Mais ainda, o Simpósio Temático se propõe a acolher pesquisadoras/pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, como Antropologia, Ciências Sociais, Educação, Geografia, História e Letras, para a construção de saberes comuns, que atravessam os limites das disciplinas. Essa pluralidade, diversidade e interdisciplinaridade de conhecimentos e afetos atravessam os nossos olhares e fazeres teóricos, epistêmicos e literários, no intuito de incentivar a continuarmos a debater sobre literaturas que chacoalham as margens da História oficial e do cânone literário ocidental. Acrescentamos que o chacoalhar da margem não objetiva transformar o ex-cêntrico no novo centro, mas em explodir / implodir a lógica colonial que estabeleceu centro e margens e as relações hierárquicas de sistemas de conhecimento e modos de viver / ser. É urgente que caminhemos em uma práxis decolonial, anticolonial, antirracista e anticapitalista para a produção de futuros ancestrais.
PALAVRAS-CHAVE: Literaturas Insubmissas. Saberes Indisciplinados. Futuros Ancestrais. Epistemologias do Sul.

LITERATURAS, AFRICANIDADES E DESCOLONIZAÇÃO: TEÓRICAS/OS (D)E PELES NEGRAS
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: LITERATURAS, AFRICANIDADES E DESCOLONIZAÇÃO: TEÓRICAS/OS (D)E PELES NEGRAS
COORDENADORES:
- Luiz Henrique Silva de Oliveira (CEFET-MG)
- Felipe Fanuel Xavier Rodrigues (UFRR)
- Paulo Dutra (UNM)
RESUMO: Dando continuidade ao projeto de acolher comunicações dedicadas ao estudo da vida, obra e pensamento de autores e autoras de ascendência africana, cuja imaginação literária provém de vivências da afrodescendência em localidades formalmente descolonizadas, às margens das quais a africanidade constitui leitmotif de literaturas que se situam dialeticamente dentro e fora de sistemas literários hegemônicos, apresentamos esta proposta de simpósio. O objetivo é explorar os contornos críticos e teóricos das produções literárias engendradas a partir das histórias, culturas e instituições de pessoas de ascendência africana, bem como o impacto dessas literaturas em contextos de desigualdades e demandas sociais. Ao declarar o período de 2015-2024 como a Década Internacional dos Afrodescendentes, as Nações Unidas reconheceram a urgência de se colocar na ordem do dia a promoção e proteção dos direitos humanos de um contingente de aproximadamente 200 milhões de pessoas de ascendência africana espalhadas pelo mundo. A discussão dessa pauta acarreta ressonância política e histórica no contexto brasileiro. Apesar de o Brasil gerar a segunda maior população afrodescendente atual, os jovens negros (pretos e pardos) são as principais vítimas de homicídio no país (CERQUEIRA et al., 2020). O fenômeno, já descrito como genocídio negro, expõe os efeitos funestos da persistência do racismo e impõe reflexões acerca da cultura como local de luta e sobrevivência para afrodescendentes que vivem em democracias desiguais. Na genealogia do racismo contemporâneo – onde quer que seja flagrante –, constam ontologias construídas para fundamentar sistemas de segregação racial que cercearam os direitos das pessoas negras em territórios controlados por projetos colonialistas etnocêntricos. Contudo, o imprevisível surgimento de literaturas de sujeitos que perspectivam tradições africanas, afirmam identidades negras e tematizam experiências em ambientes hostis manifesta a dinâmica cultural de afrodescendentes cuja escrita contrapõe práticas textuais e interpretativas que essencializaram seus corpos e os trataram como objetos. Trata-se de um processo de descolonização, isto é, um processo histórico em que sujeitos legatários do mal-estar colonial recriam a si mesmos como seres humanos, rompendo, portanto, com a conformidade à lógica de um mundo em que a discriminação racial perdura. Nesta edição, priorizaremos trabalhos que convoquem teorias desenvolvidas por autores e autoras da África e da Diáspora Africana e/ou com elas dialoguem. Com isso, focalizaremos princípios e conceitos teóricos nos quais se fundamenta o trabalho da crítica literária do corpus negro. Em sua prática teórica, esses/as pensadores/as têm desafiado sistematicamente noções pré-estabelecidas de literatura com novos conceitos de escrita, leitura e interpretação que imbricam as contingências da verossimilhança e das sociedades nas quais os sujeitos teóricos operam. Ao vigor de concepções inovadoras para perscrutar a fenomenologia da obra literária e à ascensão de paradigmas alternativos de produção criativa e crítica junta-se o emprego de teorias transdisciplinares aos interesses dos estudos da literatura per se. Por conseguinte, o escopo das teorias dedicadas ao “devir-negro do mundo” (MBEMBE, 2017, 18) atravessa as mais diversas áreas do conhecimento, intersectando a existência das pessoas negras com preocupações que vão desde o fenômeno literário à complexidade das questões relacionadas à raça, a gênero e à classe social. Reafirmamos, dessa maneira, a potencialidade das subjetividades negras para a articulação de modos de pensamento cujos impactos são sentidos na literatura, como exemplifica a declaração “Eu sou o meu próprio fundamento”, de Frantz Fanon (2020, 241). A essa inscrição ontológica correspondem gestos de autorrepresentação e autodeterminação verificados nos discursos literários que, na perspectiva fanoniana, falam para “assumir uma cultura, suportar o peso de uma civilização” (FANON, 2020, 31). Além de Fanon, os mais influentes nomes a adentrarem essa arena epistemológica são: Aimé Césaire, Léopold Senghor, Frantz Fanon, Henry Louis Gates Jr., Stuart Hall, bell hooks, James Baldwin, Toni Morrison, Édouard Glissant, Paul Gilroy, Cornel West, Chinua Achebe, Ng?g? wa Thiong'o, Francis Abiola Irele, Chimamanda Adichie, Audre Lorde, Elizabeth Alexander, Manuel Zapata Olivella, Nancy Morejón, Lélia Gonzalez, Nei Lopes, Conceição Evaristo, Cuti, Miriam Alves, Abdias do Nascimento, Muniz Sodré, Domício Proença Filho, Beatriz Nascimento, Leda Martins, Sueli Carneiro, Edmilson de Almeida Pereira, Grada Kilomba, Lívia Natália, Djamila Ribeiro, entre outros. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CERQUEIRA, Daniel et al. (orgs.). Atlas da violência 2020. Rio de Janeiro: IPEA, 2020. FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas. Trad. Sebastião Nascimento. São Paulo: UBU, 2020. MBEMBE, Achille. Crítica da razão negra. Trad. Marta Lança. 2a ed. Lisboa: 2017.
PALAVRAS-CHAVE: Literatura Afrodescendente; Africanidades; Identidade Negra; Racismo; Descolonização.

NATURALISMO/NATURALISMOS
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: NATURALISMO/NATURALISMOS
COORDENADORES:
- Leonardo Mendes (UERJ)
- Haroldo Ceravolo Sereza (UFSCAR)
- Claudia Barbieri (UFRRJ)
RESUMO: Resumo: O Simpósio propõe discutir os princípios da estética naturalista e debater suas principais manifestações literárias, de qualquer nacionalidade, tanto no século XIX, quanto nos séculos XX e XXI. As propostas deste movimento estético democrático, que ousava nos temas e apresentava novos procedimentos discursivos, garantiu sua difusão pelo mundo (Becker & Dufief, 2018), atraindo escritores de diversos países que adotavam o naturalismo como forma de se alinhar à modernidade industrial, numa geografia que não cabe nas fronteiras das literaturas nacionais. Tal força de representação ultrapassou seu tempo histórico e sobrevive até hoje, mostrando que a temporalidade literária obedece a regras específicas dos campos literários (Casanova, 1999). Tendo como princípio fundamental retratar “a vida como ela é”, o naturalismo estuda personagens de diversas classes sociais em seus cotidianos, mesmo quando desprezíveis ou abjetos. Este método de observação e de criação deu origem a críticas tanto à brutalidade e à imoralidade do naturalismo quanto à pretensão ingênua de representar fielmente a realidade. Entretanto, em vários textos-chave da estética, como o prefácio da segunda edição de Thérèse Raquin (1868) e o ensaio “O romance experimental” (1880), fala-se que o objetivo era criar uma “ilusão” da realidade, pois se o romance naturalista adotava procedimentos científicos como reação a um romantismo gasto, cabia a cada artista em seu “temperamento” individual o ato da criação. Daí que não se deva falar de “escola naturalista” e em “mestres” e “discípulos”, pois cada escritor tomou e moldou os princípios da estética à sua maneira – o que nos permite hoje falar de “naturalismos” (Becker & Dufief, 2017). Destacamos esse mal-entendido como um entre vários reducionismos impingidos ao naturalismo, retratado pela historiografia tradicional brasileira como uma estética menor, falsa e ingenuamente científica, muitas vezes reduzida a uma caricatura. Estudos recentes vêm desvendando um quadro mais sofisticado e complexo, capaz de acomodar uma gama variada de vertentes naturalistas nos séculos XIX e XX, em suas relações com o gótico, a prosa decadente, o romance popular e a literatura licenciosa, privilegiando ora uma visão trágica da existência, ora uma perspectiva “cômica” e desiludida (Baguley, 1995). Na literatura brasileira oitocentista esses desdobramentos parecem capazes de abarcar uma gama maior de autores e textos do que a historiografia tradicional conseguiu identificar. A voga naturalista do século XIX deu origem a métodos de pesquisa e criação, bem como a formas de expressão que foram retomadas por escritores nos séculos XX e XXI. A forma de abordar a realidade como elemento constitutivo da obra servirá a pintores, fotógrafos, cineastas e autores de novela, que nela verão um modo contundente de se falar sobre o mundo e as sociedades. Flora Süssekind, ao analisar o romance brasileiro do século XX, refere-se às vogas naturalistas nos anos 1930 e 1970. Também aponta, nos temas tratados na obra de Ferréz, Dráuzio Varella e Paulo Lins, nos anos 2000, para uma retomada dos postulados centrais do naturalismo. O desejo de expressar dimensões pouco atraentes da realidade, a primazia dada à descrição de conflitos sociais, os temas do preconceito racial e da diversidade sexual, assim como o desejo de documentar situações de opressão e exclusão de sujeitos subalternizados constituem elementos do pacto naturalista de leitura que se renova e se reproduz na contemporaneidade. São obras que se posicionam como retratos do real, dialogam com o tempo imediato e sugerem tomadas de posição sobre situações quotidianas de opressão e violência. O elemento extraliterário é um componente central da obra, e a busca por verossimilhança decorre tanto do discurso da experiência pessoal quanto da pesquisa científica ou jornalística. Rancière (2009) aponta que, ao abolir hierarquias e criar obras que não respeitavam a organização até então vigente, o naturalismo do século XIX criou, por meio do “efeito de realidade”, o “efeito de igualdade”, que está diretamente ligado, para ele, à possibilidade de associação livre de imagens. Rancière dirá ainda que a literatura que privilegia o descrever sobre o narrar permite que o “aristocrático emprego da ação” seja “bloqueado pela democrática coleção desordenada de imagens”. Com a perspectiva renovada de um naturalismo democrático, múltiplo e desordenado, reconhecível nos séculos XIX, XX e XXI, convidamos pesquisadores a enviar propostas de trabalho que incorporem novas questões de pesquisa e estudos de caso ao debate sobre o naturalismo.
PALAVRAS-CHAVE: Naturalismo: Realismo; Ciência; Democracia

REVISÃO DA HISTORIOGRAFIA TEATRAL: LER E RELER FONTES PRIMÁRIAS, VISÕES CRÍTICAS E JUÍZOS ESTÉTICOS NA DRAMATURGIA
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: REVISÃO DA HISTORIOGRAFIA TEATRAL: LER E RELER FONTES PRIMÁRIAS, VISÕES CRÍTICAS E JUÍZOS ESTÉTICOS NA DRAMATURGIA
COORDENADORES:
- Maria Clara Gonçalves (UNESP/Assis)
- Elizabeth Ferreira Cardoso Ribeiro Azevedo (USP/ECA)
- Fabiana Siqueira Fontana (CAL/UFSM)
RESUMO: O simpósio “Revisão da historiografia teatral: ler e reler fontes primárias, visões críticas e juízos estéticos” foi idealizado pelo grupo Estudos do Teatro Ex-Cêntrico (ETEx - CNPq/ ECA) e, pelo terceiro ano, vem se consolidando como um importante espaço de debate sobre teatro na ABRALIC. O objetivo do simpósio é discutir peças, autores, gêneros, repertórios e/ou círculos teatrais de pouca visibilidade na historiografia teatral. Os textos dramáticos são uma parte importante do teatro, apresentando-se como expressão estética que, assim como na literatura, utilizam-se das palavras para contribuir à concepção da experiência humana. Os pesquisadores que se debruçam sobre o teatro devem compreender que “a peça teatral, considerada literatura, é um dos elementos mais importantes do teatro; todavia, não o constitui, não lhe é condição indispensável” (ROSENFELD, 2008, p. 35). Devido à sua natureza multifacetada, o teatro tornou-se um objeto de análise complexo, sendo necessário levar em consideração outros fatores além do material textual. Essa “dificuldade” pode ser um dos motivos pelos quais os textos dramáticos tenham obtido um espaço menor nos estudos literários de maior relevância. Deve-se ressaltar, ainda, que as obras teatrais receberam (e ainda recebem) leituras ligadas a critérios estéticos pautados em interesses históricos do momento de concepção da crítica. Em geral, “ao observarmos as premissas estéticas e culturais que impulsionaram as criações artísticas, constatamos que as reflexões construídas sobre as mesmas foram elaboradas a partir de ideias que, ao serem, sistematicamente, defendidas, tornaram-se referências para as práticas teatrais transformadas em marcos ordenadores da temporalidade que conhecemos como História do Teatro Brasileiro” (GUINSBURG; PATRIOTA, 2012, p. 23). Torna-se necessário, assim, questionar a cristalização de determinadas apreciações nos estudos historiográficos, responsáveis pelo “apagamento” de uma parcela do universo teatral, resultando em uma linha temporal histórica fragmentada e construída a partir de critérios que, nos dias atuais, devem ser revisitados. Há de se repensar, ainda, o juízo de “valor” estético, já que determinadas peças, autores, gêneros, repertórios e/ou círculos teatrais tiveram mais relevância junto à crítica justamente por conta desse fator. As questões que atribuem essa ideia valorativa às obras de arte, em geral, sempre incorrem em julgamentos que diferenciam quais devem ocupar um lugar expressivo e quais serão colocados à margem nos estudos críticos. Os critérios norteadores da posição dessas partes constituintes do universo teatral nos estudos sobre teatro poderão ser discutidos a partir dos interesses críticos que mobilizam os pesquisadores de hoje. Ou seja, novos interesses mobilizarão novas avaliações, que fomentarão novas informações sobre a cena teatral como um todo. Contudo, não se trata de desconsiderar a relevância estética das produções, autores ou movimentos teatrais já consagrados pelos estudiosos, mas sim de fazer um exercício reflexivo que permita questionar determinados lugares-comuns da crítica, realizados em outros tempos e em outras circunstâncias. Tal movimento reflexivo permite que aos estudos sejam incorporados textos, autores e movimentos teatrais variados, que possuem relevância estética, mas que, por diversos fatores, foram postos de lado na historiografia teatral. Obviamente esse movimento já está ocorrendo e, por isso, esse simpósio busca reunir esses trabalhos e criar uma rede ativa entre os pesquisadores. Se o juízo dos críticos está ligado às ideias estéticas valorizadas no momento em que suas análises foram feitas, então “o valor é uma atribuição historicamente construída. Frases como ‘esta obra tem densidade’ não são objetivas, e evocam primariamente os interesses dos sujeitos que as enunciam” (GUINZBURG, 2008, p. 103). Para que sejam construídas análises que ampliem o entendimento sobre o teatro nos estudos críticos, torna-se relevante avaliar as concepções estéticas que orientam as apreciações estilísticas das dramaturgias; a importância de determinados autores para o entendimento da cena teatral no qual estavam inseridos; o olhar valorativo da crítica pautado na hierarquização dos gêneros; e os círculos teatrais de menos prestígio - que permitem ampliar as informações sobre o movimento teatral e as relações entre o repertório de companhias/teatros e o gosto de uma época. Por fim, a investigação de fontes primárias ilumina aspectos da cena que ultrapassem a dramaturgia, podendo ser realizada em fontes como anúncios de espetáculos; programas de peças; no ambiente histórico das encenações (destacando atores, diretores e cenógrafos); e documentos utilizados em processos de criação. Trabalhos que busquem empreender uma leitura que explore outros textos e não apenas os canonicamente evocados pela crítica estabelecida de autores consagrados, ou que busquem um novo olhar sobre os já desgastados lugares-comuns da historiografia teatral, contribuirão sobremaneira à discussão proposta neste simpósio. Referências Bibliográficas: GUINSBURG, Jacó; PATRIOTA, Rosângela. Teatro Brasileiro: ideias de uma história. São Paulo: Perspectiva, 2012. GUINZBURG, Jaime. “O valor estético: entre universalidade e exclusão”. Alea, Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas, Faculdade de Letras, Universidade Federal do Rio de Janeiro. 2008, vol. 10, n. 1, p. 98-107. ROSENFELD, Anatol. Prismas do teatro. São Paulo: Perspectiva, 2008.
PALAVRAS-CHAVE: Dramaturgia; Crítica Teatral; Fontes Primárias; Historiografia Teatral; Juízos Estéticos.

ROLAND BARTHES PLURAL: ENQUANTO SE PODE PERGUNTAR
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: ROLAND BARTHES PLURAL: ENQUANTO SE PODE PERGUNTAR
COORDENADORES:
- Márcio Venício Barbosa (Universidade Federal do Rio Grande do Norte)
- Claudia Amigo Pino (Universidade de São Paulo)
- Laura Taddei Brandini (Universidade Estadual de Londrina)
RESUMO: A obra de Roland Barthes não se encerra com a morte do autor em 1980. Ao contrário, para além dos efeitos midiáticos e dos reflexos da French Theory, as publicações póstumas e os estudos sobre esse autor exibem uma atualidade inegável, que tem como base o questionamento. A diversidade dos temas por ele tratados e a simplicidade das questões que apresenta a esses temas e a ele mesmo diante dos objetos escolhidos escondem, por vezes, dos leitores menos atentos, a profundidade da busca que ali se inicia. Éric Marty destaca que “Barthes tente toujours d’objectiver les choses, de donner au lecteur, non pas une impression à lui, mais une impression partageable: que le lecteur puisse être aussi lecteur de soi-même en lisant Barthes.” [Barthes sempre tenta objetivar as coisas, dar ao leitor não uma impressão dele mesmo, mas uma impressão partilhável: que o leitor possa ser também leitor de si mesmo lendo Barthes.] (MARTY, 2010, p. 166. Trad. nossa.) Essa característica de sua obra, localizada no campo da crítica literária, atua, entretanto, diretamente na percepção de Barthes como um autor, antes de qualquer outra qualificação que se lhe atribua, sobretudo se consideramos a última fase de sua produção intelectual, marcada por um “gesto autobiográfico”, que não escapa a uma de suas biógrafas, Typhaine Samoyault (2021, p. 513): “Se o gesto autobiográfico é crítico, não é porque ele situa à distância o sujeito que foi — como o faz Sartre em As palavras —, mas porque impede a unificação pela narrativa ou pelo sentido. Ele o refrata e o difrata alternadamente, construindo-o como objeto de uma enciclopédia móvel e não totalizante, incessantemente recomposta, subtraindo o saber à medida que ele é dado.” E mesmo no campo da crítica, seu caráter plural se mostra na diversidade dos objetos que elege, tornando-o conhecido em diversas áreas, porém de forma difusa, como bem observa Magali Nachtergael, no campo das artes: “L’influence de Barthes, si elle n’est pas toujours manifeste, est diffuse: rares sont les artistes qui n’ont pas lu ses textes et fragments. Lecture incontournable dans le monde de l’art, peu d’artistes s’en réclament pourtant directement.” [A influência de Barthes, nem sempre manifesta, é difusa: raros são os artistas que não leram seus textos e fragmentos. Leitura incontornável no mundo da arte, poucos artistas, entretanto, se referem a ele diretamente.] (NACHTERGAEL, 2015: p. 11. Trad. nossa.)Interessa-nos, pois, exatamente essa pluralidade em Barthes que, oriunda de sua subjetividade, sempre questionada, abre-se a outras subjetividades e se torna sempre mais produtiva na medida em que, sem propor métodos ou uma escola a ser seguida, questiona por dentro o platonismo da cultura ocidental, empenhando seu talento em “débusquer ce qui donne à penser et l’offrir dans une écriture susceptible de le hisser à la faveur de la majuscule. Prendre ce qui donne à penser par le côté de son intensité sensible – sauver les qualia, quitte à en faire des signes et à rester dans la caverne où ils miroitent pour écrire les mythologies du monde moderne.” [desalojar aquilo que se dá a pensar, oferecendo-o em uma escrita suscetível de içá-lo por meio da maiúscula. Tomar o que dá a pensar pelo lado de sua intensidade sensível – salvar os qualia, arriscando-se a fazer deles signos e a permanecer na caverna em que eles se espelham para escrever as mitologias do mundo moderno”] (RUEFF, 2005, p. 15. Trad. nossa.). Essa marca do texto barthesiano se vê com clareza em suas Mitologias, de 1957, aludidas por Rueff nesse trecho. Entretanto, apesar de o próprio autor, em entrevista à revista Lire, em 1979, falar na adoção de táticas para o enfrentamento da produção de sentidos nos textos, declarando que sua tática, naquele momento, era mais de recolhimento que de luta, mas reconhecia que “uma época cultural é feita de várias tentativas táticas concomitantes”(BARTHES, 2004, p. 466). O reconhecimento do plural de que são feitos os textos e que também faz as sociedades e as culturas nos chama, permanentemente, ao reconhecimento dessas táticas, palavra que integra o campo semântico bélico em que fomos mergulhados nos últimos anos. Vendo, pois, em Barthes, uma atualidade que pode sempre produzir novos questionamentos, este simpósio se abre para os trabalhos que, servindo-se de sua obra, abordem questões contemporâneas.
PALAVRAS-CHAVE: Roland Barthes; Plural; Questionamentos

SABERES EM CONFLUÊNCIA
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: SABERES EM CONFLUÊNCIA
COORDENADORES:
- Natalie Souza de Araujo Lima (Universidade Federal Fluminense)
- Thiago de Abreu e Lima Florêncio (Universidade Regional do Cariri (URCA))
- Felipe Wircker Machado (Cefet-RJ)
RESUMO: Cada vez mais presentes nas produções acadêmicas latino-americanas, os saberes dos povos afrodiaspóricos e indígenas vêm sendo reconhecidos, em diversas áreas do conhecimento, como matrizes epistemológicas nos espaços tradicionalmente dedicados à legitimação de paradigmas moderno-ocidentais, promovendo tensionamentos e diálogos extremamente necessários entre tradições de pensamento e cosmopercepções (OYEWÙMÍ, 2021). Frequentemente ligados a práticas diversas e respondendo ao enunciado colonial, tais saberes apresentam-se como propostas capazes de recolocar paradigmas e (re)formular conceitos transdisciplinarmente. Faz-se necessário lidar com um imaginário racista e uma concepção de tempo linear que se alicerçam na partição entre natureza e cultura e reificam a autoimagem de uma sociedade que enxerga sua vocação teleológica no ideal de civilização ocidental. Tal dinâmica constrói a base discursiva que sustenta uma visão evolucionista e unidirecional da história humana e seus saberes. Afinal, numa estrutura social racializada como a que nos foi imposta pela ordem moderno-colonial, mestiços, afrodiaspóricos e indígenas, bem como os territórios que ocupamos e os modos de vida que praticamos, corresponderíamos, ontologicamente, a um certo estado de natureza – ideia que se desdobra, metonimicamente, em um imaginário sobre o primitivo e o periférico. Como, então, adotar práticas-pensamento disruptivas, capazes de quebrar e contrariar essa ordem e de trazer para o centro de uma crítica ao enunciado colonial saberes e subjetividades que esse enunciado, em suas diferentes produções discursivas, tentou e tenta subjugar ou mesmo destruir? Mais até: como ultrapassar a crítica à herança colonial e desaprender a razão imperialista/colonialista? Perguntamos pela invenção de categorias baseadas em práticas e em saberes que ficaram de fora – no exterior ou na periferia – da razão colonialista/imperialista e que agora se instalam em instituições modernas por excelência, as universidades. Retrospectivamente, podemos evocar o pensamento afro-caribenho de Aimé Césaire, Frantz Fanon e Édouard Glissant, cujos respectivos conceitos de “negritude” (CÉSAIRE, 2010), “alienação colonial” (FANON, 2020), “opacidade” e “Relação” (GLISSANT, 2021) abriram caminho para as discussões em torno de subjetividades negras e sua relação com o racismo e a colonialidade. Voltando-nos para os centros hegemônicos de produção de saber nos anos 1960, 1970 e 1980, encontramos os nomes de Edward Said (1990), Homi Bhabha (1998), Stuart Hall (2003) e Gayatri Spivak (2010), que rasuram o então onipresente cosmopolitismo da pós-modernidade com conceitos como os de “orientalismo”, “multiculturalismo”, “identidade” e “subalternidade”. É também o caso de olhar para autores da América do Sul e para a perspectiva descolonial, que forja conceitos como os de “colonialidade do poder”, de Aníbal Quijano (2005), e “desobediência epistêmica”, de Walter Mignolo (2008). E embora seja importante atentar para os limites do descolonial – como desfazer o que não pára de se atualizar? –, também é necessário reconhecer que as produções teórico-críticas em torno/a partir desse termo contribuíram para a consolidação de um campo. Há também quem proponha, como é o caso do mestre quilombola Nego Bispo, outra resposta ao enunciado colonial sob a forma do contracolonialismo: estabelecer barreiras, contrariar, interromper e se contrapor em vez de desfazer ou desmanchar. (BISPO, 2021). E é com o conceito de “afroconfluência” que Bispo aponta para o encontro entre sociedades quilombolas e indígenas, ambas centradas no valor do circular e do pluri em vez do linear e do mono (BISPO, 2015). Não se trata, neste simpósio, de defender uma única maneira de lidar com o enunciado colonial, mas de reunir propostas com orientação bibliográfica plural. Nesse sentido, podemos evocar também os conceitos de “encruzilhada”, “tempo espiralar” e “corpo-tela” em Leda Maria Martins (2021; 2002), assim como os de “cruzo” e “ebó epistemológico” (RUFINO, 2019), que driblam a ideia de “descolonização” à medida que enxergam nos fazeres afrodiaspóricos inventados nas Américas – como é o caso do candomblé, da umbanda e do congado – práticas de produção de conhecimento que se infiltram e africanizam os saberes eurocristãos e coloniais. Lembremos que a crítica à colonialidade inclui a contestação do regime heteropatriarcal e seus dispositivos de colonização de corpos e subjetividades, o que faz com que as questões de gênero e sexualidade ocupem também o centro desta discussão, algo que não foi negligenciado por pensadoras como Lélia Gonzalez e Beatriz Nascimento ao proporem noções como “amefricanidade” (GONZALEZ, 2020) e a conceituação de quilombo pelo viés da história (RATTS, 2006), frisando tanto a importância de se debater questões de raça e racismo no movimento feminista quanto as questões de gênero no âmbito do movimento negro. Por sua vez, Denise Ferreria da Silva, a partir de uma perspectiva filosófica radical, propõe uma poética negra feminista a fim de abandonar a prática crítica, ela mesma herdeira de postulados ontoepistemológicos iluministas (FERREIRA DA SILVA, 2019). Assim, este simpósio pretende reunir trabalhos que se valham da oralidade ou da escrita, das formas teóricas ou ensaísticas, bem como de produções literárias, audiovisuais, performáticas ou cênicas na medida em que se entende as expressões artísticas como campos de produção de conhecimento e de pensamento.
PALAVRAS-CHAVE: encruzilhada; confluência; colonialidade; pós-colonial; decolonial

TEORIAS CRÍTICAS DA LITERATURA JUVENIL BRASILEIRA (2000-2020): REFLEXÕES E DEBATES
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: TEORIAS CRÍTICAS DA LITERATURA JUVENIL BRASILEIRA (2000-2020): REFLEXÕES E DEBATES
COORDENADORES:
- Eliane Aparecida Galvao Ribeiro Ferreira (Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" - UNESP)
- Ricardo Magalhães Bulhões (Universidade Federal do Mato Grosso do Sul - UFMS)
- Thiago Alves Valente (Universidade Estadual do Norte do Paraná - UENP)
RESUMO: Este simpósio tem por objetivo atualizar as discussões realizadas nos últimos vinte anos, pelas principais vertentes teórico-metodológicas, diretamente relacionadas à constituição do campo de estudos da Literatura Juvenil. Justifica-se esta abordagem, conforme João Luís Ceccantini (Cf. Uma estética da formação: vinte anos de Literatura Juvenil Brasileira premiada (1978-1997). 2000. Tese (Doutorado em Literatura) – Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual de São Paulo, Assis, 2000, p. 20-21), pois existem lacunas nas pesquisas voltadas à Literatura Juvenil em âmbito brasileiro, em especial, faltam “obras de referência de toda sorte – biografias, dicionários, antologias, entre outros; estudos monográficos sobre um determinado autor ou uma determinada obra, dos mais simples, aos mais complexos, que procurem integrar ambos os aspectos na análise; pesquisas mais generalistas, que deem conta de questões teóricas representativas [...]”. Embora haja crescimento em quantidade e qualidade, tanto no contexto do sistema literário brasileiro quanto internacional, como atesta Alice Áurea Penteado Martha (Cf. A literatura infantil e juvenil: produção brasileira contemporânea. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 43, n. 2, p. 9-16, abr./jun., 2008), a Literatura Juvenil ainda tende a situar-se em um lugar periférico no âmbito do sistema literário, como consequência não só da reduzida atenção que recebe por parte da academia e da crítica, como também da sua associação ao universo paraliterário, conotada como produto editorial marcado pelo recurso a fórmulas e elementos codificados. A profusão de títulos, temas e formas exige, segundo Maria Zaira Turchi (Cf. Narrativas juvenis: a inovação literária em busca do leitor. FronteiraZ, Porto Alegre, nº 17, dez. 2016. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/fronteiraz/article/view/29410), da crítica exercício constante, visando a aquilatar um conjunto de textos bastante heterogêneo, mas que também não deixa de configurar tendências frente às instâncias de legitimação das quais participa. O intrincado mosaico de textos é um dos fatores que justifica a preocupação daqueles que se dedicam à análise de um corpus multifacetado, disposto no contexto nacional e/ou estrangeiro, e/ou em outros circuitos editoriais. No que concerne aos livros contemporâneos dispostos no mercado sob a chancela de formar leitores de literatura, Marisa Lajolo e Regina Zilberman destacam que, pelo recurso “à intertextualidade e o apelo à metalinguagem” (Cf. Literatura infantil brasileira: uma nova/outra história. Curitiba: PUCPress, 2017, p. 80), se configuram como desafios a seus destinatários. Entre os textos que compõem o subsistema literário juvenil, justifica-se, então, refletir sobre o que eles deflagram. Tornam-se, então, necessárias, em consonância com José Nicolau Gregorin Filho (Cf. Literatura juvenil: adolescência, cultura e formação de leitores. São Paulo: Melhoramentos, 2011), abordagens críticas, históricas e teóricas sobre essa produção, na qual demandas diversas do homem contemporâneo – como valores e papéis sociais – revelam-se aos jovens, assim como sua própria voz e seus sentimentos. Parte-se do pressuposto, conforme Larissa Warzocha Fernandes Cruvinel (Cf. Narrativas juvenis brasileiras: em busca da especificidade do gênero. 2009.Tese (Doutorado em Letras e Linguística) – Universidade Federal de Goiás, Faculdade de Letras, 2009, p.171), de que a Literatura Juvenil “exige uma mudança de olhar para apreender o que pode ser uma renovação do literário ao buscar a criação de formas pertinentes e significativas para um jovem leitor.” Segundo Teresa Colomer (2003), a complexidade da Literatura Juvenil contemporânea advém de suas características, como dialogia, metaficcionalidade, hibridismo, entre outras. O campo cultural dessa literatura, de acordo com Teresa Colomer, “dialoga nas fronteiras entre literatura, cultura oral, cultura popular de massa, mídias e cotidiano vivido pelo receptor” (Cf. A formação do leitor literário: narrativa infantil e juvenil atual. Trad. Laura Sandroni. São Paulo: Global, 2003, p.121). Ao congregar essa composição plural, a Literatura Juvenil faculta ao jovem leitor observar que, na sociedade, existem diferentes manifestações culturais. Para tanto, no campo de estudos literários e críticos contemporâneos, e interdisciplinares, serão aceitos trabalhos que a problematizem, enquanto objeto de estudo, análise e recepção, em consonância com, pelo menos, um dos seguintes tópicos: 1. Literatura juvenil e História; 2. Literatura juvenil e Sociologia e/ou Sociologia da Leitura; 3. Literatura juvenil e Psicologia, Psicanálise; 4. Literatura juvenil e Imaginário; 5. Literatura juvenil e outras artes; 6. Literatura juvenil e Leitores; 7. Literatura juvenil e teoria Queer; 8. Literatura juvenil e Estudos Culturais – literatura africana e indígena; 9. Literatura juvenil e crítica feminista; 10. Literatura juvenil e Desconstrução/Pós-modernidade; 11. Literatura juvenil e Linguística; 12. Literatura juvenil e mercado; 13. Literatura juvenil e mídias digitais; 14. Literatura juvenil e Educação Literária e/ou Ensino de Literatura.
PALAVRAS-CHAVE: Literatura Juvenil; Espistemologia; Teorias Críticas; Estudos Interdisciplinares.

YORUBANTU: EPISTEMOLOGIAS AFRICANAS (YORÙBÁ, JEJE, FON, BANTU) E NEGRO-BRASILEIRAS NO CAMPO DOS ESTUDOS LITERÁRIOS
EIXO: EPISTEMOLOGIAS PLURAIS, SABERES COMUNS
SIMPÓSIO: YORUBANTU: EPISTEMOLOGIAS AFRICANAS (YORÙBÁ, JEJE, FON, BANTU) E NEGRO-BRASILEIRAS NO CAMPO DOS ESTUDOS LITERÁRIOS
COORDENADORES:
- José Henrique de Freitas Santos (UFBA)
- Eumara Maciel dos Santos (UFOB)
- Vercio Gonçalves Conceição (UFOP)
RESUMO: Este simpósio propõe-se a refletir acerca da centralidade das contribuições epistemológicas africanas e negra para o campo dos estudos literários no Brasil, apesar da pilhagem epistêmica (FREITAS, 2016) por que passaram esses saberes nos processos canônicos que se consolidaram nos cursos de Letras do país, nos circuitos de legitimação literária (Feiras, Festas, Congressos, Prêmios, Academias, dentre outros), no mercado editorial, nos movimentos artísticos de narração nacional, bem como nos exercícios da teoria, da crítica e da historiografia hegemônicas. Os adinkras dos povos akan, as escritas sona dos Tchokwe, os provérbios de tampa de panela dos cabinda, os odu Ifá yorubanos, dentre outros sistemas de multiletramentos multimodais africanos que fazem convergir provérbio, física, geografia, história, filosofia, direito tradicional, dentre outras áreas, em texto literário multissemiótico, demonstram como os exercícios situados de práticas sociais da leitura/escrita de muitos povos africanos já deslocava uma perspectiva alfabetocêntrica e grafocêntrica ocidentais em suas bases, bem como apontava desde já para a literatura sob outras perspectivas. O impacto da literatura-terreiro (FREITAS, 2016) no campo dos estudos literários no Brasil como consequência de sua conexão com esses e outros letramentos africanos para aqui trazidos desde o período colonial pelos sujeitos escravizados pode-se constatar a partir de gêneros yorubaianos (OMIDIRE, 2005) como os orikis, os itans, os aduras, os orùkó, mas também de toda uma produção ética e estética negro-brasileira (PEREIRA, 2013) no diálogo com as experiências bantu, fon, jeje e outras, nos já citados provérbios, nas cantigas de candomblé, nos pontos de caboclo, nas loas e ladainhas de capoeira e ainda no samba (principal gênero literário brasileiro que constituiu e constitui também o maior e mais longevo movimento literário na história do Brasil), nos cantopoemas do congado, no rap, sem contar toda uma expressão da oralitura africana e negro-brasileira que se espraiou nos textos escritos, mesmo canônicos. Essa literatura-terreiro e essas literaturas africanas no Brasil forjam-se na reexistência (SOUZA, 2009) apontando biopoliticamente antes de tudo para vida dos corpos negros no país, alvo contínuo da maquinaria de extermínio exponencial do Estado que culmina no que Abdias NASCIMENTO (1978) apontava décadas atrás como o genocídio do negro-brasileiro. Essas produções se tecem nas performances de um tempo-espaço espiralar (MARTINS, 2002) , derivadas de um sistema de pensamento nagô (SODRÉ,2017), mas também de um tempo espaço circular anti-horário (SANTANA, 2019) expresso na roda bantu (LETTIERES LEITE, 2017) dos sistemas musicais pretos, no giro da literatura-corpo dos corpos em transe narrativos dos xirês de candomblé, da roda da capoeira, do jongo, do círculo das batalhas de dança de rua. Esses textos são atravessados ainda pelo que Azoilda Trindade define como valores civilizatórios afro-brasileiros, bem como pela filosofia da ancestralidade (OLIVEIRA, 2007) no que tange a sua gênese em contextos comunitários ubuntuísticos (CASTIANO, 2015) conectados com a vida e sentidos coletivos que abrangem encantados e outros seres identificados como animais, plantas, pedras que traduzem uma literatura de encantamento do mundo. Esse simpósio, desta forma, pretende oferecer um breve panorama dos legados ancestrais negro-africanos de diversos dos povos como os Yorubá, Bantu, Fon e de outras regiões da África, bem como dos povos da diáspora negra, para os estudos literários brasileiros de modo a observar como esses saberes se plasmaram no campo ao longo dos séculos através da constituição do Brasil. Nossa proposta, assim, é configurada de maneira interdisciplinar, de modo a por em diálogo o que convencionou-se por áreas do conhecimento distintas como as Letras, a Filosofia, o Direito, a Psicologia, a História, cartografando as gnoses africanas e negro-brasileiras que integram nosso poder-saber e saber-fazer no Atlântico Negro, sobretudo no eixo Sul-Sul. Referências: AYOH’OMIDIRE, Felix. Yorubaianidade mundializada: o reinado da oralitura em textos yorubá-nigerianos e afro-baianos contemporâneos. Tese inédita defendida no PPGLL/UFBA em 2005. CASTIANO, José P. Filosofia Africana: da sagacidade à intersubjetivação. Maputo: Editora Educar, 2015. FREITAS, Henrique. O Arco e a Arkhé: ensaios sobre literatura e cultura. Salvador: Ogums Toques Negros, 2016. LEITE, Letieres Rumpilezzinho laboratório musical de jovens : relatos de uma experiência / Letieres Leite. – Salvador : LeL Produção Artística, 2017. NASCIMENTO, Abdias, Genocídio do Negro no Brasil, Rio de Janeiro, 1978. PEREIRA, Edimilson de Almeida. Blue Note: entrevista imaginada. Belo Horizonte: Nandyala, 2013. Referências: SANTOS, Tiganá Santana Neves. A cosmologia africana dos bantu-kongo por Bunseki Fu-Kiau: tradução negra, reflexões e diálogos a partir do Brasil. Programa de Pós-graduação em Estudos da Tradução, Universidade de São Paulo, 2019. Tese de Doutorado inédita. SOUZA, A.L.S. Letramentos de Reexistência: culturas e identidades no movimento hiphop. 2009. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada) – Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009.
PALAVRAS-CHAVE: yorubantu, epistemologia negra, epistemologias africanas, literatura-terreiro
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A LITERATURA, O PENSAMENTO E A FILOSOFIA
- Josué Borges de Araújo Godinho (Universidade do Estado de Minas Gerais)
- Roberto Antônio Penedo do Amaral (Universidade Federal do Tocantins)
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CARTOGRAFIAS RECENTES DO COMPARATISMO NA AMÉRICA LATINA: RELAÇÕES DE VIZINHANÇA RECONFIGURADAS
- Wanderlan Alves (Universidade Estadual da Paraíba (UEPB))
- Anselmo Peres Alós (Universidade Federal de Santa Maria (UFSM))
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EPISTEMOLOGIAS ERRANTES, COMPARATISMOS NÔMADES - ECOLOGIAS DA FRICÇÃO NAS/DAS AMÉRICAS, ÁFRICAS E AMAZÔNIAS
- Amilton José Freire de Queiroz (Universidade Federal do Acre, Colégio de Aplicação)
- Ezilda Maciel da Silva (Universidade Federal do Pará)
- Simone de Souza Lima (Universidade Federal do Acre)
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MODERNISMO E VANGUARDA DENTRO, AQUÉM E ALÉM DA PAULICEIA
- Maria de Fatima do Nascimento (Universidade Federal do Pará - UFPA)
- Hugo Lenes Menezes (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí)
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RELENDO CRITICAMENTE A PRODUÇÃO MODERNISTA DOS ANOS 20
- Paulo da Luz Moreira (University of Oklahoma)
- Raquel dos Santos Madanêlo Souza (Universidade Federal de Minas Gerais)
- Rodrigo Alexandre de Carvalho Xavier (Universidade Federal do Rio de Janeiro)

A LITERATURA, O PENSAMENTO E A FILOSOFIA
EIXO: LITERATURA COMPARADA COMO ZONA DE VIZINHANÇA
SIMPÓSIO: A LITERATURA, O PENSAMENTO E A FILOSOFIA
COORDENADORES:
- Josué Borges de Araújo Godinho (Universidade do Estado de Minas Gerais)
- Roberto Antônio Penedo do Amaral (Universidade Federal do Tocantins)
RESUMO: Este Simpósio tem por objetivo principal o estudo das relações entre a literatura, o pensamento e a filosofia, ponto em que a língua literária se dá a ler como as “Ideias que o escritor vê e ouve nos interstícios da linguagem, nos desvios da linguagem” (DELEUZE, 1997, p. 16). No prólogo de Crítica e Clínica, Deleuze, com Proust, diz que “o escritor inventa na língua uma nova língua de algum modo estrangeira” (PROUST apud DELEUZE, 1997, p. 9). Afirma, portanto, que a literatura inventa “novas potências gramaticais ou sintáticas”, o escritor desorganiza o status quo da gramática e da sintaxe e as faz delirarem. Há uma potência fora dos caminhos da língua comum que, tensionada e extraída de seu lugar ordinário, mas devolvida a seu interior, apresenta, no ato da escrita literária, o “limite ‘assintático’, ‘agramatical’, ou que se comunica com seu próprio fora”. (DELEUZE, 1997, p. 9). Nesses termos, é importante apontar para a leitura que Rancière faz das relações entre o pensamento de Deleuze e a literatura. A literatura enquanto fórmula, pontua Rancière, é o processo “que desorganiza a vida, uma certa forma de vida. A fórmula corrói a organização racional do estudo e da vida [...], estilhaça as hierarquias de um mundo mas também aquilo que as sustenta” (RANCIÈRE, 1999, p. 2). Lê-se, portanto, a literatura no processo, no movimento de deslizamento da sintaxe e da gramática, “passagem da vida na linguagem” (DELEUZE, 1997, p. 16), que é também o processo de minoração e decomposição da língua maior, oficial, que, levada ao seu limite, a um avesso de si, não pertence a si mesma, mas se dá internamente ao seu próprio sistema. Tais posicionamentos levam-nos a pensar a literatura além do atavismo às teorias miméticas aristotélicas, isto é, além dos postulados aristotélicos e, pensando com Sontag, uma alternativa à interpretação centralizadora dos sentidos e da representação. Em Contra a interpretação, Sontag afirma que a teoria da arte no Ocidente se consagrou na teoria grega “da arte como mimese ou representação” (SONTAG, 1998, p. 12), e que tal teoria é um problema, pois, prossegue a autora, trata-se de um pensamento que antepõe forma e conteúdo e sobrepõe este àquela, tornando-o, o conteúdo, essencial, e ela, a forma, acessória. (SONTAG, 1998, p. 12). Não parecem ser outros os procedimentos que se encontram em textos os mais diversos da literatura brasileira. Nesse sentido, há uma gama de escritores cujas obras retomam e reelaboram tal herança literária. Nessas, ocorre a problematização da tradição e da fundamentação aristotélica ancorada nas três unidades (sujeito, espaço e tempo), reviradas ao avesso através da experimentação da linguagem ficcional e poética. Essa linhagem experimental, a nosso ver, tem seu ponto de partida em Machado de Assis, passando por Oswald e Mário de Andrade, Graciliano Ramos, Carlos Drummond de Andrade, Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Murilo Rubião, os concretos, Manoel de Barros, Carolina Maria de Jesus, Sérgio Sant’Anna, Ana Cristina César, Wilson Bueno, Luiz Ruffato, Maria Esther Maciel, os marginais (tanto os da década de 1970 como os periféricos pós 1990), entre outros. Assim, esses autores seriam agenciadores de uma língua para a qual não só a experimentação é uma tônica, como a familiarização e a contaminação com outros sistemas de linguagens se faz de forma intensa. Exemplos desses procedimentos escriturais são os devires-outros que se leem em Vidas secas, em que o escritor, desorganizando as hierarquias que separam homem e cão, dá a visão, em um devir-intenso, da cachorra Baleia, e o narrador, ao rés do chão, narra como um cão. Também se lê no devir-mulher de “Desenredo”, de Guimarães Rosa, em que narrador e protagonista veem-se desorganizados da hierarquia narrativa estruturada numa história com começo meio e fim e, em um exercício intenso de sintaxe e de pensamento, “amatemático”, o barquinho de papel navega o abismo. São potências de “ruptura da literatura como tal com o sistema representativo, de origem aristotélica, que sustentava o edifício das belas letras” (RANCIÉRE, 1999, p. 2). Assim, interessa-nos, neste simpósio, a literatura em ponto de intensidade, de invenção intensa e torção da sintaxe, processo de produção de uma sintaxe nova, ao ponto de o escritor escrever como um animal, como um outro absoluto, como um burro, um rato, um cão “(Mas um cão não escreve. – Justamente, justamente).” (DELEUZE; GUATTARI, 2014, p. 52).
PALAVRAS-CHAVE: Teoria da literatura; Literatura menor; Pensamento; Sintaxe; Representação.

CARTOGRAFIAS RECENTES DO COMPARATISMO NA AMÉRICA LATINA: RELAÇÕES DE VIZINHANÇA RECONFIGURADAS
EIXO: LITERATURA COMPARADA COMO ZONA DE VIZINHANÇA
SIMPÓSIO: CARTOGRAFIAS RECENTES DO COMPARATISMO NA AMÉRICA LATINA: RELAÇÕES DE VIZINHANÇA RECONFIGURADAS
COORDENADORES:
- Wanderlan Alves (Universidade Estadual da Paraíba (UEPB))
- Anselmo Peres Alós (Universidade Federal de Santa Maria (UFSM))
RESUMO: Os estudos literários latino-americanos passaram de um processo de influência ao progressivo diálogo crítico, da dependência ao intercâmbio e, por fim, à emergência de discursos que disputam um lugar tanto na partilha do sensível (Rancière, 2005), no plano estético, quanto nas guerras epistemológicas (Lazzarato, 2019) que fazem do campo literário, também, um campo de batalhas. Nas últimas décadas, assiste-se a crescentes trocas nas relações intelectuais e estéticas latino-americanas que, seja como expressão de um processo de globalização ou de mundialização da cultura, da literatura e das artes, seja em função do avanço das tecnologias e dos media, ou em razão do próprio potencial conectivo das artes, fazem com que novas cartografias artístico-literárias e intelectuais emerjam (Speranza, 2012). Nesse sentido, as relações de aproximação e distanciamento e os movimentos que permitem a configuração de um limiar que constitui a noção de vizinhança se redefinem, não se restringindo à proximidade geográfica, mas expandindo-se por meio de relações de intensidade, semelhança e, por vezes, desafios em comum, num percurso que poderia encontrar seus precursores no pensamento de Aby Warbug, Walter Benjamin ou Carl Einstein, retomado, por exemplo, por Georges Didi-Huberman (2011), ou, na literatura, por Borges, cujas apostas no anacronismo, em textualidades apócrifas e na noção de precursores já transtornava quaisquer relações de vizinhança, pertencimento ou apropriação pautadas na ideia de propriedade, como deixara evidente em seu ensaio “El escritor argentino y la tradición”. Mais recentemente Renato Ortiz (1998) propõe pensar noções como local, regional, nacional e global de modo transversal, marcadas por atravessamentos que fazem com que um determinado fenômenos estético, discursivo ou cultural possa ocupar, simultaneamente, vários (ou todos esses) territórios e ser afetado por eles de diferentes maneiras. Tal perspectiva atualiza o próprio debate sobre as inclusões e exclusões da globalização no âmbito da arte, sugerindo que aquela parte da produção e dos discursos que parece escapar aos grandes circuitos (galerias, feiras, grandes editoras) pode, também, provocar fricção no campo (Giunta, 2011) e atuar em sua reconfiguração, a partir de “nano-intervenções”. Quando se pensam as relações entre estética e política e os imperativos éticos e estéticos de um tempo como o nosso, no qual quadros de guerra, homo/transfobia, xenofobia e racismo, assim como os novos fascismos reaparecem, cruzam e redesenham fronteiras, nota-se que as relações de vizinhança se atualizam e demandam novos modos de pensar, especialmente no campo dos estudos literários, no qual o conhecimento é “polémico y estratégico” (Ludmer, 2015, p. 37) e também configura espaços de experiência. Por vezes, as problemáticas envolvendo sujeitos, agenciamentos e processos de formação subjetiva entre certas regiões da América Latina, da Ásia, das Áfricas ou, mesmo, do Leste europeu, assim como de comunidades e sujeitos sem topologias (Cámara; Molina; Rodríguez-Carranza, 2020) espalhadas pelo mundo podem revelar-se mais afins do que outras que, geograficamente, envolvem sujeitos de um mesmo espaço (como São Paulo, Buenos Aires ou a Cidade do México). Por um lado, os deslocamentos tornam-se condição e inacabamento constitutivos desses sujeitos, mas, por outro, “The world is sectioned into nations and nationalities only for those who cannot afford or travel beyond their home countries. For the rich, the world is indeed transnational and deterritorialized” (Miyoshi, 2001, p. 292), o que requer a proposição de novos caminhos “to replace the imaginaries of exclusionist familiarism, comunitarianism, nationhood, ethnic culture, regionalism, ‘globalization’, or even humanism, with the ideal of planetarism” (Miyoshi, 2001, p. 295). Nesse contexto, este simpósio acolhe trabalhos que proponham pensar sobre as cartografias contemporâneas do comparativismo latino-americano, assim como suas aberturas para o diálogo e intercâmbio com línguas, literaturas, culturas e problemáticas oriundas de espaços não latino-americanos, mas que, pela via da intensidade, da errância e do anacronismo como estratégias de leitura, revelam-se alternativos para a renovação do comparatismo entre nós, bem como para uma abordagem da literatura comparada condizente com as demandas éticas, estéticas e epistemológicas atuais.
PALAVRAS-CHAVE: América Latina; trânsitos literários, culturais e epistêmicos; comparativismo; contemporaneidade; cartografias literárias

EPISTEMOLOGIAS ERRANTES, COMPARATISMOS NÔMADES - ECOLOGIAS DA FRICÇÃO NAS/DAS AMÉRICAS, ÁFRICAS E AMAZÔNIAS
EIXO: LITERATURA COMPARADA COMO ZONA DE VIZINHANÇA
SIMPÓSIO: EPISTEMOLOGIAS ERRANTES, COMPARATISMOS NÔMADES - ECOLOGIAS DA FRICÇÃO NAS/DAS AMÉRICAS, ÁFRICAS E AMAZÔNIAS
COORDENADORES:
- Amilton José Freire de Queiroz (Universidade Federal do Acre, Colégio de Aplicação)
- Ezilda Maciel da Silva (Universidade Federal do Pará)
- Simone de Souza Lima (Universidade Federal do Acre)
RESUMO: O simpósio pretende estabelecer diálogos sobre as epistemologias errantes, os comparatismos nômades e as ecologias da fricção das/nas Américas, Áfricas e Amazônias, mapeando, ademais, zonas circunvizinhas de imaginários polifônicos, rizomáticos e transliminares. Parte, assim, das reflexões sobre a ecologia de saberes (SANTOS, 2010), as “histórias locais, projetos globais (MIGNOLO, 2003), as “rotas, trânsitos, migrações” (HERRERA, HOISEL, TELLES, 2018) e as narrativas impuras (SOUZA, 2021). Mas também procura dialogar com a transversalidade da Teoria Literária, Estudos Culturais e Pós-coloniais, Decoloniais e Geografia Cultural, acolhendo a perspectiva de crítico-teórica de Ivete Walty (2012), Homi Bhabha (1998), Edward Said (2005), Stuart Hall (2013), Benjamim Abdala Junior (2012), Tania Carvalhal (2003), Zilá Bernd (2013), Eurídice Figueiredo (2013), Angel Rama (2001), Cornejo Polar (2000), Hugo Achugar (2006), Aníbal Quijano (2000) e Roberto Lobato Corrêa (2011). O simpósio acolherá trabalhos que enfoquem as interlocuções da literatura com outros saberes, tais como História, Antropologia, Sociologia, Geografia Cultural, Filosofia, Artes Plásticas, Jornalismo, Cinema, Educação, Ensino, Relações Internacionais, Direito e Tecnologias. Estudar, pesquisar e discutir as humanidades é aprofundar, expandir a visão do “fim do império cognitivo”, dimensionar as “epistemologias do Sul” (SANTOS, 2019) e desenvolver hipóteses sobre “Comparar? Aproximar? Dialogar? Friccionar” (CASA NOVA, 2008). O simpósio coloca-se, assim, como parte de um processo, sempre aberto, como é da natureza dos percursos nômades e, sobretudo, ecologias da fricção das Américas, Amazônias e Áfricas. Não à toa, procura elaborar reflexões sobre “raízes e labirinto” (SANTIAGO, 2006), “vestígios memoriais” (BERND, 2014), “Paralelas e tangentes” (SANTILLI, 2003), uma “geocrítica do eurocentrismo” (MATA, 2012), as formulações pós-coloniais (LEITE, 2013) e “os paradigmas críticos e representações em contraponto” (BRUGIONI, 2019). A diligência crítica proposta aqui quer pensar as obras literárias, em diálogo com outras esferas do conhecimento. Parte, para tanto, das seguintes questões: como os narradores africanos, latino-americanos e brasileiros configuram o diálogo entre culturas, literaturas, linguagens e humanidades nos séculos XX e XXI? Que papel exercem as estéticas do deslocamento nas trocas e transferências culturais, linguísticas, éticas? Como os conhecimentos da teoria, crítica e comparatismo podem ser articulados às correntes teóricas como os estudos culturais, pós-coloniais, decoloniais e geoculturais? Como interpretar textualidades que têm representado alteridades desviantes e suscitado novas formas de compreensão da literatura, sociedade e cultura? Como abordar romances, contos, crônicas, produções cinematográficas, artes plásticas que, em certa medida, vão na contramão da busca da identidade nacional, bem como interpretar textualidades rizomáticas marcadas por nomadismo, errância, diáspora? Ou, ainda, quem são os novos ficcionistas africanos, latino-americanos e brasileiros que estariam promovendo novas leituras dos contatos coloniais e pós-coloniais? Que espaços as textualidades rizomáticas têm ocupado na cena crítico-teórico-comparatista? Que visões do espaço urbano e rural têm sido apresentadas nestas produções artísticas? Como tais ficcionistas, intelectuais e tradutores têm vivido e representado a tensão entre o local e o global e que ocupam a era da globalização? Que posicionamentos a crítica pode adotar diante destes textos que elegem a montagem, o recorte, as imagens e a citação como formas discursivas tão díspares? Silviano Santiago (2002) desenvolve também a linha de raciocínio sobre a relação entre viagem, sociedade e literatura. Para o crítico, “os europeus viajam por que são insensíveis aos seus, porque não tem o alto senso de justiça” (p. 225). A interface entre cultura, sociedade e imaginário está ali, porém não é vista, reconhecida e vivida, sendo negada para dar lugar a construção do espelho da Europa no Novo Mundo, a propagar a fé do Império como instrumento de negação dos valores do outro, indígena, negro, feminino, sequestrar o código linguístico deste último e instituir uma prática etnocêntrica para falar pelo outro e em nome dele. Nesse sentido, pretende-se, neste simpósio, dialogar com a “Literatura brasileira contemporânea” (DALCASTAGNÈ, 2012), estudar “A literatura afro-brasileira: abordagens em sala de aula” (DUARTE, 2019), investigar as “Poéticas indígenas: lugar, identidade e memória” (GRAÚNA, 2015), discutir a leitura da “Literatura como arquivo da ditadura brasileira” (FIGUEIREDO, 2017) e ampliar as lições de “Literatura Comparada e Literatura Brasileira: circulações e representações” (JOBIM, 2020). Eis alguns dos horizontes de interesse que orientam, portanto, a concepção, proposição e concreção deste simpósio, para o qual convidamos pesquisadores e estudantes de pós-graduação a refletir sobre as ecologias da fricção das/nas Américas, Amazônias e Áfricas. Assim, o simpósio pretende ser um espaço para reconhecer que “a literatura comparada sempre teve como objeto produtos literários, e por extensão culturais, distintos, caracterizando-se como o estudo dos contatos, trocas, intercâmbios e embates entre tais produtos”, para irmos na direção de Eduardo Coutinho (2006, p. 218). Em resumo, esperamos tecer uma ecologia das fricções que permita cartografar, topografar e trans-friccionar a sinergia labiríntica, caleidoscópica e rizomática das literaturas, culturas e imaginários, adotando, por conseguinte, “miradas estrábicas”, “entre-lugares”, “solidariedades”, “espaços nômades do saber” das epistemologias errantes e dos comparatismos nômades das/nas Américas, Áfricas e Amazônias neste Congresso da Abralic, sediado na Universidade Federal da Bahia.
PALAVRAS-CHAVE: Literatura; Epistemologia; Comparatismo; Ecologias; Fricções.

MODERNISMO E VANGUARDA DENTRO, AQUÉM E ALÉM DA PAULICEIA
EIXO: LITERATURA COMPARADA COMO ZONA DE VIZINHANÇA
SIMPÓSIO: MODERNISMO E VANGUARDA DENTRO, AQUÉM E ALÉM DA PAULICEIA
COORDENADORES:
- Maria de Fatima do Nascimento (Universidade Federal do Pará - UFPA)
- Hugo Lenes Menezes (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí)
RESUMO: O Romantismo e o Modernismo são períodos estilísticos imprescindíveis para qualquer reflexão sobre a cultura brasileira, pois são momentos cruciais de autoconsciência do Brasil. Ambos se centram no nacionalismo, que manifesta no primeiro uma frequente atitude ufanista e, no segundo, um caráter predominantemente crítico, dada a diferença de contextos dos enfocados estilos epocais, cismáticos ou de rupturas. Carlos Berriel (1987, p. 63) observa que entre nós o programa romântico só se conclui na década de 1920, durante o Modernismo, na literatura, na música, nas artes plásticas e afins. Os modernistas retrabalham itens do Romantismo, como: volta às origens, investigação de fontes quinhentistas (crônicas históricas), elaboração de uma língua literária brasileira, valorização do universo oral-popular, regionalismo e indianismo, cuja retomada se encontra, emblematicamente, no livro Macunaíma (1928), de Mário de Andrade. Seu aludido trabalho relaciona-se ao Romantismo a partir da configuração genológica: na esteira da liberdade artística preconizada pelos românticos, que abandonam o preceito clássico da dita pureza dos gêneros, o autor de Pauliceia desvairada (1922), consciente do hibridismo de Macunaíma, apresenta tal produção como rapsódia, o que, também no campo semântico verbal, corresponde à compilação de temas heterogêneos e de diversas origens numa mesma obra. Vocábulo da teoria da música, enquanto fantasia instrumental, a utilizar variedade de motivos folclóricos e processos de criação, a rapsódia no Romantismo é muito difundida, cultivada por compositores da estirpe de Brahms e Liszt nas Rapsódias húngaras (1846-1886). E nosso polígrafo modernista, na rapsódia Macunaíma, perfeito exemplar do Neoindianismo, mantém ora de modo sério, ora de modo paródico, constante diálogo com o compatriota romântico José de Alencar e o romance Iracema (1865). Acrescenta Telê Ancona Lopez (s.d., p. 28) o fato de Macunaíma ultrapassar o indianismo/nacionalismo de programa, quando leva a preocupação rapsódica ao testemunho de uma identidade no âmbito da América Latina e mesmo do denominado Terceiro Mundo. Cavalcante Proença (1995, p. 37) ressalta que nossos dois grandes movimentos literários de fundo nacionalista têm por livros epônimos uma história indianista sob igualdade teleológica: contribuir para a formação de uma consciência nacional. Contudo, em semelhante dimensão, tanto o Romantismo quanto o Modernismo demonstram aspectos internos que se afiguram conflitantes. Aquele, no afã de nos libertar do jugo da metrópole portuguesa, denota não se aperceber que passa a cair no domínio francês. Já o outro, no decênio da célebre Semana de 22, ainda que venha a assumir, num Oswald de Andrade, o procedimento antropofágico no tocante à eurocêntrica influência estrangeira, resulta da importação de um ideário altamente radical do Velho Mundo. Referimo-nos aos movimentos vanguardistas de então, cujos principais representantes são: o Futurismo (1909), o Expressionismo (1910), o Cubismo (1913), o Dadaísmo (1916) e o Surrealismo (1924). Particularmente o Expressionismo não deixa de ser um Neorromantismo. E em Macunaíma, Mário de Andrade adota um tom expressivo, agora tomado de inspiração do Expressionismo alemão, segundo verificamos, por exemplo, na descrição que ele faz da "Pauliceia desvairada”, onde tudo é máquina, o que constitui imagem subjetivada, puro exagero; porém exagero proposital, mediante o que Mário de Andrade expressa, intensamente, sua visão sombria, spengleriana, da moderna cidade industrial. Tais vanguardas europeias, hoje históricas, mudam os rumos de nossa literatura e demais artes, todas as quais conquistam o Modernismo. Nesse ponto, basta mencionarmos um dos maiores nomes da Semana de 22, Villa-Lobos, que, com técnicas cosmopolitas e nuances regionais, populares, primitivas/indígenas (Bachianas brasileiras - 1930) e futuristas (incorporação de ruído etc), introduz aqui o Modernismo na música; bem assim Tarsila do Amaral, que, em contato com o Cubismo e o indianismo/nacionalismo, é a pintora do quadro Abaporu (1928), um ícone do Modernismo no País. Com a presença vanguardista no Brasil, diz Lúcia Helena (2000, p. 6): “chega ao primeiro plano a vigência do que Mário de Andrade, numa expressão feliz, chama de direito permanente à pesquisa estética”, o que se dá dentro de São Paulo, também, através de algumas publicações, a exemplo de: A onda (1921), Klaxon (1922), Revista do Brasil (1925), Terra Roxa e Outras Terras (1926) e Revista de Antropofagia (1928). Em outros espaços nacionais, o Modernismo igualmente tem lugar junto a periódicos como Belém Nova (Belém-PA, 1923), Estética (1924), A Revista (1925), Festa (1927), Verde (1927), Arco e Flecha (1928), Maracajá (1929) e Madrugada (1929). Assim, pelo exposto e no Centenário da Semana de Arte Moderna, com o simpósio ora proposto, objetivamos acolher diversos trabalhos em consonância com a temática do presente título e ementa. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BERRIEL, Carlos. Dimensão de “Macunaíma, 1987, 201 f. Dissertação (Mestre) – IEL/UNICAMP, Campinas (SP), 1987. HELENA, Lúcia. Modernismo brasileiro e vanguarda. São Paulo: Ática, 2000. LOPEZ, Telê Ancona Porto. Macunaíma pra lá de Brasil. In. ANDRADE, Mário de. Macunaíma. São Paulo: Círculo do Livro, s.d. PROENÇA, M. Cavalcante. Roteiro de “Macunaíma”. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1995.
PALAVRAS-CHAVE: PALAVRAS-CHAVE: Modernismo e Romantismo no Brasil; Vanguarda; Semana de Arte Moderna; Comparatismo.

RELENDO CRITICAMENTE A PRODUÇÃO MODERNISTA DOS ANOS 20
EIXO: LITERATURA COMPARADA COMO ZONA DE VIZINHANÇA
SIMPÓSIO: RELENDO CRITICAMENTE A PRODUÇÃO MODERNISTA DOS ANOS 20
COORDENADORES:
- Paulo da Luz Moreira (University of Oklahoma)
- Raquel dos Santos Madanêlo Souza (Universidade Federal de Minas Gerais)
- Rodrigo Alexandre de Carvalho Xavier (Universidade Federal do Rio de Janeiro)
RESUMO: Relendo criticamente a produção modernista dos anos 20 No ano da comemoração dos 100 anos da Semana de Arte Moderna, queremos ir além da celebração do evento e seus participantes mais ilustres. Celebrações festivas apenas reiteram versões e mitos consolidados sobre a literatura dos anos 20, repetidos ad nauseam em revistas, jornais e manuais escolares. Ao invés de reciclar juízos antigos, queremos promover um reencontro crítico com aquilo que se produziu de fato naquele período, relendo de fato aquela produção cultural levando em conta seu próprio contexto e nossos questionamentos contemporâneos. Incluímos aí expandir obras, autores e grupos além daquele elenco mais restrito que forma o cânone da literatura modernista dos anos 20 e estabelecer conexões além de fronteiras regionais, linguísticas ou nacionais. Não se deve prescrever a priori uma posição política ao modernismo, porque, tanto no Brasil como em outras partes, podemos encontrar modernistas de todas as principais filiações políticas da primeira metade do século XX: desde o fascismo de Pound ao socialismo de Brecht, desde o conservadorismo elitista de T.S. Eliot até o socialismo libertário de Breton, passando por iconoclastas de todos os tipos. Devemos questionar presunções de que o modernismo é expressão da grande metrópole (seja do primeiro ou do terceiro mundo), com postura uniformemente urbana, cosmopolita e internacionalista que ignorava ou combatia todas as formas de localismo. Temos em mente a advertência de Matei Calinescu sobre a oscilação do termo moderno entre juízo de valor, referência histórica e tipologia, sofrendo mutações sucessivas a medida em que relações entre passado, presente e futuro se reconfiguram. Mais que uma série de procedimentos estéticos ou posturas políticas específicas, a estética modernista exige um entendimento amplo de cultura, inclusive da dinâmica das novas tecnologias, como o espírito de uma época, uma impressão intelectual e cultural que afetou de várias maneiras quase tudo o que se escreveu depois da Primeira Guerra. A estética moderna sustenta a crença de que se passava por uma crise única na história, o sentimento de viver uma época diferente de todas as outras, como a devotio moderna do século XIV. Como afirma Eagleton, era como se “as velhas doutrinas do século XIX – o humanismo romântico, o individualismo liberal, os sonhos de progresso social – fossem todas incapazes de sobreviver ao Somme”. Essa crise, no aspecto estético, leva ao que Kermode descreveu como “uma espécie de exasperação formal”, um desvio constante, às vezes extremo e quase sempre deliberado, das normas dominantes, e uma preocupação constante com as limitações da representação – compreendida mais como interpretação criativa do que como retrato fiel – e da representação linguística em particular. A deliberada pelo desvio tangencia a relação conflituosa entre artistas e a ideia de um público geral, ligada à sensação de perda do “leitor comum”. Buscava-se questionar e desafiar a cultura ao invés de oferecer-lhe respostas ou um sentido definido, buscando conscientemente o estabelecimento de um mal-estar ou estranhamento entre criador e público. As vanguardas (o modernismo em sua feição radical) deploravam abertamente a imitação superficial, e, portanto, o modernismo dos anos 20 não pode ser compreendido apenas como uma série de procedimentos formais a serem copiados por aqueles que desejavam estar em dia com as modas literárias. Uma estética gera uma nova maneira de ver as coisas e dá visibilidade a características antes desprezadas ou até mesmo ignoradas. Um novo modo de representação leva a novas formas de interpretação da realidade. Uma forma interessante de reler o modernismo é voltar às revistas publicadas na época, e fazê-lo com um olhar renovado pelas abordagens críticas hoje à nossa disposição. Felizmente, temos acesso a essas revistas em bem cuidadas versões críticas e fac-similares e a bancos de dados que arquivam periódicos da época e podemos ler textos que não receberam atenção crítica. Podemos refletir sobre as relações, muitas vezes tensas, entre Portugal e Brasil e os seus modernismos. Devemos aproveitar esse acesso para reler a produção cultural daquela época e oferecer novas compreensões sobre o período. Muito do publicado nos anos 20 nunca foi reeditado em livros e pode nos oferecer uma visão mais precisa e nuançada das mentalidades e propostas da época. Além do que ficou esquecido no formato efêmero dos periódicos da época, mesmo no caso daquilo que foi mais tarde revisado e republicado em livro por seus autores, há questões interessantes que se oferecem pela leitura dentro de outro contexto histórico e textual de textos apareceram pela primeira vez nas revistas comparando essas primeiras versões com aquelas publicadas mais tarde. Bibliografia: CALINESCU, Matei. Five faces of modernity. United States of America: Duke University Press, 1987. EAGLETON, Terry. Figures of Dissent. London/New York: Verso, 2005. KERMODE, Frank. Modern Essays. Glasgow: Fontana Press, 1990.
PALAVRAS-CHAVE: modernismo, vanguarda, anos 20, periodismo, releitura
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A LITERATURA E SEUS FRAGMENTOS: ENTRE A PSICANÁLISE, A FILOSOFIA E A TRADUÇÃO
- Davi Andrade Pimentel (Universidade Federal do Rio de Janeiro)
- Flávia Trocoli Xavier da Silva (Universidade Federal do Rio de Janeiro)
- Markus Volker Lasch (Universidade Federal de São Paulo)
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CONFIGURAÇÕES DO ESPAÇO GÓTICO NA FICÇÃO BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA
- André Cabral de Almeida Cardoso (Universidade Federal Fluminense)
- Claudio Vescia Zanini (Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
- Pedro Puro Sasse da Silva (Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
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ESTUDOS INTERDISCIPLINARES SOBRE SHAKESPEARE IV: MUNDOS COMPARTILHADOS
- Regis Augustus Bars Closel (UFSM)
- Elizabeth Santos Ramos (UFBA)
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POÉTICAS DO (IN)VISÍVEL NA LITERATURA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA
- Carolina Barbosa Lima e Santos (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul)
- Paulo Eduardo Benites de Moraes (Universidade Federal de Rondônia)
- Wellington Furtado Ramos (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul)
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RESIDUALIDADE LITERÁRIA E CULTURAL
- Cássia Maria Bezerra do Nascimento (Universidade Federal do Amazonas)
- Cássia Alves da Silva (Instituto Federal do Ceará)
- Mary Nascimento da Silva Leitão (Universidade Federal do Ceará)
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VIRGINIA WOOLF E A ESCRITA MODERNISTA
- Davi Pinho (Universidade do Estado do Rio de Janeiro/ FAPERJ)
- Maria Aparecida de Oliveira (Universidade Federal da Paraíba)
- Nícea Helena de Almeida Nogueira (Universidade Federal de Juiz de Fora)
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TENSÕES E ALIANÇAS ENTRE PSICANÁLISE, LITERATURA E OUTRAS ARTES
- Gabriela Bruschini Grecca (Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Divinópolis)
- José Lucas Zaffani dos Santos (Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho", Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara)
- Marisa Corrêa Silva (Universidade Estadual de Maringá)

A LITERATURA E SEUS FRAGMENTOS: ENTRE A PSICANÁLISE, A FILOSOFIA E A TRADUÇÃO
EIXO: INTERSECCIONALIDADES: POSSIBILIDADES E LIMITES
SIMPÓSIO: A LITERATURA E SEUS FRAGMENTOS: ENTRE A PSICANÁLISE, A FILOSOFIA E A TRADUÇÃO
COORDENADORES:
- Davi Andrade Pimentel (Universidade Federal do Rio de Janeiro)
- Flávia Trocoli Xavier da Silva (Universidade Federal do Rio de Janeiro)
- Markus Volker Lasch (Universidade Federal de São Paulo)
RESUMO: A partir de um fragmento extraído dos Carnets de Marcel Proust, em que o escritor anota a relevância de ter em sua obra Em busca do tempo perdido uma jovem pintando a aquarela em Balbec ou em Veneza, a narradora H., de Double Oubli de l’Orang-Outang, 2010, de Hélène Cixous, escreve que não se trata de conferirmos realidade ou ficcionalidade a Balbec ou a Veneza. O que a narradora lê na obra proustiana e coloca em cena em sua própria obra é a tensão entre realidade e ficção, inscrevendo-as no entre e, com isso, suspendendo todo e qualquer movimento de pura realidade ou de pura ficcionalidade. Nessa perspectiva, a literatura seria, como provoca a narradora de Cixous, uma “Ficção real” [une “Fiction réelle”] (CIXOUS, 2010, p. 137). A narradora faz do fragmento proustiano um hieróglifo e decompõe, Frag ment, em alemão e em francês, para dizer, em duas línguas, que a questão mente, o que, em termos proustianos, seria dizer que a questão exige leitura, decifração. O fragmento passa a ser o rastro de Proust que desencadeia e constitui o fragmento de Cixous. Jacques Derrida, o filósofo e, também, personagem do livro de Cixous mencionado acima, escreve, em “Pensar em não ver”, que o rastro é sempre experiência viva de alguma coisa outra, e poder ser entendido como “remissão-a” (DERRIDA, 2012, p. 79). Fragmento, rastro e remissão encontram um limite tenso em relação às formas estéticas fragmentárias que podem ser pensadas tanto enquanto mediação de um todo acabado que seria ainda realizável, como em Schiller e Goethe, ou, como em Benjamin e Adorno, em relação a uma unidade estorvada cuja realização é apontada utopicamente ante o inacabamento histórico. Se, em sua linhagem alemã, o fragmento designa um todo em ruína, despedaçado ou parcialmente realizado; em sua linhagem francesa, o fragmento designa uma ruína, que esquece duplamente, sem nostalgia, sem utopia, o todo e que causa um fazer com o fragmento que passa a ser memória do não-todo. Na literatura, interessa-nos o que resta das passagens entre o real e o ficcional que, Em busca do tempo perdido, por exemplo, engendra uma tensão incontornável entre a autobiografia, o ensaio e o romance. Na psicanálise, é o rastro do fragmentário que permite a Sigmund Freud escrever “Análise fragmentária de uma histeria (‘O caso Dora’, 1905 [1901])”, no qual a realidade da análise, por ser inapreensível, convoca incontáveis formalizações do psicanalista que margeiam a ficcionalidade, conferindo ao Caso Dora um entrelugar na obra freudiana, assim como o ensaio em torno do Das Unheimliche (1919) suporta narrativa autobiográfica, crítica literária, reflexão estética e teoria psicanalítica, fazendo com que seu autor transite entre muitas posições enunciativas. Na tradução, entre línguas, manifesta-se, também de modo contundente, a potencialidade do resto, pois, como sinaliza Maurice Blanchot (1971, p. 72), em “Traduire”, entre a língua de partida e a língua de chegada, a tradução nos apresenta uma outra obra, nem simplesmente subjugada ao original e nem completamente aclimatada à língua para qual foi traduzida. A obra traduzida se colocaria, portanto, entre as duas línguas, entre os dois extremos linguísticos, figurando como o resto e o traço da experiência tradutória que a originou. A tradução seria uma experiência de remissão que não finda, uma vez que sua produção de signos, margearia tanto uma língua quanto a outra, porém nunca ancorando em nenhuma das margens que lhe possibilitaram a travessia entre línguas. Gostaríamos de convidar pesquisadoras e pesquisadores para pensarmos juntos figurações possíveis do entre na literatura em suas interseccionalidades, possibilidades e limites, com a psicanálise, a tradução, o teatro, a autobiografia e a história, e, também, entre a Teoria Crítica e a Desconstrução.
PALAVRAS-CHAVE: Literatura e psicanálise; Literatura e filosofia; Teoria da tradução; Desconstrução; Teoria crítica.

CONFIGURAÇÕES DO ESPAÇO GÓTICO NA FICÇÃO BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA
EIXO: INTERSECCIONALIDADES: POSSIBILIDADES E LIMITES
SIMPÓSIO: CONFIGURAÇÕES DO ESPAÇO GÓTICO NA FICÇÃO BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA
COORDENADORES:
- André Cabral de Almeida Cardoso (Universidade Federal Fluminense)
- Claudio Vescia Zanini (Universidade Federal do Rio Grande do Sul)
- Pedro Puro Sasse da Silva (Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
RESUMO: Muitos estudiosos apontam para a representação do espaço como um elemento central do gótico (cf. Hogle, 2002; Punter e Byron, 2004; França, 2016). Como observa Fernando Monteiro de Barros (2020, p. 2), “[o] Gótico literário do século XVIII talvez seja um dos gêneros mais associados ao espaço”. Figurando já no título da obra inaugural do gênero, O castelo de Otranto, de Horace Walpole, o castelo – e por extensão toda a arquitetura feudal, dos claustros às catacumbas – é, ainda hoje, um dos signos mais emblemáticos do gótico, configurando-se como um labirinto que põe em xeque a própria subjetividade daqueles que nele transitam e representando, ao mesmo tempo, um resquício do feudalismo e uma manifestação do inconsciente (Punter; Byron, 2004, p. 262). O espaço gótico, portanto, assume uma dimensão histórica, psicológica e política. A literatura gótica rearticula essas dimensões ao longo do tempo, absorvendo ansiedades trazidas pelos tempos modernos, quando o espaço gótico deixa de se limitar aos castelos e abadias afastadas dos centros civilizatórios para se imiscuir nas aglomerações urbanas que marcam a nova modernidade industrial. A partir do século XIX, a metrópole passa ser representada como um espaço goticizado, que expressa uma série de medos e contradições sociais, apresentando-se como um território perigoso – uma percepção que estaria no cerne do gótico moderno (Dryden, 2003, p. 20). A cidade passa a se mostrar como um apanhado de tensões que se manifesta na própria delimitação do espaço – em autores como Charles Dickens, os bairros pobres são descritos através de uma retórica claramente gótica, em contraste com a aparente segurança e conforto das áreas mais abastadas. Como observa Hogle (2012, p. 500), o espaço gótico é antes de mais nada um espaço simbólico em que ideologias contraditórias são postas em ação. No Brasil, o gótico sempre foi um aspecto importante da representação da paisagem. A própria aventura da colonização, ao promover um contato dos europeus com um cenário ainda desconhecido, envolvia as terras recém-ocupadas numa atmosfera de mistério, alternadamente promissora por sua aparente fertilidade e ameaçadora em seu ocultamento sombrio. Daniel Serravale de Sá (2010), explorando o chamado “gótico tropical”, nos mostra como José de Alencar, leitor da tradição gótica inglesa, se aproveita de suas estratégias de representação espacial para dar conta dessa ambiguidade da natureza brasileira. Mesmo longe das sombras das densas florestas, é possível divisar um gótico solar nos sertões, como bem analisa Júlio França na construção d’Os sertões, de Euclides da Cunha, como um locus horribilis. Para além do mundo natural, o espaço das casas grandes e senzalas marca o gótico colonial das Américas, símbolos da opressão e violência envolvidos no sistema escravagista. Segundo Monteiro de Barros (2020, p. 10), as manifestações do gótico no Brasil trazem em si os resquícios históricos desse processo de colonização marcado pela concentração do poder senhorial. No espaço metropolitano, as tradicionais marcas góticas da geografia labiríntica, dos covis de crime, da corrupção e do caos urbano se unirão à herança colonial, culminando em heterotopias de segregação social e racial nas fronteiras – às vezes tênues – dos espaços comuns (cf. SASSE, 2019, p. 385), como vemos em autores como João do Rio, Lúcio Cardoso, Rubem Fonseca ou Alberto Mussa. Florestas tropicais impenetráveis, sertões desolados, vilas erguidas com sangue escravo, cidades degeneradas e violentas, a variedade de espaços góticos encontrados em nossa tradição serve de matéria-prima para uma literatura contemporânea que ora reforçará tais imagens, ora as reformulará, incorporando ansiedades sobre nosso presente – e nosso futuro. Em A morte e o meteoro, de Joca Reiners Terron, os medos do espaço natural abrem espaço para o horror de sua ausência, em um sombrio ecoapocalipse, enquanto O riso dos ratos, do mesmo autor, delineia uma paisagem intensamente gótica para criar uma alegoria da história brasileira; em Gótico nordestino, tradições folclóricas são revisitadas a fim de fazer referências a crises prementes do presente; já os romances de Ana Paula Maia constroem um território devastado, que questiona a possibilidade de um futuro, culminando no apocalipse de De cada quinhentos uma alma. Tendo em vista as novas configurações dos espaços góticos na contemporaneidade e as convergências e divergências do gótico no Brasil, convidamos pesquisadores a submeter propostas que explorem as influências da poética gótica na representação do espaço na ficção brasileira contemporânea. Convidamos trabalhos voltados não só para a literatura, mas também para outros meios, como filmes, séries, histórias em quadrinhos e as artes plásticas. Se, como Fred Botting (2005, p. 5-6) argumenta, o gótico se caracteriza por uma ruptura de limites pré-estabelecidos, configurando um campo de transgressão, a fronteira se alça como metáfora espacial para caracterizá-lo: nas interseccionalidades entre tradição e modernidade, colônia e metrópole, natural e urbano, literatura e outras artes, forma-se um terreno de tensões e fertilizações mútuas que desafiam sentidos pré-estabelecidos e nos ajudam – ou obrigam – a divisar novos horizontes.
PALAVRAS-CHAVE: paisagem; espaço; gótico; literatura brasileira contemporânea; intermidialidade

ESTUDOS INTERDISCIPLINARES SOBRE SHAKESPEARE IV: MUNDOS COMPARTILHADOS
EIXO: INTERSECCIONALIDADES: POSSIBILIDADES E LIMITES
SIMPÓSIO: ESTUDOS INTERDISCIPLINARES SOBRE SHAKESPEARE IV: MUNDOS COMPARTILHADOS
COORDENADORES:
- Regis Augustus Bars Closel (UFSM)
- Elizabeth Santos Ramos (UFBA)
RESUMO: A produção poética e dramática de William Shakespeare (1564-1616) constantemente estimula estudos que ensejam diálogos, questionamentos, revisões e atualizações. A relevância de seus textos é frequentemente colocada à prova através de novas mídias e formas de transmissão de conteúdo, que acabam por colaborar para que incontáveis espaços sejam alcançados. Seja através do estudo, encenação, tradução ou qualquer outro meio de discussão, se compartilham sensos abrangentes de sua obra poético-dramática. Tanto a modernidade incipiente do início do século XVI que abrigou o autor como a pós-modernidade que o reinventa, compartilham algo que aproxima o aparentemente remoto mundo dos reis e rainhas Tudors e Stuarts com nosso mundo amplamente dinamizado e digital. Para pensar o eixo temático de mundos compartilhados, na quarta edição deste simpósio interdisciplinar (ocorrido em 2018, 2019 e 2021) que reúne pesquisadores, estudantes, professores e tradutores de Shakespeare, buscamos continuar a pensar tanto a variedade que caracteriza a obra estudada como as muitas facetas de sua exploração analítica. Dentro do eixo escolhido para o simpósio “Interseccionalidades: possibilidades e limites”, pretendemos explorar juntos a variedade e a riqueza de novas formas de leitura e análise da obra shakespeareana e de seus contemporâneos, sob a luz de perspectivas críticas emergentes, assim como os desdobramentos de leituras com bases críticas já bem estabelecidas. Quando consideramos sua obra poética e dramática, nos deparamos com algo variado e imenso em vários níveis. Em mais de quarenta produções nas quais ele está presente, individualmente ou colaborativamente, encontramos mundos tão distintos como as muitas facetas de suas “Romas”, seus territórios no exótico Mediterrâneo, ilhas desconhecidas ou mesmo a Inglaterra dos Plantagenetas. A aparente variedade e distanciamento espaço-temporal se contrapõe com o sentimento de reconhecimento de emoções e de comportamentos “humanos” nos textos. Aquilo que nos aproxima de personagens e situações diferentes extrapola os limites geográficos e temporais de seus vários mundos, personagens e situações. Compartilhar um mundo com Tímon, Coriolano, Hamlet e Macbeth sinaliza que são tênues as fronteiras entre seus mundos e os mundos dos leitores e espectadores dos textos, sejam eles nossos contemporâneos ou antecessores. Contudo, essa proximidade não cria homogeneidade de recepção e de interpretação, algo que atesta a permanência e a relevância para uma infinidade de pequenos mundos contidos na ilimitada variedade de seus leitores e intérpretes. A multiplicidade e diversidade interpretativa pode ser pensada e acessada através das muitas formas em que Shakespeare se materializa em nossa cultura. Dentro do discurso acadêmico e do campo em que este simpósio se enquadra, existe uma grande quantidade de formas de leitura especializada para os textos. A capacidade dos seus textos em responder aos mais distintos focos e ênfases analíticas somada ao elevado capital cultural de sua obra, possibilita às muitas séries especializadas em crítica literária resultados fascinantes. Como exemplos, pode se pensar na amplitude da série “Shakespeare and Theory” publicada pela Arden Shakespeare desde 2015, incluindo obras especializadas em determinada perspectiva crítica, a saber, os livros recém-lançados Shakespeare and Reception Theory (WOOD, 2022), Shakespeare and Adaptation theory (IYENGAR, 2022) e Shakespeare and Textual Studies (GOSSETT, 2022), entre muitos outros na mesma coletânea. De forma semelhante, há mais de vinte anos a Oxford University Press oferece a série “Shakespeare Oxford Topics”, na qual um tema ou tópico é privilegiado na exploração de um conjunto de textos poéticos ou dramáticos (LOFTIS, 2021; FULLER, 2021; JOUBIN, 2021). Nessas séries, se conecta aquilo que lhe é imediatamente reconhecível a algo que pode inovar ou confrontar leituras consolidadas. Em ambas, existem campos especializados de discussão cuja aplicação e conceituação teórica se torna mais acessível a partir dos exemplos em textos fascinantes. Em uma vertente mais ampla, existem séries de estudos que consideram o panorama geral do período, no qual obras de Shakespeare dividem o palco com outros de seus contemporâneos tanto na poesia e dramaturgia como em outros registros, como panfletos, documentos históricos, objetos, decretos, cartas, entre outros. Exemplos podem ser encontrados nas séries Arden Performance Editions e Arden Shakespeare Intersections, que focalizam estudos de performance e interdisciplinares, ou nas monografias especializadas da Cambridge Studies in Early Modern History, Early Modern Cutural Studies, Early Modern Studies ou Early Modern Literary Geographies, entre tantas outras. Por fim, coletâneas e edições têm tomado direções inovadoras com a publicação da New Oxford Shakespeare (2016-17) e de Shakespeare Collaborative Plays (2013). Considerando este universo que compartilha muito em suas diferenças, convidamos submissões que busquem refletir a variedade do alcance e da interpretação da obra shakespeareana pelos pesquisadores brasileiros, em seus mais distintos campos de especialização e de interesse. Desta forma, pretendemos compartilhar o mundo dos estudos shakespeareanos ao mesmo tempo que seus limites são constantemente desafiados e reconstruídos.
PALAVRAS-CHAVE: William Shakespeare; Teoria & Crítica Literária; Interdisciplinaridade.

POÉTICAS DO (IN)VISÍVEL NA LITERATURA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA
EIXO: INTERSECCIONALIDADES: POSSIBILIDADES E LIMITES
SIMPÓSIO: POÉTICAS DO (IN)VISÍVEL NA LITERATURA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA
COORDENADORES:
- Carolina Barbosa Lima e Santos (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul)
- Paulo Eduardo Benites de Moraes (Universidade Federal de Rondônia)
- Wellington Furtado Ramos (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul)
RESUMO: Diante de inúmeras inovações artísticas acumuladas desde a poética mallarmeana, propomo-nos a congregar, neste Simpósio, estudos voltados para propostas interartísticas desenvolvidas na literatura brasileira contemporânea. Interessa-nos, em especial, a análise de poéticas cujas formas desafiam os limites convencionais dos gêneros literários estabelecidos desde o século XIX. Objetivamos, assim, promover discussões acerca de projetos literários brasileiros que apresentam, a partir de um profundo diálogo com a tradição ocidental, novas formas de ler e atuar no mundo. Valemo-nos, aqui, do estudo de Anne-Marie Christin (2006), em A imagem escrita ou a des-razão gráfica, como um ponto de partida para esta discussão. Neste ensaio, a autora recupera a compreensão relacionada à origem imagética da escrita ao explicar que, longe de se resumir à transcrição de um discurso oral, a grafia torna a palavra visível. De acordo com Christin (2006), o surgimento da escrita, bem como o da imagem, deve-se à descoberta da superfície, elemento espacial que viabiliza a ilustração, a projeção e a visualização desses grafismos, atuando como um denominador em comum entre as duas linguagens na medida em que a tela desempenha na pintura a mesma função que a página na escritura. Conforme lembra a estudiosa, Mallarmé, em Um lance de dados jamais abolirá o acaso, não só apresentou ao mundo moderno um poema que retoma o aspecto visual da escrita como também impulsionou o surgimento de inúmeros outros textos literários compostos por ilustrações, cartazes e jogos tipográficos. Sugerindo a superação do próprio livro como suporte literário, o poeta francês desafia as limitações da linguagem discursiva para anunciar novas possibilidades poéticas, nas quais convergem a experiência da música, da pintura, do jornal e do cinema. Historicamente, esta proposta de integração de diferentes linguagens e de um fazer artístico estruturado em operações lógicas foi potencializada em obras que preanunciaram o surgimento das vanguardas europeias, num período denominado pela escritora Marjorie Perloff (2018) como avant-guerre. Perloff explica que o avant-guerre é o tempo das parole in libertà, isto é, de proposições literárias que não são nem completamente “verso” nem “prosa”, cuja unidade não é nem o parágrafo nem a estrofe, mas a própria página impressa. Para dar cor a esta reflexão, a autora propõe, em outra obra, a expressão conceitual de “gênio não original” (2013). Esta expressão não anula completamente a noção de “gênio”, antes, reformula e questiona a associação advinda desde o romantismo, pelo menos, entre originalidade e gênio. Como explica Perloff (2013), o tempo exige e permite novas inventiones, isto é, novas práticas e estratégias criativas. Para a pensadora, a formulação da ideia de “gênio original”, mais do que uma realidade, é uma construção, uma vez que a prática da escrita demanda uma constelação referencial que um(a) determinado(a) autor(a) decide se apropriar. Conforme explica Perloff (2013), um dos modos de expansão do fazer tradicional da escrita artístico-literária passa pelas poéticas do recorte, da citacionalidade, seleção, reciclagem, montagem, práticas que apontam para a não originalidade ou, como a própria autora denomina, uma poética da síntese, isso porque a tarefa do criador é sintetizar, e não criar. Sob essa perspectiva, este simpósio se interessa pela discussão em torno da passagem e da tensão entre uma concepção de arte ligada ao critério de criação/criatividade, logo original, e uma concepção na qual os próprios meios e suportes materiais da expressão artística determinam os modos de criação, de modo que a inventio possa ser percebida em seu espaço de apropriação, restrição elaborada, composição visual e sonora e uma certa dependência das relações interartísticas. No Brasil, a poesia concreta proposta por Décio Pignatari, Augusto e Haroldo de Campos apresenta-se como a primeira manifestação literária a valer-se destas inovações, publicizadas no cenário europeu, e somar a elas a utilização de potencialidades visuais e sonoras oferecidas por recursos eletrônicos. Contemporaneamente, autores como Luiz Ruffato, Angélica Freitas, Carlito Azevedo, Verônica Stigger e Leila Danziger, e outros, não só ancoram a estrutura de suas respectivas poéticas a uma linguagem interartística, como anunciam formas literárias que desafiam os limites impostos pela tradicional divisão de gêneros literários. Diante disso, o simpósio espera receber pesquisas voltadas à análise dessas (possíveis) inovações estéticas apresentadas nestas propostas interartísticas. Compreendendo a necessidade dar visibilidade ao eventual surgimento de novas formas e tendências literárias, não catalogadas em manuais de teoria literária, propomo-nos a desenvolver um encontro no qual estas manifestações literárias venham a ser coletivamente debatidas e, se possível, sistematizadas. Christin, Anne-Marie. A imagem escrita ou a des-razão gráfica. In: Arbex, Márcia (Org.). Poéticas do visível: ensaios sobre a escrita e a imagem. Belo Horizonte: UFMG, 2006. Perloff, Marjorie. O momento futurista: Avant-garde, Avant-guerre, e a Linguagem da Ruptura. Trad. Sebastião Uchoa Leite. São Paulo: EDUSP, 2018. Perloff, Marjorie. O gênio não original: poesia por outros meios no novo século. Trad. Adriano Scandolara. Belo Horizonte: UFMG, 2013.
PALAVRAS-CHAVE: Poéticas do Visível; Literatura Brasileira Contemporânea; Literatura e Outras Artes; Estudos Interartes.

RESIDUALIDADE LITERÁRIA E CULTURAL
EIXO: INTERSECCIONALIDADES: POSSIBILIDADES E LIMITES
SIMPÓSIO: RESIDUALIDADE LITERÁRIA E CULTURAL
COORDENADORES:
- Cássia Maria Bezerra do Nascimento (Universidade Federal do Amazonas)
- Cássia Alves da Silva (Instituto Federal do Ceará)
- Mary Nascimento da Silva Leitão (Universidade Federal do Ceará)
RESUMO: Cada tempo comumente herda inúmeros traços de um passado próximo ou distante. Dentre esses, podemos identificar, de um lado, aqueles elementos considerados arcaicos, por exemplo, os fósseis; e, do outro, é possível reconhecer os modos de pensar, agir e se comportar de determinadas épocas e culturas. A residualidade faz parte do último grupo, pois estuda o remanescente, os resquícios de pensamentos de eras anteriores que persistem nas ideias propagadas na atualidade, refletidas nas obras literárias de um modo geral. Essa ideia já foi sugerida por Raymond Williams em Marxismo e Literatura, quando se referiu aos resíduos como algo “efetivamente formado no passado, mas que ainda está vivo no processo cultural, não só como elemento do passado, mas como elemento efetivo do presente” (WILLIAMS 1979, p.125). De certo, a ideia de resíduo está em toda parte, em diversas áreas do conhecimento, por isso, muitas vezes, encontramos o mesmo termo designando resto, sobra, destroços, sejam eles reaproveitáveis ou não. No campo literário, essa designação aparece de modo diferente. O resíduo, embora tenha sido formado no passado, no presente ele é o núcleo de um novo imaginário. Sua presença é tão intensa que parece fazer parte do tempo presente e isso apenas comprova sua força atemporal, que o faz continuar vivo e nítido e ser sempre contemporâneo. Consequentemente, não deve ser visto como algo arcaico, que serve apenas para ser apreciado em museus. Pelo contrário, o resíduo não é apreciado, é vivido e sentido. Para ser considerado resíduo, é intrínseca sua utilidade na cultura em que está inserido. Trata-se de um elemento de força que, tendo vencido todas as dificuldades proporcionadas pelas mudanças do tempo, permanece atuante e vigoroso, muitas vezes contribuindo para a formação de “novas” culturas, de “novas” identidades. Tomando a ideia de identidade proposta por Stuart Hall (2002), podemos afirmar ser ela instável, construída historicamente, formada e transformada conforme o contexto em que o sujeito ou grupo se inserem. Assim, “à medida em que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar” (HALL, 2002, p.13). Essa pluralidade motiva a construção de identidades híbridas que tanto se manifestam de modo individual, a partir do processo de endoculturação (PONTES, 2006a), como de maneira coletiva, de acordo com a concepção de hibridação cultural (BURKE, 2003). A Residualidade Literária e Cultural, título e teoria deste simpósio, reafirma-se enquanto método de investigação literária, uma forma específica de interrogar os textos literários e sua interação com outros textos, literários ou não, e outras formas de expressão cultural e artística como se espera nos estudos em literatura comparada, como argumento que permite reconhecer a literatura como um sistema complexo e que conduz a resíduos literários e culturais. Com base nesta fundamentação, este simpósio acolhe trabalhos nos quais se discuta, em obras de autores do Brasil e do mundo: 1. as remanescências do imaginário medieval, ou de outros períodos históricos, sobre a mulher, em prosa, a fim de compreender de que modo aquilo que remanesce do imaginário em questão afeta as personagens femininas e/ou masculinas das obras; 2. a poesia residual em análises; 3. os elementos culturais e os processos de endoculturação e hibridação cultural e de construção de identidade presentes; 4. análises literárias com diálogos possíveis da residualidade com outras teorias literárias e/ou de outras áreas do conhecimento, em perspectiva complexa; 5. resultados de práticas sistematizadas de leitura literária com interpretações sobre as mudanças no tempo. A escolha de 5 (cinco) possibilidades de enquadramento ao simpósio se justifica diante dos estudos de residualidade que podemos localizar como resultados de pesquisas em relatórios, teses e dissertações e também de publicações em livros e periódicos; também pela possibilidade de aproximação de demais pesquisadores para diálogo profícuo. A partir das discussões propostas nos trabalhos, poderão ser identificados vestígios de outra época e o caminho seguido por tais vestígios e o modo como eles atravessaram o tempo e o espaço para adentrar e construir o modo de pensar de povos de diferentes lugares e culturas. Isto mostrará a complexidade dos modos de ser de uma determinada sociedade, mas também concorrerá para melhor entendimento das características de um povo. Por fim, as análises, que envolverão o elemento residual na literatura e na cultura, serão aprofundadas e realizadas à luz de um todo complexo.
PALAVRAS-CHAVE: Hibridação cultural. Remanescência. Residualidade.

VIRGINIA WOOLF E A ESCRITA MODERNISTA
EIXO: INTERSECCIONALIDADES: POSSIBILIDADES E LIMITES
SIMPÓSIO: VIRGINIA WOOLF E A ESCRITA MODERNISTA
COORDENADORES:
- Davi Pinho (Universidade do Estado do Rio de Janeiro/ FAPERJ)
- Maria Aparecida de Oliveira (Universidade Federal da Paraíba)
- Nícea Helena de Almeida Nogueira (Universidade Federal de Juiz de Fora)
RESUMO: Neste ano emblemático de celebrações em torno das vanguardas históricas e de reflexões acerca das rupturas e inquietações da escrita modernista, convidamos trabalhos que leiam a obra de Virginia Woolf em diálogos com as cenas modernistas globais e embasados em investigações interseccionais contemporâneas. Tomando o centenário de Jacob’s Room como um convite à discussão, este simpósio retoma e expande o debate que se iniciou na Abralic de 2019, quando propusemos pela primeira vez que leitoras/es de Virginia Woolf se reunissem para pensar as marcas que a escrita woolfiana deixou na ficção, na teoria e na crítica contemporâneas, especialmente no que se refere ao dito formalismo modernista e às questões de gênero. Em 2022, nossa proposta é a de contribuir para novas narrativas do modernismo, visto que a pesquisa em literaturas de língua inglesa frequentemente reproduz a formulação de Willa Cather ao dizer que, com as primeiras publicações da tradução inglesa de À la recherche du temps perdu, de Marcel Proust, de Ulysses, de James Joyce, e de “The Wasteland”, de T. S. Eliot, “o mundo quebrou em dois em 1922” (cf. GOLDSTEIN, 2017). Mas se o mundo se partiu em dois há 100 anos, o que advém dessa quebra (enquanto projetos estéticos e políticos) não se limita a um mero antes e depois unívoco, especialmente se incluirmos outras contribuições à lista de publicações em língua inglesa também datadas de 1922, como as de Katherine Mansfield, com The Garden Party and Other Stories, de D. H. Lawrence, com Aaron’s Rod, e de Virginia Woolf, com seu Jacob’s Room. Ao reconhecer as diferenças entre essas obras, os estudos modernistas têm desafiado certa narrativa da história da literatura — que insiste em pensar o modernismo como um movimento unificado, decomposto em um alto modernismo formalista da década de 1920 e uma virada realista dos political 30s — ao formular o modernismo como encenações diversas de críticas à modernidade, produzidas em um contexto de embates estéticos e políticos sobre os limites da linguagem, da representação, bem como da democracia e das liberdades individuais (Cf. GOLDMAN, 2004; RYAN & ROSS, 2018). A tarefa que nos damos agora é a de investigar a escrita woolfiana no contexto da literatura modernista de língua inglesa, a de produzir outras perspectivas críticas desse mesmo contexto, e/ou ainda a de deslocar as interferências feministas de Woolf em seu tempo e lugar para outras cenas modernistas transnacionais, produzindo análises comparadas e interseccionais. De sua primeira recepção, e sua ênfase na forma, aos estudos feministas da década de 70 e além, o nome “Virginia Woolf” constituiu por vezes um problema para uma história do modernismo, pois ora se encontrava fechado no vocabulário dos formalistas de Bloomsbury, ora no vocabulário do feminismo estadunidense, ou ainda na esteira da desconstrução de Derrida e dos saberes rizomáticos de Deleuze. No entanto, como vêm revelando os estudos woolfianos recentes, a questão estética em Woolf está inextricavelmente entrelaçada à questão política que figura em sua obra, o que lança a autora em busca de novas formas de escrita que oscilam produtivamente entre o estético e o político. Filiando o poético ao material, vale pensar hoje como as leituras de Virginia Woolf do século passado não se excluem, mas são complementares no pensamento woolfiano, que é centrífugo por excelência (ALLEN, 2010). Voltar à escrita de Virginia Woolf nos permite achar os pontos de conexão em seu mosaico de perspectivas e no mosaico de perspectivas de seus intérpretes, atentando sempre para os sentidos que sua forma deixa escorregar para o nosso presente. Almejamos acolher trabalhos que contemplem os seguintes temas, ou quaisquer outros que estejam em diálogo com a vida, a obra e/ou o tempo de Virginia Woolf: Woolf e o modernismo, as artes e/ou o Bloomsbury Group; 100 anos de Jacob’s Room: revisões; releituras, comparações; Woolf e o trauma, a guerra e/ou o nazifascismo; Woolf e a influenza, a pandemia e/ou a doença; Woolf e a educação, os movimentos sociais e/ou o materialismo histórico; Woolf em outras cenas modernistas: questionamentos, atravessamentos, rupturas e continuidades; Woolf e o pós-modernismo, o pós-estruturalismo e/ou a filosofia; Woolf e os estudos feministas interseccionais, queer e/ou transfeministas; Woolf e o Império e/ou os estudos pós-coloniais; Woolf, a ecocrítica e o ecofeminismo; Woolf e os estudos pós-humanos e/ou transumamos ; Woolf e/em tradução e/ou adaptação; Woolf transnacional, transcultural, transtemporal; Woolf e a teoria crítica e/ou a psicanálise; Woolf e o neomaterialismo, as coisas, e os objetos; Woolf leitora/ leitores de Woolf.
PALAVRAS-CHAVE: Virginia Woolf; Modernismo; Contemporaneidade.

TENSÕES E ALIANÇAS ENTRE PSICANÁLISE, LITERATURA E OUTRAS ARTES
EIXO: INTERSECCIONALIDADES: POSSIBILIDADES E LIMITES
SIMPÓSIO: TENSÕES E ALIANÇAS ENTRE PSICANÁLISE, LITERATURA E OUTRAS ARTES
COORDENADORES:
- Gabriela Bruschini Grecca (Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Divinópolis)
- José Lucas Zaffani dos Santos (Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho", Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara)
- Marisa Corrêa Silva (Universidade Estadual de Maringá)
RESUMO: Este Simpósio tem como intuito acolher propostas de comunicação oral que busquem ofertar debates e ampliar o repertório crítico através das intersecções entre a psicanálise, de quaisquer vertentes (lacaniana, freudiana, junguiana), e as manifestações literárias e artísticas, em tempos e espaços diversos. Acreditamos que, por ter a prática psicanalítica uma forte inclinação pelos usos e manifestações da linguagem, tanto a literatura como outras artes modernas e contemporâneas tendem, como nos lembra Adalberto de Oliveira Souza (2009, p. 244) a ofertar, pela linguagem, “um espaço marginal às formas habituais da comunicação e tendo como fundamento a expressão de uma subjetividade” e “do sentido reprimido que se espera recuperar”. Tais “sentidos reprimidos” podem ser lidos no campo da representação tanto na dimensão individual, enfocando, por exemplo, a construção de personagens, quanto na coletiva, ao investigar, na forma da obra, seus sintomas e as fissuras de seu discurso, sem, todavia, “psicologizar” a gramática do campo político e social daquilo que é analisado. É sabido que Freud cercou-se de objetos artísticos a fim de criar os fundamentos de sua metapsicologia, o que pode ser visto em seus trabalhos acerca da produção artística de Michelangelo, E.T.A. Hoffmann e outros. No entanto, o médico austríaco buscava, na arte, conteúdos que indicassem pistas para desvendar o inconsciente do artista, “do fantasma organizador, da formação de compromisso que permite à libido do artista, mais ou menos representado por seu herói, escapar ao recalque e se sublimar na obra, ao preço de nela inscrever seu enigma”, como destaca Jacques Rancière (2009, p. 52). O século XX passaria a incorporar o arcabouço da psicanálise como método de interpretação da arte, desvinculando-se, assim, da presença biográfica de seu autor, para concentrar-se nos enigmas contidos nas entrelinhas da própria obra, que agora fala por si, revelando seu próprio “inconsciente estético”. Por outro lado, Georg Lukács, em A teoria do romance (2009), apresenta a categoria “indivíduo problemático” para tratar do perfil de sujeito que emerge com a modernidade. Tal perfil encontra-se no estatuto do romance moderno, como em autores ingleses do século XVIII, como Daniel Defoe, Henry Fielding, entre outros. Enquanto a epopeia apresentava uma ideia de mundo onde o herói desempenhava ações voltadas para a coletividade e cumpria, sem questionar, um destino determinado pelas divindades, o personagem do romance burguês vive em conflito com um mundo que não reconhece sua subjetividade. Esse “indivíduo problemático” que habita o romance moderno, e contemporâneo, narra um mundo que enxerga como sem sentido e hostil aos seus desejos. Nesse sentido, a categoria “indivíduo problemático” de Lukács pode ser aproximada da psicanálise, visto que esta se concentra no um a um, ou seja, em ouvir como o indivíduo entende a si próprio e ao mundo à sua volta. Para Vladimir Safatle (2020), é importante pensar a psicanálise como instrumento que precisa negar a centralização do sujeito e de suas decisões conscientes no mundo, uma vez que o inconsciente não atua somente nas decisões da vida privada de um indivíduo, mas, sim, em suas decisões como ator da práxis política, em sua sociabilização, comunicação e – acrescentamos – em seus registros estéticos, fontes de mediação da angústia, do sofrimento e de outros sentimentos introjetados. Segundo Jacques Lacan (1998, p. 86), “a linguagem, antes de significar alguma coisa, significa para alguém [...] ela se exprime, mas sem ser compreendida pelo sujeito, naquilo que o discurso relata do vivido, na medida em que o sujeito assume o anonimato moral da expressão: é a forma do simbolismo”. Todavia, a escolha da psicanálise como abordagem crítica para a interpretação das manifestações artísticas não se dá somente por meio da transposição, para dentro do campo estético, da relação entre analisando (texto) e analista (crítico). Por essa razão, este Simpósio também está aberto a aceitar trabalhos que partam de estudos que utilizem, como fundamento metodológico, os conceitos pensados para a clínica, tais como angústia, identificação, transferência, entre outros, e que os operacionalizam como modos de leitura. De acordo com Marisa Corrêa Silva (2009, p. 212), o próprio Lacan atuava enfatizando “sua recusa de definições, sua perpétua abertura para o jogo de novos significados e sua proposta de que o Inconsciente se estrutura como linguagem [...] se aproxima de autores como Derrida e Deleuze, no sentido de recusar as formas de pensamento fechadas, calcadas na lógica de origem grega, que acabavam resultando em formas autoritárias de pensamento, uma vez que caíam facilmente no dualismo e no maniqueísmo”, revelando, assim, relações criativas entre objetos de cultura e possibilidades de (res)significação. Portanto, diferentes apropriações da psicanálise como o Materialismo Lacaniano, os Estudos Culturais e outras teorias serão aceitas, desde que operem no entrecruzamento das fronteiras entre literatura, psicanálise e outras artes, tal como proposto.
PALAVRAS-CHAVE: Psicanálise; Literatura; Estudos interartes.
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MULTIPLICIDADE DE MUNDOS E BEM VIVER
- Ana Lígia Leite e Aguiar (Universidade Federal da Bahia)
- Bernard Belisário (Universidade Federal do Sul da Bahia)
- Elane Abreu de Oliveira (Universidade Federal do Cariri)

MULTIPLICIDADE DE MUNDOS E BEM VIVER
EIXO: ESTÉTICAS DO BEM-VIVER: COSMOLOGIAS, COLETIVIDADES E ESPÉCIES COMPANHEIRAS
SIMPÓSIO: MULTIPLICIDADE DE MUNDOS E BEM VIVER
COORDENADORES:
- Ana Lígia Leite e Aguiar (Universidade Federal da Bahia)
- Bernard Belisário (Universidade Federal do Sul da Bahia)
- Elane Abreu de Oliveira (Universidade Federal do Cariri)
RESUMO: Escondido sob um mundo em cinzas arde o tição que conserva o fogo para reavivar-se no dia seguinte. Com essa bela imagem, o pensador indígena Ayuujk (Mixe) Floriberto Díaz (ROBLES HERNÁNDEZ, 2018) descreveu um porvir acolhedor aquecido ao fogo da cultura de seu povo no México. Ainda nas montanhas do sudoeste mexicano, ouviram-se as vozes das comunidades que se levantaram para afirmar um mundo onde cabem muitos mundos (EZLN, 1996). Como manejar os bem viveres em meio ao caos, diásporas contemporâneas, incontáveis guerras civis, uso de combustíveis fósseis em grande escala (CHAKRABARTY, 2009), neoliberalismo, guerras internacionais, necropolíticas (MBEMBE, 2018), a negação das políticas de vida e a interdição da diversidade que podem ganhar as formas de resistência e das relações? Queremos alteridade, troca, escambo, prática-teórica, mais o comum do que os ismos. O bem viver (ACOSTA, 2016). O tempo. O direito ao luto (BUTLER, 2021). A criança. _ velh_. Os transportes públicos de multidões. O trabalho não alienado da vida em comum, do bem viver. A vida em pequena escala. Menos petróleo e seus derivados, mais florestas, mais saberes ancestrais. Água limpa. O Pantanal, a Amazônia, o Cerrado, a Caatinga, a Mata Atlântica, os Pampas. Os muitos biomas e suas cosmogonias. Este é um simpósio sobre as formas que o trabalho acadêmico e o trabalho comunitário podem ganhar. Repensar as imagens, as escrituras, o consumo, o deslocamento pelo mundo, ser outro/a: tornar-se estrangeirx. Pela multiplicidade. N-1. Teko porã. Ubuntu. O debate da democracia, dos direitos humanos e dos direitos da natureza. A comunidade, a comunalidade, o coletivo. Pensamentos indissociáveis das práticas. Intenta-se debater “as relações de produção, de intercâmbio e de cooperação que propiciem suficiência – mais que apenas eficiência – sustentada na solidariedade” (ACOSTA, 2016). Contra o antropoceno, o antropocêntrico, o antropo-cego (DE LA CADENA, 2018). Contra o consumismo e contra a biopirataria em face aos conhecimentos tradicionais (CARNEIRO DA CUNHA, 2009). Pelo direito à alimentação, ao banho diário, à saúde. Pelo direito à farmácia viva (CARLINI, 2006). Pela biodiversidade e pelas populações conhecedoras. Por formas emancipatórias e histórias de luta, como o cinema e a literatura indígenas, negro diaspóricos, periféricos. Investigar maneiras de adiar a destruição completa do planeta e, ao mesmo tempo, afirmar a multiplicação de mundos. Buscamos aqui outras ontologias, outras imagens-devires – de levantes, de formas de vida e de afecção outras. Eis a proposta deste simpósio – uma caixa de pandora do buen vivir. Imaginar com o que já existe: assembleias, colagens, agrupamentos. O sumak kawsay. Pelo direito cósmico. Despojamento. E ação. Referências bibliográficas: ACOSTA, Alberto. O Bem Viver: uma oportunidade para imaginar outros mundos. São Paulo: Autonomia Literária/Elefante, 2016. BARTHES, Roland. Como viver junto. São Paulo: Martins Fontes, 2013. BUTLER, Judith. A força da não violência: um vínculo ético-político. São Paulo: Boitempo, 2021. CARLINI, Elisaldo Araújo. A história da maconha no Brasil. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, Rio de Janeiro, v. 55, n. 4, 2006. CARNEIRO DA CUNHA, Manuela. Cultura com aspas. São Paulo: Cosac Naify, 2009. CHAKRABARTY, Dipesh. “O clima da história: quatro teses”. Sopro, n. 91, 2013, p. 4-22. EZNL - Ejército Zapatista de Liberación Nacional. Cuarta Declaración de la Selva Lacandona, 1996. GORDILLO, Gastón R. Rubble: The Afterlife of Destruction. Durham, NC: Duke University Press, 2014. HARAWAY, Donna J. “Staying with the Trouble: Anthropocene, Capitalocene, Chthulucene”. In: MOORE, Jason W. (Ed.). Anthropocene or Capitalocene: Nature, History and the Crisis of Capitalism Oakland: PM Press, 2016a. p. 34-76. HARAWAY, Donna. O manifesto das espécies companheiras: – Cachorros, pessoas e alteridade significativa. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2021. hooks, bell. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. São Paulo Martins Fontes, 2013. KOPENAWA, Davi & ALBERT, Bruce. A queda do céu: palavras de um xamã Yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. MBEMBE, Achille. Necropolítica. São Paulo: n-1 edições, 2018. OYÊWÙMÍ, Oyèrónké. A invenção das mulheres: Construindo um sentido africano para os discursos ocidentais de gênero. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2021. ROBLES HERNÁNDEZ, Sofía. Floriberto Díaz. Escrito: Comunalidad, energía viva del pensamiento mixe. Ciudad de México: UNAM, Dirección General de Publicaciones y Fomento Editorial, 2018. VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. A inconstância da alma selvagem. São Paulo: Cosac Naify, 2002.
PALAVRAS-CHAVE: Bem viver; Cultura; Política; Imagem; Estéticas
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INTERARTES: LITERATURA E SUAS INTERFACES
- Sandro Santos Ornellas (Universidade Federal da Bahia)
- Lisa Carvalho Vasconcellos (Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais)
- Cassia Dolores Costa Lopes (Universidade Federal da Bahia)
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LITERATURA E TECNOLOGIA - FUTUROS (IM)POSSÍVEIS
- Vinícius Carvalho Pereira (Universidade Federal de Mato Grosso)
- Andréa Catrópa da Silva (Universidade Anhembi Morumbi)
- Rejane Cristina Rocha (Universidade Federal de São Carlos)
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LITERATURA, MÚSICA E ALTERIDADE: ELEMENTOS ESTÉTICOS E TEMÁTICOS COM/PARTILHADOS
- Rafael Eisinger Guimarães (Universidade de Santa Cruz do Sul)
- Gérson Luís Werlang (Universidade Federal de Santa Maria)
- Roniere Silva Menezes (Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais)
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MONTEIRO LOBATO EM REDE: MEDALHÕES, MODERNOS, ANTIMODERNOS, MODERNISTAS
- Patrícia Aparecida Beraldo Romano (Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA)/Universidade de São Paulo (USP))
- Cilza Carla Bignotto (Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR))
- Milena Ribeiro Martins (Universidade Federal do Paraná (UFPR))
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INTERARTES: LITERATURA E SUAS INTERFACES - GRUPO 2
- Júlia Morena Costa (Universidade Federal da Bahia (UFBA))
- Sara del Carmen Rojo de la Rosa (Universidade Federal de Minas Gerais/ CNPq)

INTERARTES: LITERATURA E SUAS INTERFACES
EIXO: RELAÇÕES INTERARTES, REDES VIRTUAIS, METAVERSOS
SIMPÓSIO: INTERARTES: LITERATURA E SUAS INTERFACES
COORDENADORES:
- Sandro Santos Ornellas (Universidade Federal da Bahia)
- Lisa Carvalho Vasconcellos (Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais)
- Cassia Dolores Costa Lopes (Universidade Federal da Bahia)
RESUMO: Esse simpósio abarca discussões sobre literatura, tendo em vista suas interfaces e seus diálogos com outras manifestações artísticas, seja a fotografia (BRIZUELA, 2014), o cinema (VASCONCELOS, 2015), a música (OLIVEIRA, 2002), a pintura (GIL, 2015), as artes plásticas (CASA NOVA, 2008), a dança (GIL, 2005), os games (TEIXEIRA, 2013) e as dramaturgias (SARRAZAC, 2013). Nesse encontro múltiplo de saberes e de olhares, consoante as diferentes tessituras das linguagens em seus processos de experimentação e composição textual e discursiva, a escrita literária transita pelo suporte do livro, bem como por campos expandidos, exteriorizando-se e adquirindo variados contornos e configurações (SANTOS, REZENDE, 2011), conforme uma época marcada por intenso desenvolvimento tecnológico, com intensificação de redes informacionais, com o uso constante da Internet, dos computadores, dos celulares, dos tablets, no visível apelo para emergência de outros suportes atentos a esse contexto de acelerado incremento técnico e de produção de informação (SANTAELLA, 2002, 2005, 2016). No caso específico da dramaturgia, por exemplo, abre-se espaço de reflexão sobre procedimentos de interseção entre as diversas funções e meios que hoje configuram o campo das práticas dramatúrgicas. Além de sua tradicional associação com as artes cênicas, tais práticas vêm sendo enriquecidas por novas relações entre criadores e receptores, graças à crescente demanda lançada por novos meios audiovisuais, que abrem possibilidades antes insuspeitadas para a experimentação de outros formatos para comunicação das obras dramatúrgicas. Ao mesmo tempo, a complexidade e a rapidez de difusão dessa praxis interpela decisivamente, em inúmeras questões, o conhecimento construído pela tradição teórico-crítica do drama, da literatura e de outras formas de arte (CÍCERO, 2012). Assim, esse simpósio abre-se para pesquisas cujos olhares investigam desde os diversos processos de composição dramática na contemporaneidade – como adaptações de textos, escrita e tradução de peças e roteiros para o palco, TV, vídeo, rádio e cinema – até estudos de teoria, história e crítica do drama e do cinema, no diálogo com artistas pensadores e teóricos das artes na contemporaneidade, considerando a diversidade de interlocuções de vozes sobre o encontro das linguagens artísticas. O quadro das articulações teórico-críticas, debruçadas sobre as composições interartes da contemporaneidade, não pode ficar indiferente aos apelos dessa nova pauta de escritores e artistas, com suas invenções e reinvenções de processos criativos, exigindo de seus leitores e interlocutores diferentes aparatos interpretativos, que pedem um olhar sensível ao papel da imagem no seu aspecto multiforme, com a dinâmica do visual, no jogo com diferentes geografias teóricas, atentas às diversas temporalidades históricas e processos de subjetivação que acabam por fazer do exercício de leitura textual um operador crítico de demandas políticas de nosso tempo, voltadas para a multiplicidade de sujeitos e vozes que compõem o espaço social (DIDI-HUBERMAN, 2010, 2013). A prática de leitura dos textos, sejam eles que formato tiverem, exige também uma crítica de valores estéticos, pautados na pesquisa de uma geografia de saberes e de poderes, que coloca o horizonte do artista também inserido numa agenda de reflexão política sobre a sociedade, suas práticas de socialização de seus produtos artísticos. Daí que o Simpósio pensa em encontros, por exemplo, como os da literatura de testemunho ou da poesia com a fotografia (SELIGMANN-SILVA, 2014; NAVAS, 2017), da poesia escrita com a imagem cinemática (MARTELO, 2012; ROWLAND, BÉRTOLO, 2015) ou com o livro de artista (CADÔR, 2012), da encenação teatral com a escrita performática (ZUMTHOR, 2007), da polifonia literária com a polifonia musical (GARCIA JUNIOR, 2018), da instalação com a literatura (SANTOS, 2015), dentre outras possíveis travessias transdisciplinares. Para tanto, ambiciona-se um olhar comparatista que atribua aproximações e distanciamentos, experimentações e fluxos, indeterminações e zonas cinzentas, arquivos e especulações entre textos, linguagens, gêneros, formas, materialidades, discursos, numa geopolítica dos valores das leituras em face de contextos sociais específicos que reveem paradigmas interpretativos numa abordagem inter e/ou transcultural (JOBIM, 2019). Pretende-se construir, portanto, diálogos que conjuguem o ético, o poético e o estético, a partir de um mapeamento de questões filosóficas políticas e teórico-críticas. Tais questões se assentam em um olhar lançado às realidades contemporâneas como modos de entender as artes em contextos de acelerada circulação de informações, agressivas tramas de sentidos político-culturais e exaustão dos tradicionais lugares de resistência, tudo sob o signo de um capitalismo de crise (COMITÊ INVISÍVEL, 2016, 2017). Pelas experimentações teórico-críticas dessas investigações sobre o campo das relações interartes, ambiciona-se não pensar as linguagens artísticas como modulações disciplinares, mas espaços para usos comuns (AGAMBEN, 2007) da literatura, entendida como uma linha transversal de instabilidades e potencialidades da arte, da linguagem e do pensamento (DERRIDA, 2014).
PALAVRAS-CHAVE: Interartes; Diálogos; Comparação

LITERATURA E TECNOLOGIA - FUTUROS (IM)POSSÍVEIS
EIXO: RELAÇÕES INTERARTES, REDES VIRTUAIS, METAVERSOS
SIMPÓSIO: LITERATURA E TECNOLOGIA - FUTUROS (IM)POSSÍVEIS
COORDENADORES:
- Vinícius Carvalho Pereira (Universidade Federal de Mato Grosso)
- Andréa Catrópa da Silva (Universidade Anhembi Morumbi)
- Rejane Cristina Rocha (Universidade Federal de São Carlos)
RESUMO: Debates sobre literatura e tecnologia têm crescido em todo o mundo, ainda que mais lentamente no Brasil do que no Hemisfério Norte ou em outros países latino-americanos. A longa história da aproximação entre esses dois campos do saber já foi retraçada em publicações acadêmicas sobre o tema, as quais retomam a ambiguidade do termo tékhne no pensamento aristotélico, que designa o artificial ou técnico em oposição à physis. É comum que os primeiros gêneros elencados como significativos dessa ambiguidade sejam as narrativas utópicas ou distópicas sobre a relação homem-máquina, produzidas desde o Renascimento. Posteriormente a ficção científica passa a se destacar nesse âmbito, especialmente nos sistemas literários inglês e estadunidense a partir do século XIX. A discussão das imbricações entre literatura e tecnologia pode – entre tantos outros percursos distintos – partir dessa literatura sobre a máquina para uma análise da literatura como máquina, no que ganham destaque os movimentos de vanguarda e neovanguarda do século XX, como a escrita automática surrealista, os jogos tipográficos concretistas, ou a linguagem como potência algorítmica do grupo Oulipo. Sob a superfície variada desses experimentalismos, observa-se um vetor comum que aproxima a arte verbal de uma certa engenharia da palavra, em associação ou não com a imagem, favorecendo projetos artísticos de rigor formalista ou algebrismos insuspeitos. As relações entre a literatura e a tecnologia podem, ainda, ser mapeadas a partir dos suportes em que os signos são produzidos, circulados ou consumidos. Nesse âmbito, observa-se a evolução das materialidades da literatura – com destaque para a invenção do livro – para os processos de escritura com ou para os aparatos eletro-eletrônicos, nos séculos XX e XXI, sejam as máquinas de escrever elétricas, os softwares editores de texto, ou os dispositivos digitais de leitura (e-readers), entre tantos outros que vêm se multiplicando nos últimos anos. Ainda nesse contexto, cumpre destacar o espaço crescente da “literatura eletrônica”, “literatura cibernética/ciberliteratura” ou “literatura digital”. Muito embora se reconheça que cada um desses adjetivos atrelados ao substantivo “literatura” denota a especificidade do campo por uma associação particular (respectivamente, ao eletrônico, em oposição ao elétrico; ao cibernético, por referência à comunicação entre máquinas; e ao digital, em oposição ao analógico), o conjunto de obras recobertas pelos três termos é praticamente o mesmo, o que justifica seu uso intercambiável neste contexto. Para fins de clareza, pode-se utilizar, porém, a definição de literatura eletrônica postulada pela Electronic Literature Organization (maior grupo mundial de estudos sobre o tema): textos que contêm “um aspecto literário importante que aproveita as capacidades e contextos fornecidos por um computador independente ou em rede” (HAYLES, 2009, p. 21). Ou, ainda, recorrer à definição proposta por Carolina Gainza (2021), que compreende a literatura digital como aquela que experimenta com o código ou com a mídia digitais, referindo-se não apenas a obras construídas pela programação de softwares e linguagens de programação, mas também àquelas produzidas pelo aproveitamento criativo de redes sociais e plataformas de comunicação, em um movimento descrito por Arlindo Machado (2007) como "desprogramação da técnica”. Há que se destacar, por fim, que nenhum dos eventos que pontuam a história das associações entre literatura e tecnologia pode ser compreendido de forma dissociada dos fenômenos sociais, políticos e econômicos da modernidade e da contemporaneidade. Devem, pois, ser entendidos como parte de um processo maior de mudança social, e não como produto de um determinismo tecnológico ou estético, o qual alienaria o código de sua função precípua: a expressão humana. É o que postulam estudos desenvolvidos por estudiosos oriundos de países periféricos no que tange ao desenvolvimento tecnológico, como é o caso de Kozak (2013, 2019) e Gainza (2018), por exemplo. Nesse contexto, propomos o presente simpósio, já em sua segunda edição, com vistas a congregar estudos sobre as relações que podem ser estabelecidas entre os campos da literatura e da tecnologia, atentando para os pontos mencionados ao longo deste resumo, ou para outros que possam se mostrar pertinentes à temática. Nosso objetivo é fomentar e ampliar as discussões sobre o campo, relevante não só pelo rendimento estético dos produtos literários que o integram, mas também pelas provocações que coloca, sobretudo no que diz respeito às definições de escrita, texto, autoria, leitura – isto é, alguns dos pilares sobre os quais se assenta o entendimento do fenômeno literário.
PALAVRAS-CHAVE: Literatura e tecnologia; Máquina; Experimentalismos; Materialidades; Códigos.

LITERATURA, MÚSICA E ALTERIDADE: ELEMENTOS ESTÉTICOS E TEMÁTICOS COM/PARTILHADOS
EIXO: RELAÇÕES INTERARTES, REDES VIRTUAIS, METAVERSOS
SIMPÓSIO: LITERATURA, MÚSICA E ALTERIDADE: ELEMENTOS ESTÉTICOS E TEMÁTICOS COM/PARTILHADOS
COORDENADORES:
- Rafael Eisinger Guimarães (Universidade de Santa Cruz do Sul)
- Gérson Luís Werlang (Universidade Federal de Santa Maria)
- Roniere Silva Menezes (Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais)
RESUMO: A literatura e a música têm compartilhado seus mundos há séculos, seja, por exemplo, a partir da ancestral conexão entre verbo e ritmo na lírica grega clássica, nas manifestações das culturas orais africanas ou na musicalidade dos versos dos trovadores medievais, seja, mais contemporaneamente, a partir do trânsito que se estabelece entre essas duas linguagens na musicalização de poemas, na presença de elementos musicais em textos narrativos, dramáticos e poéticos ou no jogo intertextual entre obras literárias, produções audiovisuais, letras de canções e composições musicais eruditas. Fruto dessa proximidade tão rica, as relações entre os mais distintos tipos de produções literárias e musicais têm inspirado inúmeros estudos, eventos e publicações, consolidando assim um espaço de debate e reflexão bastante instigante, sobretudo no âmbito da Literatura Comparada. Conforme se observa nesse contexto, as investigações acerca de tais diálogos interartes ora apontam para uma superação dos limites entre o literário e o musical, ora ressaltam a forma como, justamente por resguardarem seus aspectos específicos, essas linguagens propiciam uma iluminação mútua. Tendo por base essas questões, o Simpósio Temático “Literatura, música e alteridade: elementos estéticos e temáticos com/partilhados” pretende aprofundar as discussões desenvolvidas nos congressos da ABRALIC realizados em 2020 e 2021. Nesse intuito, buscamos retomar algumas contribuições teóricas fundamentais para os estudos da área, em especial as idéias de Adriana Cavarero (2011), Boaventura de Souza Santos e Paula Maria Menezes (2009), Florencia Garramuño (2009), João Camillo Penna (2013), José Miguel Wisnik (2003, 2004, 2017), Luiz Tatit (2002), Murray Schaffer (2011), Paul Zumthor (1993, 2007, 2010), Ruth Finnegan (2008), Sérgio Bairon (2005) e Solange Ribeiro de Oliveira (2002), dentre outras perspectivas que lancem olhares sobre os compartilhamentos estéticos, temáticos e conceituais existentes entre essas duas manifestações artístico-culturais. Almejamos, em linhas gerais, receber propostas que ressaltem diálogos existentes entre letras, sons, ritmos e performances, tomando como parâmetro povos, culturas, países distintos, pensando inclusive nos jogos existentes entre criação local e cosmopolitismo. Em função da celebração do centenário da Semana de Arte Moderna, o simpósio está aberto, de forma especial, a contribuições que reflitam sobre ressonâncias de propostas modernistas no cancioneiro popular brasileiro. Poderão ser analisados, por exemplo, reflexos das ideias de Mário de Andrade e Oswald de Andrade em manifestações musicais da Bossa Nova à contemporaneidade. Nessa perspectiva, podemos nos lembrar de Tom Jobim e Baden Powell, de criações relacionadas ao Tropicalismo, como obras de Caetano, Gilberto Gil, Tom Zé, Torquato Neto, entre outros. Serão bem-vindos trabalhos que discutam as interfaces entre o Modernismo e o Clube da Esquina (Milton Nascimento, Tavinho Moura, etc), ou tracem relações entre obras modernas e canções de Chico Buarque, Edu Lobo, João Bosco, etc. Não devemos nos esquecer da geração nordestina dos anos 1970 (Novos Baianos, Alceu Valença, Zé Ramalho, etc) e os movimentos mais ao Sul (MPG, Os Almôndegas, Bebeto Alves e Vitor Ramil, etc). Devemos nos lembrar do rock e do pop nacional, como as composições de Arnaldo Antunes e Marina Lima, de criações do Mangue Beat, do rap (Emicida, Criolo, Racionais MC's, de Djonga, etc), de Chico César, entre várias outras invenções ligadas, inclusive, ao Norte e ao Centro Oeste do país. Como representantes dos inúmeros letristas nacionais, podemos ressaltar os nomes de Vinicius de Moraes, Fernando Brant, Márcio Borges, Aldir Blanc, Paulo César Pinheiro, Antonio Cícero, etc. Pensando ainda na homenagem ao modernismo - e mesmo indo além do movimento -, os trabalhos podem relacionar manifestos, artigos, ensaios, criações literárias ligadas ao gênero lírico, narrativo ou dramático à música popular tradicional ou folclórica, à música popular ligada aos meios de comunicação de massa ou à música erudita. As comunicações podem estabelecer comparações tomando como objeto apenas textos musicais. Estamos abertos a estudos entre literatura e música que propõem a reavaliação estético-cultural dos projetos modernos ou que apontem inovações dentro do circuito cancional do país. Para concluir, e ampliando mais a série, gostaríamos de sugerir trabalhos relativos à performance corporal e vocal. Nesse sentido, entram, por exemplo, Elis Regina, Gal Gosta, Maria Bethânia, Ney Matogrosso, Clara Nunes, Elza Soares, entre vários nomes da atualidade. Dessa forma, este Simpósio Temático irá acolher propostas que analisem e problematizem relações intertextuais, temáticas, conceituais, culturais e técnicas entre literatura e música em variadas manifestações e em diversos contextos sócio-históricos.
PALAVRAS-CHAVE: literatura; música; canção; relações interartes; crítica comparada.

MONTEIRO LOBATO EM REDE: MEDALHÕES, MODERNOS, ANTIMODERNOS, MODERNISTAS
EIXO: RELAÇÕES INTERARTES, REDES VIRTUAIS, METAVERSOS
SIMPÓSIO: MONTEIRO LOBATO EM REDE: MEDALHÕES, MODERNOS, ANTIMODERNOS, MODERNISTAS
COORDENADORES:
- Patrícia Aparecida Beraldo Romano (Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA)/Universidade de São Paulo (USP))
- Cilza Carla Bignotto (Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR))
- Milena Ribeiro Martins (Universidade Federal do Paraná (UFPR))
RESUMO: O escritor e editor Monteiro Lobato (1882-1948) foi figura-chave na produção e circulação de obras literárias e artísticas, brasileiras e estrangeiras, sobretudo a partir de 1918, quando funda sua primeira editora, sob a chancela da prestigiada Revista do Brasil. No ano em que se comemoram os cem anos da Semana de Arte Moderna e se avalia criticamente o seu legado, parece fundamental examinar a obra lobatiana, as obras publicadas por ele — assim como as que ele recusou publicar —, as redes de escritores e leitores com quem interagiu, sobretudo por correspondência, e as redes de artistas, intelectuais, empresários, políticos e outros agentes sociais com quem manteve intenso contato naquela década e nas subsequentes. Como editor, Lobato publicou modernistas como Oswald de Andrade, Menotti del Picchia, Guilherme de Almeida e Di Cavalcanti. Também editou escritores ligados a outros projetos de renovação literária e artística, como Lima Barreto, Alphonsus de Guimaraens, Hilário Tácito, Ribeiro Couto, entre outros. Escritoras feministas, como Ercília Nogueira Cobra, Rosalina Coelho Lisboa, Abel Juruá e Chrysanthème, dentre outras foram publicadas por Lobato, bem como escritores negros, tais como Gabriel Marques e Lima Barreto. Anita Malfatti, Di Cavalcanti e outros artistas renomados fizeram capas para livros publicados pelas editoras lobatianas. Lobato poderia ter editado livros de poesia de Manuel Bandeira, que chegou a ter obra anunciada em catálogo da editora, e de Mário de Andrade, a quem o editor encomendou o “Prefácio interessantíssimo”, de Pauliceia Desvairada. Ambos faziam parte da rede lobatiana de contatos. A recusa em editá-los talvez estivesse ancorada no projeto estético escolhido por Lobato como diretriz editorial para sua empresa. Na editora e em seus catálogos, conviviam os chamados “medalhões” — escritores como Coelho Neto, Medeiros e Albuquerque, Alfredo d'Escragnolle Taunay, Francisca Júlia —, os futuramente denominados modernistas e escritores que apresentavam projetos literários inovadores, embora não vinculados a vanguardas europeias. Havia, ainda, os que podemos classificar como antimodernos, conforme denominação de Antoine Compagnon (2011, p. 11): Quem são os antimodernos? […] Nem todos os campeões do status quo, os conservadores e reacionários até o último fio de cabelo, nem todos os atrabiliários e os frustrados com seu tempo, os imobilistas e os ultracistas, os resmungões e os ranzinzas, mas os modernos melindrados pelos Tempos Modernos, pelo modernismo ou pela modernidade, ou os modernos que o foram a contragosto, modernos atormentados ou modernos intempestivos. A convivência entre medalhões e modernos também ocorria na seção da editora dedicada a livros infantis. O próprio Lobato escreveu o primeiro título para crianças publicado por sua editora: A Menina do Narizinho Arrebitado (1920), inaugurando a série de aventuras transcorridas no Sítio do Picapau Amarelo, que transformaram radicalmente o cenário da literatura para crianças no país, por meio de recursos internos e externos aos textos. A linguagem das obras infantis e juvenis lobatianas apresenta forte diálogo com os preceitos do momento modernista, seja a partir do uso da coloquialidade, do humor e da criticidade ou dos jogos intertextuais. Em decorrência da experiência leitora e também da figura pública do escritor, muitas crianças-leitoras começaram a se corresponder com Lobato, relatando experiências de leitura, fazendo-lhe pedidos, correções e sugestões. Formava-se uma rede de contatos que Lobato manteria até o fim da vida. Como editor, porém, Lobato publicou livros infantis de autores menos inovadores, como Dolores Barreto, e clássicos infantis traduzidos, como As aventuras do Barão de Münchausen. Tendo em vista os aspectos acima apresentados e salientando nossa percepção da convivência de vários modernismos no cenário cultural brasileiro a partir dos anos 1920 (percepção formulada desde o projeto Monteiro Lobato e outros Modernismos brasileiros, coordenado por Marisa Lajolo), este simpósio convida pesquisadores a apresentarem trabalhos sobre: 1) Textos literários e não-literários de Monteiro Lobato, para adultos ou crianças; 2) Textos literários e não-literários de escritores que interagiram com Lobato ou fizeram parte dos campos intelectuais das décadas de 1920-1940; 3) Textos críticos referentes a obras de Lobato ou de escritores de sua rede; 4) Traduções de obras de Lobato, traduções publicadas ou realizadas por ele, traduções de autores participantes de suas redes; 5) Cartas, contratos, manuscritos, arquivos, acervos ligados a Lobato e/ou a escritores que interagiram com ele; 6) Músicas, pinturas, esculturas, fotografias, filmes e outras obras artísticas de Lobato e/ou de escritores que tiveram vínculo com ele; 7) As obras infantis de Lobato e suas relações com outras linguagens; 8) Monteiro Lobato como editor; 9) Escritores de literatura infantil anteriores e posteriores a Lobato e as interfaces de suas obras com a lobatiana. 10) Literatura e sociedade: elementos históricos, editoriais ou artísticos relevantes para a compreensão do contexto de Lobato; 11) Profissionais das letras dos anos 1920-1940 e suas relações com Lobato.
PALAVRAS-CHAVE: Monteiro Lobato, sistema literário, modernismos

INTERARTES: LITERATURA E SUAS INTERFACES - GRUPO 2
EIXO: RELAÇÕES INTERARTES, REDES VIRTUAIS, METAVERSOS
SIMPÓSIO: INTERARTES: LITERATURA E SUAS INTERFACES - GRUPO 2
COORDENADORES:
- Júlia Morena Costa (Universidade Federal da Bahia (UFBA))
- Sara del Carmen Rojo de la Rosa (Universidade Federal de Minas Gerais/ CNPq)
RESUMO: . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
PALAVRAS-CHAVE: .
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"ISTO NÃO É UM ROMANCE": POLÍTICA E RESISTÊNCIA À FORMA NO ROMANCE SETECENTISTA E OITOCENTISTA
- Andréa Sirihal Werkema (Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
- Maria Juliana Gambogi Teixeira (Universidade Federal de Minas Gerais)
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"LER/ESCREVER O SÉCULO XXI: A NOVÍSSIMA FICÇÃO PORTUGUESA"
- Jorge Vicente Valentim (UFSCar)
- Gabriela Silva (UFLA)
- André Carneiro Ramos (UEMG-Passos)
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A EST(ÉTICA) NA LITERATURA E OUTRAS LINGUAGENS ARTÍSTICAS COMO UM GESTO POLÍTICO PARA MITIGAR A VIOLÊNCIA
- Flávio Adriano Nantes (UFMS)
- Cláudia Maria Ceneviva Nigro (UNESP)
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A PERSISTÊNCIA DAS LITERATURAS 'FRANCÓFONAS' NO BRASIL: RESISTÊNCIA, ESTÉTICA E POLÍTICA
- Josilene Pinheiro-Mariz (Universidade Federal de Campina Grande)
- Dennys Silva-Reis (Universidade Federal do Acre)
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DECOLONIALIDADE, MEMÓRIA E RESISTÊNCIA NA ESCRITA DE AUTORIA FEMININA
- Algemira de Macêdo Mendes (Universidade Estadual do Piauí e Universidade Estadual do Maranhão)
- geovana quinalha de oliveira (ufms)
- Lucilene Machado Garcia Arf (UFMS)
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ESCRITA E DESAPARECIMENTO
- Gabriela Lopes Vasconcellos de Andrade (Universidade Federal de Minas Gerais)
- Livia Laene Oliveira dos Santos Drummond (Universidade Federal da Bahia)
- Antonia Torreão Herrera (Universidade Federal da Bahia)
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ESCRITAS E VIDAS CONTEMPORÂNEAS: INCURSÕES, AVALIAÇÕES E DESAFIOS AO COMPARATIVISMO
- Adeítalo Manoel Pinho (Universidade Estadual de Feira de Santana)
- Maria de Fátima Gonçalves Lima (PUC-Goiás)
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ESPAÇO E LUGAR NAS LITERATURAS AFRICANAS: NECESSÁRIAS CONTRIBUIÇÕES AOS ESTUDOS LITERÁRIOS
- Janice Ines Nodari (UFPR)
- João Pedro Wizniewsky Amaral (UFCG)
- Mônica Stefani (UFSM)
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ESTRATÉGIAS DO FEMININO: LITERATURA ESCRITA POR MULHERES E RESISTÊNCIA
- Laura Barbosa Campos (UERJ)
- Anna Faedrich (UFF)
- Silvina Carrizo (UFJF)
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LITERATURA E DISSONÂNCIA
- André Dias (Universidade Federal Fluminense - UFF)
- Rauer Ribeiro Rodrigues (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS)
- Felipe Gonçalves Figueira (Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES)
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LITERATURA E TESTEMUNHO: TEORIAS, LIMITES, EXEMPLOS
- Wilberth Claython Ferreira Salgueiro (UFES / CNPq)
- Marcelo Paiva De Souza (UFPR / CNPQ)
- Marcelo Ferraz De Paula (UFG / CNPQ)
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MACHADO DE ASSIS: ARTICULAÇÃO ENTRE REFLEXÃO ESTÉTICA E CRÍTICA SOCIAL
- Juracy Ignez Assmann Saraiva (Universidade Feevale)
- Marinês Andrea Kunz (Universidade Federal da Paraíba)
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MANIFESTAÇÕES DE RESISTÊNCIA NA LITERATURA SUL-AMERICANA CONTEMPORÂNEA: PODER, HISTÓRIA, MEMÓRIA
- Renata Rocha Ribeiro (Universidade Federal de Goiás - UFG)
- Luciana Paiva Coronel (Universidade Federal do Rio Grande - FURG)
- Gínia Maria Gomes (Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS)
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NARRATIVAS DE EXCLUSÃO: IMAGINÁRIO E REPRESENTAÇÕES
- Denise Dias (IF Goiano/Amazonas)
- Lícia Soares de Souza (Universidade Estadual da Bahia)
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NORTE/AMAZÔNIA NA GEOGRAFIA MUNDIAL DA BARBÁRIE: LITERATURA SOBRE A RESISTÊNCIA E O TESTEMUNHO NA REGIÃO
- Abilio Pachêco de Souza (UNIFESSPA)
- Luiza Helena Oliveira da Silva (UFNT)
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O CONTO CONTEMPORÂNEO NA LITERATURA BRASILEIRA
- Gislei Martins De Souza Oliveira (IFMT)
- Claudia Vanessa Bergamini (UFAC)
- Vanderluce Moreira Machado Oliveira (IFMT)
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O DISCURSO LITERÁRIO COMO COMPARTILHAMENTO E RESISTÊNCIA: AS MALHAS ESTÉTICO-POLÍTICAS DA LITERATURA
- Evaldo Balbino da Silva (Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG))
- Leni Nobre de Oliveira (Centro Federal Tecnológico de Minas Gerais (CEFET – MG))
- Tereza Ramos de Carvalho (Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT/CUA))
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PALAVRAS DA CRÍTICA, PALAVRAS EM DISSIDÊNCIA: GÊNEROS, SUBJETIVIDADES, SEXUALIDADES
- Paulo César García (Universidade do Estado da Bahia)
- Marcus Antônio Assis Lima (Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia)
- Marinela Freitas (UP | Universidade do Porto/PT)
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POÉTICAS DAS RUAS
- Daniela Silva de Freitas (Universidade Federal de Alfenas)
- Rossi Alves Gonçalves (Universidade Federal Fluminense)
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RETORNOS, ANTEPASSADOS E MEMÓRIAS DO FUTURO
- Alessia Di Eugenio (Universidade de Bologna)
- Francesca De Rosa (Universidade de Napoli)
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SABERES SUBALTERNIZADOS: LITERATURA E (RE) EXISTÊNCIA, OUTROS(AS) SUJEITOS(AS) DE CRIAÇÃO
- Alvanita Almeida Santos (UFBA)
- Jailma dos Santos Pedreira Moreira (UNEB)
- Carlos Magno Gomes (UFS/CNPq)
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TRANSGRESSÃO, MEMÓRIA E (IN)SUBALTERNIZAÇÃO NAS LITERATURAS AFRICANAS E AFRODIASPÓRICAS PRODUZIDAS POR MULHERES
- Cíntia Acosta Kütter (Universidade Federal Rural da Amazônia)
- Sávio Roberto Fonseca de Freitas (Universidade Federal da Paraíba)
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USOS POLÍTICOS DA MEMÓRIA E DA HISTÓRIA NAS LITERATURAS DE LÍNGUA PORTUGUESA
- Daniel Marinho Laks (Universidade Federal de São Carlos - UFSCar)
- Renata Flavia da Silva (Universidade Federal Fluminense - UFF)
- Roberta Guimarães Franco (Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG)
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ESCRITA DE MULHERES: LUTAS, OLHARES E PERCURSOS
- Ana Maria Chiarini (UFMG)
- Silvia La Regina (Universidade Federal do Sul da Bahia - UFSB)

"ISTO NÃO É UM ROMANCE": POLÍTICA E RESISTÊNCIA À FORMA NO ROMANCE SETECENTISTA E OITOCENTISTA
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: "ISTO NÃO É UM ROMANCE": POLÍTICA E RESISTÊNCIA À FORMA NO ROMANCE SETECENTISTA E OITOCENTISTA
COORDENADORES:
- Andréa Sirihal Werkema (Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
- Maria Juliana Gambogi Teixeira (Universidade Federal de Minas Gerais)
RESUMO: “Ora, o crítico que, depois de Manon Lescaut, Paul et Virginie, Dom Quixote, Liaisons dangereuses, Werther, Afinidades eletivas, Clarisse Harlowe, Emile, Candide, Cinq-Mars, René, Les Trois Mosquetaires, Mauprat, Le Père Goriot, La Cousine Bette, Colomba, Le Rouge et le Noir, Mademoiselle de Maupin, Notre-Dame de Paris, Salammbô, Madame Bovary, Adolphe, Monsieur de Camors, L'Assommoir, Sapho, etc, ainda ousar escrever : ‘isso é um romance, isso não é’, me parece dotado de uma perspicácia que se aparenta em muito à incompetência” (Maupassant. Pierre et Jean) A célebre estocada de Maupassant contra um certo pendor crítico oitocentista, ansioso em tentar estabelecer um figurino ideal para um gênero que se afirma na resistência a qualquer prescrição genérica é já nossa velha conhecida, a tal ponto que se converteu num status quo dos estudos sobre o romance. Mas se tal traço parece hoje plenamente assentido, também é verdade que tal abertura genérica não impediu teóricos de diversas matrizes de tentar encontrar, em lugar de um figurino genérico, um núcleo de sentido comum ao proteico universo dos romances. Desde Hegel e sua “epopeia burguesa” ou, como desenvolveu Lukács, “a epopeia de uma era para a qual a totalidade extensiva da vida não é mais dada de modo evidente” (Lukács, 2009, p. 55), o romance, complementa Thomas Pavel, “por causa do corte que interpõe entre o protagonista e seu meio, (...) é o primeiro gênero a se interrogar sobre a gênese do indivíduo e sobre a instauração de uma ordem comum” (Pavel, 2006, p. 46). É essa cisão entre sujeito e a ordem comum ou a fratura na imanência que acaba por dotar o gênero de uma forte propensão a se apresentar como leitura político-filosófica do mundo, independente de tal subtexto fazer parte explicitamente de sua forma e/ou conteúdo. Essa dimensão política-filosófica do romance, para além das matrizes de leitura, é, ao lado da dimensão proteiforme do gênero, outro dado tão bem estabelecido nos estudos do romance que prescinde de referências precisas a autores e obras. Gênero polimorfo e gênero político-filosófico, independentemente de sua forma/conteúdo e das pretensões de seu autor são, portanto, as duas constantes hermenêuticas na leitura de qualquer romance. Mas a célebre estocada de Maupassant também nos convida a uma outra direção, direção essa tomada inclusive por alguns dos romances ali evocados: aqueles que recusam a própria denominação. Romances que recusam o nome de romance, seja ao acionarem o famoso topos setecentista que intitula esta chamada (isso não é um romance), seja porque se pretendem outra coisa que não um romance, querendo preencher outros espaços estranhos ao que atribuem ao campo próprio do gênero. Qual seria o fundamento dessa resistência ao romance e o que sustentam para além (ou para aquém?) da poliformia e da mirada político-filosófica? É de se notar que a escolha ou não de um gênero literário, enquanto rótulo, carrega consigo toda uma gama de significações – o romance, nas fichas catalográficas e nas organizações das bibliotecas, acaba por perfazer o percurso que ele de certa maneira combateu. Mas se há resistência ao rótulo, há também a resistência do rótulo, e infelizmente, queiram ou não os seus autores, o romance muitas vezes prevaleceu mesmo ali onde se recusava seu nome. O que não apaga o gesto autoral que recusa – que problematiza – o gênero (mesmo que esse tenha nascido contra todos os gêneros). O presente simpósio convida, portanto, a todos aqueles que desejam ainda fazer a discussão sobre o gênero dos gêneros na modernidade, ou o antigênero, na verdade tanto faz. Marcamos os séculos XVIII e XIX como não apenas o momento de estabilização do romance enquanto gênero inclusivo, mas também de seu questionamento – aspecto previsto em uma teoria autoconsciente ou autorreflexiva da literatura. É o momento, como se coloca no parágrafo acima, em que romancistas podem muito bem recusar a forma, ou abraçá-la como expressão formal de uma visão de mundo, em tempos de fortes acentos políticos, de tomadas de posição, de leitura de romances. Em suma, um romance seria sempre fruto de seu momento, porque é gênero aberto na medida em que conversa, sempre, com aquilo que o cerca. Não há como separar o pensamento burguês já formado, seu olhar sobre o mundo, sua resistência às velhas formas de organização social, de uma estrutura literária que descreve, que caracteriza, que narra e que enfim questiona. O lastro realista que habita todo romance, seja por seu avesso (como um Tristram Shandy) seja por sua afirmação de que é possível criar e recriar mundos, traduz-se muitas vezes nas melhores análises políticas que podemos ler através dos tempos, quando não nas melhores teorias sobre o romance.
PALAVRAS-CHAVE: Palavras-chave: romance setecentista, romance oitocentista, política do romance, teoria do romance.

"LER/ESCREVER O SÉCULO XXI: A NOVÍSSIMA FICÇÃO PORTUGUESA"
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: "LER/ESCREVER O SÉCULO XXI: A NOVÍSSIMA FICÇÃO PORTUGUESA"
COORDENADORES:
- Jorge Vicente Valentim (UFSCar)
- Gabriela Silva (UFLA)
- André Carneiro Ramos (UEMG-Passos)
RESUMO: O presente Simpósio Temático tem como objetivo propor um espaço de diálogo e discussão sobre a produção literária portuguesa, nascida, surgida e publicada a partir dos anos 2000, ou seja, contextualizada no século XXI. Levando em consideração alguns fatores históricos, políticos e sociais de Portugal, como o momento pós-Revolução dos Cravos, a deflagração da liberdade de pensamento e expressão artística, os cenários advindos dessas décadas posteriores ao evento demarcador da redemocratização, a crise econômica diante da instituição da troika nas primeiras décadas de 2000 e os novos desafios impostos pelo recente cenário de pandemia e seus efeitos colaterais, importa-nos refletir de que maneira essa produção ficcional vem demandando necessidades éticas, sem abrir mão de um projeto estético efetivo, ainda que multíplice na sua consecução, em que temas, tais como os vários tipos de violência (familiar, física, de gênero), o medo diante de ameaças terroristas, os direitos humanos e as reivindicações sociais (como as dos grupos LGBTQIA+ e as dos movimentos antifascistas e antirracistas), o consumismo exacerbado no contexto neoliberal, os êxodos migratórios para os territórios europeus, dentre outros, acabam se constituindo uma gama exponencial para refletir e discutir sobre o próprio tempo presente. Se, como propõe Giorgio Agamben, a contemporaneidade pode ser entendida como “uma singular relação com o próprio tempo, que adere a este e, ao mesmo tempo, dele toma distâncias” (AGAMBEN, 2010, p. 59), interessa-nos pensar como a ficção portuguesa contemporânea escreve o século XXI e como este tempo pode ser lido por nós a partir das propostas artísticas do(a)s autore(a)s, seja num movimento de aproximação, seja no de um anacronismo, propiciando uma espécie de afastamento proposital para conseguir estabelecer uma relação analítica e crítica. Nesse sentido, aplicado à literatura portuguesa, o conceito em questão remete ao momento crucial e demarcador da saída de Portugal de uma ditadura de mais de 40 anos e da consequente entrada no caminho de um Estado democrático de direito: a Revolução dos Cravos, de 25 de abril de 1974. As mais variadas fontes da fortuna crítica portuguesa apontam exatamente esse momento como um dos eixos temporais paradigmáticos (BARRENTO, 2016; REIS, 2005; SEIXO, 2001). Tal como esclarece João Barrento (2016), o elenco de escritore(a)s surgido(a)s nesse cenário revela já uma multiplicidade de tendências, demonstrando per se a possibilidade de um livre trânsito por diferentes caminhos de consecução na estética romanesca, além de uma demarcação dos seus principais enfoques temáticos. Ainda que tal designação, muitas vezes, dirija-se para toda essa geração centrada no período 1974-2000, a ideia do simpósio é direcionar os estudos sobre ficção portuguesa para o período 2000-2022, sublinhando, portanto, a sua distinção a partir de uma proposição pluridimensional, em que determinados projetos estéticos não excluem ou obliteram certos posicionamentos éticos em relação aos desafios e às complexidades do nosso tempo. Nesse sentido, a expressão talhada por Gabriela Silva (2016) – “a novíssima literatura portuguesa” – surge, aqui, retomada, agora, num direcionamento mais específico, a partir de um recorte temporal pontual, afinal, importa-nos pensar como essas novas e “diferentes identidades de escrita” (SILVA, 2016, p. 6) propiciam caminhos para escrever e ler o século XXI. Voltado, portanto, para as obras nascidas e publicadas a partir dos anos 2000, o presente Simpósio Temático abriga propostas de comunicação que abordem exclusivamente escritore(a)s enquadrado(a)s nesse contexto epocal. Se, como aponta Isabel Cristina Rodrigues (2014), a atual ficção portuguesa caminha entre a tradição e a inovação, então, não será possível pensar de que maneira o(a)s escritore(a)s portuguese(a)s dessa novíssima geração consolidam uma literatura em que estética, política e resistência constituem palavras-chave para o seu enquadramento e a sua compreensão? Ao escreverem (n)o século XXI, não estarão ele(a)s propondo formas de ler o nosso tempo, o nosso presente? Ou seja, os desafios éticos emergidos neste contexto, observados nas principais linhas de interesse do(a)s autore(a)s portuguese(a)s mais recentes – e, de certo modo, acentuados pelo cenário atual de pandemia da covid-19 –, não parecem estar distanciados de uma práxis estética, cujas consecuções primam pela multiplicidade em suas realizações concretas. Não será isto uma forma bem conseguida de criar uma espécie de unidade na capacidade e na potencialidade dessa ficção em se consolidar pela diversidade? Essas são algumas das inquietações levantadas pelo Simpósio Temático, cujas propostas de comunicação poderão contribuir para a construção de um espaço de diálogo e troca de ideias, onde a novíssima ficção portuguesa seja o ponto central de discussão.
PALAVRAS-CHAVE: Novíssima ficção portuguesa; Século XXI; Desafios éticos; Projetos estéticos; Resistência.

A EST(ÉTICA) NA LITERATURA E OUTRAS LINGUAGENS ARTÍSTICAS COMO UM GESTO POLÍTICO PARA MITIGAR A VIOLÊNCIA
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: A EST(ÉTICA) NA LITERATURA E OUTRAS LINGUAGENS ARTÍSTICAS COMO UM GESTO POLÍTICO PARA MITIGAR A VIOLÊNCIA
COORDENADORES:
- Flávio Adriano Nantes (UFMS)
- Cláudia Maria Ceneviva Nigro (UNESP)
RESUMO: Há 13 anos consecutivos, o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking mundial em assassinatos a mulheres trans (Transgender Europe – TGEU/ Associação Nacional de Travestis e Transexuais – ANTRA, relatório de 2021), somam-se a isso, o alto índice de violência contra mulheres cis (feminicídio), os assédios, as injúrias, o continuum de violência contra os corpos gays, lésbicos, negros, bem como outras dissidências corpóreas: práticas sociais que nos permitem inferir que os engendramentos sociais brasileiros estão sob o signo da violência. E isso se intensifica quando o Estado-nação não empreende políticas sociais para mitigar a violência contra esses corpos, o que o filósofo camaronês Achille Mbembe define como necropolítica (2018). Para a filósofa estadunidense Judith Butler (2015), existem vidas que são passíveis ao luto e outras que não o são. Em outras palavras, há corpos que estão para o choro estatal e outros não. Que vidas são merecedoras do choro/luto social? Que corpos importam? Os corpos hegemônicos, i.e., brancos, médios, cisgêneros, magros, urbanos, sem deficiência; já outros, LGBTs, negros, indígenas, pobres, etc., não são passíveis ao luto. A literatura, bem como outras linguagens artísticas, na contramão da violência a determinados corpos, como um gesto político, articula-se para que reflitamos acerca dos corpos que estão submetidos à violência – muitos levados à eliminação letal – e, por conseguinte, fazê-los existir e resistir. Neste sentido, Italo Calvino é categórico ao afirmar que: “A literatura é necessária à política em primeiro lugar quando ela dá voz àquilo que não tem voz, quando dá nome àquilo que ainda não tem nome, e especialmente àquilo que a linguagem política exclui ou tenta excluir. Quero dizer, aspectos, situações, linguagens, tanto do mundo exterior como do mundo interior; as tendências reprimidas no indivíduo e na sociedade. A literatura é como um ouvido que pode escutar além daquela linguagem que a política entende; é como um olho que pode ver além da escala cromática que a política percebe. Ao escritor, precisamente por causa do individualismo solitário de seu trabalho, pode acontecer explorar regiões que ninguém explorou antes, dentro de si ou fora; fazer descobertas que cedo ou tarde resultarão em campos essenciais para a consciência coletiva” (CALVINO, 2006, p. 345). O crítico cubano, conforme se observa, aposta na literatura como uma fresta, uma fissura, um espaço de escape, onde vozes silenciadas, sujeitos invisibilizados e apagados socialmente podem vir à existência. Calvino leva a literatura – e acrescentamos aqui as coisas das artes em geral – até a ultima consequência enquanto um gesto político-democrático. O que o Estado procura apagar quando não propõe estratégias de sobrevivência, o que as instituições sociais invisibilizam, o que os sujeitos detentores do poder (nas relações) desqualificam, subalternizam, hierarquizam, a literatura pode dar-lhe voz, servir-lhe de ouvido. O objeto artístico funciona, por assim dizer, como uma espécie de contradiscurso, aquele que subverte a demanda social hegemônica, problematiza conceitos cristalizados por demandas conservadoras, propõe outra política de afetos, desestabiliza determinadas convenções que prejudicam a democracia, como bem o faz uma Conceição Evaristo, um Marcelino Freire, uma Angélica Freitas, um João Anzanello Carrascoza, uma Natalia Borges Polesso, um Caio Fernando Abreu, uma Cassandra Rios, uma Elvira Vigna, um Bernardo Kucinski, e um grande etc. Por outro lado, os constructos artísticos – quando utilizados de forma equivocada – podem se ocupar de empreendimentos antidemocráticos, como há notícias de artistas e/ou intelectuais que apoiaram o nazismo, endossando a política de morte empreendida por Hilter. Quando a literatura é utilizada erroneamente, artistas contrários a essa prática são silenciados e a destruição da cultura das artes é empreendida. A arte, portanto, pode exercer práticas democráticas ou não, devendo a sociedade, mais especificamente a crítica especializada, empreender procedimentos de leituras que visem a esclarecer suas pretensões. A est(ética), então, que se propõe a conduzir o artefato artístico na esteira do pensamento democrático, posiciona-se veementemente contra a violência, o assédio, a injúria, a objeção, sobre qualquer corpo. A partir deste pensamento político acerca das coisas das artes, convidamos pesquisadoras e pesquisadores – que entendam o fazer artístico como um gesto democrático por excelência que pode lançar um facho de luz sobre a sociedade com o intuito de desbaratar qualquer pensamento e prática produtores de violência – para participar do simpósio “A est(ética) na literatura e outras linguagens artísticas como um gesto político para mitigar a violência”.
PALAVRAS-CHAVE: Literatura e corporeidade; Literatura e democracia; Políticas literárias.

A PERSISTÊNCIA DAS LITERATURAS 'FRANCÓFONAS' NO BRASIL: RESISTÊNCIA, ESTÉTICA E POLÍTICA
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: A PERSISTÊNCIA DAS LITERATURAS 'FRANCÓFONAS' NO BRASIL: RESISTÊNCIA, ESTÉTICA E POLÍTICA
COORDENADORES:
- Josilene Pinheiro-Mariz (Universidade Federal de Campina Grande)
- Dennys Silva-Reis (Universidade Federal do Acre)
RESUMO: Pensar em mundos “com-partilhados”, no âmbito das literaturas, leva-nos imediatamente a pensar nas worldliterature ou Weltliteratur, ou, com o olhar voltado para a língua francesa, vemos a littérature-monde [literatura-mundo]. Em qualquer uma das línguas, a noção de mundo está presente na literatura, expandindo-se para além da própria língua que nomeia o termo. Assim, neste simpósio, pretendemos acolher reflexões sobre essa “littérature-monde”, isto é, buscamos reunir pesquisas e discussões a respeito das literaturas escritas em língua francesa pelo mundo, seja ela oriunda de países em que o francês é língua materna, segunda ou língua administrativa, seja também acolhendo estudos sobre autores que não se encaixam em nenhum desses espaços supracitados, mas que fizeram a opção pela língua francesa como língua de escrita, tais como Julia Kristeva, nascida em Silven, na Bulgária ou o grego Vassilis Alexakis ou ainda a húngara Ágota Kristóf, que diz ser o francês, a sua língua de adoção e tantos outros autores e autoras russas, chinesas e de tantos outros espaços geográficos pelo mundo. Neste simpósio, portanto, propomos reflexões que revelem a obra literária de tais espaços como resultado de resistência em uma escrita poética e política, conforme se pode ler no conjunto da obra: dos martiniquenses Édouard Glissant e Frantz Fanon; dos congoleses Emmanuel Dongala, Sony Labou Tansi e Marie-Léontine Tsibinda ou o togolês Gustave Akakpo; das senegalesas Mariama Bâ e Aminata Sow Fall; das camaronesas Léonora Miano e Calixthe Beyala, das marfinenes Tanella Boni e Marguerite Abouet; dentre tantas outras obras. A produção literária das Américas na escrita de Patrick Chamoiseau, Raphaël Confiant, Simone Schwartz-Bart, Maryse Condé, Jacques-Stephen Alexis, Yanick Lahens revelam uma resistência semelhante à identificada nas obras de autoras e autores africano/as, tanto do Maghreb, Machreck, ao norte do deserto do Sahara, quanto da África subsaariana, ao sul do deserto, e nas Áfricas oceânicas. No que concerne à estética da obra literária de língua francesa na "littérature-monde", destacamos a poética do reunionês Boris Gamaleya e da guianesa, franco-brasileira Assunta Reneau Ferrer, a poeta Imasango, da Nova Caledônia ou ainda Louise Peltzer, na Polinésia Francesa e a mauriciana Ananada Devi e muitos outros autores belgas suíços, quebequenses e de todos os outros espaços de escrita em língua francesa. Evidentemente, estes nomes representam apenas uma pequena amostra da imensa produção de língua francesa pelo mundo. Nesta proposta de simpósio, os citados autores constituem-se em exemplos da diversidade poética da língua francesa pelo mundo, mas, revelam o quanto ainda há a ser explorado nos estudos das ditas "literaturas francófonas". Para além da polêmica em todo do termo francofonia, está no nosso foco discutir as ideias que subjazem no termo que está longe de ser unânime entre especialistas nesses estudos (OBERGÖKER, 2010). Portanto, o nosso objetivo é o de reunir estudioso/as das literaturas de língua francesa, dessas ditas "literaturas francófonas", a fim de compreender a arqueologia do texto literário francófono (ALLOUACHE, 2017), buscando também discutir a noção de francofonia a partir das obras de autores que escrevem em francês. Interessa-nos conhecer e “com-partilhar” estudos que revelem a persistência das literaturas “francófonas” no Brasil, acentuando, evidentemente, a problemática da língua do escritor, como nos lembra Maryse Condé: “Cada escritor cria sua língua. Não existe língua materna para um escritor, porque um escritor forja sua língua na medida que tem algo a dizer” (entrevista de CONDÉ a SIMASOTCHI-BRONES, 2013, p. 185). Ademais, Para Joubert (2006), escolha determinada para a escrita literária pode permitir aos escritores de se expressarem na língua francesa de um modo que não o fariam em outra língua. Assim, para este espaço, espera-se trabalhos que tratem de autores e obras escritas em francês que não pertençam ao Hexágono. Almeja-se reunir trabalhos que tragam estudos de autoria, teoria, epistemológico, metodológico, historiográfico e de política literária direcionada às ‘francofonias’. O intuito é mostrar a diversidade de olhares e a multiplicidade de perspectivas teóricas que as literaturas francófonas possuem na atualidade. Também serão muito bem-vindos os trabalhos comparatistas de literaturas francófonas com outras literaturas, bem como com outras linguagens, artes e mídias. Que este simpósio possa ser uma confluência de pesquisadores que estudam as literaturas escritas em língua francesa para além da França hexagonal.
PALAVRAS-CHAVE: F/francofonias, poética; política; língua francesa

DECOLONIALIDADE, MEMÓRIA E RESISTÊNCIA NA ESCRITA DE AUTORIA FEMININA
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: DECOLONIALIDADE, MEMÓRIA E RESISTÊNCIA NA ESCRITA DE AUTORIA FEMININA
COORDENADORES:
- Algemira de Macêdo Mendes (Universidade Estadual do Piauí e Universidade Estadual do Maranhão)
- geovana quinalha de oliveira (ufms)
- Lucilene Machado Garcia Arf (UFMS)
RESUMO: Este simpósio propõe congregar reflexões sobre a literatura de autoria feminina desde uma perspectiva política, ética e estética. Tomando como ponto de partida a crítica decolonial, busca-se discutir a dimensão do poder de dominação, exploração, violência e controle do sistema colonial/moderno/capitalista/patriarcal (Lugones 2020) instituído forçadamente nas sociedades do Sul global, especificamente na América latina, pelos colonizadores. Ao aprofundar as pesquisas de Aníbal Quijano em relação à colonialidade do poder/saber, Maria Lugones (2020) preconiza o que chamou de “sistema moderno colonial de gênero”. Sua proposta é agregar aos debates da teorização da lógica opressiva da modernidade colonial as mais diversas formas de opressão e de violência de gênero praticadas pela estrutura colonial. A partir desta percepção, a autora passa a problematizar a “colonialidade do gênero” no sentido de apreender os mecanismos de opressão exercidos pelo sistema colonial/moderno enquanto interação complexa de sistemas econômicos, racializantes e engendrados. Nesta direção, é possível pensar o Sul global enquanto paisagem colonializada na qual o agenciamento de gênero é um mecanismo fundamental para sua expansão. Isto porque a imposição de dicotomias hierárquicas de gênero configurou ficções estratégicas e elementos facilitadores de dominação social que resultaram, entre outros elementos, no apagamento da participação das mulheres no desenvolvimento dos processos de tomada de decisão política, social, artística e econômica. Por meio de uma releitura crítica do passado e de propostas de valoração de epistemologias outras, locais e pluriculturais, como sugerem Yuderkys Miñoso (2020), Julieta Paredes (2018), Ochy Curiel (2020), Françoise Vergès (2020), entre outras feministas, este simpósio espera reunir pesquisas que tratam criticamente dessas questões nas produções literárias de mulheres a partir de diferentes lugares de fala. Trata-se de pensar o modo como a escrita de autoria feminina rompe silêncios, preenche lacunas e, por extensão, reescreve a história constituída por colonizações, ditaduras, confrontos étnicos, exploração capitalista e relações hierárquicas/dicotômicas de gênero. Por esse viés, a literatura será aqui apreendida como um constructo cultural cuja potência é representativa do espaço e da voz conquistados ao longo do tempo, permitindo a constituição de novas subjetividades nos modos de ser e sentir em uma visão interseccional de categorias como as de classe, raça/etnia, lugar e gênero (Carla Akotirene, 2019). A escrita de mulheres promove, nesse sentido, projetos críticos mais conscientes de nossa condição e, consequentemente, das nossas especificidades de sujeitos colonizados pelo sistema capital/moderno/patriarcal. Estudar a literatura de mulheres é, certamente, uma forma de refletir sobre os dispositivos que regulam a recepção e a circulação de obras definindo quais merecem pertencer ou não ao cânone. Como afirma Adrienne Rich (2017), a literatura é um indício de como vivemos, como temos vivido, como nós, mulheres, temos sido levadas a nos imaginar e, sobretudo, como nossa linguagem tem nos aprisionado ou libertado. Por essa razão, podemos dizer que todas as questões apontadas até aqui atuam, inevitavelmente, como elementos de articulação em que a autoria feminina pode ser analisada como lugar de (des)encontro, deslocamento, diferença e resistência voltados para a compreensão dos procedimentos e das implicações políticas da produção discursiva e simbólica de elementos históricos, culturais, identitários e de alteridade. Como nos ensina bell hooks (2019), a tendência acadêmica de ressignificação radical dessas categorias abre espaço para produções que se enquadram na perspectiva da diferença. Como forma de combater a imposição do opressivo discurso eurocêntrico, o feminismo decolonial vem atuando em diversos campos como o político, o acadêmico, o social e o cultural. Essa perspectiva crítica que quer revolucionar as práticas cotidianas almeja uma sociedade que se atente para a valoração da diferença e das minorias, a exemplo dos corpos das mulheres, tomando como ponto de partida as muitas pluralidades que as compõem e que podem ser vistas na literatura de autoria feminina. Se a colonialidade de gênero é parte ativa da colonialidade do poder/saber, as autoras aqui citadas propõem a formação de um feminismo decolonial como forma de resistência à colonialidade de gênero a partir da valoração da diferença das localidades outras. Este movimento, no entanto, encontra imenso desafio quando busca desmontar a invenção do sistema colonial/moderno em silenciar as práticas políticas, econômicas, religiosas, culturais do sujeito colonizado, reduzindo-as a atribuições como seres primitivos, infantis, pecaminosos em suas ritualísticas e em suas relações sexuais. Esta problemática se complexifica em se tratando das mulheres, o que justifica a proposta de um feminismo decolonial. Na perspectiva exposta acima, esse simpósio busca, portanto, reunir trabalhos e pesquisas de diferentes reflexões críticas e teóricas e de múltiplas áreas do conhecimento que dialogam com memória, decolonialidade e resistência.
PALAVRAS-CHAVE: Autoria feminina; decolonialidade; memória e resistência.

ESCRITA E DESAPARECIMENTO
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: ESCRITA E DESAPARECIMENTO
COORDENADORES:
- Gabriela Lopes Vasconcellos de Andrade (Universidade Federal de Minas Gerais)
- Livia Laene Oliveira dos Santos Drummond (Universidade Federal da Bahia)
- Antonia Torreão Herrera (Universidade Federal da Bahia)
RESUMO: Desaparecer é um gesto que pode ser observado em inúmeras formas de expressão. Um gesto de revolta, pois nele está em jogo um ethos que é próprio ao humano. O gesto de desaparecer é o aniquilamento da (im)possibilidade: esgota-se o que não se realiza no possível. O corpo se esgota porque não aguenta o adestramento civilizatório, a mutilação biopolítica, o entorpecimento, a banalidade do cotidiano, o estado de exceção, a digitalização estética e a violência do capital. Para o escritor, encenar no espaço literário é, a um só tempo, uma tentativa paradoxal de desaparecer e de sobreviver. É uma forma de garantir sua sobrevivência, editando sua subjetividade. Jacques Derrida (1990) discorre criticamente sobre a questão da assinatura como um registro de uma intenção de autoria e permanência. Assinatura não é um mero registro ou uma marca gráfica, mas um testemunho, um arquivo que garante um tipo de enunciação – um nome que evoca um certo sentido estabelecido. Ela é um signo e está sujeito a indeterminação, instabilidade, mutabilidade e diferença. David Le Breton (2018) afirma que a individualização do sentido e a precarização da vida e da relação com os outros desperta a sensação de desmantelamento do sujeito. O sujeito múltiplo, que aciona mecanismos de socialização performática, alcança o niilismo pelo fracasso na própria ficcionalização de si para forjar a sua assinatura. Para o autor, o sentido de si está atrelado a como os outros percebem o projeto ficcional do sujeito. Assim, atua-se para caber nos palcos da vida e evitar o desejo de desaparecer, de desmantelar-se. No entanto, a precarização ocorre justamente pelo fato de a construção de sentido de si estar atrelada a percepção do outro. O sujeito, ao se ficcionalizar na busca precária de uma assinatura, faz um gesto parricida niilista: desaparecer de si. Uma forma de desaparecimento do autor é o uso de pseudônimos. Por que escrever sob pseudônimos? Tratar o pseudônimo apenas como disfarce autoral, como recurso que serve para proteger publicamente uma identidade, não atende às reflexões aqui propostas, pois, se até o século XVIII esses recursos eram utilizados com muita frequência e, na maioria das vezes, os autores “reais” jamais reivindicavam a autoria, era porque a ocultação e o disfarce serviam para proteger uma identidade nobre de uma imputação civil ou moral. Preferimos pensar o uso do pseudônimo como uma estratégia que dramatiza uma questão central: a fragmentação de um sujeito tido como uno, entendido enquanto entidade subjetiva. Essa fragmentação começa a partir do momento em que determinado escritor decide apagar o nome próprio, que assina a obra como marca identitária, criando para si outras identidades, esvaziadas de subjetividades previamente demarcadas. Assinar com pseudônimos coloca o escritor como uma personagem a mais na obra, evidenciando a condição de ambiguidade da assinatura. Nesse caso, o uso do pseudônimo esgarçaria uma das práticas comuns ao universo da escrita: colocar-se em jogo. O pseudônimo coloca em jogo não apenas a noção de autor, mas a “própria pessoa”, que no espaço textual se quer também personagem, e ainda questiona a autoridade da sua assinatura, pois, no nível mais evidente, constatamos que o nome que assina já não coincide plenamente com o nome daquele que escreve – um duplo desaparecimento. Ao lançar mão da estratégia pseudonímica, o escritor coloca em evidência um tema sempre revisitado na escrita: a dissolução do sujeito. O espaço literário é um dos mais profícuos para essa dissolução. Escrever sob pseudônimo desestabiliza o lugar de autoridade garantido ao autor pela assinatura do seu nome civil. No fazer literário, as autobiografias são falsas, as identidades maleáveis, as genealogias bastardas e o trânsito entre o tempo, o espaço e a vida são múltiplos, podendo assim ironizar a própria imagem de autoria que se tenta construir. Talvez a literatura, ainda que imbuída em todos os gestos de autoria necessários em um âmbito material, permita, em suas rupturas constantes, uma escrita de si que evoca o fantasma do desaparecimento para exorcizá-lo. Dessa vez não é uma corrente teórica tentando apagar o autor por ter olhado, no passado, para um excesso de presença, mas o escritor que forja um excesso de presença para morrer e desaparecer na ficção. Se o jogo da escrita é caracterizado pelo desaparecimento do sujeito que escreve, esse mesmo sujeito pode ser evocado, não mais enquanto indivíduo, mas como aquele que se recompõe no discurso.
PALAVRAS-CHAVE: Escrita; Assinatura; Desaparecimento; Corpo; Esgotado;

ESCRITAS E VIDAS CONTEMPORÂNEAS: INCURSÕES, AVALIAÇÕES E DESAFIOS AO COMPARATIVISMO
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: ESCRITAS E VIDAS CONTEMPORÂNEAS: INCURSÕES, AVALIAÇÕES E DESAFIOS AO COMPARATIVISMO
COORDENADORES:
- Adeítalo Manoel Pinho (Universidade Estadual de Feira de Santana)
- Maria de Fátima Gonçalves Lima (PUC-Goiás)
RESUMO: Esta proposta é a continuação de simpósio realizado nos Congressos Abralic de 2015, Belém- PA, a 2021, em Porto Alegre-RS. Dado êxito das apresentações e discussões naquelas oportunidades e por ser do âmbito do Projeto Procad/Capes PUC-Rio/UNEBSalvador/UEFS-Bahia/PUC-Goiás, consideramos esta proposta decisiva para as atividades do projeto. A continuação da proposta e realização do simpósio expressam a consolidação de um grupo de trabalho multi-institucional e em instância nacional. Para delinear os desafios presentes no título deste Simpósio, e aqui propostos para seguir como um convite instigador a pesquisadores interessados na atualidade das práticas culturais, artísticas e teórico-críticas, elegemos, no pequeno e exitoso ensaio de Giorgio Agamben, uma das postulações a O que é o contemporâneo: "Contemporâneo é aquele que mantém fixo o olhar no seu tempo, para nele perceber não as luzes, mas o escuro." A imagem potente de um "escuro" do tempo delineia metaforicamente a problemática a ser compartilhada pelos pesquisadores, em vertentes ou perspectivas compatíveis com seus objetos de investigação. Tal imagem se impõe quando se constata que, nas últimas décadas, na área dos estudos literários como nas ciências humanas, ocorreram alterações que reconfiguraram os pilares do território disciplinar, abalando o domínio de objetos previsto, o elenco de instrumentos, métodos e o corpo das proposições aceitas como horizonte teórico dos estudos de literatura, outras artes e da cultura. Tais alterações repercutiram predominantemente na diluição de fronteiras entre as disciplinas, na multiplicação inovadora das questões e temas de investigação plausíveis para cada uma delas e na ampliação dos instrumentos conceituais e técnicas que as singularizam. Em paralelo às alterações no plano epistemológico são expressivas também, nas últimas décadas, as alterações que ocorrem no âmbito da cultura e no campo artístico, especialmente no domínio do literário. No primeiro caso, a noção de "cultura" alargou-se, extrapolando a legitimidade que lhe atribuíram – igualmente, mas em circunstâncias diversas – o empreendimento civilizacional iluminista, o Estado nacional moderno e as elites cultas na alta modernidade estética, tornando a cultura e, principalmente, o valor cultural focos de instabilidade, conflito e disputa, por forças que saíram dos bastidores e passaram a disputar a significação cultural. Os dois eixos da significação e valor que atravessaram a área de Letras, afetando o âmbito dos estudos comparados: por um lado, problematiza-se a ligação mutuamente legitimadora entre literatura e nacionalidade, parte do processo de constituição dos estados modernos e matriz de toda a historiografia que por um século pautou os estudos da literatura; por outro, dá-se a contestação ao confinamento do valor cultural à esfera erudita, às artes canônicas e, consequentemente, à separação entre arte, cultura e o que pensadores como Edward Said e Stuart Hall designaram como a "mundanidade". Em grande parte, emanam deste cenário de mudanças epistemológicas e culturais o "escuro do tempo" ou os desafios do contemporâneo, que constituem o campo temático do debate aqui proposto, que deverá confrontar-se com o caráter intempestivo, insurgente da contemporaneidade, sistematizando e provendo instrumental teórico e crítico para lidar com as suas diversas dimensões ou concreções. O deslocamento ou a recusa de hierarquias instituídas tanto na dimensão epistemológica quanto na dimensão artísticocriativa geram a oportunidade para que estejam sob o foco deste Simpósio – como desafios que emergem das zonas de sombras do contemporâneo – as formas, expressões e domínios de experiência resistentes, tais como: (a) o corpo, em sua materialidade e enquanto superfície de inscrição e energia ético-estética; (b) os afetos, enquanto força disruptora a dar ensejo a outras formas de representação das vivências; (c) o comum e o cotidiano enquanto categorias transversais da cultura, a mobilizar uma rede de significados que remetem a espaços periféricos, tanto no cenário político e sociocultural quanto nos cenários textuais e artísticos; (d) a violência, a exclusão e a cidade como figurações do presente que convulsionam os limites da representação ao instaurarem, em diversas linguagens artísticas; (e) a lógica do testemunho, do biográfico e do documental, em flagrante desafio à compreensão estabilizada do que seria próprio do domínio ficcional. Ao acolher as perspectivas dos estudos de literatura e de outras linguagens artísticas, bem como dos estudos de produções, práticas e políticas da cultura, incorporando as dimensões de materialidade, de performatividade e de insurgência, próprias das estratégias criativas da atualidade, este Simpósio ambiciona empreender não apenas uma discussão estética e política que possibilite a acolhida analítica das forças e das formas artísticas e culturais do presente, mas – e principalmente – acentuar uma potência inovadora e transformadora que possa afetar práticas investigativas, formativas e educacionais na sociedade brasileira contemporânea.
PALAVRAS-CHAVE: Literatura. Contemporaneidade. História. Identidade. Memória. Multidisciplinaridade.

ESPAÇO E LUGAR NAS LITERATURAS AFRICANAS: NECESSÁRIAS CONTRIBUIÇÕES AOS ESTUDOS LITERÁRIOS
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: ESPAÇO E LUGAR NAS LITERATURAS AFRICANAS: NECESSÁRIAS CONTRIBUIÇÕES AOS ESTUDOS LITERÁRIOS
COORDENADORES:
- Janice Ines Nodari (UFPR)
- João Pedro Wizniewsky Amaral (UFCG)
- Mônica Stefani (UFSM)
RESUMO: Desde seu surgimento, os Estudos Pós-Coloniais possibilitaram uma verdadeira revolução na forma de lidar com a literatura e o mundo em que vivemos. A partir desse movimento teórico, tornou-se manifesta a necessidade de que vozes até então silenciadas (propositadamente ou não) começassem a ter a oportunidade de se expressar; o desafio maior na pós-modernidade é aferir se essas vozes estão conseguindo se manifestar. Ainda, ouvir o que elas têm a nos dizer acerca de suas experiências, de seu entorno, de sua compreensão do mundo é igualmente uma tarefa complexa. Movimentos sociais recentes, como o Black Lives Matter, a partir de acontecimentos no Hemisfério Norte, parecem ter reacendido a necessidade de revisitar atitudes e também cânones ao redor do mundo. O foco deste simpósio está em um continente que, apesar de muitos esforços, parece continuar sendo visto, de acordo com o autor queniano Binyavanga Wainaina em seu ensaio “How to Write About Africa” (2005), “como se fosse um país. [A África] É quente e poeirenta com pastagens ondulantes e imensos rebanhos de animais e pessoas altas, magras, que estão famintas. Ou é quente e úmida com pessoas muito baixas que comem primatas”. A África continua perseverando na luta por igualdade de condições e é possível entender a premiação de Abdulrazak Gurnah em 2021 com o Nobel de Literatura como um reconhecimento não só a Gurnah, mas a outros escritores africanos e escritoras africanas e suas escritas em diáspora, em exílio, suas práticas de autotradução e escrita de si como representativas de vivências que mudam o espaço e o transformam em lugar (TUAN, 2013, 2012), que revisitam a memória e a reescrevem de modo coletivo (CANDAU, 2008), e que deixam sua terra natal em direção à metrópole do Império Britânico ou ainda os Estados Unidos em busca de um espaço, em busca da possibilidade de poder (re)escrever a história que não é só sua. O que acontece nesse deslocamento e as impressões desses africanos em seu próprio espaço em comparação às impressões desses africanos (que mudam também conforme se deslocam) em um espaço novo (e na maioria das vezes inóspito e nada convidativo) são o que interessa aos críticos literários em suas análises dos personagens, por exemplo. Outro ponto importante é a necessidade de se prestar atenção às vozes que estão tratando de tópicos cruciais, como as relações humanas dentro desse espaço, justificando a importância cada vez maior dada a esse elemento estruturador de produções literárias e de sujeitos reais. Sendo assim, é possível afirmar que entre os inúmeros aspectos inerentes às Literaturas Africanas, em especial em relação às produções literárias escritas em países como Tanzânia, Quênia e África do Sul, o aparato teórico dos estudos pós-coloniais tem oferecido contribuições úteis e se mostrado um suporte valioso para diversas análises literárias, mas não é o único. Além dos estudos pós-coloniais, outra área de estudos que tem apresentado contribuições para uma maior conscientização acerca dos espaços e preservação do ambiente são os estudos Ecocríticos, uma vez que ampliam noções a respeito de territórios selvagens, espaços africanos, entre outros (GARRARD, 2006). Há ainda aspectos externos a esse âmbito da crítica encontrados no texto escrito na sua materialidade - principalmente o narrador e seu ponto de vista, os personagens, o espaço, o tempo - que se destacam. Enquanto componentes estruturais, esses aspectos também direcionam o leitor e os olhos do crítico para os elementos que não são apenas caros ao escritor: eles têm a capacidade de conectar escritor e leitor. Em vista disso, este simpósio tem como objetivo oportunizar a leitura e a análise de produções literárias africanas, sejam elas clássicas ou contemporâneas, colocando em prática a chamada “mente descolonizante”, termo cunhado pelo queniano Ng?g? wa Thiong’o em seu ensaio “Decolonising the Mind”, publicado em 1986. De lá para cá, muitas leituras e produções surgiram, e em meio a constantes transformações sociais, este simpósio acolherá trabalhos que busquem reconhecer as vozes que têm ajudado a compreender traços estruturantes de identidades e formas de expressão na África, independentemente da língua da obra escolhida como tópico para estudo (já que a África também possui como característica a pluralidade linguística). Deste modo, podemos visualizar como diferentes pontos de vista contribuem para a leitura e interpretação de diferentes textos literários produzidos em diferentes períodos de tempo e em diferentes espaços, de certo modo colocando este esforço junto aos demais que estão buscando a conscientização de que a África é muito mais do que a irônica descrição de Wainaina: um continente rico, que merece respeito. E esse respeito tão almejado só virá a partir do compartilhamento de conhecimento, que é o que este simpósio está buscando.
PALAVRAS-CHAVE: Literaturas Africanas; Descolonização; Pós-colonialismo; Espaço; Ecocrítica.

ESTRATÉGIAS DO FEMININO: LITERATURA ESCRITA POR MULHERES E RESISTÊNCIA
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: ESTRATÉGIAS DO FEMININO: LITERATURA ESCRITA POR MULHERES E RESISTÊNCIA
COORDENADORES:
- Laura Barbosa Campos (UERJ)
- Anna Faedrich (UFF)
- Silvina Carrizo (UFJF)
RESUMO: Pretende-se examinar a manifestação da resistência na literatura produzida por mulheres, de todas as épocas, das mais variadas nacionalidades, tendo em vista as diferentes formas de enfrentar as intempéries da trajetória intelectual e literária feminina. A ideia central é abrir espaço para o diálogo entre pesquisadores que investigam variadas autoras, cujas obras expressam traumas e/ou dificuldades de existir, enquanto escritoras e mulheres pensantes, em uma sociedade patriarcal e hostil. A repercussão da contribuição literária feminina ensejou reações de escritores – homens – que revelam os jogos de poder e suas implicações sobre a fortuna das carreiras de 62 mulheres no mundo das letras. Virgínia Woolf, em Um teto todo seu, anotou que a “indiferença do mundo, que Keats, Flaubert e outros homens geniais achavam tão difícil de suportar, não era, no caso d[a mulher], indiferença, mas hostilidade” (Woolf, 2014, p. 78). Sendo assim, interessa-nos o estudo dos mecanismos sociais de exclusão da literatura de autoria feminina do cânone literário e das histórias literárias brasileiras e estrangeiras, bem como as estratégias utilizadas pelas escritoras como enfrentamento dos espaços que lhe foram reservados – o doméstico e desvalorizado, para as mulheres; o público e prestigioso, para os homens. É possível identificar estratégias do feminino que se impõem como procedimentos evidentes para adentrar o meio – predominantemente masculino – das letras. Reedições dos romances, poemas e crônicas dessas autoras têm sido realizadas com intenção de facilitar o acesso aos leitores, já que muitas dessas obras se encontram em raras bibliotecas, em situações de deterioração, beirando ao desaparecimento. Uma vez aferidos os valores estéticos das obras de autoria feminina – que em termos literários não ficam aquém das escritas por homens – buscamos compreender os mecanismos sociais de exclusão das escritoras. Após anos de estudos – relembramos o trabalho das pesquisadoras e pesquisadores do Grupo de Trabalho (GT) Mulher e Literatura, que, desde os anos 1980, vêm contribuindo com os estudos literários, abrindo espaço para análise e consideração de obras escritas por mulheres –, está comprovado que se trata de uma exclusão por viés de gênero. Ao analisar a masculinidade como nobreza, em A dominação masculina, Bourdieu esclarece que “a definição de excelência está, em todos os aspectos, carregada de implicações masculinas” (Bourdieu, [1998] 2002, p. 78). O homem como dominante reconhece o seu modo particular de ser como universal. Um modo que, segundo tal perspectiva, uma mulher jamais atingirá. Ou melhor, um modo de ser que uma mulher jamais terá a chance de atingir. Sem chances de atingir a “nobreza” masculina, as escritoras são vítimas da sofisticação dos mecanismos de exclusão realizada – consciente ou inconscientemente – pelos historiadores e críticos literários, que perpetuam as mesmas listas de eleitos para figurar a História da Literatura. Naturaliza-se essa exclusão no ensino e nas histórias de literatura que alunas e alunos aprendem nas universidades, antes de se tornarem correias de transmissão das mesmas exclusões, nas ementas que organizam para o alunado também das escolas de formação pré-universitária. Este consenso e naturalização devem ser permanentemente questionados, tendo em vista que a relação do campo literário com a literatura de autoria feminina é socialmente construída. Nesse sentido, a produção das escritoras só pode ser devidamente compreendida quando se explicitam as expectativas sociais, em particular as expectativas de escritores homens sobre a escrita literária. Como postulou o sociólogo francês Émile Durkheim (1895), essas expectativas coletivas são usualmente tão naturalizadas que, como uma segunda natureza, sequer são percebidas, exceto 63 quando desafiadas ou quando se lhes tenta alterar o curso. Trata-se de uma coerção doce, porque sua força, embora se exerça de modo permanente, não se percebe. E, sendo coletiva, não é produto de vontades individuais, embora se manifeste nas ações de cada um. A luta da volição individual contra a expectativa do coletivo é desigual. O coletivo dispõe de recursos de coerção de toda sorte, quando vê a norma desafiada. Hoje desafiamos o que nos foi paulatinamente naturalizado, tornando possível a alteração do curso. Embora nosso objeto de estudo seja literário – literatura de autoria feminina –, e não interdisciplinar ou cultural, acredito ser possível dialogar com os estudos culturais, sem abrir mão da teoria literária e do exercício crítico. Se a história da literatura reproduziu seleções arbitrárias, por sua índole essencialmente falonarcísica e patriarcal, ela também é um instrumento para reconstruir narrativas em novas perspectivas. Tal reconstrução é um trabalho literário e político. O que se espera é que os trabalhos apresentados no Simpósio abordem questões voltadas tanto para a estética das obras escritas por mulheres, quanto para questões sociológicas pertinentes ao âmbito da teoria feminista para pensar a exclusão das escritoras – segundo uma visão falonarcísica e um princípio androcêntrico, para usar os termos de Bourdieu – e as estratégias do feminino no intuito de romper com a expectativa de gênero.
PALAVRAS-CHAVE: Escritoras; resistência; trauma; feminismo; cânone literário

LITERATURA E DISSONÂNCIA
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: LITERATURA E DISSONÂNCIA
COORDENADORES:
- André Dias (Universidade Federal Fluminense - UFF)
- Rauer Ribeiro Rodrigues (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS)
- Felipe Gonçalves Figueira (Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES)
RESUMO: A proposta do simpósio é examinar a manifestação da dissonância em diferentes obras literárias das mais variadas nacionalidades, com vistas a compreender o modo pelo qual alguns autores se constituíram, através dos discursos literários, como vozes questionadoras de seus tempos, sociedades e condições existenciais. A ideia central é abrir espaço para o diálogo entre pesquisadores que investigam variados autores, cujas obras expressam inquietações e questionamentos, tanto na esfera sociopolítica quanto na ideológica, na estética ou na existencial. O que se espera é que os trabalhos apresentados no âmbito do Simpósio Literatura e Dissonância discutam, entre outras questões, o problema teórico do intelectual frente às variadas ideologias, quer sejam elas hegemônicas ou não, e o problema histórico dos escritores diante do status quo, manifestado na esfera da política, dos costumes, da economia, da cultura, da tecnologia etc. Mikhail Bakhtin, falando sobre o grande tempo histórico e o trabalho dos escritores, chama atenção para o seguinte fato: “o próprio autor e os seus contemporâneos veem, conscientizam e avaliam antes de tudo aquilo que está mais próximo do seu dia de hoje. O autor é um prisioneiro de sua época, de sua atualidade. Os tempos posteriores o libertam dessa prisão, e os estudos literários têm a incumbência de ajudá-lo nessa libertação.” (BAKHTIN, 2003, p. 364). Sendo assim, ao abordarmos a temática Literatura e Dissonância, temos clareza de que todo autor, para o bem e para o mal, é antes de tudo um homem de seu tempo. Desse modo, aos que se ocupam da investigação literária cabe a tarefa de, dialogicamente, atualizarem os diversos discursos literários produzidos nos mais variados tempos e espaços históricos. Agindo assim, os estudiosos da literatura contribuirão para manter a vivacidade de distintos autores e obras. Sobre a criação romanesca, o pensador russo adverte que “o autor-artista pré-encontra a personagem já dada independentemente do seu ato puramente artístico, não pode gerar de si mesmo a personagem – esta não seria convincente” (BAKHTIN, 2003, 183-184). Em outras palavras, nenhuma personagem é fruto do gênio criador de um autor adâmico, pois a matéria de memória da literatura está no mundo social, local de onde os escritores extraem os motivos para criar. Dessa forma, as premissas bakhtinianas apresentadas aqui fundamentam o desenvolvimento das nossas reflexões e ajudam a ampliar os sentidos das análises. O fórum, observada a perspectiva da dissonância no campo dos estudos literários e do comparativismo, acata propostas que vão desde o enfoque do ensino da literatura, passando pela questão do trabalho crítico, até chegar à discussão teórica das experiências literárias e dos diálogos transdisciplinares. Seja no espaço das territorialidades, cujos limites se esvaem diante da instantaneidade das comunicações globais, seja no âmbito do regional esvaziado no mesmo diapasão, procura-se o dissonante na antiga ordem hierarquizada, no finado mundo bipolar ou no universo multilateral que se instaura. Há que se considerar, ainda, estudos comparativos entre autores que, mesmo distantes no tempo e no espaço, fixam a seu modo o questionamento de valores hegemônicos e não hegemônicos. Tais autores, independente se no âmbito da prosa ou da poesia, acabam por constituir uma aproximação literária mediada pelo estado de permanente inquietação. Entretanto, dialeticamente, a literatura, ao mesmo tempo que compartilha inquietações, estilhaça certezas e provoca os leitores. Nas palavras de Antoine Compagnon: “A literatura desconcerta, incomoda, desorienta, desnorteia, mais que os discursos filosófico, sociológico ou psicológico porque ela faz apelo às emoções e à empatia. Assim, ela percorre regiões da experiência que os outros discursos negligenciam, mas que a ficção reconhece em seus detalhes” (COMPAGNON, 2009, p.50). Nesse sentido, o discurso literário potencializa as noções de resistência, de estética e de política, na medida em que tais conceitos, mediados pelo trabalho literário, terão suas perspectivas matizada por diversas concepções de mundo, abrindo possibilidades dialógicas infinitas a todos que se ocupam da experiência literária. Do ponto de vista da historiografia literária, qualquer que seja o modo analítico proposto, os problemas se sucedem, pois os últimos anos têm sido de deslocamentos incessantes dos postulados teóricos. Tais deslocamentos transformaram em cada vez mais inglórios os embates com o mundo concreto, considerando a acelerada mutabilidade das circunstâncias sociais, políticas, históricas e das representações simbólicas, no âmbito das artes em geral e da literatura em particular. Assim sendo, no estudo da circulação e dos sentidos construídos a partir da literatura cabe, inclusive, questionar as significações do conceito de literariedade. Tal questionamento pode incorporar novas e dissonantes acepções ao termo, tanto na perspectiva dos cânones consagrados, quanto dos cânones emergentes. Levantar questionamentos, de preferência contundentes, e produzir conclusões, ainda que provisórias, é o que se espera com o presente Simpósio Temático, cuja sequência de participações na Abralic, sempre com intensa adesão dos colegas, indica a pertinência do debate proposto.
PALAVRAS-CHAVE: Literatura; Prosa; Poesia; Análise de discursos.

LITERATURA E TESTEMUNHO: TEORIAS, LIMITES, EXEMPLOS
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: LITERATURA E TESTEMUNHO: TEORIAS, LIMITES, EXEMPLOS
COORDENADORES:
- Wilberth Claython Ferreira Salgueiro (UFES / CNPq)
- Marcelo Paiva De Souza (UFPR / CNPQ)
- Marcelo Ferraz De Paula (UFG / CNPQ)
RESUMO: Contemporaneamente, a noção de testemunho vincula-se à chamada “literatura do Holocausto”, como a narrativa de Primo Levi e a poesia de Paul Celan, por exemplo, mas também à literatura eslava – polonesa e russa, em especial – sobre o Gulag, como as obras de Gustaw Herling-Grudzi?ski e Varlam Chalámov, entre outros. Na América Latina, destaca-se um amplo e variado conjunto de textos voltados à memória e à denúncia de fatos reveladores do viés autoritário, discriminatório e excludente de nossas sociedades, abrangendo desde Graciliano Ramos e Rigoberta Menchú a Ferréz, desde Miguel Barnet aos Racionais MC’s. A proposta do simpósio é estudar as relações entre literatura e testemunho, a partir de alguns traços e textos que caracterizam este “gênero”, como, por exemplo: registro em primeira pessoa; compromisso com a verdade e a lembrança; desejo de justiça; vontade de resistência; valor ético sobre o valor estético; representação de um evento coletivo; forte presença do trauma; vínculo estreito com a história; etc. A ideia é, portanto, “manter um conceito aberto da noção de testemunha: não só aquele que viveu um ‘martírio’ pode testemunhar” (SELIGMANN-SILVA, 2003, p. 68), entendendo, assim, que “testemunha também seria aquele que não vai embora, que consegue ouvir a narração insuportável do outro e que aceita que suas palavras levem adiante, como num revezamento, a história do outro” (GAGNEBIN, 2006, p. 57). Pensar o que há de testemunho na literatura significa, a um só tempo, pensar as intrincadíssimas teias entre verdade e ficção, entre ética e estética, entre história e forma. Percebe-se que a existência da “literatura de testemunho”, na sua salutar diversidade conceitual, promove um inevitável abalo na noção de cânone e de valor literário, além de alterar o quadro dos agentes ou produtores de literatura: textos e registros de presos, torturados, crianças de rua, favelados, empregados domésticos, prostitutas, sem-teto, povos tradicionais, enfim, todo um grupo “subalternizado” depõe e se expõe não só em nome próprio, mas também em nome de muitos. Nesse sentido, é preciso destacar que “o problema do valor do texto, da relevância da escrita, não se insere em um campo de autonomia da arte, mas é lançado no âmbito abrangente da discussão de direitos civis, em que a escrita é vista como enunciação posicionada em um campo social marcado por conflitos, em que a imagem da alteridade pode ser constantemente colocada em questão” (GINZBURG, 2012, p. 52). O Simpósio pretende reunir, em suma, pesquisadores interessados na problemática do testemunho e suas relações com o literário, apresentando [a] estudos teóricos que discutam os limites e as confluências entre estes discursos (o literário, tradicionalmente ligado à estética; e o testemunho, produzido a partir de um propósito primordialmente ético) e mormente [b] estudos que analisem obras específicas que exemplifiquem ou provoquem tais relações – quer obras já consagradas nesta perspectiva do testemunho, quer obras menos conhecidas ou mesmo não analisadas à luz do paradigma testemunhal. No XII Congresso Internacional da Abralic, ocorrido em 2011, em Curitiba, este Simpósio teve a sua primeira edição. Desde então mantém sua regularidade nos congressos da Abralic: teve a sua segunda edição em 2013, em Campina Grande; a terceira em 2015, em Belém; a quarta em 2017, no Rio de Janeiro; a quinta em Uberlândia, em 2018; a sexta em Brasília, em 2019; a sétima e a oitava edições em versão online nos anos 2020 e 2021. Nestes encontros, além de questões eminentemente teóricas, o debate envolveu nomes como Alan Pauls, Aleksander Henryk Laks & Tova Sender, Alex Polari, Ana Maria Gonçalves, Art Spiegelman, Bernardo Élis, Bernardo Kucinski, Boris Schnaiderman, Cacaso, Caio Fernando Abreu, Carlo Levi, Carlos Drummond de Andrade, Carolina Maria de Jesus, Clarice Lispector, Conceição Evaristo, Chico Buarque, Czes?aw Mi?osz, Davi Kopenawa & Bruce Albert, Eduardo Galeano, Eliane Potiguara, Elie Wiesel, Elisa Lucinda, Ferréz, Franz Kafka, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, João Antônio, Kaka Werá Jecupé, Lara de Lemos, Lídia Tchukóvskaia, Lima Barreto, Luis Fernando Verissimo, Luiz Alberto Mendes, Manuel Alegre, Mario Benedetti, Miron Bia?oszewski, Noemi Jaffe, Paulo Ferraz, Paulo Leminski, Paulo Lins, Pedro Tierra, Pierre Seel, Primo Levi, Racionais MC’s, Reinaldo Arenas, Renato Tapajós, Ricardo Aleixo, Ricardo Piglia, Roberto Bolaño, Ruth Klüger, Sérgio Sampaio, Sérgio Vaz, Stefan Otwinowski, Svetlana Aleksiévitch, Tadeus Ró?ewicz, Ungulani Ba Ka, W?adys?aw Szlengel e W. G. Sebald. Nessa 9ª. edição do Simpósio, a ideia é estender o debate, seja em relação a estes nomes, como, naturalmente, incorporar outros autores e textos em que o problema da literatura e do testemunho se deixe perquirir. REFERÊNCIAS: GAGNEBIN, Jeanne Marie. Memória, história, testemunho. Lembrar, escrever, esquecer. São Paulo: Ed. 34, 2006, p. 49-57. GINZBURG, Jaime. Linguagem e trauma na escrita do testemunho. Crítica em tempos de violência. São Paulo: Edusp, Fapesp, 2012, p. 52. SELIGMANN-SILVA, Márcio. Apresentação da questão. História, memória, literatura: o testemunho na era das catástrofes. Org.: Márcio Seligmann-Silva. Campinas: Editora da Unicamp, 2003. p. 59-88.
PALAVRAS-CHAVE: Testemunho. Literatura. História. Memória. Trauma.

MACHADO DE ASSIS: ARTICULAÇÃO ENTRE REFLEXÃO ESTÉTICA E CRÍTICA SOCIAL
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: MACHADO DE ASSIS: ARTICULAÇÃO ENTRE REFLEXÃO ESTÉTICA E CRÍTICA SOCIAL
COORDENADORES:
- Juracy Ignez Assmann Saraiva (Universidade Feevale)
- Marinês Andrea Kunz (Universidade Federal da Paraíba)
RESUMO: A literatura é um mundo compartilhado desde o processo criativo que dá forma aos textos até sua recepção pelo ato de leitura, estendendo-se, entre esses dois momentos, a rede de produção e de comercialização, às quais sucede o dinamismo da crítica. As manifestações artísticas traduzem relações entre o que nelas está expresso e a realidade, e esse processo mimético, que não se constitui a partir da reprodução exata do real, traz em si o diálogo do artista com o mundo exterior, com sua interioridade e com a tradição estética precedente. Nesse sentido, a ação de representar pressupõe depreender como se dá o agir humano, como ele pode ser configurado por meio da linguagem, que, para tanto, institui significações, retoma símbolos e confere conexões temporais aos acontecimentos. Desenha-se, assim, a troca entre um saber estabelecido e aquele que se concretiza no ato de criação, visto que o produto daí resultante, por situar-se no terreno das experiências, do intangível e do desconhecido, assume um caráter sedutor, exigindo a cumplicidade do destinatário. Esse, pela mediação simbólica da linguagem, relaciona o objeto esteticamente configurado com situações reais, estabelecendo um percurso em que se entrelaçam o mundo do texto e seu próprio mundo. Assim, tanto no ato de produção do texto quanto no de sua recepção há o compartilhamento do fazer artístico e, no universo representado, expõem-se percepções, crenças, valores, que podem abalar as convicções do receptor, liberá-lo de um estado de opressão ou atender sua busca de conhecimento sobre a própria humanidade. Portanto, partindo do princípio de que o texto literário não é autotélico em sua concepção, tampouco destituído de finalidade, este simpósio propõe a análise e a discussão da ficção de Machado de Assis. Ambas revelam dois aspectos fundamentais: por um lado, compõem um jogo de espelhos, no qual o objeto representado e sua representação compelem o leitor a assumir um posicionamento crítico-interpretativo sobre o contexto; por outro, instalam a reflexão sobre a arte em geral e sobre a literatura em particular, que é concebida como parte de um sistema artístico, para o qual convergem outras formas de expressão. Em relação ao primeiro aspecto, estabelece-se uma tensão entre a realidade, vicariamente instituída, e o posicionamento do autor, acusado de omissão quanto aos problemas sociais, em particular quanto ao da escravidão, o qual, exatamente por ser omitido, ganha uma relevância inquestionável, obrigando o leitor a buscar respostas para essa lacuna na representação do contexto. Em relação ao segundo, as narrativas de Machado instituem reflexões autorreferenciais e elos intertextuais, instituindo um espaço metaficcional por meio de comentários sobre o ato de escrita e de referências que vinculam a significação do texto a obras da tradição literária ou da cultura do século XIX. Esse procedimento exige que o leitor integre, ao exercício de interpretação, reflexões sobre a urdidura do texto e sobre o campo da arte, aspectos que esclarecem a poética de Machado de Assis. Paralelamente, referendando a natureza dialógica e/ou polifônica da linguagem, o simpósio abre espaço para os estudos da crônica machadiana, vista como veículo de observação e avaliação da sociedade brasileira, e estende a discussão às produções dramáticas, aos poemas e aos textos críticos que traduzem, assim como as demais produções de Machado, elementos do contexto estético-histórico-cultural. Nesse, avulta, por sua vez, o estatuto de mercadoria da obra literária e a mercantilização da cultura, fenômeno que assinala a importância das relações do escritor com os jornais, como veículos de divulgação de sua obra, e com as instâncias editoriais, particularmente, com a editora Garnier. Na abrangência de seus enfoques, o simpósio “Machado de Assis: articulação entre reflexão estética e crítica social” visa a discutir o posicionamento crítico de Machado de Assis tanto em relação à sociedade brasileira quanto em relação ao fazer artístico. Nesse sentido, propõe salientar aspectos conjunturais, estéticos e políticos de suas obras, cuja neutralidade é recusada pela natureza ideológica da linguagem. A pluralidade de enfoques possíveis possibilita que sejam elucidados, nos corpora selecionados para análise, reflexões que demonstram que Machado de Assis se situa frente a seu tempo, transformando a palavra em revelação e denúncia e, também, em resistência contra atos desumanos. A partir desse eixo central, as comunicações podem optar, como corpus de análise, pelo romance, pelo conto, pelo teatro, pela poesia, pela crônica, pela crítica, pela ensaística. Em síntese, o simpósio tem o objetivo de contribuir para a divulgação de estudos que exploram a obra de Machado de Assis e/ou aplicam conhecimentos sobre ela no âmbito acadêmico e no sistema educacional brasileiro, no qual a leitura de textos machadianos e sua discussão é um investimento na cultura brasileira.
PALAVRAS-CHAVE: Machado de Assis; Mimese; Ficção; História; Dramaturgia; Poética; Crítica.

MANIFESTAÇÕES DE RESISTÊNCIA NA LITERATURA SUL-AMERICANA CONTEMPORÂNEA: PODER, HISTÓRIA, MEMÓRIA
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: MANIFESTAÇÕES DE RESISTÊNCIA NA LITERATURA SUL-AMERICANA CONTEMPORÂNEA: PODER, HISTÓRIA, MEMÓRIA
COORDENADORES:
- Renata Rocha Ribeiro (Universidade Federal de Goiás - UFG)
- Luciana Paiva Coronel (Universidade Federal do Rio Grande - FURG)
- Gínia Maria Gomes (Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS)
RESUMO: A literatura contemporânea passa por uma espécie de processo revisional no que tange a questões históricas. São inúmeras as obras literárias que têm se dedicado a revisitar capítulos da história recente e, de forma bastante recorrente, os horrores vivenciados pela humanidade no século XX. O contexto sul-americano passou por tais horrores nos períodos em que Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile se viram subjugados a regimes ditatoriais. Logo, é premissa básica deste simpósio a promoção do diálogo entre a literatura contemporânea e a violência de Estado que marcou as ditaduras sul-americanas, em consonância com a herança traumática dos processos de colonização e escravidão vivenciados no continente. Marianne Hirsch, em The generation of postmemory (2012), questiona fatos históricos traumáticos acontecidos no século passado, na tentativa de propor uma autocrítica da geração posterior em relação ao que foi vivido pelos antepassados. A autora instiga uma reflexão sobre como lidar com as catástrofes mais recentes sem desrespeitar aqueles que as vivenciaram, além de questionar como a humanidade hoje está implicada em consequências de crimes dos quais não foi, diretamente, vítima. Mesmo partindo do pressuposto de que o contexto a que Hirsh se refere mais diretamente ser o da Shoah, algumas aproximações têm sido feitas entre este evento histórico e as ditaduras sul-americanas, exatamente pelo fato de serem produtos de regimes autoritários e por transformarem as sociedades perpassadas pelo trauma social. Segundo a ótica de Renato Janine Ribeiro, em “A dor e a injustiça” (1999), o contexto sul-americano passou por dois traumas formativos: a colonização, que quase dizimou os povos originários, e a escravidão, prolongada após os processos de independência como chaga que estende a violência colonial. Somos, portanto, herdeiros de um processo de formação social extremamente violento, com consequências que nos alcançam ainda hoje. Desse modo, o conceito de pós-memória tem ultrapassado a experiência dos judeus. A título de exemplo, podemos citar Amalia Ran, no artigo “Nuestra Shoa?: Dictaduras, Holocausto y represio?n en tres novelas judeorioplatenses” (2009), que realiza uma aproximação entre a Shoah e a ditadura argentina: “[...] ao usar a iconografia judaica e preparar o terreno intelectual e artístico, um lugar de memória é criado, um lugar que proponha, ao invés de uma versão utópica da origem, uma narração que reconheça as injustiças do passado violento e as demandas da recordação” (RAN, 2009, p. 18, tradução nossa). No Brasil, Cristiano Paixão e Giovanna Frisso, em “Usos da memória: as experiências do Holocausto e da ditadura do Brasil” (2016), consideram ser relevante partir da memória traumática do Holocausto para que possamos, em nossa realidade, refletir sobre os nossos próprios traumas. Para além do conceito de Hirsch que, como já advertido, diz respeito a um evento específico mas tem sido de alguma forma apropriado por outros contextos, além de ser questionado por uma autora como Beatriz Sarlo (Tiempo pasado, 2005), é importante (re)pensar a memória do trauma ditatorial por outras vias teórico-críticas. Nesse sentido, Jeanne Marie Gagnebin, em Lembrar escrever esquecer (2009, p. 55), amparada por Walter Benjamin, considera que a “rememoração também significa uma atenção precisa ao presente, em particular a estas estranhas ressurgências do passado no presente, pois não se trata somente de não se esquecer do passado, mas também de agir sobre o presente.” Assim, voltando nossa mirada para a literatura sul-americana produzida a partir das e sobre as ditaduras, entendemo-las como uma forma de reelaboração do passado (nos termos de Joël Candau em Memória e identidade), mas também como uma tentativa de tensionar o presente, de fazer com os que hoje vivem não esqueçam e, ainda mais importante, não admitam que este passado ressurja. É relevante também destacar o entendimento de Elizabeth Jelin, em Los trabajos de la memoria (2002, p. 9, tradução nossa), acerca da cultura da memória no mundo ocidental contemporâneo: “As pessoas, os grupos familiares, as comunidades e as nações narram seus passados, para si mesmos e para outros e outras, que parecem estar dispostas/os a visitar esses passados, a escutar e olhar seus ícones e rastros, a perguntar e indagar. Esta ‘cultura da memória’ é em parte uma resposta ou reação à mudança ra?pida e a uma vida sem ancoramentos ou raízes. A memória apresenta então um papel altamente significativo, como mecanismo cultural para fortalecer o sentido de pertencimento a grupos ou comunidades”. Reverberar, por meio das discussões tanto no âmbito acadêmico quanto externas a ele, obras literárias que propõem essa visita ao passado ditatorial sul-americano, a estas memórias tão incômodas quanto incontornáveis, é um modo de nos fazer entender como povos, nações, sociedades, bem como intervir em momentos de alerta. A partir destas e de outras discussões correlatas, é objetivo deste simpósio receber colaborações que, como já mencionado, tratem de relações entre o autoritarismo, a violência de Estado no âmbito latino-americano e suas respectivas literaturas, seja em chave comparatista ou não.
PALAVRAS-CHAVE: literatura contemporânea; literatura sul-americana; ditadura; poder; memória; transmissão

NARRATIVAS DE EXCLUSÃO: IMAGINÁRIO E REPRESENTAÇÕES
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: NARRATIVAS DE EXCLUSÃO: IMAGINÁRIO E REPRESENTAÇÕES
COORDENADORES:
- Denise Dias (IF Goiano/Amazonas)
- Lícia Soares de Souza (Universidade Estadual da Bahia)
RESUMO: O simpósio “Narrativas de exclusão: imaginário e representações” busca congregar pesquisadores e trabalhos que analisem os caminhos trilhados na avaliação do literário e suas representações na interface do testemunho do caos social demonstrando as condições precárias de vida, como “zonas de inimizade” de um estado neoliberal que pouco se preocupa com o bem-estar de seus cidadãos. O ensaio Necropolítica, publicado no Brasil pela Editora N-1 Edições em 2018, aponta como o “estado de exceção e a relação de inimizade” tornaram-se a base normativa do direito de matar, e como o poder apela à exceção, à emergência e à uma noção ficcional do inimigo para justificar o extermínio de outrem. O pensamento de Mbembe se inspira na noção de ”biopoder” de Foucault e dos conceitos de Agambem de “estado de exceção e estado de sítio”. Mbembe vai, entretanto mais longe, ao explicar as várias maneiras pelas quais os estados desenvolvem interesses de destruição máxima e a criação de “mundos de morte”. Essas maneiras são formas novas e únicas da existência social, nas quais vários grupos sociais são submetidos a condições de vida precária que lhes confere o status de “mortos-vivos”. No âmbito da Estética da Exclusão, muitas listas desfilaram pela Internet com livros e filmes que espelharam pandemias e moléstias anteriores e que debateram igualmente a formação do gênero da distopia na contemporaneidade. Esses não estariam mais ligados apenas à ficção científica, mas refletiria a desorganização dos valores humanos e sociais, no âmbito dos estados neoliberais. Entre as obras mais discutidas, encontram-se A peste (1947) de Albert Camus, Ensaio sobre a cegueira (1995) de José Saramago e Morte em Veneza (1912) de Thomas Mann. A peste é um livro emblemático, cuja simbologia remete à Europa sitiada pelos nazistas. A peste se torna metáfora para todas as formas de opressão e de resistência que, de tempos em tempos, surgem para a infelicidade e o ensinamento da humanidade. O período da quarentena é tratado com um debate existencial sobre a capacidade das pessoas passarem tanto tempo isoladas, separadas de seus entes queridos, em um mundo distópico em que as memórias individuais funcionam muito mais como vetores de desintegração de cada “ser” do que como catalisadoras de vidas harmônicas. No final, Camus lança sua grande provocação existencial: aquela pandemia termina, mas os ratos são levados para uma terra feliz, podendo retornar a qualquer momento. Na verdade, todas as precariedades da pequena Orã, cidade da Argélia natal de Camus, para fazer frente a um flagelo são reveladas, mas, uma vez a peste terminada, não são discutidas políticas públicas de melhoria da sociedade que fica vulnerável a um retorno dos ratos. Atentando para essas circunstâncias propicias para a investigação sistematizada de relações literárias, no entrecruzamento do horror das epidemias e do humano, busca-se proceder ao levantamento e à análise de obras produzidas no século XX e XXI, as quais ilustraram situações distópicas de enfrentamento de epidemias e enfermidades nefastas para a sociedade. Nesse sentido, no entre-lugar dos centros urbanos organizados e das periferias negligenciadas pelos poderes públicos (favelas, trapiches, lazaretos, asilos, cárceres, matas, metrôs, etc.) quer-se mapear, analisar e classificar, de acordo com as diferentes estratégias que determinam, de um lado, a crítica da razão da exclusão, em situação transtextual e transacional, e, de outro lado, as mobilidades nos espaços semiosféricos que permitem a ultrapassagem das zonas necropolíticas para as zonas do discurso oficial. A crise da Covid-19 propiciou o escancaramento do projeto neoliberal de aniquilamento das populações em situação de vulnerabilidade social, tais como: negros, indígenas, migrantes, trabalhadores informais, etc. Assim, vislumbra-se proceder a uma discussão em torno da dimensão limítrofe entre vida e morte, explicitando a necropolítica, o qual afere que o Estado tem o poder de decidir quem morre e quem vive, a depender de como as políticas públicas vigoram no meio social. O método utilizado para a investigação, toma por base os textos teóricos dos filósofos Michel Foucault, Giorgio Agamben e Achille Mbembe. Além de Ginzburg, Sontag, Candido, Arendt, Han, Perlman, Silverman O Simpósio reunirá pesquisas que tomam por objeto trabalhos que se debrucem sobre a estética da exclusão social, problematizando comportamentos sociais. No campo da literatura mais especificamente obras que reverberam sobre doenças e suas consequências coletivas, sugerindo reflexões sobre sistemas de metáfora da exclusão das doenças; de sinais que prenunciam pragas; de ascensão de discursos nacionalistas e xenofóbicos de formas de preconceito; de gestão governamental em situações de crise sanitária e toda forma que de estética da necropolítica. Esta é a Crítica da Razão de Exclusão que pretendemos sistematizar com a análise do presente simpósio.
PALAVRAS-CHAVE: Biopoder; Educação; Exclusão; Literatura Comparada; Necropolítica.

NORTE/AMAZÔNIA NA GEOGRAFIA MUNDIAL DA BARBÁRIE: LITERATURA SOBRE A RESISTÊNCIA E O TESTEMUNHO NA REGIÃO
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: NORTE/AMAZÔNIA NA GEOGRAFIA MUNDIAL DA BARBÁRIE: LITERATURA SOBRE A RESISTÊNCIA E O TESTEMUNHO NA REGIÃO
COORDENADORES:
- Abilio Pachêco de Souza (UNIFESSPA)
- Luiza Helena Oliveira da Silva (UFNT)
RESUMO: Este simpósio propõe reunir trabalhos que versam sobre a produção literária de cunho testemunhal e/ou ficcional relativa à ditadura na região Norte do país. Parte do pressuposto de que os regimes de exceção (autoritários e totalitários) que lançam suas bases nos centros de poder político não deixam de estender seus tentáculos nos mais variados espaços fora de centro, periféricos, marginais, urbanos ou não. Esses espaços, cujas luzes do interesse público, cujo foco de atenção da imprensa e cuja atenção por parte dos historiadores é minguada, costumam sofrer primeiro sob o coturno, depois sob o insulamento, o desconhecimento e o silenciamento. Na mesma direção, a produção literária também parece privilegiar acontecimentos do centro. Isso pode se dar por razões que ainda envolvem a própria condição dos sujeitos da periferia longe do status de autores de suas narrativas de luta e resistência, ou ainda por efeito da intimidação e cerceamento, na medida em que atores vinculados a regimes ditatoriais continuam atuando na região, em alguns casos inclusive com papel político de destaque, como se dá, no caso da Guerrilha do Araguaia, com relação ao Major Curió. Aqueles e aquelas que resistem e testemunham o fazem a partir desta dupla condição. Há ainda o prestígio conferido de modo desigual a autores situados em diferentes pontos do território e as dificuldades de divulgação de produções literárias de autores periféricos. Apesar disso, encontram-se trabalhos que se valem do testemunho, que pretendemos aqui privilegiar. O momento é ocluso e a guerra que vem depois (PEIXOTO, 2014) parece nunca acabar para quem a vive/u e parece nunca ter existido para quem está alhures. O testemunho é necessário como tarefa de memória para lermos também estes espaços como integrantes de uma "geografia mundial da barbárie" (DE MARCO, 2002), considerando, inclusive, as especificidades dessas regiões, como afirmou Paulo Fonteles Filho (Paulinho) sobre o papel da Comissão da Verdade do Pará no contexto da Comissão Nacional da Verdade e das demais Comissões Estaduais (2014). Os problemas da região também se baseiam no obscurantismo, na impunidade, nos crimes de pistolagem, no trabalho escravo e nos processos de silenciamento/s. A região Norte/Amazônia Brasileira foi palco e cenário dos mais diversos episódios de violência (institucional, física e simbólica) desde a colonização, passando pelo Império e pela República, bem como no século dos extremos, como assim chamou Hobsbawm. Os tentáculos violentos do poder político continuam presentes na região Norte/Amazônia. Seja por conta de um passado que não passa, seja por conta dos mais variados processos de silenciamento (talvez por isso, os principais textos narrativos sobre a Guerrilha do Araguaia foram escritos por pessoas residentes em outras regiões do país.). Nesta região, tal como em muitos outras partes do Brasil, assistimos a perseguição, tortura e morte de opositores, violência contra povos tradicionais, emprego da força e outros expedientes contra colonos, campesinos e militantes. Apesar do desequilíbrio de forças houve também luta e resistência. Nesse sentido, destacam-se movimentos organizados contra o regime, como as “Forças Guerrilheiras do Araguaia” (FONTELES FILHO, 2013) e as comunidades quilombolas em Oriximiná (AZEVEDO; CASTRO, 1998), além de outros “processos de resistência na Amazônia” apontados por Sacramento (2015) durante o período da ditadura. Além disso, sucederam-se também grupos, associações e comissões nos anos seguintes. Nas artes em geral, e na literatura em particular, muitas foram as vozes de homens e mulheres que se colocaram contra o estado de coisas, colocando em risco a própria segurança pessoal e suas integridades física e moral. Na poesia, Thiago de Mello (AM), Paes Loureiro e Paranatinga Barata (PA) e Ferreira Gullar (MA); na prosa, Benedicto Monteiro e Eneida de Moraes, são alguns dos nomes proeminentes deste que tiveram também algum reconhecimento nacional. Somam-se a estes outras vozes contemporâneas que integram a resistência estética e ideológica seja na luta pela memória política dos estados de exceção: Alfredo Garcia, Ana Diniz, Janailson Macedo, Liniane Haag Brum, Pedro Tierra, Wanda Monteiro; seja por pautas emancipatórias e afirmativas: Márcia Kambeba, Monique Malcher, Eleazar Venâncio Carrias, Marcos Samuel da Costa, para citarmos apenas alguns. Há ainda o caso de Milton Hatoum (AM), cuja narrativa em trilogia de publicação recente - ainda sem o último volume - a trata da ditadura no eixo Brasília-São Paulo-Paris. Frente a todas as questões acima, este simpósio acolherá trabalhos cujo corpus sejam obras literárias ou artísticas de resistência e/ou de teor testemunhal criadas por autores e autoras da região ou mesmo produções estéticas de autores de outras regiões cujo enfoque seja a região Norte/Amazônia, compreendendo como tal o que se designa como Amazônia Legal.
PALAVRAS-CHAVE: literatura do Norte; literatura da Amazônia; resistência; testemunho

O CONTO CONTEMPORÂNEO NA LITERATURA BRASILEIRA
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: O CONTO CONTEMPORÂNEO NA LITERATURA BRASILEIRA
COORDENADORES:
- Gislei Martins De Souza Oliveira (IFMT)
- Claudia Vanessa Bergamini (UFAC)
- Vanderluce Moreira Machado Oliveira (IFMT)
RESUMO: O simpósio agregará comunicações que proponham uma interpretação do conto na literatura contemporânea brasileira, levando em consideração as mais diversas projeções e estratégias que revelam o aperfeiçoamento da escrita do gênero. Desde os primeiros estudos sobre a terminologia do conto, conforme orienta Nádia Battella Gotlib (1990), observa-se a tendência de diferenciá-lo do romance, o qual teria uma forma mais longa e tradicional, sendo que apenas no século XIX surge a acepção short story, a fim de designar uma narrativa curta com características específicas e independentes. A diversidade e dinâmica de procedimentos estéticos utilizados na construção do conto têm relações estreitas quanto ao funcionamento da estrutura romanesca e, assim, torna-se salutar o estudo dos efeitos produzidos por cada gênero em suas singularidades. A autora ainda faz um percurso diacrônico que esboça o debate acerca da teoria do conto, seguindo uma linhagem variada de autores, a saber: Edgar Allan Poe, Júlio Cortázar, Horacio Quiroga, passando também por Charles Perrault, André Jolles, Boris Eikhenbaum, Olivier Henry, bem como Mário de Andrade, Machado de Assis, dentre outros. Sendo assim, é possível observar os vários empreendimentos teóricos e literários os quais permitiram que essa forma breve alçasse um patamar privilegiado no rol da literatura ocidental. Ricardo Piglia (1990), por exemplo, traz luz a autores como Franz Kafka e Jorge Luis Borges, seguindo o argumento de que o conto moderno constitui uma narrativa composta por duas histórias, uma superficial e outra secreta, que encaminham o desfecho para uma revelação. Paradoxalmente, configura-se uma tensão entre as duas histórias, fazendo que dessa lógica narrativa antagônica aflore correlações surpreendentes: “Há algo no final que estava na origem, e a arte de narrar consiste em postergá-lo, mantê-lo em segredo, até revelá-lo quando ninguém o espera.” (PIGLIA, 1990, p.106). Percebe-se que o conto deixa de ser algo engessado a um paradigma conceitual quando é apreendido em seus diversos efeitos de sentido que sugerem, como afirma Piglia, sua natureza fragmentária e elíptica. Interessa ainda ressaltar a denúncia feita por Júlio Cortázar (2006, p. 149) quanto à primazia do romance: “De qualquer modo, enquanto os críticos continuam acumulando teorias e mantendo exasperadas polêmicas acerca do romance, quase ninguém se interessa pela problemática do conto.” Outro elemento entra em cena quanto à abordagem do conto e corresponde ao tempo da leitura em relação à demanda de cada gênero. O romance, devido a sua extensão, é lido com interrupções e pausas que estão em conformidade com o ritmo imposto pela sua composição, enquanto o conto, em decorrência de sua brevidade, pode ser apreciado em uma só “assentada”, como diria Poe (apud GOTLIB, 1990). De modo analógico, o intelectual argentino relaciona o romance com o cinema na tentativa de mostrar que ambos têm uma “ordem aberta” e, ainda, o conto com a fotografia, tendo em vista o foco limitado à perspectiva estética do fotógrafo, ou melhor, a um fragmento da realidade. Ao capturar a “fugacidade na permanência”, cabe ao conto apresentar um enredo capaz de prender a atenção do leitor e de convencê-lo a persistir com a leitura. Quanto à projeção do conto contemporâneo na literatura brasileira, Karl Erik Schøllhammer (2004) destaca a fragmentação e a procura por novas formas de experiência narrativa como recursos estéticos que transgridem ao mesmo tempo que dialogam com a escrita tradicional do gênero. Desse modo, o conto adquire novas roupagens quando introduz uma maior dinâmica no processo de criação literária. O autor delineia que a literatura contemporânea apenas representa o mundo atual por meio de uma inadequação e/ou “[...] uma estranheza histórica que a faz perceber as zonas marginais e obscuras do presente, que se afastam de sua lógica.” (2011, p. 10). Escritores, como Luiz Ruffato e Marcelino Freire, exemplificam a nova vertente para se refletir sobre a produção de narrativas curtas no Brasil, pois, segundo Schøllhammer, retratam a realidade pelo ponto de vista dos que estão às margens do sistema social. Além disso, outros traços como a metaficção e a escrita de si demonstram que a realidade trazida pela literatura atual não se trata de um realismo tradicional e ingênuo. Nesse cenário múltiplo pelo qual o conto contemporâneo circula, a própria definição do que é contemporâneo é – quase – impalpável, remete ao que há de mais vanguardista, àquilo que suscita o sabor da atualidade e, portanto, permite o diálogo imediato entre o tempo presente e a narrativa de linguagem híbrida, aberta, simbólica, cujos traços carecem de debates e estudos que busquem, no mínimo, a compreendê-los.
PALAVRAS-CHAVE: CONTO; DINAMICIDADE; REAL; CONTEMPORANEIDADE.

O DISCURSO LITERÁRIO COMO COMPARTILHAMENTO E RESISTÊNCIA: AS MALHAS ESTÉTICO-POLÍTICAS DA LITERATURA
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: O DISCURSO LITERÁRIO COMO COMPARTILHAMENTO E RESISTÊNCIA: AS MALHAS ESTÉTICO-POLÍTICAS DA LITERATURA
COORDENADORES:
- Evaldo Balbino da Silva (Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG))
- Leni Nobre de Oliveira (Centro Federal Tecnológico de Minas Gerais (CEFET – MG))
- Tereza Ramos de Carvalho (Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT/CUA))
RESUMO: Este simpósio busca abarcar leituras críticas de discursos literários que neles verifiquem elementos de resistência, em termos “políticos” no amplo sentido desta expressão adjetiva. O discurso literário, em sua forma construída por autores e em produção nos atos de recepção literária, traz em si elementos formais que nos permitem análises que vão além de uma sociologia da literatura e que chegam de fato a uma crítica literária sociologicamente orientada. É importante verificar o vínculo entre a obra e o contexto, mas antes se deve ter em mente que a análise estética precede considerações de outra ordem. O contexto importa, “não como causa, nem como significado, mas como elemento que desempenha um certo papel na constituição da estrutura [do texto], tornando-se, portanto, interno.” (CANDIDO, 2000, p. 4). Nessa possibilidade de leitura, temos as possibilidades de estudos da posição e da função social do escritor; das relações entre sua posição e a natureza da sua obra, da função política da obra e do autor. Tecer uma crítica literária sociologicamente orientada é filtrar os elementos de ordem social, através de uma concepção estética, e trazê-los ao nível da obra, para entendermos a singularidade e a autonomia desta (CANDIDO, 2000, p. 15). Se um obra literária é criação de um autor, ela é também construção de sentidos pelos leitores. Produzindo sentidos numa sociedade, a tessitura estética erigida em palavras nos permite aproximar a literatura à sobrevivência dos vaga-lumes, como nos diria Georges Didi-Huberman. De acordo com Didi-Huberman, a vida dos vaga-lumes parecerá estranha e inquietante, como se fosse feita de matéria sobrevivente, e os resistentes se transformam em vaga-lumes fugidios tentando se fazer tão discretos quanto possível, continuando a emitir os seus sinais (DIDI-HUBERMAN, 2011, p. 13-14; 17). A questão dos vaga-lumes, metáfora para a resistência, passou a ser política e histórica, tanto que em 01 de fevereiro de 1975 Pasolini publicou o artigo “O vazio do poder na Itália”, que posteriormente viria a ser intitulado “O artigo dos vaga-lumes”, no qual o cineasta e poeta teorizou e afirmou a sua tese do “desaparecimento dos vaga-lumes”. Nos primeiros anos da década de 60, por causa da poluição do ar, e, sobretudo, no campo, por causa da poluição da água, os vaga-lumes começaram a desaparecer. Após alguns anos, não havia mais vaga-lumes. Hoje esta é uma lembrança um tanto pungente do passado (PASOLINI apud DIDI-HUBERMAN, 2011, p. 27-28). A narrativa e as imagens poéticas surgem como luzes que insistem em permanecer acesas, apesar de todo um contexto que insiste em apagá-las. O dizer contra o silêncio. A fala contra a censura. Alfredo Bosi, no livro O ser e o tempo da poesia, quer ver em toda grande poesia, a partir do Pré-Romantismo, uma forma de resistência aos discursos dominantes. Trata do modo historicamente possível de a poesia existir no interior do processo capitalista, parecendo condenada a dizer apenas aqueles resíduos de paisagem, de memória e de sonho que a indústria cultural ainda não conseguiu manipular para vender. Na verdade, a resistência também cresceu junto com a "má positividade” do sistema. A partir de Leopardi, de Hölderlin, de Poe, de Baudelaire, só se tem a consciência da contradição. A poesia há muito que não consegue integrar-se, feliz, nos discursos correntes da sociedade. Daí vêm as saídas difíceis: o símbolo fechado, o canto oposto à língua da tribo, antes brado ou sussurro que discurso pleno, a palavra-esgar, a autodesarticulação, o silêncio. O canto deve ser "um grito de alarme”, era a exigência de Schönberg (BOSI, 1977). De acordo com Bosi, a poesia moderna foi compelida à estranheza e ao silêncio: “Pior, foi condenada a tirar só de si a substância vital. Ó indigência extrema, canto ao avesso, metalinguagem!”. Desse modo, a resistência passaria a ter muitas faces: ora propõe a recuperação do sentido comunitário perdido (poesia mítica, poesia da natureza); ora melodia dos afetos em plena defensiva (lirismo de confissão); ora a crítica direta ou velada da desordem estabelecida (sátira, paródia, epos revolucionário, utopia) (BOSI, 1977, p. 144). O mesmo Bosi retoma o tema da resistência no seu artigo “Narrativa e resistência” (BOSI, 1996) e considera que o sentido mais profundo dessa resistência apela para a força da vontade que resiste à outra força, exterior ao sujeito: “Resistir é opor a força própria à força alheia. O cognato próximo é in/sistir; o antônimo familiar é de/sistir” (CANDIDO, 1996, p. 11-27). Arriscando um novo caminho exploratório, Bosi diz que a ideia de resistência, quando conjugada à de narrativa, é realizada “de duas maneiras que não se excluem necessariamente: (a) a resistência se dá como tema; (b) a resistência se dá como processo inerente à escrita.” (CANDIDO, 1996, p. 13).
PALAVRAS-CHAVE: Literatura – Resistência – Política

PALAVRAS DA CRÍTICA, PALAVRAS EM DISSIDÊNCIA: GÊNEROS, SUBJETIVIDADES, SEXUALIDADES
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: PALAVRAS DA CRÍTICA, PALAVRAS EM DISSIDÊNCIA: GÊNEROS, SUBJETIVIDADES, SEXUALIDADES
COORDENADORES:
- Paulo César García (Universidade do Estado da Bahia)
- Marcus Antônio Assis Lima (Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia)
- Marinela Freitas (UP | Universidade do Porto/PT)
RESUMO: A proposta do simpósio se inspira no livro Palavras da crítica, de José Luís Jobim, publicado em 1992. Frisamos a importância desta coletânea relativa ao modo de apresentar o quadro interpretativo do que vem sendo posicionado em torno de dissidentes formas de existência e, principalmente, às eletivas criações artísticas, quando permitem o poder de enunciação menos coordenadas pela sociedade de controle e mais exposta a deslocar estruturas e mover a prática de liberdade na efervescência em descolonizar saberes. Assim o fio condutor de textos como cânon, ideologia, gênero, desconstrução, influência, leitor, literatura negra, literatura, texto e outras demais palavras-chave incorporam a dimensão reflexiva da obra e oferecem um núcleo de debates e diálogos com a contemporaneidade, como o papel da arte e sua relação com as políticas de subjetivação. Para nós, o que tais palavras proporcionam é querer questionar criticamente os moldes culturais nos mais variados contextos das relações identitárias e interseccionais, das performances de LGBTQIA+, drag-queer-porno-biográficas, por exemplo. Torna interessante pensar a “valorização” dessas vozes, não apenas por ter direito a ter voz, mas tomar para si o modo de construir, produzir a narrativa-de-vida, passando a ser uma “organização discursiva e estética” (1992) que permeia outros e novos enunciados no mundo contemporâneo. Para a crítica estadunidense Judith Butler (1997), a linguagem nos põe vulneráveis. Até que ponto a própria linguagem em sua vulnerabilidade nos coloca rodeados de termos que nos constituem e nos faltam alguma coisa, entre palavras, gestos, atos? Outro fundamento em Rancière (2009) visa expressar a política e a estética reordenando-as sob a percepção do espaço e de desconstruir formas de pertencimento, demonstrando que a política tem uma dimensão estética e a estética tem uma dimensão política. Ainda assim, se a lógica de rompimento concebida pela teoria de Rancière se diferencia com o processo de igualdade, certamente, a postura do sujeito é atravessada por linguagens e com elas renasce a todo instante a percepção da diferença dentro de uma cultura. Já em O dispositivo da sexualidade, Foucault (1988) motiva explorar os significados que embutem atos de cercear, disciplinar, modos de olhar a sexualidade que são sempre outros modos de vê-la, mesmo em evidência, na maneira de a existência de comportamentos sexuais serem dados como naturalizados em oposição a outros. São argumentações cuja literatura não deixa de refletir o equilíbrio precário do mundo, de preconizar o reconhecimento tenso que não desbarata outras posições de existir. Nesse sentido, os corpos não podem falhar, já que são girados pela forma normatizadora e regulada de ser. Portanto, a edição em Palavras da crítica é uma oportunidade significativa para refletir sobre os seus desdobramentos e criativamente pensar os movimentos políticos e dissidentes estreitados em cada texto, tendo um papel de destaque para interagir e defender noções com a diversidade, a multiplicidade, o deslocamento, o transversal, a partir das relações construídas entre homens diante dos fluxos interculturais e posições interseccionais identitárias. São respaldos que cabem destaques em estudos que apontem ideias e posições, conceitos e temas relacionados às relações de gênero e de sexualidades dissidentes nas artes, de maneira geral, mas, também, na literatura e nas demais textualidades e da cultura. Considerando que a Literatura Comparada “é hoje uma área efervescente do saber” (COUTINHO, 2017, p. 18), como pensar as escritas queer manifestadas na periferia e/ou nos grandes centros metropolitanos; como as conexões entre campos de conhecimento são intermediados em espaços geoculturais e temporais onde textos são criados, que de outro modo não se compreendem facilmente com os enfoques acadêmicos tradicionais? A esse respeito, a reapresentação ou o espetáculo do signo não se torna centrado na essência e não mais sobre o texto somente, e sim imagem e texto reverberando na receptividade do leitor de modo a especular as percepções próprias da tecnologia da escrita. Melhor dizer, Preciado apresenta uma forma fértil de compreender a possibilidade de o corpo fertilizar por outro lugar de enunciação, para além da sociedade disciplinar, já que o corpo-devir intermedia a saturação de signos (PRECIADO, 2014, p. 190). “Podemos identificar formas alternativas de ver e de saber, capazes de desafiar os regimes escópicos da modernidade colonial” (GOPINATH, 2020, p. 24), de maneira a permitir debates em torno das expressões peculiares a cada linha de registros que se incube a apontar análises e potencializar leituras nos mais variados focos temáticos que o livro se dispõe, visando aos agenciamentos substanciais no que proporcionam com os mais variados focos discursivos e otimizações que distanciam de paradigmas sociais e culturais.
PALAVRAS-CHAVE: Palavras da crítica, literatura, cultura, gênero e sexualidades dissidentes

POÉTICAS DAS RUAS
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: POÉTICAS DAS RUAS
COORDENADORES:
- Daniela Silva de Freitas (Universidade Federal de Alfenas)
- Rossi Alves Gonçalves (Universidade Federal Fluminense)
RESUMO: A proposta deste simpósio é pensar produções artísticas demandadas pela rua nas últimas décadas. Por serem mais afeitas à realização no espaço público, por se engajarem numa luta pelo direito à rua ou, ainda, pela quase absoluta falta de opção de equipamentos culturais disponíveis para modalidades não-hegemônicas de arte, certas atividades artísticas, como slam, roda cultural, batalha de rima, sarau, entre outras, inventaram um lugar nos últimos anos. As “escrevivências” (Evaristo, 2007) da rua trazem, como agentes, poetas, escritores e artistas desconhecidos que, com frequência, usam o corpo como recurso fundamental de produção de significados, mobilizando outras gramáticas, a fim de estabelecer canais de comunicação imediata com o público. Como afirma Paul Zumthor (2010) acerca da poesia oral, a obra não se completa no poeta, mas requer a colaboração, ou melhor, a coautoria do público, de modo que um verso com sentido vago pode ser completado por quem ouve, através de suas experiências e dentro daquilo que é discutido na estética da recepção como “horizonte de expectativas”. Na performance, outros elementos são colocados em situação de julgamento e estes em muito se distanciam daqueles presentes no texto escrito. Atua na produção dessa poética das ruas um elaborado conjunto de gestual que conforma a poesia: trejeitos, balanço do corpo, repetições, voz em falsete, risos, movimento de braços, gritos, aplausos, saltos do público, estímulos da plateia. Há ainda outros elementos externos ao corpo, que compõem o ambiente e têm inserção na realização da performance, como sons, iluminação e clima meteorológico - toda uma estética peculiar à rua. Frente a um imaginário coletivo marginalizante sobre a rua, ainda promotor de interdições, “erguer a voz” (hooks, 2019) é um posicionamento político, através do qual artistas convidam o público à construção coletiva de outras vozes literárias. Entretanto, mesmo que a rua assim se realize nesse imaginário - isso é, plena de dubiedades -, para os artistas e público de arte urbana, tal aspecto também a reveste de enorme valor. A rua se recobre de um valor simbólico de “correria”, coragem, disposição, “verdade”. Ser um artista de rua é ter uma identidade respeitada entre os seus. E é a partir da centralidade da rua que este simpósio busca acolher reflexões críticas acerca das relações entre a literatura contemporânea, os corpos e as vozes de autores, produtores, colaboradores e leitores, e suas negociações com o espaço público, seja o espaço físico da rua, da praça ou da cidade, ou o espaço digital das redes sociais. Tendo em vista a expansão de um vocabulário teórico que reflita sobre experiências literárias que operam ao largo da cultura do livro e da escrita tradicional e, consequentemente, dos esquemas e circuitos tradicionais de produção, recepção e distribuição da literatura, pretendemos reunir trabalhos que analisem as transformações e adaptações que tais produções operam na forma literária tradicional, no regime dos gêneros ou na própria especificidade da literatura frente a outras artes. De forma especial, interessa-nos pensar sobre como essas transformações na forma literária se conectam a discussões acerca das questões de gênero, raça, classe, nação e suas interseccionalidades, adaptando suportes tradicionais, tanto de eventos literários quanto de tecnologias e linguagens de registro para a recepção e distribuição da produção literária. Nesse importante momento, vislumbramos outros caminhos de diálogo entre políticas públicas de cultura, subjetividades e poesia das ruas. As vozes que emergem nesse contexto não se colocam nessa querela apenas como o lado mais fraco da negociação, mas também como atores que podem escolher negociar ou não e impor certas condições. Como Stuart Hall (2003) aponta, o que é relevante são as estratégias culturais que conseguem abalar o poder. A luta contra os poderes hegemônicos ainda se desenvolve de forma bastante desigual e os espaços para a luta cultural são escassos e muito verticalizados. Porém, as novas táticas adotadas pelos segmentos subalternizados não têm como fim ser “o mesmo” e estão produzindo agências. Logo, são meios que não devem ser menosprezados. Com o intuito de mapear algumas dessas estratégias, este simpósio convida submissões sobre as poéticas das ruas. Seus temas podem incluir, mas não se restringem às, discussões acerca da música, da canção e da poesia; da literatura marginal, literatura negra e literatura de autoria feminina contemporâneas; da literatura digital, disponibilizada, pensada e consumida através das redes sociais; do slam e seus circuitos de produção, circulação e distribuição - seus poetas, coletivos e coletivas; seus eventos locais, nacionais e internacionais; seu suporte visual, oral e escrito e sua realização síncrona e assíncrona; das diferentes manifestações da cultura hip-hop e seus elementos - saraus, rodas culturais, batalhas de MC, bailes, shows e festas; funk, rap, DJs, equipes e produtoras; videoclipes, peças de teatro, filmes, livros e álbuns; grafite e artes visuais; cabelo, moda, performance e repertórios culturais; o quinto elemento e o compromisso político do hip-hop.
PALAVRAS-CHAVE: rua; performance; corpo; voz; resistência.

RETORNOS, ANTEPASSADOS E MEMÓRIAS DO FUTURO
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: RETORNOS, ANTEPASSADOS E MEMÓRIAS DO FUTURO
COORDENADORES:
- Alessia Di Eugenio (Universidade de Bologna)
- Francesca De Rosa (Universidade de Napoli)
RESUMO: A memória não é apenas lembrança, mas é uma construção psíquica do passado, uma construção de sentido que desintegra e reajusta continuamente o passado e o transforma e submete aos interesses do presente (Halbwachs 1950). Estes interesses do presente dependem também do horizonte de expectativas geracionais que chamamos “futuros possíveis" e que têm uma relação com as memórias dos futuros passados (Jedlowski 2017). Paulo Jedlowski dedica um estudo às que define como memórias do futuro – memórias das expectativas que indivíduos e grupos tiveram no passado –, afirmando que essas memórias são capazes de questionar interesses, preocupações e identidades do presente à luz do que foi considerado possível pelos nossos antepassados e pelas gerações anteriores. Nesse sentido, a memória do que foi imaginado no passado pode se tornar um armazém de possibilidades para repensar uma questão ainda hoje bastante problemática: o retorno. Em diferentes espaços geográficos e tempos históricos a ideia do “retorno” num lugar constituiu um horizonte de futuro e afetou também os processos de transmissão transgeracional da memória, ou seja os processos que permitem uma ligação entre memória autobiográfica, conectada à vivência individual (familiar ou extra-familiar) e consciência ou autoconsciência histórica baseada nas experiências históricas coletivas (Pethes e Ruchatz 2002). Muitas gerações cresceram com expectativas, esperanças ou medos de diferentes retornos: retornos forçados por motivos políticos (o caso dos Retornados em Portugal, depois do fim das guerras coloniais); retornos efetivos/imaginários na terra dos ancestrais, o retorno à África dos libertos (Schwarcz 2018; Cunha 2012; Alencastro 2000), como pulsão de uma população transplantada ou como obsessão do Um (Glissant 1981), ou por gerações de afrodescendentes, frequentemente ligado às religiões afrobrasileiras - Iluaê, a terra da vida - e associado à busca de raízes (Carneiro 1991); o retorno à pátria por quem foi exilado ou decidiu se exilar em momentos autoritários (o regresso de brasileiros e brasileiras ao Brasil depois da anistia de 1979). São muitos os exemplos de retornos e muitas as literaturas e, mais em geral, as obras de arte que foram produzidas sobre ideias, histórias e memórias dos retornos. Muitas obras acabaram se tornando narrativas de resistência contra autoritarismos, busca implacável de futuro. Definida por Margarida Calafate Ribeiro como “narrativas de regresso” do pós-25 de Abril (Ribeiro 2003), a literatura produzida pelos “retornados” problematiza o regresso de África para Portugal, país que se torna apenas um lugar imaginado através do olhar dos pais. Obras como O retorno (2011) de Dulce Maria Cardoso ou Cadernos de memórias coloniais (2015) de Isabela Figueiredo questionam, de fato, as memórias problemáticas da geração anterior e a possibilidade do retorno pós-colonial. Há também uma "história depois do regresso” (Ribeiro 2020), ou seja, uma linha de literatura afrodescendente portuguesa em que, como no romance Essa dama bate bué (2018) de Yara Monteiro, se constrói a possibilidade de um retorno de Portugal para África para desconstruir as narrativas sobre as quais se foram construindo e narrando o império ultramarino português. No cinema, filmes quais Yvone Kane (2018) de Margarida Cardoso ou Farewell Amor (2020) de Ekwa Msangi assinalam a urgência de refletir sobre esses retornos (im)possíveis. Também sobre o retorno à África de afrodescendentes existem diferentes obras literárias e reflexões artísticas. O retorno, as andanças e os trânsitos entre Brasil e África aparecem na obra Um defeito de cor de Ana Maria Gonçalves (2006). Ou, por exemplo, no filme Mazagão - A porta do mar (2016) de Gavin Andrews e Cassandra Oliveira que conta o processo de reinvenção do passado (marroquino) e da memória cultural da comunidade de Mazagão Velho em busca de raízes ancestrais na terra africana dos antepassados. Tradições locais, narrativas e obras de arte foram elaboradas e transmitidas encorajando, sobretudo entre as jovens gerações, formas de turismo de diáspora (Silva e Tavim 2013). Por fim, outras formas de retorno foram narradas sobre o período da ditadura civil-militar. Além de trabalhos pioneiros como Memórias das mulheres do exílio (1980), em que é central o tema do retorno esperado, imaginado, temido ou negado pelas gerações envolvidas, novas obras literárias abordam a questão do ponto de vista dos filhos dos exilados e da pós-memórias (Hirsch 2012): A chave de casa (2007) de Tatiana Salem Levy, Mar Azul (2012) de Paloma Vidal, A resistência de Julián Fuks (2015), Rio-Paris-Rio (2016) de Luciana Hidalgo. A reelaboração de experiências e memórias do futuro dos pais ajuda a pensar o que foi, pelas filhas e pelos filhos, a imaginação do retorno, por exemplo na terra dos pais. Nesse sentido, as propostas podem incidir sobre as seguintes questões: como aparecem todos esses “retornos” na transição entre gerações? Como foram reinventadas, transformadas ou utilizadas, por novas gerações, as memórias do futuro dos próprios antepassados em relação à transformação do horizonte do futuro e/ou à crise do futuro? Quais novas reconfigurações do retorno hoje? Qual o espaço de resistência nessas narrativas?
PALAVRAS-CHAVE: retornos; memórias do futuro; antepassados; literatura; artes.

SABERES SUBALTERNIZADOS: LITERATURA E (RE) EXISTÊNCIA, OUTROS(AS) SUJEITOS(AS) DE CRIAÇÃO
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: SABERES SUBALTERNIZADOS: LITERATURA E (RE) EXISTÊNCIA, OUTROS(AS) SUJEITOS(AS) DE CRIAÇÃO
COORDENADORES:
- Alvanita Almeida Santos (UFBA)
- Jailma dos Santos Pedreira Moreira (UNEB)
- Carlos Magno Gomes (UFS/CNPq)
RESUMO: Trata-se de uma reflexão sobre saberes subalternizados, tecidos na e com a literatura, considerando os modos de produção destes, seus impasses e perspectivas, bem como seus sujeitos de enunciação e os contextos geopolíticos que os engendram. Desse modo, interessam-nos pesquisas/artigos que abordem apropriações literárias que explorem seu jogo estético político, abrindo outros caminhos teóricos, políticos e existenciais para mulheres diversas, sujeitos da América Latina, do mundo e, inclusive, para a própria Literatura. Dar visibilidade a esses saberes, sua manufatura, os valores que encenam, assim como as problemáticas que enfrentam, ou seja, contra as quais se colocam em confronto, é nosso interesse. De modo que possamos partilhar não só estes outros saberes submersos, muitas vezes não vistos nem valorizados, assim como as táticas que também estamos inventando para acessá-los e os caminhos e roteiros de trabalhos que estes nos solicitam, nos instigam também a tecer, em prol de um bem viver, de uma vida na terra mais justa, solidária, equitativa e menos autodestrutiva. Com esse propósito, buscamos rastrear outros signos de vida, outros enredos, personagens e narrativas diversas, que subsistem. Assim, existindo, resistindo, re-existindo, pelas bordas, nas fronteiras, circulam saberes invisibilizados, subalternizados, empurrados para margens, mas que continuam pululando em diversos lugares, ocupando espaços convencionais e alternativos, mantendo-se vivos e transformadores. Dessas insistências se ocupa este Simpósio. Conforme nos instiga Conceição Evaristo (s/d), apesar de terem combinado de nos matar, nós combinamos de não morrer. Dessa forma, nosso objetivo é apresentar, discutir, problematizar diferentes produções de resistência, considerando novos paradigmas de análise e outros operadores teóricos que tragam uma (re)visão de valores e de modelos. São tomadas aqui, por viés, as propostas de uma perspectiva decolonial, antirracista, feminista, com alguns caminhos como o de Maria Lugones (2014), alertando-nos que vivemos em uma sociedade capitalista, patriarcal, racista, colonizada. Também nos pautamos em percursos que tomam uma perspectiva de interseccionalidade, sobretudo considerando o que alerta Patrícia Collins, situando essa questão em sua relação com as políticas feministas negras, das décadas de 1960 e 1970 nos Estados Unidos, pensando que “racismo, exploração de classe, patriarcado e homofobia, coletivamente, moldavam a experiência de mulher negra, a libertação das mulheres negras exigia uma resposta que abarcasse os múltiplos sistemas de opressão” (COLLINS, 2017). Nesse sentido, observamos experiências de abordagens metodológicas diversas das convencionais, as quais são eurocêntricas, sexistas, logocêntricas, masculinas, brancas. São necessárias outras formas de pensamento, de saber, de teorias, de metodologias, que possam dar conta desse universo “outro” que não se pauta pelas construções ditas “clássicas”. Dessa maneira, desvendar a potência criativa das margens, como afirma Grada Kilomba (2019), encontrar nosso discurso afrolatino, como defende Lélia Gonzalez(2020 ), ao tratar do feminismo, descortinar os fundamentos eurocêntricos que nos impedem o movimento outro, como postula Oyewùmí (2020), ao tratar dos desafios das epistemologias africanas, assim como lutar pelos nossos direitos epistemológicos, questionando os aparelhos conceituais, como afirma Breny Mendoza ( 2017), são questões que atravessam nosso desejo compartilhado de reflexão. Portanto, através de práticas decoloniais, desafiando matrizes, como orienta Heloisa Buarque de Holanda (2020), esperamos receber proposições que tragam para a cena conhecimentos vitais, saberes originários, epistemologias subalternizadas que ponham em xeque esse modo de vida capitalista, racista, sexista, homofóbico, patriarcal, que tanto tem aprisionado a existência, a vida e a natureza, enquanto nosso bem comum. Assim, o Simpósio Saberes subalternizados: literatura e (re) existência, outros(as) sujeitos(as) de criação se abre para vozes/perspectivas/ficções/teorias minoritárias que têm posto em questão regimes de poder-verdade, trazendo vários conhecimentos/aprendizagens, que estão nos ensinado a rever os limites de nossas percepções, ajudando-nos a construir novos sentidos de mundo, potencializando a relação entre política, ética e arte da existência, como nos lembra Miñoso (2010), ao tratar das práticas teóricas e políticas dos feminismos minoritários latinoamericanos. Assim, enfocando o sujeito feminino, mas não se restrigindo a ele, buscamos, portanto, refletir sobre as poéticas da existência, que, nesse teatro político subalterno, têm não só resistido aos diversos sistemas de barbárie, como reficcionalizado sujeitos, existências. Para isso, é preciso compreender e pautar as reflexões em outras epistemologias, ultrapassando a questão relevante de “dar voz”, para avançar em uma luta por agenciamentos em que sujeitos/sujeitas apresentam uma outra história. Nessa cena, também pensamos, neste simpósio, fazer emergir dessa categoria “subalternizados” as reações a esse processo de opressão e tentativas de dominação, inclusive pela imposição de saberes apresentados como universais, mas que são muito bem marcados.
PALAVRAS-CHAVE: Saberes subalternizados; Feminismos; Literatura e política; Mulheres e literatura

TRANSGRESSÃO, MEMÓRIA E (IN)SUBALTERNIZAÇÃO NAS LITERATURAS AFRICANAS E AFRODIASPÓRICAS PRODUZIDAS POR MULHERES
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: TRANSGRESSÃO, MEMÓRIA E (IN)SUBALTERNIZAÇÃO NAS LITERATURAS AFRICANAS E AFRODIASPÓRICAS PRODUZIDAS POR MULHERES
COORDENADORES:
- Cíntia Acosta Kütter (Universidade Federal Rural da Amazônia)
- Sávio Roberto Fonseca de Freitas (Universidade Federal da Paraíba)
RESUMO: A produção literária africana e afrodiaspórica de autoria feminina vem ocupando os espaços de discussão acadêmica no âmbito dos estudos literários já há algum tempo devido à peculiaridade dos recorrentes temas voltados para questões culturais e de gênero presentes em poemas, contos e romances de escritoras que recorrem à literatura como espaço ficcional para discussões políticas voltadas para temas que tensionam as relações de raça, gênero e classe sob um ponto de vista feminino e feminista. Desta forma, definir as relações de raça, gênero e classe na literatura afro-brasileira é um exercício complexo. A demarcação de fronteiras no que diz respeito a estas relações está cada vez mais indistinta, principalmente com as oscilações teóricas e ideológicas que orientam os estudos literários e tornam cada vez mais instigantes as investigações sobre a literatura de autoria feminina africana e da diáspora africana. O simpósio "Transgressão, memória e (in)sulbalternização nas literaturas africanas e afro-diaspóricas produzidas por mulheres", tem por objetivo colocar em debate questões crítico-literárias que se proponham a pensar possibilidades de representação das várias transgressões sociais, sobretudo no que tange ao corpo feminino, por meio da memória e da (in)sulbalternização e/ou subalternização das mulheres frente aos diversos sistemas de opressão de raça, gênero e classe. Para isso, Susan Sontag (2003) aponta para pensarmos de que maneira a personagem feminina se coloca no lugar do outro e como a recíproca, não sendo verdadeira passa a incomodar a sociedade. Nesse sentido, Gayatri Spivak (2010) sinaliza o lugar destinado às mulheres como problemático, visto que a autora propõe uma discussão sobre a questão do gênero feminino estar destinado à subalternidade, ou seja, não poder falar; e Oyewumi (2021) nos conduz a pensar o afro-feminismo a partir de uma construção de vários sentidos africanos que problematizam os discursos ocidentais de gênero. Portanto, este simpósio pretende acolher trabalhos que tenham como foco a relação entre as questões relacionadas à transgressão, à memória e à (in)sulbalternização femininas presentes nas obras literárias de origem africanas e/ou afrodiaspóricas produzidas por mulheres, ou seja, estudos das manifestações literárias africanas e afrodiaspóricas em suas mais diversas possibilidades de análise crítica de textos poéticos, narrativos e dramáticos. A produção literária africana e afrodiaspórica de autoria feminina precisa ocupar ainda mais espaços nos congressos internacionais, pois até o momento, ainda é considerada, por parte da crítica literária eurocentrada, com uma produção pouco significativa e irrelevante se comparada ao cânone literário oficial, o qual ainda é composto massivamente por homens, mesmo diante de todo o movimento acadêmico das universidades brasileiras e internacionais que discute o binômio Mulher e Literatura. Esse posicionamento, contudo, não tem se fundamentado em critérios suficientemente válidos. Dessa forma, o gênero, através de seu próprio questionamento, problematiza o fenômeno literário e sua trajetória na contemporaneidade oferecem novas perspectivas sobre as mudanças e revisões cartográficas das literaturas africanas e afro-diaspóricas de autoria feminina. Este simpósio acolhe análises críticas de produções literárias que deem visibilidade às vozes femininas que compõem a roda de intelectuais e feministas contemporâneas em países africanos e afro-diaspóricos. A produção literária de escritoras como Chimamanda Adichie(Nigéria), Buchi Emecheta (Nigéria), Fatu Diome (Senegal), Hirondina Joshua (Moçambique), Rinkel (Moçambique), Sónia Sultuane(Moçambique), Paulina Chiziane(Moçambique), Ken Bugul (Senegal), Nawal El Saadawi(Egito), Fatema Mernissi (Marrocos), Ama Ata Aidoo(Gana), Odete Semedo (Guiné Bissau), Conceição Lima (São Tomé e Príncipe), Yvonne Vera(Zimbabwe), Warson Shire(Quênia), Léonora Miano (Camarões), e crítica feminista africana feita por Theo Sowa (Gana), Osai Ojibo (Nigéria), Luimah Gbwee (Libéria), Minna Salammi (Nigéria), Amina Doherty (Nigéria), Nana Sekyiannah (Gana), Amina Mama (Nigéria), Yewande Omotoso (Nigéria), Parity Kagwiria (Quênia), Yaba Badoe (Gana), Aisha Ibrahim Fofana (Serra Leoa) , entre outras, que mostram uma cumplicidade feminina que se constrói para discutir temas que corroboram com a territorialização da autoria feminina em um campo minado por ideologias machistas e patriarcais em países africanos e da diáspora que obnubilam temas como: aborto, abuso sexual, tráfico de mulheres, tráfico de drogas, pedofilia, prostituição, lesbianismo, maternidade, casamento, guerra civil, colonialismo, pós-colonialismo, decolonialidade, identidade cultural, religiosidade, direitos humanos, ativismo político, feminismo africano. Desta forma, nosso simpósio pretende desenvolver uma discussão que viabiliza o ponto vista feminista africano e afrodiaspórico como categoria problematizadora das questões de raça, gênero e classe em textos críticos e literários elaborados por mulheres africanas e da diáspora africana. Referências: SONTAG, Susan. Diante da dor dos outros; tradução Rubens Figueiredo. –São Paulo: Companhia das Letras, 2003. SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Pode o subalterno falar?; tradução de Sandra Regina Goulart Almeida, Marcos Pereira Feitosa, André Pereira Feitosa. –Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010. OYEWUMI, Oyèrónké. A invenção das mulheres. Construindo um sentido africano para os discursos ocidentais de gênero; tradução Wanderson Flor do Nascimento. – 1. Ed. – Rio de Janeiro: Bazar do tempo, 2021.
PALAVRAS-CHAVE: literatura africana; literatura afrodiaspórica; transgressão; memória;

USOS POLÍTICOS DA MEMÓRIA E DA HISTÓRIA NAS LITERATURAS DE LÍNGUA PORTUGUESA
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: USOS POLÍTICOS DA MEMÓRIA E DA HISTÓRIA NAS LITERATURAS DE LÍNGUA PORTUGUESA
COORDENADORES:
- Daniel Marinho Laks (Universidade Federal de São Carlos - UFSCar)
- Renata Flavia da Silva (Universidade Federal Fluminense - UFF)
- Roberta Guimarães Franco (Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG)
RESUMO: As relações entre memória, história e literatura sempre foram objeto de análise e de debate acerca das especificidades de cada campo e das possibilidades de diálogos interdisciplinares, especialmente dentro do campo conflituoso da Literatura Comparada. Obras literárias que dialogam de forma próxima com a história, seja pelo gênero literário, pelo tema e/ou personagens escolhidos, ou que apresentam um caráter (auto)biográfico, podem funcionar como base para a organização de arquivos públicos ou particulares, monumentos e museus, os quais têm como objetivo mediar o estabelecimento de uma memória coletiva sobre acontecimentos transcorridos. A possibilidade de curadoria dos episódios que devem ser rememorados ou comemorados sob uma perspectiva nacional está intimamente ligada à afirmação dos interesses de grupos que estabeleceram sua hegemonia e, nesse sentido, o processo de produção de uma memória coletiva pretende funcionar como ferramenta política de legitimação de estruturas específicas de poder. Debate também presente na formação dos cânones literários, questionados por correntes críticas mais contemporâneas pelo seu caráter fragmentário e centralizador, que atenderia a perspectivas e interesses específicos. Nesse sentido, a memória vem, cada vez mais, se configurando como um elemento essencial na construção de sentidos entre o texto literário e o discurso histórico. Ao longo do tempo, a análise literária foi ganhando contornos que incluem, desde a possibilidade de pensar a obra em múltiplos contextos e temporalidades de acordo com o leitor, advinda através da Estética da Recepção, até os mais recentes Estudos Culturais e Póscoloniais, possibilitando novas formas de olhar eventos históricos consagrados ou trazendo à luz questões que a dita história oficial silenciou. A memória, por sua vez, seja pensada como componente intratextual, atuando diretamente na estrutura narrativa, aliada à ideia de tempo, seja constituindo o espaço entre a obra literária e o seu contexto de produção, ou ainda estabelecendo fronteiras entre as perspectivas individuais e coletivas, se configurou como instância que permite pensar a literatura tanto na sua esfera subjetiva quanto social. No contexto das literaturas de língua portuguesa, pode-se evidenciar formas variadas de diálogo entre memória, história e literatura. No Brasil, tais diálogos podem apontar desde a necessidade de criação de uma identidade nacional, até a urgência em propor limites e questionamentos a este conceito – basta lembrar das ideias de Silviano Santiago em Uma literatura nos trópicos (1978) –, chegando a manifestações mais recentes, ou a recuperação de obras/escritores apagados/silenciados, que trazem novos olhares sobre acontecimentos, personagens e espaços. No caso da Literatura Portuguesa, por exemplo, a história desempenhou um importante diálogo por meio de diferentes temas, mas também como próprio elemento ficcional. Basta pensar a maneira pela qual os mitos identitários foram construídos pela história da literatura portuguesa ao longo dos séculos. Além da transformação da memória nacional como um dos grandes temas da literatura, um outro aspecto relevante é o reverso dessa temática, como afirma Eduardo Lourenço (2014), ao apontar a dificuldade de assumir uma memória nacional não mais baseada nos grandes mitos, mas na decadência da colonização. Grande parte da literatura portuguesa do século XX, sobretudo após a Revolução dos Cravos, tem se ocupado da revisitação de fatos históricos ou da escrita ou reescrita de momentos relevantes para o país no que diz respeito à colonização. Já para as Literaturas Africanas de Língua Portuguesa – ainda lutando por uma nomenclatura que as particularize na academia – a relação entre literatura e história parece ainda mais evidente, pelos recentes processos históricos que trazem um caráter testemunhal, muitas vezes autobiográfico, para essas literaturas, problematizando os silenciamentos em torno da colonização, das guerras pelas independências, da descolonização e das guerras civis. E também, dialogando com um passado mais distante, pela necessidade de reformular a história produzida pelo olhar exógeno, reconstruindo mitos, recuperando personagens, reconfigurando espaços agora nacionais. Portanto, as literaturas de língua portuguesa formam um extenso objeto de análise, comparadas entre si ou dentro de um único espaço, para o antigo e ainda necessário debate entre Literatura, História e Memória. Este simpósio, continuidade da proposta de edições anteriores, pretende, assim, acolher trabalhos que discutam as relações entre memória, história e literatura. Para isso, sugerimos, entre outros possíveis, alguns eixos de articulação: a literatura como arquivo; representação do trauma na narrativa e na poesia; vertentes políticas das escritas de si; memória coletiva e espaços públicos; relações entre os espaços de língua portuguesa.
PALAVRAS-CHAVE: Literaturas de língua portuguesa; História; Memória; Política, Arquivo.

ESCRITA DE MULHERES: LUTAS, OLHARES E PERCURSOS
EIXO: ESTÉTICA E POLÍTICA, LITERATURA E RESISTÊNCIA
SIMPÓSIO: ESCRITA DE MULHERES: LUTAS, OLHARES E PERCURSOS
COORDENADORES:
- Ana Maria Chiarini (UFMG)
- Silvia La Regina (Universidade Federal do Sul da Bahia - UFSB)
RESUMO: . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
PALAVRAS-CHAVE: .
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(AUTO)TRADUÇÃO DE LITERATURAS EM LÍNGUAS INDÍGENAS/ORIGINÁRIAS
- Sara Lelis de Oliveira (Universidad Nacional Autónoma de México)
- ANA HELENA ROSSI (Universidade de Brasilia)
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FEMINISMO DECOLONIAL E TRADUÇÃO: POR UM ARCABOUÇO METODOLÓGICO PARA O PROCESSO TRADUTÓRIO E A ANÁLISE DE TEXTUALIDADES DE RESISTÊNCIA
- Norma Diana Hamilton (Universidade de Brasília)
- Luciana de Mesquita Silva (Cefet/RJ)
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GÊNERO E TRADUÇÃO: AS VOZES FEMININAS NA LITERATURA ESPANHOLA E HISPANO-AMERICANA E SUAS REPRESENTAÇÕES NO SISTEMA LITERÁRIO BRASILEIRO
- María del Mar Paramos Cebey (Universidade de Brasília (UnB))
- Luciana Ferrari Montemezzo (Universidade Federal de Santa Maria (UFSM))
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NARRATIVA, TRADUÇÃO E TRANSCRIAÇÃO: DIÁLOGOS ENTRE LÍNGUAS, LINGUAGENS, GÊNEROS LITERÁRIOS E CONFIGURAÇÕES ESTÉTICAS
- Lacy Guaraciaba Machado (PUC-Goiás)
- Joabson Lima Figueiredo (UNEB-BA)
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NÃO APENAS O MEDITERRÂNEO: DISCUTINDO A TRADUÇÃO DE CLÁSSICOS GLOBAIS PARA O BRASIL DE HOJE
- Andrei dos Santos Cunha (UFRGS)
- Lica Hashimoto (USP)
- Michele Eduarda Brasil de Sá (UFRJ/UFMS)
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TRADUZINDO NO ATLÂNTICO NEGRO
- Denise Carrascosa França (Universidade Federal da Bahia)
- Mayana Rocha Soares (UFOB - Universidade Federal do Oeste da Bahia)
- Felix Ayoh' Omidire (Universidade Obafemi Awolowo, Ile-Ife, Nigéria)
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TRADUÇÃO E LINGUAGENS TRANSCRIATIVAS: ESTUDO DE TEXTOS INTERARTÍSTICOS SOB DIFERENTES OLHARES
- Divino José Pinto (Pontifícia Universidade Católica de Goiás)
- Átila Silva Arruda Teixeira (Pontifícia Universidade Católica de Goiás)
- Simone Gorete Machado (Universidade de São Paulo)
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TRADUÇÃO LITERÁRIA CRIATIVA: DESAFIOS E REFLEXÕES DO TRADUTOR
- Andréa Cesco (Universidade Federal de Santa Catarina)
- Lilian Cristina Barata Pereira Nascimento (Universidade Federal do Pará)
- Wagner Monteiro Pereira (Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
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TRADUÇÃO LITERÁRIA E FEMINISMOS: PONTOS DE ENCONTRO
- Luciana Carvalho Fonseca (USP)
- Marina Leivas Waquil (USP)
- Leticia Maria Vieira de Souza Goellner (Pontificia Universidad Católica de Chile)

(AUTO)TRADUÇÃO DE LITERATURAS EM LÍNGUAS INDÍGENAS/ORIGINÁRIAS
EIXO: TRADUÇÃO COMO ARTE DO (DES)ENCONTRO
SIMPÓSIO: (AUTO)TRADUÇÃO DE LITERATURAS EM LÍNGUAS INDÍGENAS/ORIGINÁRIAS
COORDENADORES:
- Sara Lelis de Oliveira (Universidad Nacional Autónoma de México)
- ANA HELENA ROSSI (Universidade de Brasilia)
RESUMO: Entre as várias e possíveis definições de tradução encontra-se a de que traduzir consiste em uma operação relativa à linguagem na qual o/a tradutor/a entra em contato com a organização do conhecimento e das experiências inerentes às diversas línguas-culturas, bem como investiga os processos de construção das mesmas. Segundo Antoine Berman (2012), da tradução originam-se saberes sui generis sobre literaturas, línguas, culturas e cosmovisões, pois tudo se expressa na língua/linguagem, e não através dela, retomando Walter Benjamin (2011). Por atuar no campo da linguagem, um dos papéis da tradução é justamente o de transformação dos conhecimentos e o de proposição e inserção de novas e diferentes concepções da realidade no imaginário de outras línguas e culturas. A tradução constitui-se como um trânsito entre línguas, acarretando entendimentos a partir da (re)construção de textos e culturas, mas também, conforme Andrés Claro (2012), propiciando os entraves para a reconciliação de linguagens, os quais abrem caminhos para compreender as discrepâncias linguísticas que revelam as particularidades culturais e de cosmovisão plasmadas em ambas as línguas, na que se traduz quanto na para qual se traduz. Assim, traduzir constitui uma reflexão singular acerca das línguas-culturas e das respectivas cosmovisões que modelam os textos, sobretudo os literários, e ainda mais os textos literários em línguas indígenas/originárias. A definição de autotradução, por sua vez, não diferiria da tradução de literaturas em línguas indígenas/originárias de outrem senão por seu espectro político mais presente. Autores/as indígenas e/ou descendentes de povos originários que traduzem as expressões verbais de seus antepassados e/ou suas próprias criações literárias para suas segundas línguas ou para o(s) outro(s) idioma(s) que conhecem geralmente estão reivindicando suas línguas-culturas, resistindo ao meio que impõe as chamadas línguas majoritárias em prol da comunicação e da mitigação das diferenças. Conforme Luz María Lepe (2009), a tradução é condição sine qua non das literaturas indígenas desde suas épocas pré-hispânicas e coloniais, pois seguem mantendo alguns de seus propósitos, tais como: reverter os danos da imposição das línguas colonizadoras; introduzir novas epistemologias e cosmovisões (ou decolonizar); posicionar e dar visibilidade a suas obras no contexto da literatura universal. Se escrever em línguas indígenas/originárias configura um ato de resistência, ser o/a próprio/a tradutor/a delas configura um duplo ato de resistência. Os tradutores não autores dessas obras igualmente resistem ao optarem pelo conhecimento do Outro pela alteridade, pelo não apagamento de sua estética, pela recriação de seus recursos linguísticos que conformam a visão de mundo de povos indígenas/originários. Isto posto, este simpósio pretende reunir tradutores/as e tradutores/as de si mesmos cujas pesquisas abordem seus processos e projetos de tradução ou autotradução de literaturas (cantos, contos, poemas, relatos orais, narrativas, romances, memorias coletivas, mitos) em línguas indígenas/originárias da América Latina, América do Norte (México) e América Central para o português ou para o espanhol. Nesse sentido, são bem-vindas as propostas de trabalho que: 1) discutam as questões de tradução que emergem das diversas línguas e dos diversos corpora, sejam eles diretamente escritos ou oriundos da oralidade: questões como oralidade-escrita, musicalidade, performance, representação, marcas orais, estratégias mnemotécnicas, entre tantos outros que surgem no âmbito dessa experiência que, por vezes, ultrapassa o saber linguístico-cultural; 2) no caso das autotraduções, que versem sobre os ires e vires entre dois mundos, explicitando como se organiza a expressão verbal com os próprios recursos das línguas indígenas, e as estratégias de (re)criação de suas obras em outra língua que também lhe é própria; 3) se baseiem em traduções diretas (língua originária-português/espanhol), bem como análises de textos traduzidos nos referidos pares linguísticos a partir de corpora confeccionados desde as colônias até os dias atuais. 4) dialoguem com diferentes tradições linguístico-culturais, isto é, que coloquem em evidência as características textuais, que deem a conhecer outras visões de mundo, e que reconheçam a alteridade como parte do todo. Para tanto, se privilegiarão trabalhos construídos nas linhas prático-teóricas de Walter Benjamin, Antoine Berman, Boris Schnaiderman, Haroldo de Campos, Paulo Rónai, entre outros de mesma filiação teórica ou cujo escopo é o acolhimento do Outro. As comunicações poderão ser apresentadas em português ou espanhol. O objetivo é promover um espaço coletivo em que tradutores/as-pesquisadores/as compartilhem as problemáticas de (auto)tradução de línguas indígenas/originárias, contribuindo minimamente para a inclusão dessas literaturas tanto nos círculos literários como nos círculos acadêmicos e sua reflexão como um campo de estudo da Tradutologia/Estudos da Tradução.
PALAVRAS-CHAVE: (Auto)tradução, literaturas, línguas indígenas/originárias, português, espanhol.

FEMINISMO DECOLONIAL E TRADUÇÃO: POR UM ARCABOUÇO METODOLÓGICO PARA O PROCESSO TRADUTÓRIO E A ANÁLISE DE TEXTUALIDADES DE RESISTÊNCIA
EIXO: TRADUÇÃO COMO ARTE DO (DES)ENCONTRO
SIMPÓSIO: FEMINISMO DECOLONIAL E TRADUÇÃO: POR UM ARCABOUÇO METODOLÓGICO PARA O PROCESSO TRADUTÓRIO E A ANÁLISE DE TEXTUALIDADES DE RESISTÊNCIA
COORDENADORES:
- Norma Diana Hamilton (Universidade de Brasília)
- Luciana de Mesquita Silva (Cefet/RJ)
RESUMO: O objetivo deste simpósio é desenvolver diálogos sobre o feminismo decolonial e a tradução, pensando arcabouços metodológicos que podem ser utilizados em processos tradutórios ou em análises de textos traduzidos referentes às vozes femininas negras, indígenas, lésbicas e de imigrantes, em contextos caribenhos e latino-americanos. O feminismo decolonial, termo cunhado pela intelectual argentina de origem indígena Maria Lugones (2008), é desenvolvido a partir das produções intelectuais e mobilizações de feministas indígenas, negras, lésbicas e imigrantes do Caribe e da América Latina, como práxis para elas poderem analisar seus contextos sociais opressores, encontrar soluções e tornar-se sujeito, deixando de ser objeto nas investigações, debates e ações sobre e contra a opressão que enfrentam. Como já denunciava a feminista dominicana Ochy Curiel “[...] aqueles que foram definidos como outrxs [mulheres caribenhas e latino-americanas], que são quem representam a diferença colonial, são geralmente os objetos das investigações e pesquisas [...], como se somente assumi-las como matéria-prima seja uma pesquisa feminista crítica e decolonial” (2019, p. 5). A práxis feminista decolonial, protagonizada por essas mulheres, assim-chamadas de “minoria”, não é reduzida ao nível acadêmico-epistemológico, mas sim envolve as ações cotidianas, que podem propulsionar políticas públicas, pedagógicas, transformações, justiça. Pode-se afirmar que as pensadoras do feminismo decolonial beberam da fonte da crítica social produzida pelo feminismo negro estadunidense, caribenho e brasileiro. Os conceitos teóricos como Ponto de Vista (Hill-Collins, 2009), Interseccionalidade (Crenshaw, 1989), Posição de Dentro e Fora (Lorde, 1984), Identiade Mestiza, 1987), Racismo e sexismo automático (Segato, 2003), Lugar de fala (Ribeiro, 2017), Epistemicídio (Carneiro, 2005), dentre outros, têm sido empregados por elas, para pensar e construir ações para subverter a opressão estrutural. O feminismo decolonial foi influenciado também pelas contribuições teóricas oriundas do Projeto Decolonial. As/os pensadoras/es do Projeto Decolonial nos mostram que, apesar de o colonialismo ter oficialmente chegado ao fim, os princípios de relações de poder nas esferas socioeconômicas – referentes a categorias de gênero, raça, classe, origem geopolítica, a divisão internacional do trabalho entre centros e periferias, –continuam iguais nos dias de hoje. Nas palavras de Curiel, “ao contrário, o que tem acontecido é uma transição do colonialismo moderno à colonialidade global (2019, p. 5).” Isto nos aponta para a ideia de que o colonialismo continua ativo, não mais de forma oficial, mas sim, de forma material e simbólica. Em nossa visão, muitas das regras coloniais, embora não estejam escritas, continuam em vigência, restringindo o espaço e experiências das pessoas racializadas. As “fantasias coloniais” (Kilomba, 2020) continuam governando fortemente nossos discursos e ações comuns no cotidiano, nossas vidas. As concepções teóricas oriundas do Projeto Decolonial: Colonialidade do poder (Quijano, 2005), Colonialidade do Saber (Mignolo, 2005), Colonialidade de Gênero (Lugones, 2008) têm sido usado pelas intelectuais e escritoras caribenhas e latino-americanas em suas produções de diferentes tipos de textos de resistência. A tradução tem sido uma aliada para a ampla divulgação de produções escritas por feministas decoloniais. Podemos afirmar que no Brasil a empreitada da tradução dos textos das mulheres indígenas, negras, lésbicas, imigrantes apresentou alguns avanços nos últimos anos, mas, de forma geral, ainda é tímida. Nesse contexto especificamente, Araújo, Silva e Silva-Reis denunciam a negligencia geral da voz feminina negra na visibilidade de produções culturais em tradução e ressaltam que "a escolha da obra a ser traduzida pode equilibrar o leque de representações femininas, restituindo à mulher negra o direito de se reconhecer positivamente na literatura e nos produtos culturais que consome" (2019, p. 6). Ligada a essa questão da representatividade no campo da tradução, é a responsabilidade de tradutores pela representação adequada das vozes femininas caribenhas e latino-americanas, em busca da inclusão. Conforme Carrascosa, o/a tradutor/a deve usar "a linguagem como agente produtor de identidade, subalternidade e, ao mesmo tempo, em sua dimensa?o reto?rica, como potencial fator gerador de disseminação subversiva" (2016, p. 65). Em relação à análise de textos traduzidos, é de suma importância considerar aspectos relativos ao/à tradutor/a, tais como: “quem é, de onde veio, como se percebe racialmente, como se insere em movimentos políticos, qual é sua trajetória acadêmica, o que pensa sobre tradução enquanto prática que envolve não só textualidades, mas as subjetividades que as conformam” (Nascimento, 2017, p. 137). Este simpósio aceita propostas de trabalhos que abordam o feminismo decolonial e a tradução referentes a diversos tipos de textos produzidos por/ ou voltados sobre mulheres caribenhas e latino-americanas. Tais trabalhos podem contemplar as diversas línguas faladas no espaço demarcado. Além disso, espera-se a elaboração de processos metodológicos nesses trabalhos que atendam aos processos tradutórios e analíticos de textos, em conversa com o feminismo decolonial.
PALAVRAS-CHAVE: Feminismo Decolonial; Tradução; Vozes Femininas Caribenhas e Latino-Americanas; Processo tradutório; Textualidades; Resistência

GÊNERO E TRADUÇÃO: AS VOZES FEMININAS NA LITERATURA ESPANHOLA E HISPANO-AMERICANA E SUAS REPRESENTAÇÕES NO SISTEMA LITERÁRIO BRASILEIRO
EIXO: TRADUÇÃO COMO ARTE DO (DES)ENCONTRO
SIMPÓSIO: GÊNERO E TRADUÇÃO: AS VOZES FEMININAS NA LITERATURA ESPANHOLA E HISPANO-AMERICANA E SUAS REPRESENTAÇÕES NO SISTEMA LITERÁRIO BRASILEIRO
COORDENADORES:
- María del Mar Paramos Cebey (Universidade de Brasília (UnB))
- Luciana Ferrari Montemezzo (Universidade Federal de Santa Maria (UFSM))
RESUMO: O presente simpósio pretende abordar o papel da mulher na literatura espanhola ou hispano-americana, seja como personagem narrativa, como tradutora ou como escritora. Levando em consideração a personagem de ficção é importante problematizar a construção do papel feminino nos diversos gêneros literários: como têm sido construídas essas personagens, tanto em obras de autoria feminina como masculina, assim como perceber seu papel social além do clássico tripé: esposa, mãe e dona de casa. É importante conhecer como essas personagens femininas foram incorporadas ao sistema literário brasileiro por meio da tradução e como essas novas obras se evidenciam hoje, no âmbito das proposições teórico-críticas. De acordo com Sherry Simon (1996), Luise von Flotow (1991), Rosvitha Friesen Blume (2010), Olga Castro (2009) e Cláudia Costa (2012), entre outras teóricas feministas, o vínculo entre mulheres e tradução é antigo, pois trata-se de uma construção histórica que ressalta como a exclusão das mulheres do âmbito profissional e social as levaram ao não tão visível trabalho de tradução que, à época, era visto como ofício secundário. As produções originais, escritas principalmente por homens, eram consideradas obras relevantes, enquanto as traduções – da mesma forma que as mulheres – recebiam qualificações associadas à submissão e à “traição”, era considerada uma atividade secundária e estava relacionada a estereótipos misóginos. A tradução foi a porta de entrada de muitas mulheres no mundo literário, já que esse sistema patriarcal negava o papel de escritoras ou as mantinha no papel de autoras invisíveis. E foi também graças à tradução que foi possível divulgar a pluralidade de ideologias feministas, visibilizando os diferentes níveis de opressão de gênero, dependendo da cultura e sociedade de cada mulher (Castro, 2008). E além de enriquecer os Estudos da Tradução, as ideologias feministas, também contribuíram para superar algumas noções tradicionais como equivalência, fidelidade, além de questionar os papéis de gênero, desempenhando, portanto, um importante papel de enriquecimento cultural. Por isso é importante reflexionar sobre o papel das mulheres tradutoras nessa prática. Os feminismos demonstraram que essa neutralidade ideológica exigida na tradução é, de acordo com Castro (2008) uma ficção produto do patriarcado e que resulta inevitável uma intervenção no texto traduzido, isto é, a tradução como reescritura (Bassnett e Lefevere, 1990). Por isso, a interação entre feminismos e tradução é uma área relevante pelo compromisso que as tradutoras adquirem na prática, já que as estratégias feministas devem ser visíveis e mostrar a posição ideológica da tradutora e não invisibilizá-las numa suposta objetividade. Os Estudos da Tradução e os Estudos de Gênero oferecem possibilidades de revisar essas questões e resgatar textos que foram traduzidos de forma sexista, assim como a realização de projetos de tradução cujo principal objetivo é o de visibilizar os trabalhos produzidos por mulheres, criando assim uma rede de apoio e de destaque através desse ato político. Cabe destacar que a prática de tradução feminista não abrange somente a teoria ou observações sobre o processo tradutório, ela possibilita trabalhar da mesma forma com textos feministas e propor traduções viabilizando que outras pessoas tenham acesso a esses trabalhos, criando essa conexão em que são partilhados conhecimentos e vivências. As mulheres autoras vêm ganhando uma maior visibilidade nas últimas décadas. Muitas dessas autoras também eram tradutoras e foram eclipsadas ao longo dos séculos, como a escritora espanhola do século XIX, Emilia Pardo Bazán, pioneira na defesa dos direitos da mulher; a chilena Gabriela Mistral, Nobel de Literatura em 1945, e menos conhecida mundialmente do que os outros ganhadores do Prêmio Nobel espanhóis ou hispano-americanos; as autoras invisibilizadas do boom latino-americano do século XX, entre as que podemos destacar a Elena Garro, María Luisa Bombal ou Rosario Castellanos. Nestas duas décadas do século XXI estamos presenciando uma maior visibilidade de autoras hispano-americanas que, inclusive, já contam com suas obras traduzidas no Brasil. É de sobrada relevância, principalmente na América Latina, o movimento intitulado “Mujeres que Traducen Mujeres” #womenintranslation, isto é, mulheres que traduzem mulheres de língua espanhola para a língua inglesa. Esta tentativa possibilita que outras culturas possam ter acesso a autoras hispanas por meio da tradução, fato que provoca certo incômodo em algumas vozes que já consideraram a possibilidade de que este movimento pode priorizar questões de gênero à qualidade literária das obras traduzidas. O mapeamento de quais autoras hispano-americanas são traduzidas para o Brasil e quem as traduz é considerado relevante para este debate. Por fim, são esperadas, também, investigações que discutam os desafios entre os diversos feminismos: o ocidental, o pós-colonial, entre outros (bell hooks, 2018; Spivak, 2010), com o fim de contribuir aos estudos feministas e de tradução literária.
PALAVRAS-CHAVE: literatura espanhola, literatura hispano-americana, mulher, tradução literária.

NARRATIVA, TRADUÇÃO E TRANSCRIAÇÃO: DIÁLOGOS ENTRE LÍNGUAS, LINGUAGENS, GÊNEROS LITERÁRIOS E CONFIGURAÇÕES ESTÉTICAS
EIXO: TRADUÇÃO COMO ARTE DO (DES)ENCONTRO
SIMPÓSIO: NARRATIVA, TRADUÇÃO E TRANSCRIAÇÃO: DIÁLOGOS ENTRE LÍNGUAS, LINGUAGENS, GÊNEROS LITERÁRIOS E CONFIGURAÇÕES ESTÉTICAS
COORDENADORES:
- Lacy Guaraciaba Machado (PUC-Goiás)
- Joabson Lima Figueiredo (UNEB-BA)
RESUMO: Etimologicamente, o termo traduzir provém da palavra latina traducere que alude a “fazer passar”, “conduzir alguém pela mão para o outro lado, ou para outro lugar”, “transpor de uma língua para outra”; o prefixo trans-, presente em transcriação, por sua vez, significa “através de, para além de” (CUNHA, 1982, p. 780-781, respectivamente). Elaborado por Haroldo de Campos dentro das problemáticas da poesia concreta, o ensaio “Da tradução como criação e como crítica”, publicado pela primeira vez em 1962, apesar de não explicitar o vocábulo transcriação, pode ser um ponto de partida para compreendê-lo: mais que uma tentativa de adequação de significado de um texto para outro código linguístico, transcriar seria um processo de reinvenção estética de uma obra em outra língua e/ou sistema semiótico. A transcriação conjugaria a construção de uma teoria sobre a poética do traduzir, na qual não apenas a criação, mas também a crítica literária se reorganizariam de modo especial, abrangendo tanto a valorização da materialidade dos signos e da carga semântica, como também os aspectos de (re)significação de uma obra quando confrontada com tempos e/ou espaços diversos. Campos renomeou a tradução criativa como transcriação na nota introdutória da tradução que realizou de alguns cantos da parte “Paraíso”, da A Divina Comédia, de Dante Alighieri: a transcriação seria um modo de traduzir que se preocupa eminentemente com a reconstituição da informação estética do original para outra língua, não lhe sendo, portanto pertinente o simples escopo didático de servir de auxiliar à leitura do original. Há, assim, uma perspectiva de isomorfia em relação ao texto matriz, que, de certa maneira, ambiciona afirmar-se como um outro original, uma vez que a prática de transcriar inicia pela percepção e pelo exame dos eixos articuladores do texto a traduzir. Nesse sentido, em uma perspectiva mais radicalizada, a transcriação pode se fazer presente não apenas na tradução de uma obra para outra língua com a (re)criação de aspectos estéticos - como a passagem de contos de fadas para a literatura surda -, mas também com o diálogo e a (re)configuração de suas estruturas em outros gêneros literários que, por seu turno, são cada vez mais marcados pela dissolução de seus liames. Ampliando essa possibilidade para além das fronteiras literárias, o processo de (re)elaboração estética pode ainda estreitar laços com outras artes e até mesmo com a narrativa histórica, aumentando a compreensão da linguagem artística em sua riqueza e multiplicidade de leituras críticas e redimensionando as noções de literatura e de crítica literária, sempre em diálogo com o contexto sócio-histórico e cultural. Apesar de, a priori, o texto histórico não estar correlacionado ao universo artístico, sua inclusão dentro da perspectiva da transcriação se deve ao fato da literatura, com destaque as de países com uma modernização tardia - como é o fato do Brasil -, estabelecer um diálogo crítico, posicionando-se através da estética frente a questões políticas e sociais. Essa outra perspectiva semiótica traz complexidade as narrativas que passam a estar paralelas frente ao mesmo objeto: o passado. Esse, por seu turno, é reconfigurado esteticamente a partir das possibilidades de vivência, da memória, do não-acontecido que evocam a configuração das engrenagens sociais de uma época em que os embates entre atraso x progresso, tradição x modernidade estavam colocados, intentando-se construir um texto que venha conduzir o leitor a um maior conhecimento tanto estético quanto histórico. Isso posto, o objetivo geral desse simpósio é apresentar estudos sobre as relações entre narrativa, tradução e transcriação a partir dos diálogos entre línguas, linguagens, gêneros literários e configurações estéticas que diferentes textos podem estabelecer entre si. Tendo como base estudos críticos e teóricos concernentes tanto à Teoria da Narrativa e à Literatura Comparada, quanto à transcriação e à tradução literária, com enfoque eminentemente transdisciplinar, a pesquisa pretende estabelecer conexões entre diferentes sistemas de significação e de relações intersemióticas (literatura, história, literatura surda, teatro, música, pintura, escultura, arquitetura, cinema, fotografia, artes plásticas e publicidade). Assim, as pesquisas que se vincularem ao simpósio podem analisar obras de arte observando o processo criativo no imaginário contemporâneo; abordar os estudos que sustentam as teorias da narrativa, da tradução e da transcriação; discutir sobre o tema proposto, construindo estudos, comparações, leituras e reflexões em torno da tradução e da transcriação literárias, utilizando ou não as novas linguagens midiáticas; ou, por fim, promover discussões sobre a acessibilidade à literatura surda para o público não ouvinte, além de refletir sobre as relações que ela estabelece com os estudos literários de uma forma geral. As exposições também podem acrescentar o caráter de apropriação e transcriação do discurso histórico pelo literário, tônica Literatura Brasileira, exemplificando como ocorre essa relação e sua reconfiguração estética.
PALAVRAS-CHAVE: Tradução; Transcriação; Linguagens Interartísticas; História e Literatura.

NÃO APENAS O MEDITERRÂNEO: DISCUTINDO A TRADUÇÃO DE CLÁSSICOS GLOBAIS PARA O BRASIL DE HOJE
EIXO: TRADUÇÃO COMO ARTE DO (DES)ENCONTRO
SIMPÓSIO: NÃO APENAS O MEDITERRÂNEO: DISCUTINDO A TRADUÇÃO DE CLÁSSICOS GLOBAIS PARA O BRASIL DE HOJE
COORDENADORES:
- Andrei dos Santos Cunha (UFRGS)
- Lica Hashimoto (USP)
- Michele Eduarda Brasil de Sá (UFRJ/UFMS)
RESUMO: A ideia de “letras clássicas”, aplicada na Europa a um corpus específico e regionalmente limitado de textos, tem equivalentes em outras partes do mundo. As literaturas da China, da Índia, da Coreia, dos povos pré-colombianos, do Japão e do mundo árabe — para ficarmos apenas em alguns exemplos muito visíveis e conceitualmente consolidados — também possuem um conjunto de textos que servem a função político-identitária de dar profundidade cronológica à narrativa de formação de um determinado sistema. Muitas dessas literaturas têm caráter supranacional. Na Europa, o grego clássico e o latim foram os veículos de produções literárias que ignoravam uma razoável quantidade de fronteiras. As culturas semíticas possuem livros sagrados e seculares escritos em línguas estudadas para além do grupo que as utilizava. O mundo árabe, a civilização persa, o Império Otomano e a cultura eslava são também exemplos de comunidades de escrita que incluem falantes de muitos idiomas. O subcontinente indiano tem obras literárias canônicas que são lidas em diferentes comunidades linguísticas. A esfera civilizacional chinesa se baseia em uma escrita compartilhada que é compreendida e utilizada mesmo por autores que não falam a língua que os ideogramas inicialmente representavam. A ideia — e a problematização — de uma “literatura clássica” foi recentemente revisitada por Lande e Feeney (2021). Segundo os autores, apesar da alta complexidade desse problema, investigá-lo com justa (e ousada) atenção comparatista se revelaria um exercício de grande valor para quem deseja repensar os primeiros textos de qualquer tradição. Pode-se considerar, por exemplo, as relações desses “começos literários” tanto com as oralidades à sua volta quanto com os sistemas de escrita que serviram de suporte às suas palavras; quais as preferências formais da sua “linguagem poética” — aquilo que Earl Miner (1990) chama de “poéticas fundacionais” e que ele buscou analisar no contexto de uma “poética comparada” —; de que forma a sua presença social ajudou a construir alguma ou diversas identidades nacionais ou políticas; qual a importância da atividade tradutória no seu desenvolvimento; de que modo suas obras motivaram e foram lidas pelas tradições críticas que as leram primeiramente; e como esses “começos” foram recebidos ulteriormente por outras civilizações. Todos esses parâmetros permitem descobrir similaridades e diferenças informativas entre duas ou mais literaturas iniciantes e entre seus respectivos processos de formação. A proposta de discutir essas literaturas e suas traduções brasileiras conjuntamente participaria dos debates comparatistas contemporâneos que giram em torno das ideias de literatura-mundo e das literaturas sem morada fixa (COUTINHO, 2022). Essas obras mais ou menos antigas — seja em suas línguas-mães, seja em suas traduções — são parte possível de um cânone global múltiplo temporal e espacialmente e fluido no seu acervo, que é revitalizado e sempre expandido a cada nova versão sua para uma língua estranha ao seu primeiro contexto de concepção. No caso das literaturas clássicas regionais europeias, um crescente número de investigadores tem voltado sua atenção às especificidades da recepção desses textos no contexto literário brasileiro — uma discussão que passa pela recuperação histórica das traduções e edições realizadas no Brasil e engloba questões de categorias diversas, como a técnica e a norma tradutória, o tipo de paratexto, o polissistema nacional, o referencial periférico, a posição do Brasil no mundo, e muitos outros aspectos tanto práticos como teóricos. Ora, pode-se lançar mão do mesmo tipo de discussão também para o caso de clássicos de outras regiões do planeta quando eles são recebidos pelo nosso sistema literário — os casos de O livro de travesseiro de Sei Shônagon, da Epopeia de Gilgámesh, do Popol Vuh e do Livro das mil e uma noites são exemplos célebres de um conjunto em expansão. Mesmo com todas essas novas edições brasileiras, a assimetria quantitativa (e de prestígio) entre as “letras clássicas stricto sensu” — ou seja, o corpus delimitado das literaturas helênica e latina — e as outras “letras clássicas do mundo” em tradução no Brasil continua sendo uma questão preocupante e que precisa ser trabalhada no âmbito acadêmico. O presente Simpósio Temático acolherá discussões relacionadas aos seguintes tópicos: (1) problematizações da definição e da geolocalização do sistema de “letras clássicas”; (2) projetos de tradução, análises literárias ou descrições de corpora tradutórios de obras consideradas como pertencentes a conjuntos denominados, em suas culturas, como “letras clássicas”, “começos literários”, “poéticas fundacionais” ou categorias análogas; (3) questões de tradução ou de recepção relacionadas à especificidade daquilo que se convencionou chamar de “letras clássicas”, assim como à sua aplicabilidade a outros conjuntos textuais de categorias análogas; (4) a recepção brasileira das obras ditas “clássicas”, tanto as do conjunto stricto sensu (ou seja, as da Antiguidade mediterrânea) quanto as pertencentes a outros grupos de características análogas.
PALAVRAS-CHAVE: letras clássicas, letras clássicas não mediterrâneas, poéticas fundacionais, começos literários, tradução literária no Brasil

TRADUZINDO NO ATLÂNTICO NEGRO
EIXO: TRADUÇÃO COMO ARTE DO (DES)ENCONTRO
SIMPÓSIO: TRADUZINDO NO ATLÂNTICO NEGRO
COORDENADORES:
- Denise Carrascosa França (Universidade Federal da Bahia)
- Mayana Rocha Soares (UFOB - Universidade Federal do Oeste da Bahia)
- Felix Ayoh' Omidire (Universidade Obafemi Awolowo, Ile-Ife, Nigéria)
RESUMO: O campo dos estudos de tradução literária no Brasil, aquele que orienta a práxis tradutória de textos da literatura e da cultura em suas mais diversas formas, permanece epistemologicamente centrado em teorias e métodos advindos do norte global, que ignoram a teoria crítica a regimes políticos, simbólicos e subjetivos racializados e gendrificados sob as violentas regras de nossa colonialidade escravista. A partir deste diagnóstico, propomos uma intervenção teórico-crítica no referido campo de debates que descolonize sua episteme e projete uma cartografia de teorias, métodos e práxis tradutórias dos textos da literatura e da cultura afrodiaspóricas e africanas que lidem com as questões raciais, de gênero, sexualidade e classe social, em um sentido abolicionista destas opressões sociais ainda violentamente ativas no Brasil contemporâneo. No contrafluxo, os nossos operadores conceituais de tradução funcionarão como bússolas recalibradas que, ao invés de magnetizadas pelo binômio norte-sul, operarão apontando para o Oriente dos pontos em que estivermos localizados – aquilo que lermos como negro-local ali nos pontos de fuga dos projetos de nação. As formas eurocentradas de ler e traduzir terão seu volume diminuído ao mínimo na interseccionalização de conceitos e experiências e experimentações subjetivas transnacionais e transidentitárias. Os projetos decolonial e negro-feminista farão a recalibragem deste instrumento náutico para corrigir-nos dos perigos de invisibilização dos locais afrodiasporicamente potentes em seu porvir de conexão nas rotas negro-atlânticas, para que consigamos distinguir modernidades outras. O espaço entre aquilo que se vê no horizonte e os astros vem sendo medido em filosofia e teoria de arte há mais de dois milênios no calendário cristão. Nossos astrolábios temporalmente viciados mensuram essas distâncias e congelam as possibilidades do céu a cada velha-nova estrela que faz surgir. Os astros que emitem sua luz imensurável em uma órbita temporal outra não entram na parametrização; aguardam calmamante quem lhes traduza neste espaço navegável. Outros sextantes poderão, talvez, precisar movimentos tonais de línguas afrodiaspóricas, com rítimicas incrustadas na orla de uma memória oral que se refazem em uma diversidade de textos estéticos, inclusive os visuais e os performativo-corporais, em formas literárias que não admitem separação entre letra morta e corpo vivo. Como traduzir grafo-centradamente os textos estéticos negros? Sua insterseccionalidade midiática pode ser ignorada na tarefa de tradução? Aquilo que ora se vem chamando tradução literária ou mesmo literatura alcança a multidimensionalidade ancestral das estéticas afrocentradas? Há algo indizível e não dito de forma audível no Brasil, no campo dos estudos de tradução, que deriva, evidentemente, como em tantas outras esferas de nossas instituições sociais, de nosso passado escravocrata e colonial e de nossa imensa e cordial capacidade de não lidar com seus fantasmas no processo moderno de formação da identidade nacional. A maioria absoluta da textualidade estrangeira que nos chega pela via da tradução e, na contramão, da textualidade brasileira traduzida para outros países é feita por pessoas não negras. Este fato tem relação com a acessibilidade ao aprendizado de línguas estrangeiras em um país de maioria populacional negra que, tendo concentrado o acesso às línguas estrangeiras modernas nas escolas particulares e cursos livres privados, manteve um dispositivo de controle de entrada e saída de informações e ideias centrado em interesses e perspectivas não negras, como uma das formas de gestão de uma supremacia ideológica branca na base da construção de pensamento no país. A nossa universidade contemporênea – epistemológica e linguisticamente eurocentrada – é consequência direta desse projeto político-racial. Aqui perguntamos: quais sãos as rotas prioritárias de tradução para o Brasil e a partir do Brasil? Quem escolhe os textos a serem traduzidos? Como se traduzem os textos escolhidos? As textualidades afrodiaspóricas que são traduzidas escapam efetivamente aos mecanismos ideológicos e estéticos de controle? O processo de tradução de textualidades afrocentradas pode produzir formas de comunidades outras que tracem rotas inesperadas, que foram inviabilizadas pelas barreiras linguísticas e nacionais impostas pelo processo colonial e escravocrata racista. Este projeto de tradução do e no Atlântico Negro tende a gerar plataformas de intercomunicabilidade de experiências e experimentações para além das identidades raciais, de classe, de gênero e sexuais controladas que os projetos nacionais modernos inscreveram no porvir dos povos territorializados, a fim de capitalizar suas rentabilidades econômico-políticas, fixando os lugares humanos dentro de uma escala hierarquicamente útil. Palavras-chaves: tradução literária afrodiaspórica; literatura negra brasileira; literatura negra africana. Referências Bibliográficas AKOTIRENE, Carla. Interseccionalidade. São Paulo: Sueli Carneiro, Ed. Jandaíra, 2020. BANDIA, Paul F. Translation as Reparation: writing and translation in postcolonial Africa. New York: St. Jerome, 2008. CARRASCOSA, Denise. Traduzindo no Atlântico Negro: cartas náuticas afrodiaspóricas para travessias literárias. Salvador: Editora Ogum’s, 2017. EDWARDS, Brent Hayes. The practice of diaspora: literature, translation and the rise of black internationalism. Cambridge: Harvard University Press, 2003. GLISSANT, Édouard. Introdução a uma poética da diversidade. Juiz de Fora: Ed. UFJF, 2005.
PALAVRAS-CHAVE: Palavras-chaves: tradução literária afrodiaspórica; literatura negra brasileira; literatura negra africana.

TRADUÇÃO E LINGUAGENS TRANSCRIATIVAS: ESTUDO DE TEXTOS INTERARTÍSTICOS SOB DIFERENTES OLHARES
EIXO: TRADUÇÃO COMO ARTE DO (DES)ENCONTRO
SIMPÓSIO: TRADUÇÃO E LINGUAGENS TRANSCRIATIVAS: ESTUDO DE TEXTOS INTERARTÍSTICOS SOB DIFERENTES OLHARES
COORDENADORES:
- Divino José Pinto (Pontifícia Universidade Católica de Goiás)
- Átila Silva Arruda Teixeira (Pontifícia Universidade Católica de Goiás)
- Simone Gorete Machado (Universidade de São Paulo)
RESUMO: TRADUÇÃO E LINGUAGENS TRANSCRIATIVAS: ESTUDO DE TEXTOS INTERARTÍSTICOS SOB DIFERENTES OLHARES Resumo: Este simpósio agrega pesquisadores da área da tradução, na prática da leitura e da crítica estético-literária, tanto interlingual, quanto intralingual ou intersemiótica, compreendendo as bases do comparatismo como princípio inter e transdisciplinar que regem as demais ações que delas decorrem. A proposta norteadora deste simpósio diz respeito à exploração crítica das relações dialógicas da tradução, em suas distintas modalidades e formas de aparição, nas dimensões interartísticas, numa perspectiva de interação com os sujeitos que atuam no processo mesmo da produção e da leitura das obras de arte várias, a saber: o autor, o leitor e a própria obra de arte. Nesse sentido, entendemos que, tanto o autor quanto o leitor se apoiam em seu repertório cultural de que são dotados e nas bases teóricas acumuladas que os movem durante o ato da produção e da leitura, num exercício performativo silencioso que aproxima as duas partes desse processo. Isso porque é consabido que toda obra de arte construída nos diferentes sistemas de linguagem se converte, tão logo que é criada, em uma ferramenta instigadora de construção de redes de sentidos. E são essas redes que, em última análise, movimentarão, de forma metalinguística, outras linguagens que se debruçam sobre tal objeto artístico. Daí é que se depreende toda a relevância de se intensificarem os estudos que estabeleçam a relação das interartes constitutivas de um território amplo e de um espaço/lugar sedutor, atentando-se para as novas perspectivas de análise, interpretação e demais mecanismos de investigação que conduzam à compreensão das variadas formas de obras de artes em suas múltiplas e profícuas correspondências. As linguagens, sejam elas verbais, sejam visuais ou de qualquer outro sistema semiótico, incorporam e mobilizam signos distintos, autônomos e complexos, dada a sua natureza estética e sua função no ato expressivo que encenam. Assim é, que delimitadas as ações, neste simpósio, pretende-se constituir, como provocação para que se socializem as investigações tradutórias, em seus modos distintos, comparatísticas, transcriativas e interartísticas, relacionadas à produção e recepção estéticas, mediante abordagens de cotejamentos que promovam novos olhares sobre combinações e processos de hibridação de linguagens criativas, incluindo estudos sobre a recepção da obra de arte e sua relação com espaços de leitura e ferramentas contemporâneas adotadas para a produção, circulação e veiculação de textos críticos e artísticos. Realizar estudos teóricos da linguagem literária na sua relação com outras linguagens pressupõe estabelecer aproximações, contrapontos e distinções, para melhor compreender o parentesco e a parentalidade de gêneros artísticos manifestados nessas linguagens. Daí a relevância em explorar relações dialógicas entre Literatura e outras artes apreendidas como fatores geradores de identidades em cada uma dessas formas artísticas, assumidas como fonte criativa de acentuada produtividade nos dias atuais. Alguns teóricos que subsidiam os estudos pautados por propósitos como estes que aqui descrevemos podem ser representados por Haroldo de Campos, Heloisa Barbosa, Eduardo Coutinho, Tânia Franco Carvalhal, Suzane Langer, Júlio Plaza, Giorgio Agamben, Mario Bellatin, Walter Benjamin, Theodor W. Adorno, Roland Barthes, Susan Buck-Morss, para quem, A coletividade do século XX [...] constrói sua identidade na base da imagem ao invés da palavra (BUCKMORSS, 2009, p. 28) e forma uma comunidade transnacional, embora o signo verbal continue habitando os mais diferenciados espaços textuais verbais e não-verbais. Nessa direção, pretende-se aqui socializar, neste simpósio, estudos que tratem, por meio dos múltiplos olhares, das relações entre textos de diferentes sistemas de linguagem, averiguando, por exemplo, até que ponto os aspectos relativos o processo da continuidade/descontinuidade, à compleição formal das obras articulam-se e podem ser entendidos como fenômenos inerentes à produção, à complexidade ou simplificação estética e de como tudo isto proporciona relações de fruição artística e consumo. Neste simpósio, atenta-se também para as questões emergentes na produção, consumo e fruição de objetos artísticos na era da velocidade, considerando os meios diversos da comunicação de massa, os mais diversificados canais virtuais da contemporaneidade capazes de colocar em contato, de forma ágil, as comunidades mais distintas em suas realidades e espaços mais longínquos possíveis. Destarte, as teorias da desconstrução, do rizoma e as teorias da pós e da hipermodernidade são contempladas, uma vez que estas têm se tornado objeto de grande interesse no âmbito acadêmico, no intuito de oferecer possíveis respostas à sociedade que busca mais compreensão sobre os tempos e os modos pautados pela incerteza que hoje vivenciam perplexa. Palavras-Chave: Estudos comparados e tradução. Hibridação de linguagens criativas. Interartes. Repertório cultural. Transcriação.
PALAVRAS-CHAVE: Palavras-Chave: Estudos comparados e tradução. Hibridação de linguagens criativas. Interartes. Repertório cultural. Transcriação.

TRADUÇÃO LITERÁRIA CRIATIVA: DESAFIOS E REFLEXÕES DO TRADUTOR
EIXO: TRADUÇÃO COMO ARTE DO (DES)ENCONTRO
SIMPÓSIO: TRADUÇÃO LITERÁRIA CRIATIVA: DESAFIOS E REFLEXÕES DO TRADUTOR
COORDENADORES:
- Andréa Cesco (Universidade Federal de Santa Catarina)
- Lilian Cristina Barata Pereira Nascimento (Universidade Federal do Pará)
- Wagner Monteiro Pereira (Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
RESUMO: O simpósio busca reunir trabalhos cuja metodologia esteja centrada na tradução de textos literários, sejam eles em prosa ou poesia. Isto é, textos que envolvem linguagem poética, carregada, em certo grau, de “informação estética”, conforme as reflexões do filósofo Max Bense (BENSE, 1971, apud CAMPOS, 2011, p. 16). Isso infere uma tradução criativa, envolvendo engenhosidades e estratégias muito mais complexas do que transpor significados exclusivamente semânticos de uma língua para outra: a informação estética transcende a informação semântica e exige frequentemente um gesto de recriação (CAMPOS, 2006, p. 35). Como nos lembra Octavio Paz (1992, p. 77), o sublime da tradução poética “consiste em produzir com meios diferentes efeitos análogos”. No século XX surgiram teorias que pensam a tradução de forma menos empírica e em relação com diferentes áreas. Nesse sentido, tem papel fundamental o texto de Walter Benjamin, A tarefa do tradutor (2010), cuja ideia central é a de que na tradução de uma obra poética deve-se privilegiar a forma significante em detrimento da simples transmissão do conteúdo da língua original para a traduzida. O texto de Walter Benjamin funcionou como um ponto de partida para diversas discussões sobre a prática tradutória no século XX. Haroldo de Campos, em Da transcriação: poética e semiótica da operação tradutora (2011), atentou para a complexidade que uma tradução poética implica e relaciona a língua pura de Benjamin com um lugar semiótico da poesia. Esta ideia também se alinha à óptica derridiana de sobrevida do texto poético, que dialeticamente o considera traduzível e intraduzível. Em síntese, para Derrida (2005, p. 105), o texto traduzido surge como uma espécie de revenant, um espectro localizado dentro de um “aqui-e-agora”, um novo éthos que confirma dois pontos cruciais na visão do filósofo francês: a alteridade – “tout autre est tout autre” e a liberdade criadora que efetiva o caráter inventivo do poeta-tradutor. Em uma linha oposta, Paulo Henriques Britto, em A tradução literária (2012), afirma que um texto considerado difícil e estranho em sua cultura de origem deve ser traduzido no sentido de provocar as mesmas reações de estranhamento nos leitores da cultura de chegada, pois, para ele, quando traduzimos textos poéticos devemos, sem dúvida, considerar muito mais o som do que o sentido e até mesmo a aparência do texto (como os versos são construídos quanto à forma), pois são estes elementos que produzem o tão almejado efeito estético; não se traduz apenas o significado, traduz-se o próprio signo, sua iconicidade. Antoine Berman, em A prova do estrangeiro (2002, p. 263-264), afirma que “o tradutor obriga o leitor a sair de si mesmo, a fazer um esforço de descentramento para perceber o autor estrangeiro em seu ser de estrangeiro”. Já em A tradução e a letra ou o albergue do longínquo (2013), Berman reconhece que o objetivo ético da tradução consiste, na língua de chegada, em manifestar uma novidade “pura”, que não havia antes, trazendo a oportunidade de preservar o efeito da novidade, e contínua, “O objetivo ético do traduzir, por se propor acolher o estrangeiro na sua corporeidade carnal, só pode estar ligado à letra da obra” (2013, p. 98). E Viveiro de Castro (2005) sintetiza perfeitamente a presente proposta: “O outro não é aqui um espelho, mas um destino”. Deste modo, questões como tradução versus recriação, bem como o papel do tradutor como difusor de obras literárias são pertinentes dentro deste debate. Assim, este simpósio pretende proporcionar um espaço de discussão e reflexão sobre as escolhas, os desafios e as operações que envolvem a tradução criativa e suas implicações, assim como discutir o posicionamento do tradutor em relação ao texto de partida e de chegada, ao leitor e a questões culturais. São relevantes trabalhos que discutam questões caras às teorias da tradução, como os conceitos de equivalência, empréstimo e transposição e que se proponham a dialogar com as teorias culturais da Pós-Modernidade. Sendo assim, são aceitas contribuições que versem sobre as mais diversas experiências de tradução literária, que implicam necessariamente a tradução criativa e que procuram reproduzir em outra língua as operações literárias do texto fonte. Ademais, trabalhos que abordem a recepção de obras literárias também serão pertinentes para se debater, inclusive, diferentes posturas perante o texto, conforme a época em que as traduções foram realizadas ou publicadas. Considera-se que a escolha deste tema poderá oferecer o espaço necessário para o intercâmbio e o (des)encontro entre os diferentes posicionamentos teóricos e práticos.
PALAVRAS-CHAVE: Tradução literária. Prática da tradução. Tradução criativa. Recriação.

TRADUÇÃO LITERÁRIA E FEMINISMOS: PONTOS DE ENCONTRO
EIXO: TRADUÇÃO COMO ARTE DO (DES)ENCONTRO
SIMPÓSIO: TRADUÇÃO LITERÁRIA E FEMINISMOS: PONTOS DE ENCONTRO
COORDENADORES:
- Luciana Carvalho Fonseca (USP)
- Marina Leivas Waquil (USP)
- Leticia Maria Vieira de Souza Goellner (Pontificia Universidad Católica de Chile)
RESUMO: Tradução literária e feminismos: pontos de encontro Já há bastante tempo está consagrada a relação da literatura com a tradução. Trata-se, inclusive, de uma relação de forte interdependência: se, por um lado, para a tradução, uma de suas principais fontes textuais é justamente a literatura, para a produção literária, o contato com traduções representa a possibilidade do encontro com a alteridade – com diferentes experiências de mundo, culturas, línguas e subjetividades. Assim, os sistemas literários são enriquecidos pela recepção de traduções, ao passo que a produção literária alimenta a prática tradutória. Neste simpósio, no entanto, buscamos adicionar outra camada a essa relação: a dos feminismos. Desde a chamada virada cultural, os Estudos da Tradução vêm acolhendo reflexões e debates sobre a relação da tradução com perspectivas, sujeitos e objetos por muito tempo invisibilizados e invisibilizadas. Como consequência, a tradução deixou de ser vista exclusivamente como uma operação linguística de decodificação/codificação para ser entendida, estudada e praticada como uma complexa atividade comunicativa, dinâmica, guiada por fins predeterminados e, portanto, nunca neutra, mas sempre atravessada por ideologias e relações de poder. Com o impulso das teorias pós-estruturalistas, desconstrutivistas, decoloniais – entre outras – e com a influência da força dos movimentos sociais, a tradução também passou a ser estudada a partir de seu potencial como ferramenta em lutas políticas, como intermediadora cultural, como atividade ético-ideológica. Dessa forma a reflexão do campo ampliou o debate normativo e prescritivo sobre “como” traduzir, adicionando questões como: quem é traduzido? Quem traduz? Por que se traduz? De onde e para onde se traduz? Foi nesse contexto de expansão do paradigma teórico-metodológico da tradução que se desenvolveram – e seguem em desenvolvimento – reflexões feministas no campo da tradução, centradas nas desiguais relações de poder mantidas por práticas tradutórias em função das múltiplas opressões de gênero. De teóricas da chamada escola canadense à mais recente Tradutologia Feminista Transnacional, os Estudos da Tradução vêm se dedicando à observação de questões – incluindo opressões, lutas e celebrações – de gênero em contextos de tradução (Fonseca et al. 2020). Inicialmente centrado na denúncia sobre a linguagem sexista empregada na produção escrita e tradutória, com foco na sua subversão, o debate foi, aos poucos, ampliando-se para dar conta de novas demandas da luta contra a opressão de gênero – como apontam Castro e Spoturno (2020, p. 13), os enfoques feministas da tradução se adaptaram para “responder a novas e diferentes materializações do patriarcado e outros sistemas de opressão”. Assim, em diálogo com o paradigma da interseccionalidade, outras variáveis identitárias (como raça, classe, contextos geopolíticos) passaram a ser observadas em sua relação com a de gênero e, assim, expandiram o debate da tradução feminista. Nesse campo, tem espaço evidente e essencial a literatura: a tradução literária é um dos campos mais frutíferos para o debate feminista na medida em que o texto literário é também um meio de expressão subjetiva, política, cultural, decolonial e, portanto, é um potencial instrumento de reivindicação de justiça social. Como resultado, assistimos, nos últimos anos, a um aumento importante de pesquisas que, por exemplo, destacam a polifonia no texto traduzido, incluindo a valorização da voz e da subjetividade da tradutora; que denunciam e criticam traduções e/ou estratégias tradutórias que reproduzem os efeitos das opressões de gênero em suas intersecções com outras variáveis; que celebram a produção literária de mulheres em contextos de tradução, com sua introdução em novos públicos leitores; que questionam o cânone literário reprodutor das relações de poder a partir da possibilidade de revertê-lo pela tradução; entre outros. Trata-se, em suma, de, por meio da tradução e de um posicionamento ético-político alinhado com as lutas feministas, buscar compensar desigualdades, denunciar ausências e preencher lacunas históricas que ainda sustentam, na literatura e na sua difusão por meio da tradução, desigualdades sociais importantes. Levando isso em consideração, este simpósio convida a proposição de trabalhos que discutam as múltiplas possibilidades de relação da tradução literária com os feminismos, bem como os estudos da tradução feminista. Trata-se, assim, de reunir discussões que proponham repensar a cartografia da tradução literária (Sánchez, 2019) levando em conta a possibilidade de reverter fluxos epistemológicos, tradutórios e literários que ainda sustentam opressões de gênero. Ao mesmo tempo, é uma oportunidade de celebrar esforços que venham sendo realizados no sentido da reversão da violência epistêmica (Spivak, 1993), também perpetuada por meio da literatura e de sua tradução, que mantém, como consequência da opressão de gênero, diversas vozes literárias em silêncio.
PALAVRAS-CHAVE: Tradução; Literatura; Feminismos
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EDUCAÇÃO LITERÁRIA EM PERSPECTIVA ANTIRRACISTA
- Fernando Maués de Faria Júnior (Universidade Federal do Pará)
- Vima Lia de Rossi Martin (Universidade de São Paulo)
- Ana Crelia Penha Dias (Universidade Federal do Rio de Janeiro)
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ENSINO DE LITERATURA: PERSPECTIVAS SISTÊMICAS
- Cristiane Brasileiro Mazocoli Silva (UERJ)
- Marcel Alvaro de Amorim (UFRJ)
- Mônica de Menezes Santos (UFBA)
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LEITURA E ESCRITA LITERÁRIAS EM SALA DE AULA: DIMENSÕES TEÓRICAS E PRÁTICAS
- Andresa Fabiana Batista Guimarães (IFSULDEMINAS)
- Gabriela Rodella de Oliveira (UFSB)
- Sarah Vervloet Soares (Instituto Federal Fluminense)
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LITERATURA, EDUCAÇÃO INTERCULTURAL E CURRÍCULO ANTROPOFÁGICO
- Marcia Paraquett (Universidade Federal da Bahia)
- Ludmila Scarano Barros Coimbra (Universidade Estadual de Santa Cruz)
- Marcos Antônio Alexandre (UFMG)
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LITERATURA, ÉTICA E ESTÉTICA: TRANS/FORMANDO LEITORES NA ESCOLA E NA UNIVERSIDADE
- Juciane dos Santos Cavalheiro (Universidade do Estado do Amazonas)
- Márcia Lopes Duarte (UNISINOS)
- Sabrina Vier (UNISINOS)

EDUCAÇÃO LITERÁRIA EM PERSPECTIVA ANTIRRACISTA
EIXO: LITERATURA E ESPAÇOS COMUNS DE APRENDIZAGEM
SIMPÓSIO: EDUCAÇÃO LITERÁRIA EM PERSPECTIVA ANTIRRACISTA
COORDENADORES:
- Fernando Maués de Faria Júnior (Universidade Federal do Pará)
- Vima Lia de Rossi Martin (Universidade de São Paulo)
- Ana Crelia Penha Dias (Universidade Federal do Rio de Janeiro)
RESUMO: Em janeiro de 2003 foi sancionada a Lei Federal 10.639, que estabeleceu a obrigatoriedade do ensino da temática “História e Cultura Afro-Brasileira” no currículo oficial da Rede de Ensino, em especial nas Áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras. Cinco anos depois, em março de 2008, a Lei 11.645 acrescentou a ela a obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Indígena Brasileira, ampliando e legitimando o estudo e a compreensão de nossa formação social a partir desses dois grupos étnicos de origem não europeia: africanos e indígenas. Como se sabe, as duas leis tiveram impacto significativo nas pesquisas acadêmicas sobre literatura, nos programas de formação de professores, na elaboração de materiais didáticos e no cotidiano das salas de aula de todo o Brasil. Trata-se de conquista decisiva para a valorização do patrimônio cultural negro e indígena e para a garantia do acesso de estudantes brasileiros, e da sociedade como um todo, a narrativas e saberes capazes de problematizar a perspectiva eurocêntrica que, historicamente, orientou a construção de nossa identidade nacional. Mais ainda, as reflexões e ações produzidas desde 2003 têm contribuído diretamente para a educação acerca das relações étnico-raciais e para o combate ao racismo estrutural (ALMEIDA, 2019) que organiza as relações sociais brasileiras. A escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, em O perigo de uma história única (ADICHIE, 2019), defende a ideia de que nosso conhecimento é formado pelas histórias que escutamos e que, por isso, quanto mais diversificadas forem essas histórias, mais sábios e humanizados poderemos nos tornar. Contra a construção e a manutenção de estereótipos, recomenda que evitemos o caminho da “história única”, sempre parcial e incompleta. No contexto brasileiro, em que a colonização e a escravidão são traumas históricos que se desdobraram na política de branqueamento efetivada após a Abolição e no mito da democracia racial que ainda vigora entre nós, é imprescindível ouvirmos outras vozes e outras histórias para além daquelas que se oficializaram ao longo do tempo. É certo que há escritores considerados canônicos que problematizam os valores hegemônicos, denunciando o caráter autoritário, violento e excludente do projeto nacional brasileiro. Entretanto, garantir que histórias contadas por africanos, afrodescendentes e indígenas sejam ouvidas e possam circular socialmente, especialmente nas instituições de ensino, responsáveis pela formação de leitores sensíveis e críticos, é essencial para uma formação humana mais abrangente, mais matizada e complexa, mais rica para de todos nós - negros e brancos, indígenas e não indígenas. Ensinar as literaturas africanas, afro-brasileira e a indígena, do ponto de vista da educação das relações étnico-raciais, requer um reposicionamento epistemológico por parte de educadoras e educadores. Isso significa, de um lado, o reconhecimento da matriz colonial que historicamente tem orientado o estabelecimento dos currículos e, de outro, o comprometimento com uma proposta de educação literária alternativa, capaz de se abrir para outras vozes e dicções que problematizam, inclusive, seu próprio lugar marginal no sistema literário hegemônico. Assim, não se trata simplesmente de agregar “novos conteúdos” aos currículos tradicionais, mas de contemplar outras possibilidades de organização da própria história e do cânone literários, compreendendo os sentidos que sustentam as ausências e apagamentos presentes no repertório literário dominante. Ainda, trata-se da discussão acerca da distribuição e organização do repertório literário e dos conteúdos da área no fragmento limitado de tempo reservado à Literatura, no contexto do ensino formal e nos ambientes informais de promoção de leitura, e de como as diversas vozes e manifestações literárias lutam, em condições desiguais, por espaço nesse palco estreito. Também, abarca-se possibilidade de novas leituras do cânone tendo em vista a explicitação dos percursos que culminaram com a edificação de modelos racistas ao mesmo tempo que se contempla a capacidade do texto literário de guardar a antítese, a crítica dos mesmos modelos que cristaliza Este simpósio acolherá trabalhos que, em diálogo com esse panorama, propõem uma articulação entre ensino de literatura e (des)igualdade racial, seja em termos de discussões teóricas ou de abordagens práticas que, teoricamente embasadas, visem à construção de uma educação literária antirracista, que se faz tão urgente nos dias que correm. Bibliografia ADICHIE, Chimamanda Ngozi. O perigo de uma história única. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. ALMEIDA, Silvio. Racismo estrutural. São Paulo: Pólen Livros, 2019. hooks, bell. Ensinando a transgredir. A educação como prática da liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2013. BRASIL. Lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Brasília, DF: Ministério da Educação. BRASIL. Lei 11.645, de 10 de março de 2008. Brasília, DF: Ministério da Educação. GOMES, Nilma Lino (Org.). Um olhar além das fronteiras: educação e relações étnico-raciais. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2020. MUNANGA, Kabenguele. Negritude: usos e sentidos. São Paulo: Autêntica, 2019.
PALAVRAS-CHAVE: Educação literária; Desigualdade racial; Literatura e ensino; Cultura indígena brasileira; Cultura afro-brasileira

ENSINO DE LITERATURA: PERSPECTIVAS SISTÊMICAS
EIXO: LITERATURA E ESPAÇOS COMUNS DE APRENDIZAGEM
SIMPÓSIO: ENSINO DE LITERATURA: PERSPECTIVAS SISTÊMICAS
COORDENADORES:
- Cristiane Brasileiro Mazocoli Silva (UERJ)
- Marcel Alvaro de Amorim (UFRJ)
- Mônica de Menezes Santos (UFBA)
RESUMO: Este simpósio se destina prioritariamente a reunir pesquisadores que discutam o ensino de literatura em espaços institucionais e as práticas de leitura literária nos âmbitos da Educação Básica e do Ensino Superior em diferentes contextos. Consideramos, como fonte especial de motivação desta proposta, nossa convicção persistente na importância de agirmos em prol de garantir o “direito à literatura” preconizado por Antonio Candido com especial atenção a um cenário em que uma certa crise do ensino da literatura dá sinais de ter se aguçado por vários fatores. Por um lado, temos por exemplo o acirramento de problemas de ordem mais geral como o desprestígio crescente das licenciaturas, o agravamento das condições socioeconômicas dos professores e a nítida retração de investimentos públicos na educação. Por outro lado, temos fatores mais específicos ligados ao ensino da literatura como os questionamentos crescentes a respeito das clássicas abordagens historiográficas e estilísticas, as críticas ao cânone literário já mais enraizado, a implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e a participação relativamente baixa dos profissionais da área de Literatura em setores estratégicos que definem políticas públicas para a disciplina de Língua Portuguesa na Escola Básica (como nos programas responsáveis pela avaliação e indicação de livros para constituição dos acervos escolares ou ainda nos grupos que elaboram as avaliações diagnósticas que moldam os focos centrais de atenção dos currículos escolares e dos livros didáticos). Partimos de uma base de trabalho ligada aos coordenadores do simpósio com longa e estreita relação com projetos sistemáticos de formação continuada de professores e ampla experiência de imersão nas salas de aula em diversos níveis e segmentos, por vezes, inclusive, já reunidos em projetos públicos ligados ao ensino de literatura nas escolas federais, estaduais e municipais, em coordenação de propostas curriculares já implementadas nas escolas públicas e também em cursos e publicações acadêmicas e didáticas. Pretendemos, em relação a esse histórico conjunto de trabalhos na área, desenvolver ações de elaboração avançada das experiências já ocorridas e de retomada crítica de seus pressupostos, suas conquistas e ainda das vicissitudes que enfrentaram ao longo dos últimos anos. Para a expansão e o aprofundamento dessa base inicial de experiências e diálogos, vamos privilegiar no simpósio perspectivas teóricas de caráter sistêmico que se afinem não só com o olhar já clássico de Antonio Candido sobre o “sistema literário”, mas também com as contribuições centrais de expoentes da ciência da literatura empírica, reunidos no Brasil principalmente em torno dos estímulos teóricos trazidos por Heidrun Krieger. Nesse sentido, buscamos dialogar com trabalhos que levem em conta não só os desafios metodológicos ligados à própria natureza da literatura e da leitura literária de um modo geral, em termos próximos aos de autores como Rildo Cosson e Cyana Leahy-Dios, mas que também sejam capazes de articular a essa análise uma multiplicidade de fatores que condicionam muito concretamente a experiência de leitura literária no ambiente escolar, tais como: documentos norteadores do MEC (como os PCN, as OCN , as OCEM e a BNCC), currículos locais, políticas públicas de aquisição e constituição de acervos escolares (tais como o PNLD e o PNBE, além dos grandes portais públicos e os repositórios digitais), a fontes de acesso aos livros didáticos e paradidáticos e aos demais materiais de apoio, o próprio panorama da produção contemporânea de literatura para crianças e jovens, o funcionamento das avaliações diagnósticas de largo espectro (como o ENEM e a Prova Brasil) e ainda as condições estruturais e políticas em que têm se dado a formação e a prática docente nos espaços institucionais. A partir da discussão e do estreitamento de contato entre pesquisadores ligados a esse leque de abordagens possíveis, propomos ainda que o simpósio possa funcionar como uma referência efetiva e um catalizador não só para uma ampla revisão crítica das metodologias de ensino da área, mas também para uma elaboração conjunta de outras intervenções públicas. Nesse sentido, destacamos o nosso interesse na construção de ações de interlocução ligadas às orientações curriculares vigentes, à constituição de instrumentos de análise mais refinados para seleção e produção de materiais destinados ao ensino de literatura, e ainda em relação à criação ou à consolidação de práticas e canais de compartilhamento mais sistemático de estratégias para o desenvolvimento de letramentos literários e dos letramentos literários de reexistência em contextos formais e mesmo em contextos informais de aprendizagem.
PALAVRAS-CHAVE: ensino de literatura - perspectivas sistêmicas - metodologias de ensino - políticas públicas - orientações curriculares - BNCC - acervos escolares - materiais did&aac

LEITURA E ESCRITA LITERÁRIAS EM SALA DE AULA: DIMENSÕES TEÓRICAS E PRÁTICAS
EIXO: LITERATURA E ESPAÇOS COMUNS DE APRENDIZAGEM
SIMPÓSIO: LEITURA E ESCRITA LITERÁRIAS EM SALA DE AULA: DIMENSÕES TEÓRICAS E PRÁTICAS
COORDENADORES:
- Andresa Fabiana Batista Guimarães (IFSULDEMINAS)
- Gabriela Rodella de Oliveira (UFSB)
- Sarah Vervloet Soares (Instituto Federal Fluminense)
RESUMO: Desde o final da década de 1960 e início da de 1970, a Reader-Response Theory e as teorias da recepção da Escola de Constança evidenciam o papel essencial do leitor na construção dos sentidos de um texto. Para Iser (1996, p. 197), o “texto só existe pelo ato de constituição de uma consciência que o recebe”. Stanley Fish define a noção de “comunidade interpretativa” como uma entidade pública e coletiva, formada por todos aqueles que compartilham das mesmas estratégias de interpretação e, partindo do princípio de que “a habilidade de interpretar não é adquirida: ela é constitutiva do ser humano”, afirma: “o que é adquirido são os modos de interpretação e esses modos podem ser esquecidos, suplantados, complicados ou dispensados” (FISH, 1980, p. 172, tradução nossa). Jauss (1979) entende o leitor como o elemento que garante a historicidade das obras literárias, e defende que uma obra só se converte em acontecimento literário a partir da relação dialógica resultante da interação entre o leitor, suas experiências anteriores e a própria obra. No estabelecimento dessa relação, o saber prévio, ou “horizonte de expectativas” do leitor sobre a obra, será determinante em sua recepção. Para o crítico, a obra suscita expectativas, desperta lembranças, “conduz o leitor a determinada postura emocional e, com tudo isso, antecipa um horizonte geral da compreensão” (JAUSS, 1994, p. 28). Nesse sentido, a historicidade coincide com a atualização da obra literária, e a recepção apresenta-se como um fator social e histórico, pois reações individuais são parte de uma leitura mais ampla de um grupo no qual o sujeito está inserido, o que pode tornar a sua leitura semelhante à de outros homens que vivem sua época. Na atual corrente francesa acerca da didática da literatura, Annie Rouxel (2013) afirma que ao se pensar o ensino de literatura é fundamental livrar-se dos “demônios do formalismo” e considerar a dimensão subjetiva e as realizações efetivas dos sujeitos leitores (alunos, estudantes, professores). Dessa forma, delineia-se uma nova perspectiva didática para o ensino de literatura, que se contrapõe à tradição escolar de um trabalho com literatura baseado na leitura analítica (de interpretação de texto com base na análise do professor e/ou dos críticos literários, ou mesmo nas respostas dos livros didáticos) e propõe uma outra perspectiva, a da leitura cursiva (leituras pessoais, autônomas e livres de coerção avaliativa), descrita como “a forma livre, direta e corrente” da leitura. Para a pesquisadora francesa, a prática da leitura literária abarca a da leitura cursiva, torna evidente a importância de se garantir um tempo em sala de aula para a leitura integral das obras, e não se reduz a uma atividade cognitiva, pois o processo de elaboração semântica enraíza-se na experiência do sujeito. Desta maneira, pode-se dizer que a prática da leitura literária possibilita a identificação e convida o leitor a uma apropriação singular das obras, favorecendo assim a construção de uma outra relação com o texto, sendo possível levar em consideração os desejos e interpretações de leitores reais. A mudança de perspectiva didática também pode ser vista no viés do ensino e da aprendizagem da escrita literária. Ao lermos um texto literário, que não nosso, a relação que estabelecemos com ele elabora algumas questões fundamentais, um “algo a mais” a oferecer. Quando escrevemos textos literários, essas questões e tantas outras também aparecem, porque são reescritas de palavras, leituras e releituras de histórias e vivências, uma continuidade ou também uma construção de “algo a mais” da literatura. Desenvolvemos um saber sobre a literatura que deve ser despertado e desenvolvido por meio do diálogo com as obras literárias, a leitura literária e a escrita literária. Tauveron (2014) aponta diferenças que balizam o trabalho da escrita literária na perspectiva do autor/escritor e do aluno. Nas atividades de sala de aula (escolares), o trabalho de escrita do aluno parece estar isolado do escritor por uma “fronteira intransponível [já que] ele não estaria apto a alcançar o status de cultivador da língua, construir seu próprio estilo” (p. 3). Desta forma, acreditamos que as atividades de escrita literária na escola possibilitam ao aluno a percepção de autoria, já que por meio da escrita ele se torna o criador de sua história. Nesse sentido, no simpósio “Leitura e escrita literárias em sala de aula: dimensões teóricas e práticas” propõe-se dar sequência à discussão sobre o que seria uma didática para a leitura literária, iniciada em simpósios temáticos da Abralic em 2020 e 2021, buscando perscrutar os desafios que se delineiam para as práticas da leitura de literatura em sala de aula e o surgimento da escrita literária como parceira dessa leitura por meio do compartilhar de pesquisas acadêmicas, experiências e vivências que estejam voltadas a essas novas perspectivas.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino de Literatura; Leitura Literária; Sujeito Leitor; Escrita Literária.

LITERATURA, EDUCAÇÃO INTERCULTURAL E CURRÍCULO ANTROPOFÁGICO
EIXO: LITERATURA E ESPAÇOS COMUNS DE APRENDIZAGEM
SIMPÓSIO: LITERATURA, EDUCAÇÃO INTERCULTURAL E CURRÍCULO ANTROPOFÁGICO
COORDENADORES:
- Marcia Paraquett (Universidade Federal da Bahia)
- Ludmila Scarano Barros Coimbra (Universidade Estadual de Santa Cruz)
- Marcos Antônio Alexandre (UFMG)
RESUMO: Antonio Candido sempre defendeu que a literatura deve ser um direito básico da humanidade, porque as narrativas interferem no caráter e na formação das pessoas. Essa também é nossa compreensão, já que nossa experiência profissional, dedicada ao que se convenciona chamar de ‘Formação de Professores’, nos leva a pensar currículos e, evidentemente, práticas que incluam a literatura nessa formação cidadã de estudantes da Educação Básica. Como discutido em Barros e Coimbra (2020, p.46), embora haja diferentes orientações teóricas que conduzem a diferentes compreensões de currículo, estamos apostando numa proposta de currículo que seja o conjunto de experiências vivenciadas por estudantes e planejadas por professores, desvinculadas de hegemonias e de silenciamentos. As autoras supracitas se referem à ‘antropofagia curricular’, ou seja, “uma ideia afinada com a lógica de uma balbúrdia que assume a diversidade como um dos elementos fundantes na construção de uma base curricular comum”. Essa compreensão não pode estar dissociada dos interesses desse Simpósio, que quer refletir sobre a presença e a ausência da literatura na Educação Básica, seja em disciplinas de língua materna ou estrangeiras, dando visibilidade a vozes literárias, de diferentes gêneros, sexualidades e etnias, que levem à aprendizagem das diferenças que nos constituem como sujeitos e sujeitas de nosso espaço geopolítico, ou seja, a América Latina. Dessa forma, as discussões no Simpósio envolverão temas fundamentais para uma educação inclusiva, como definida na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), publicada em 2018, e particularizada na Resolução Nº 2 do Conselho Nacional de Educação, publicada em 2019, e que regula as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores para a Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC-Formação). Em ambos os documentos há competências gerais que alertam para a necessidade da presença das artes na escola e na formação profissional para o magistério, como é o caso da competência de número 3, ao explicitar que cabe à escola: “Valorizar e incentivar as diversas manifestações artísticas e culturais, tanto locais quanto mundiais, e a participação em práticas diversificadas da produção artístico-cultural para que o estudante possa ampliar seu repertório cultural”. Outra competência muito relevante para os interesses desse Simpósio é a de número 9, mais orientada para uma educação intercultural, já que a escola precisa “Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos, com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de qualquer natureza” (BRASIL, 2019, p.13). Além desses dois documentos, a Educação Básica brasileira está regida pela Lei nº 11.645, de 10 de março de 2008, que dispõe sobre a inclusão no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena. Exige o documento que as escolas públicas ou privadas, nos Ensinos Fundamental e Médio, devem incluir “diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil” (BRASIL, 2008, s/p). No nosso ponto de vista, a literatura se constitui na materialidade mais adequada a esses interesses, porque nos textos poéticos convivem diferentes subjetividades e lugares de fala, assim como variadas formas de expressar a vida humana. Ademais, os textos literários são produzidos em contextos temporais e espaciais diferenciados, levando-nos a afirmar que a literatura é o ambiente mais apropriado para as discussões que levem à inclusão social, assim como não haverá materialidade mais relevante para uma práxis interdisciplinar e intercultural. Em Paraquett (2017, p.156) se esclarece que a Interculturalidade tem sido entendida com base em diferentes perspectivas, mas sempre envolvendo palavras como respeito, solidariedade, inclusão, interação e, especialmente, equidade. “Portanto, não se trata de nenhum modelo de aprendizagem, mas de uma postura que precisamos assumir como cidadãos e cidadãs, e não apenas como profissionais, se queremos conviver num mundo que seja menos agressivo e injusto”. Por isso mesmo, a Interculturalidade tem sido discutida em diferentes contextos profissionais, porque é uma urgente estratégia de comportamento diante dos conflitos a que estamos assistindo. De maneira muito objetiva, o Simpósio quer priorizar as seguintes questões: Literatura, Educação Básica, Interculturalidade, Currículo, Gêneros, Sexualidades, Etnias, mas sempre pensadas em contexto latino-americano.
PALAVRAS-CHAVE: Literaturas; Interculturalidade; Currículo

LITERATURA, ÉTICA E ESTÉTICA: TRANS/FORMANDO LEITORES NA ESCOLA E NA UNIVERSIDADE
EIXO: LITERATURA E ESPAÇOS COMUNS DE APRENDIZAGEM
SIMPÓSIO: LITERATURA, ÉTICA E ESTÉTICA: TRANS/FORMANDO LEITORES NA ESCOLA E NA UNIVERSIDADE
COORDENADORES:
- Juciane dos Santos Cavalheiro (Universidade do Estado do Amazonas)
- Márcia Lopes Duarte (UNISINOS)
- Sabrina Vier (UNISINOS)
RESUMO: Nosso Simpósio parte de duas premissas amplas e necessárias ao refletir sobre a literatura e os espaços de aprendizagem. Primeira, dada a sua “forma de conhecimento”, ou seja, a literatura como encontro entre subjetividade e alteridades. Segunda, a literatura como um direito básico, também pensado a partir de Candido, na medida em que ela humaniza, ao possibilitar vivenciar experiências outras, constituindo o ser humano como sujeito. Reside daí um compromisso ético e estético da literatura. Ético no sentido de “corresponder a uma necessidade universal, que precisa ser satisfeita e cuja satisfação se constituiu um direito” (CANDIDO, 2011, p. 177). Estético, por constituir a essência da compreensão da literatura, sobretudo a partir daquilo que marca a experiência humana, ou seja, a alteridade, o diálogo, a escuta, o conhecimento, o enfrentamento, a exotopia, pois “a princípio eu tomo consciência de mim através dos outros: deles eu recebo as palavras, as formas e a tonalidade para a formação da primeira noção de mim mesmo.” (BAKHTIN, 2017, p. 30). A autora espanhola Rosa Montero, em seu livro A louca da casa, afirma que “A imaginação sem freios é como um raio no meio da noite: abrasa, mas ilumina o mundo. [...] Na pequena noite da vida humana, a louca da casa acende as velas” (MONTERO, 2016, p. 125). Aí está o ponto crucial de nossa preocupação neste Simpósio: tentar compreender qual perspectiva estética/simbólica é inaugurada por cada obra, no sentido de demarcar os limites do imaginário pela via da perspectiva comparatista, cujo escopo permite ressignificar as relações de sentido. Borges (2007, p. 12) reflete que “a música, os estados de felicidade, a mitologia, os rostos trabalhados pelo tempo, certos crepúsculos e certos lugares querem dizer algo, ou algo disseram que não deveríamos ter perdido, ou estão aponto de dizer algo; essa iminência de uma revelação que não se produz é, quem sabe, o fato estético”. Atentar ao fato estético, a esse algo que está sempre acontecendo quando contemplamos o objeto artístico, ou que está sempre por acontecer, é imprescindível quando se pensa a leitura literária. E se, seguindo Antonio Candido (2011), a escola e a universidade são as instituições privilegiadas onde se exercem o direito à literatura, então é também necessária uma reflexão sobre a formação de professores, em que se faz a reflexão crítica sobre o texto literário, e sobre o que concerne à educação básica, na qual se deveria propiciar o contato humanístico com a literatura. Propomos, assim, neste Simpósio, a pensar o lugar da literatura de modo inseparável ao lugar da crítica e ao espaço de aprendizagem. Estes lugares e espaços formais são como que a mola propulsora para a trans/formação de leitores, sobretudo pelo acesso à acentuada diversidade de fontes, o que garante a ampliação do repertório e a formação do gosto pela leitura. São urgentes propostas metodológicas e análises de obras que transcendam a significância, levando-o, conforme afirma Larrosa (2007), ao limite de si mesmo e permitindo sua transgressão. Dessa maneira, a materialidade dos objetos artísticos, marcadamente o texto literário, precisa reverberar nos sujeitos. Isso porque “o texto só tem significado através de seus leitores; altera-se com eles” (CHARTIER, 1997, p. 12). E mais: compreender que a leitura precisa transformar o leitor, colocando-o em questão com aquilo que ele é: “a leitura como formação implica pensá-la como uma atividade que tem a ver com a subjetividade do leitor; não só com o que o leitor sabe, mas também com aquilo que ele é” (LARROSA, 2007, p. 129). Parafraseando Benveniste (1989), muito antes de comunicar algo, a leitura literária, porque transforma leitores, serve para viver. Nesse sentido, o Simpósio pretende reunir pesquisadores e interessados na potência dos espaços de aprendizagem – tanto da Educação Básica quanto do Ensino Superior – como possibilidade de vivências literárias, reunindo [a] propostas ou princípios metodológicos que coloquem em cena a ética e a estética como experiências artísticas e inter/subjetivas e [b] estudos que buscam, por meio do texto literário, refletir sobre a perspectiva estética/simbólica inaugurada em cada obra. Assim, este Simpósio busca, com base em teóricos como Alberto Manguel, Antonio Candido, Mikhail Bakhtin, Roger Chartier, Émile Benveniste, Jorge Larrosa, Walter Benjamin, Jorge Luis Borges, entre outros, pensar espaços de aprendizagem que coloquem em cena o texto literário “como algo que nos forma (ou nos de-forma ou nos trans-forma), como algo que nos constitui ou nos põe em questionamento com aquilo que somos” (LARROSA, 2003, p. 25-26).
PALAVRAS-CHAVE: Estética; Ética; Literatura; (Trans)Formação de leitores; Alteridade.
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REPRESENTAÇÕES DO ESPAÇO-TEMPO UTÓPICOS E DISTÓPICOS
- Ozíris Borges Filho (Universidade Federal do Triângulo Mineiro)
- André Pinheiro (Universidade Federal do Piauí)
- Sidney Barbosa (Universidade de Brasília)
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UTOPIAS E DISTOPIAS NOS MUNDOS POSSÍVEIS DO INSÓLITO FICCIONAL
- Flavio García (Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
- Marisa Martins Gama-Khalil (Universidade Federal de Uberlândia)
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UTOPIAS MEDIEVAIS: ENTRE VIAGENS, MARAVILHAS E A FORMAÇÃO DO CORTESÃO
- Raúl Cesar Gouveia Fernandes (Centro Universitário FEI)
- Geraldo Augusto Fernandes (Universidade Federal do Ceará)

REPRESENTAÇÕES DO ESPAÇO-TEMPO UTÓPICOS E DISTÓPICOS
EIXO: REINVENÇÕES DO MUNDO: UTOPIAS E DISTOPIAS
SIMPÓSIO: REPRESENTAÇÕES DO ESPAÇO-TEMPO UTÓPICOS E DISTÓPICOS
COORDENADORES:
- Ozíris Borges Filho (Universidade Federal do Triângulo Mineiro)
- André Pinheiro (Universidade Federal do Piauí)
- Sidney Barbosa (Universidade de Brasília)
RESUMO: Em termos filosóficos e científicos é visível a importância dada às reflexões sobre o tempo. Basta lembramos as obras fundamentais Durée et simultanéité: à propos de la théorie d’Einstein de Henri Bergson, publicado em 1922 e a obra capital de Martin Heidegger, O ser e o tempo, publicado em livro em 1927 e lembraríamos ainda Georges Poulet e o famoso livro Études sur le temps humain, de 1949. Desde o fim do século XIX, pesquisadores vinham refletindo sistematicamente sobre a categoria “tempo” em seus múltiplos aspectos, não apenas na ciência, mas também nas artes e na religião. No campo da Teoria da Literatura, no século XX, são significativos os trabalhos de Meyerhoff, Mendilow, Pouillon, Ricoeur e Genette para citar alguns. No entanto, a partir de investigações contemporâneas, sabemos que o século XX também produziu obras significativas sobre a categoria do espaço. Para Jameson (2002), o ressurgimento do interesse pelo espaço se deve a Henri Lefèbvre com seu livro La production de l’espace, de 1974. Acrescentaríamos ainda a importante obra de George Matoré L'espace humain, publicada em 1962. Já nos anos setenta, Edward Soja anuncia a virada espacial(the spatial turn) nas ciências sociais, privilegiando o espaço ao tempo. Na Teoria da Literatura, a primeira metade do século XX também se ateve ao estudo da espacialidade: Percy Lubbock(1921); Edwin Muir(1928); Auerbach(1946); Curtius(1948) todos eles falaram sobre a importância do espaço na obra literária mesmo que esse não tenha sido o tema principal de suas obras(o tempo também não o foi). Já na segunda metade do século XX, no campo dos estudos literários, surgem obras específicas sobre a categoria do espaço, cuja bibliografia mundial é, hoje em dia, muito maior que aquela sobre o tempo. Acreditamos que o século XXI é aquele que deve ir além da virada espacial. Já superemos o tempo do tempo. Já superamos o tempo do espaço. Estamos no tempo do espaço-tempo, ou, como propôs Bakhtin, cronotopo. (Miterrand, 1990; Bemong, 2015) Entre 1937 e 1938, Bakhtin escreveu o texto Formas de tempo e de cronotopo no romance - ensaios de poética histórica. Em 1973, ele acrescentou um texto ao final daquele primeiro a que chamou de “Observações finais”. Apesar de ser um texto publicado há mais de cinqüenta anos, ele ainda é atual e foi pouco tratado pelos estudos literários. Ao que se sabe, o teórico russo foi o primeiro a trazer para os estudos literários a idéia de uma abordagem indissociável entre o espaço e o tempo. A essa junção das duas categorias da narrativa, ele chamou de cronotopo. Atente-se para o fato de que Bakhtin, ao contrário do que afirma FIORIN (2006, p. 133), não é o criador do conceito de cronotopo. Como escreve o próprio autor russo: “Esse termo é empregado nas ciências matemáticas e foi introduzido e fundamentado com base na teoria da relatividade (Einstein).” (p. 211) Assim, Bakhtin transpõe o conceito para a literatura, naturalmente fazendo as adaptações para o campo literário. Como afirma o autor russo, ele transpõe o conceito “para a crítica literária quase como uma metáfora (quase, mas não totalmente).” Apesar de ter sido o primeiro a trazer tal conceito para os estudos literários cumpre salientar que as relações espaço-tempo estavam na ordem do dia nos anos vinte. Além do texto Formas do tempo e cronotopo no romance, o estudioso russo disserta sobre o conceito de cronotopo no texto O romance de educação na história do Realismo que se encontra no livro Estética da criação verbal. Esse texto foi escrito entre 1936 e 1938. Portanto, é provável que ele tenha sido escrito na sequência do primeiro que mencionamos, formando um todo. Esses são os dois únicos textos em que Bakhtin trabalha explicitamente com a noção de cronotopo. Este simpósio pretende refletir sobre a indissociabilidade entre espaço-tempo e suas implicações nas representações literárias das Utopias e Distopias. Para tal reflexão, claro, o instrumental teórico não precisa ser necessariamente de origem ou influência bakhtinianas, mas aceitam-se amplos caminhos metodológico-interpretativos. Desde os gregos sabemos que a vida não é possível sem essas duas categorias básicas da existência. Não se pode ser sem estar. Ser é ser em algum lugar. Nesse sentido, o presente GT pretende refletir de que maneira as representações espaço-temporais na literatura refletem sobre o nosso modo de ser, de estar e de com/partilhar seja na solidão de nós mesmos, seja no contato com outro, seja em cronotopos utópicos, seja em cronotopos distópicos. Enfim, serão bem-vindos trabalhos que problematizem o espaço-tempo na literatura a partir de múltiplas visões teóricas e pragmáticas.
PALAVRAS-CHAVE: Cronotopo; Cronotopanálise; Espaço; Tempo; Utopias; Distopias.

UTOPIAS E DISTOPIAS NOS MUNDOS POSSÍVEIS DO INSÓLITO FICCIONAL
EIXO: REINVENÇÕES DO MUNDO: UTOPIAS E DISTOPIAS
SIMPÓSIO: UTOPIAS E DISTOPIAS NOS MUNDOS POSSÍVEIS DO INSÓLITO FICCIONAL
COORDENADORES:
- Flavio García (Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
- Marisa Martins Gama-Khalil (Universidade Federal de Uberlândia)
RESUMO: Toda ficção constitui-se de procedimentos paradoxais, e, mesmo quando seu mundo possível assemelha-se com o mundo objetivo, ele é apenas uma seleção (re)ordenada de referenciais deste. As imagens de que um texto compõe-se são o resultado da seleção e da combinação intencionais do autor, a partir dos referentes que acessa na realidade. Conforme Lubomir Dolezel (1999), três aspectos delineiam os mundos possíveis: não indicam uma evidência factual, determinam mundos infinitos e variáveis, enunciam plausibilidades em relação ao mundo objetivo. Para ele, um mundo possível não pode ser enquadrado a partir das grades da mimesis, entretanto, deve instigar à narrativa ficcional uma autonomia da realidade, sendo entendida, pois, não como uma narrativa de imitação, mas como uma narrativa de múltiplos mundos. Carlos Reis, com base em Marie-Laure Ryan (1991) e Thomas Pavel (1986), explica que “no âmbito da teoria literária e da ficção, [tem-se] sublinhado a pertinência operatória da expressão mundo possível, como ponto de partida para a configuração do conceito de mundo ficcional”. Nessa linha de entendimento, ele define que um mundo possível é um “construto abstrato, funcionando como modelo alternativo ao mundo real” (2018, p. 274). A arte constrói-se por uma topologia especial, oferece-se como espaço plurissignificativo exatamente por derivar da estrutura aberta dos mundos possíveis, canal que se planteia a partir de mundos pretensamente objetivos, propiciando infinitas aberturas para novas dimensões. A tela A traição das imagens, de René Magritte (1929), demonstra que o mundo possível da ficção nunca é, literalmente, um mundo pretensamente objetivo, apesar de compartilhar aspectos similares com este, pois o cachimbo representado na tela é muito próximo imageticamente de um cachimbo real, mas sua materialidade unidimensional anula essa proximidade. Para Roland Barthes (2007), pela natureza do discurso literário, não há como fazer coincidir a ordem pluridimensional do real com a ordem unidimensional da linguagem. Umberto Eco (1994) argumenta que até mesmo a ficção fantástica erguerá um mundo possível fundado por aproximações com o mundo empírico, como em A metamorfose de Franz Kafka (1997), na qual Gregor Samsa, ao acordar, vê-se transformado em um enorme inseto. A narrativa é tecida através de um discurso detalhado, apresentando a descrição realista de um inseto, com a distinção apenas da sua desproporcionalidade: o inseto tem o tamanho de um homem, o tamanho de Gregor Samsa. Na perspectiva de Flavio García, esse mundo possível composto por Kafka em A metamorfose seria um exemplo de mundo do insólito ficcional. A proposta deste simpósio é reunir trabalhos que tratem da construção de mundos possíveis do insólito ficcional, tomando como base cenários utópicos ou distópicos. Na utopia, a ficção se baseia em uma visão idealizada de mundo. Ela “não pretende destruir a realidade atual que aceita no que ela tem de melhor; portanto, a sociedade que ela mostra é apenas sua projeção, na qual os aspectos positivos são maximizados” (MAFFEY, 2000, p. 1286). A distopia ficcionaliza um mundo possível como “uma sociedade inexistente descrita em detalhes precisos e normalmente localizada em um tempo e espaço em que o(a) leitor(a) contemporâneo(a) consegue enxergar uma estrutura social consideravelmente pior que a sociedade na qual ele(a) vive” (MEIRELLES, 2020). As fronteiras entre utopia e distopia dispõem-se de movente e tenuemente, pois o que é utopia para uns pode ser distopia para outros. Na configuração social da Utopia, projetada por Thomas Morus (2004), por exemplo, há a escravidão, que revela uma contradição, na medida em que aquela sociedade projetada era utopia para uns, mas não para os escravos. Para estes, a utopia tinha feitio de distopia. Tanto as utopias como as distopias elaboram mundos ficcionais a partir de mundos possíveis, e são caras aos debates que se desenvolverão neste simpósio. Referências: BARTHES, R. Aula. São Paulo: Cultrix, 2007. DOLEZEL, L. Heterocosmica: Ficción y mundos posibles. Tradução de Félix Rodríguez. Madrid: Arcos Livros, 1999. ECO, U. Bosques Possíveis. In. ECO, Umberto. Seis passeios pelos bosques da ficção. São Paulo: Companhia das Letras, p. 81-102, 1994. GARCÍA, F. Insólito. In: JOBIM, J. L.; ARAÚJO, N.; SASSE, P. P. (Orgs.). (Novas) Palavras da crítica. Rio de Janeiro: Makunaíma, p. 276-291, 2021. Disponível em: www.edicoesmakunaima.com.br/images/livros/novas_palavras_da_critica.pdf. Acesso em: 17 de mar. De 2022. KAFKA, F. A metamorfose. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. MAFFEY, A. Utopia. In: BOBBIO, N.; GIANFRANCO, P.; MATTEUCCI, N. (Orgs.). Dicionário de política. Brasília: UnB; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2000. p. 1284-1290. MEIRELES, A. In: REIS, C.; ROAS, D.; FURTADO, F.; GARCÍA, F.; FRANÇA, J. (Eds.). Dicionário Digital do Insólito Ficcional (e-DDIF). Rio de Janeiro: Dialogarts. Disponível em: www.insolitoficcional.uerj.br/m/medo. Acesso em: 16 de mar. De 2020. MORUS, T. Utopia. Brasília: Editora Universidade de Brasília/ Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, 2004. PAVEL, T. Fictional Worlds. Cambridge/London: University Press, 1986. REIS, C. Dicionário de Estudos Narrativos. Coimbra: Almedina, 2018. RYAN, M-L. Possible Worlds, Artificial Intelligence, and Narrative Theory. Bloomington/Indiana: Indiana University Press, 1991.
PALAVRAS-CHAVE: Mundos Possíveis. Mundos Ficcionais. Insólito Ficcional. Fantástico. Ficção Utópica. Ficção Distópica. Ficção Apocalí

UTOPIAS MEDIEVAIS: ENTRE VIAGENS, MARAVILHAS E A FORMAÇÃO DO CORTESÃO
EIXO: REINVENÇÕES DO MUNDO: UTOPIAS E DISTOPIAS
SIMPÓSIO: UTOPIAS MEDIEVAIS: ENTRE VIAGENS, MARAVILHAS E A FORMAÇÃO DO CORTESÃO
COORDENADORES:
- Raúl Cesar Gouveia Fernandes (Centro Universitário FEI)
- Geraldo Augusto Fernandes (Universidade Federal do Ceará)
RESUMO: UTOPIAS MEDIEVAIS: ENTRE VIAGENS, MARAVILHAS E A FORMAÇÃO DO CORTESÃO Ainda que o termo “utopia” tenha sido empregado pela primeira vez por Thomas More apenas em 1516, é legítimo dizer que o conceito pode ser útil para descrever também elementos da literatura e da cultura medievais (FRANCO JR., 2021). Com efeito, como em todos os demais momentos da história, o homem medieval também procurou compreender os motivos das injustiças, do sofrimento e das violências que sempre estiveram sempre presentes na sociedade, imaginando e descrevendo distintas realidades utópicas em que a humanidade finalmente pudesse se ver livre de todo mal (da fome, da guerra e das doenças). A partir do relato bíblico da Queda de Adão e Eva e de sua expulsão do Paraíso (KRAUSS, 2006), a imaginação utópica medieval se divide entre o retorno a um passado edênico, em que os seres humanos ainda viviam em plena comunhão entre si e com Deus, e a imaginação de locais misteriosos em que fosse possível viver em plenitude. Assim como no caso da Ilha de Utopia, criada por Thomas More, a cultura medieval muitas vezes imaginou sucedâneos do Paraíso Terrestre, situados em terras longínquas, “ilhas utópicas” ou reinos fantásticos, como o da Cocanha ou de Preste João, entre muitos outros (DELUMEAU, 1994). O acesso a esses locais pode se dar por meio de viagens fantásticas, mas também por meio de visões e sonhos: alguns exemplos disso são a Divina Comédia, a Vida de São Brandão e a Visão de Túndalo. Dado que a busca pelo Paraíso implica um deslocamento ou viagem (ZIERER, 2002), fica evidente sua ligação com outros aspectos relevantes da cultura medieval: não apenas com as peregrinações, como até mesmo com a noção de homo viator, que, conforme observou Jacques Le Goff, é a imagem que melhor representa a condição humana, de acordo com a mentalidade medieval (LE GOFF, 1989). Daí que o tema da utopia permita lançar novos olhares também a outros temas centrais da literatura medieval, como são os da cavalaria e do amor. Com efeito, o cavaleiro andante não deixa de ser, a seu modo, um peregrino “em demanda” de aventuras, da glória pessoal ou de sua salvação – à busca de si mesmo, em suma (MONGELLI, 1995). Em seu caminho, ele se depara com aventuras (ou provas), mas também com maravilhas que permitem entrever o significado oculto das circunstâncias e da realidade quotidiana, revelando sentidos e dimensões até então desconhecidos (KÖHLER, 1984; LE GOFF, 1985). Por isso, Johan Huizinga retratou a figura do cavaleiro como “representante da liberdade absoluta em direção ao ideal” (s.d, p. 79). Por outro lado, da mesma forma que o Graal pode ser compreendido como símbolo de uma realidade supra-humana, que permite a realização ideal do homem em busca, com frequência o amor também pode representar uma via privilegiada de acesso à divindade, como proclama S. Bernardo de Claraval (GILSON, 1934). No entanto, o amor também pode assumir outro tipo de função claramente educativa e enobrecedora no espaço de corte, como o declaram insistentemente os trovadores provençais e galego-portugueses (SCHNELL, 1989). Ainda que por vezes em contradição com preceitos religiosos e até mesmo com a moral da época, o debate profano sobre o amor não deixa de ser de algum modo decalcado na mística, prometendo a realização de um sonho de felicidade e realização que tem muito de utópico. Em síntese, a proposta do presente seminário pretende explorar o tema das utopias medievais dos mais diversos pontos de vista, reunindo interessados sobre diferentes aspectos das letras na Idade Média. DELUMEAU, J. Uma história do Paraíso. O Jardim das Delícias. Lisboa: Terramar, 1994. FRANCO JR., H. Em busca do Paraíso Perdido: as utopias medievais. Cotia: Ateliê, 2021. GILSON, E. La théologie mystique de Saint Bernard. Paris: J. Vrin, 1934. HUIZINGA, J. O declínio da Idade Média. 2 ed. Lisboa: Ulisseia, s,d. KÖHLER, E. L’aventure chevaleresque: idéal et réalité dans le roman courtois. Paris: Gallimard, 1984. KRAUSS, H. O Paraíso: de Adão e Eva às utopias contemporâneas. São Paulo: Globo, 2006. LE GOFF, J. O homem medieval. Lisboa: Presença, 1989. LE GOFF, J. O maravilhoso e o quotidiano no Ocidente medieval. Lisboa: Edições 70, 1985. MONGELLI, L. M. Por quem peregrinam os cavaleiros de Artur. Cotia: Íbis, 1995. SCHNELL, R. L’amour courtois en tant que discours courtois sur l’amour. Romania, t. 110, n. 437-438, 1989, p. 72-126. ZIERER, A. Paraíso versus inferno: a Visão de Túndalo e a viagem medieval em busca da salvação da alma (séc. XIII). Mirabilia, v. 2, 2002, p. 150-184.
PALAVRAS-CHAVE: LITERATURA MEDIEVAL; UTOPIA